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V - O Partido e a Classe Operária Dentro do Sistema da Ditadura do Proletariado
Falei mais atrás da ditadura do proletariado do ponto de vista de seu caráter historicamente inevitável, do ponto de vista de seu conteúdo de classe, do ponto de vista de seu caráter como Estado, e, finalmente, do ponto de vista de seus objetivos destrutivos e criadores, objetivos que se realizam no decorrer de todo um período histórico, que é o período de transição do capitalismo ao socialismo.
Vamos falar, agora, da ditadura do proletariado do ponto de vista de sua estrutura, do ponto de vista de seu "mecanismo", do ponto de vista do papel e do significado "correias de transmissão", "alavancas" e "força orientadora", as quais, em seu conjunto, formam o "sistema da ditadura do proletariado" (Lenine) e por meio das quais se leva a cabo a tarefa diária da ditadura do proletariado.
Quais são estas "correias de transmissão" ou "alavancas" dentro do sistema da ditadura do proletariado? Qual é essa "força orientadora"? Para que fins são necessárias?
As alavancas ou correias de transmissão são aquelas organizações de massa do proletariado sem cujo auxilio é impossível pôr em pratica a ditadura.
A força orientadora é o destacamento de primeira linha do proletariado, sua vanguarda, que constitui a força dirigente e fundamental da ditadura do proletariado.
Estas correias de transmissão, alavancas e força orientadora são necessárias para o proletariado porque, sem elas, este se encontraria, em sua luta pela vitória, na situação de um exército sem armas frente ao capital organizado e armado. Estas organizações são necessárias para o proletariado, porque, sem elas, ele sofreria uma derrota irremediável em sua luta pela derrubada da burguesia, na luta pela consolidação de seu poder, na luta pela construção do socialismo. O auxilio sistemático destas organizações e a força orientadora da vanguarda são necessárias, porque, sem estas condições, é impossível uma ditadura do proletariado mais ou menos estável e sólida.
Quais são estas organizações?
São, em primeiro lugar, os sindicatos operários com suas ramificações no centro e na base, sob a forma de toda uma serie de organizações de produção, de cultura, de educação, etc. Estas organizações unificam todos os operários de todos os ofícios. Não se trata de uma organização de partido. Pode-se dizer que os sindicatos são a organização geral da classe operária dominante em nosso país. Os sindicatos são a escola do comunismo. Destacam-se de seu seio os melhores homens para o trabalho dirigente em todos os ramos da administração. Servem de ligação entre os elementos mais avançados e os mais atrasados dentro da classe operária. Unem as massas operárias com a vanguarda da classe operária.
São, em segundo lugar, os Soviets, com suas numerosas ramificações no centro e na base, sob a forma de organizações administrativas, econômicas, militares e culturais, alem das demais organizações do Estado, ligadas a inumerável quantidade de associações de massas de trabalhadores surgidas espontaneamente e que envolvem essas organizações, unindo-as à população. Os Soviets são uma organização de massas de todos os trabalhadores da cidade e do campo. Não são uma organização de partido. Os Soviets são a expressão direta da ditadura do proletariado. Através dos Soviets passam todas e cada uma das medidas de consolidação da ditadura e da construção do socialismo. Por meio dos Soviets, leva-se a cabo a direção estatal dos camponeses pelo proletariado. Os Soviets unem os milhões e milhões de trabalhadores com a vanguarda do proletariado.
São, em terceiro lugar, todos os tipos de cooperativas, com todas as suas ramificações. A cooperativa é uma organização de massas dos trabalhadores, uma organização sem partido, que unifica os trabalhadores, antes de mais nada, como consumidores e, no decorrer do tempo, também como produtores (nas cooperativas agrícolas). Esta organização adquire importância especial depois da consolidação da ditadura do proletariado, durante o período da construção em grande escala. Facilita o contacto da vanguarda do proletariado com as massas camponesas e fornece a possibilidade de arrastar essas massas para os canais da edificação socialista.
Em quarto lugar, temos a União das Juventudes. É esta uma organização de massas da juventude operária e camponesa, organização que não pertence ao Partido, mas lhe dá apoio. Sua missão é ajudar o Partido a educar a nova geração no espírito do socialismo. Fornece reservas novas às demais organizações de massas do proletariado, em todos os ramos da administração. A União das Juventudes adquiriu importância especial depois da consolidação da ditadura do proletariado, durante o período de realização do vasto trabalho cultural e educativo do proletariado.
Por último, é o Partido do proletariado, sua vanguarda. A força do Partido consiste em absorver os melhores homens do proletariado, saídos de todas as suas organizações de massas. Sua missão consiste em unificar o trabalho de todas as organizações de massas do proletariado, sem exceção, e encaminhar suas atividades para um só objetivo: a libertação do proletariado. E isto, unificar e encaminhar seus atos na direção de um só objetivo, é absolutamente necessário, pois, sem isso, é impossível a unidade de luta do proletariado, sem isso, é impossível dirigir as massas proletárias na sua luta pelo poder, na sua luta pela construção do socialismo. Mas só a vanguarda do proletariado, o seu Partido, é capaz de unificar e encaminhar o trabalho das organizações de massas do proletariado. Só o Partido do proletariado, só Partido dos comunistas é capaz de desempenhar este papel de dirigente principal dentro do sistema da ditadura do proletariado.
Por que?
"Primeiro, porque o Partido é o ponto no qual se concentram os melhores elementos da classe operária, mantém vinculas diretos com as organizações sem partido do proletariado e, com frequência, as dirige; segundo, porque o Partido, como um ponto no qual se concentram os melhores elementos da classe operária, é a melhor escola para a formação dos chefes da classe, operária, capazes de dirigir todas as formas de organização de sua classe; terceiro, porque o Partido, como a melhor escola para a formação dos chefes da classe operária, é, por sua experiência e autoridade, a única organização capaz de centralizar a direção da luta do proletariado, convertendo assim todas e cada uma das organizações sem partido da classe operária em órgãos auxiliares e em correias de transmissão que unem o Partido à classe". (Veja-se Sobre os Fundamentos do Leninismo).
O Partido é a força dirigente fundamental dentro do sistema da ditadura do proletariado.
"O Partido é a forma superior da unificação de classe do proletariado". (Lenine).
Resumindo: os sindicatos, como organização de massas do proletariado, que vinculam o Partido à classe operária, principalmente no que se refere à produção, os Soviets, como organização de massas dos trabalhadores, que vinculam o Partido a estes, principalmente no sentido do Estado; as cooperativas, como organização de massas, principalmente dos camponeses, que vinculam o Partido às massas camponesas, principalmente no sentido econômico, no sentido de atrair os camponeses para a edificação socialista; a União das Juventudes, com organização de massas da juventude operária e camponesa, chamada a facilitar à vanguarda do proletariado a educação socialista da nova geração e a formação de reservas juvenis; e, finalmente, o Partido, como força fundamental, orientadora, dentro do sistema da ditadura do proletariado, chamada a dirigir todas essas organizações de massas. Tal é, em traços gerais, o quadro do "mecanismo" da ditadura, o quadro do "sistema da ditadura do proletariado".
Sem o Partido, como força dirigente fundamental, não pode haver ditadura do proletariado mais ou menos estável e solida.
Desse modo, para usar as palavras de Lenine,
"obteremos, em conjunto, um aparelho proletário, formalmente não comunista, flexível e relativamente amplo, potentíssimo, por meio do qual o Partido estará estreitamente ligado à classe e à massa e por meio do qual se conseguirá a ditadura de classe sob a direção do Partido". (Lenine, t. XXV, pág. 192, Extremismo, Doença Infantil do Comunismo).
Isso, naturalmente, não significa que o Partido possa ou deva substituir os sindicatos, os Soviets e as demais organizações de massas. O Partido realiza a ditadura do proletariado, não o fazendo, porém, diretamente, mas sim com o auxilio dos sindicatos, por meio dos Soviets e de suas ramificações. Sem essas "correias de transmissão", seria impossível uma ditadura mais ou menos solida.
"Não é possível — diz Lenine — levar a ditadura er seu fermo sem que haja algumas "correias de transmissão" entre a vanguarda e a massa da classe avançada, entre essa e a massa dos trabalhadores... "O Partido absorve, por assim dizer, a vanguarda do proletariado, e esta vanguarda leva a seu termo a ditadura do proletariado. E, sem uma base como a dos sindicatos, não se pode chegar à ditadura, não se pode cumprir as funções do Estado. Estas têm que se realizar por meio (sublinhado por Stálin) de uma série de instituições especiais também de tipo novo, e concretamente por meio (sublinhado por Stálin) do aparelho soviético". (Lenine, t. XXVI, págs. 65 e 64, Sobre os Sindicatos).
Em nosso país, a União Soviética, no país da ditadura do proletariado, deve-se, por exemplo, considerar como expressão superior do papel dirigente do Partido o fato de que não haja uma só questão importante de política ou de organização que as organizações soviéticas ou as outras organizações de massas de nosso país resolvam sem as indicações orientadoras do Partido. Nesse sentido, poder-se-ia dizer que a ditadura do proletariado é, substancialmente, a "ditadura" de sua vanguarda, a "ditadura" de seu Partido, com força fundamental dirigente do proletariado. Eis o que Lenine dizia, a respeito, no II Congresso da Internacional Comunista:
"Tanner diz ser partidário da ditadura do proletariado, mas não imaginar a ditadura do proletariado como nós a imaginamos. Diz que entendemos a ditadura dó proletariado, substancialmente (sublinhado por Stálin), como sendo a ditadura de sua minoria organizada e consciente. Na época do capitalismo, com efeito, quando as massas operárias se encontram submetidas a uma exploração permanente e não podem desenvolver suas faculdades humanas, o que mais caracteriza os partidos políticos operários é precisamente o fato de só poderem abranger uma minoria de sua classe. Um partido político só pode unificar a minoria da classe, do mesmo modo que os operários realmente conscientes de toda a sociedade capitalista formam apenas uma minoria dentro da totalidade dos operários. Isto obriga-nos a reconhecer que só essa minoria consciente pode dirigir as grandes massas operárias e levá-las consigo, E, se o camarada Tanner diz que é inimigo dos partidos, mas, ao mesmo tempo, advoga que a minoria dos operários, mais organizados e mais revolucionários, deve apontar o caminho a todo o proletariado, então posso dizer que, na realidade, não há diferença entre nós". (Lenine, t. XXV, pág. 347, discurso pronunciado no II Congresso da Internacional Comunista Sobre o Papel do Partido Comunista).
Mas significa isso que se pode traçar entre a ditadura do proletariado e o papel dirigente do Partido ("ditadura" do Partido) um sinal de igualdade, isto é, que se pode identificar a primeira com o segundo, que se pode substituir a primeira pelo segundo? Naturalmente que não! Naturalmente que não se pode fazer isso! Sorin, por exemplo, diz que
"a ditadura do proletariado é a ditadura do nosso Partido". (Veja-se A Doutrina de Lenine Sobre o Partido, pág. 95).
Como vedes, esta tese identifica a "ditadura do Partido" com a ditadura do proletariado. Pode-se considerar exata esta identificação sem sair do terreno do leninismo? Não, não se pode. E eis porque não se pode:
Primeiro — No trecho atrás citado, de seu discurso, no II Congresso da Internacional Comunista, Lenine não identifica de modo algum o papel dirigente do Partido com a ditadura do proletariado. Diz unicamente que
"só a minoria consciente (isto é, o Partido, J. Stalin) pode dirigir as grandes massas operárias e levá-las consigo" e, nesse sentido, precisamente, "por ditadura do proletariado entendemos, substancialmente, (sublinhado por Stálin) a ditadura de sua minoria organizada e consciente".
Dizer "substancialmente" não quer dizer "integralmente". Dizemos, com freqüência, que o problema nacional é, substancialmente, um problema camponês. E isto é bastante exato. Mas isso não significa que o problema nacional se limita ao problema camponês, que o problema camponês seja igual ao problema nacional em toda a sua grandeza, que o problema camponês se identifique com o problema nacional. Não é preciso demonstrar que o problema nacional é, por sua grandeza, um problema mais amplo e de mais conteúdo que o problema camponês. O mesmo deve-se dizer, por analogia, no que se refere papel dirigente do Partido e à ditadura do proletariado. Se o Partido leva a seu termo a ditadura do proletariado e, nesse sentido, pode-se dizer que a ditadura do proletariado é, substancialmente, a "ditadura" de seu Partido, isto não significa que a "ditadura do Partido" (seu papel dirigente) seja idêntica à ditadura do proletariado, que a primeira seja igual à segunda, no que se refere à sua amplitude. Não é preciso demonstrar que a ditadura do proletariado é, por sua amplitude, mais extensa e de mais conteúdo do que o papel dirigente do Partido. O Partido leva a seu termo a ditadura do proletariado, mas o que ele realiza é a ditadura do proletariado e nenhuma outra. Quem identifica o papel dirigente do Partido com a ditadura do proletariado substitui a ditadura do proletariado pela "ditadura" do Partido.
Segundo — Nem uma só resolução importante das organizações de massas do proletariado é adotada sem as indicações orientadoras do Partido. Isso é completamente exato. Mas, acaso, isto significa que a ditadura do proletariado se reduz às indicações orientadoras do Partido? Acaso isso significa que, por esta razão, as indicações orientadoras do Partido possam identificar-se com a ditadura do proletariado? Naturalmente que não! A ditadura do proletariado consiste nas indicações orientadoras do Partido, mais a realização dessas indicações pelas organizações de massas do proletariado, e mais a sua encarnação na realidade pelo trabalho da população. Estamos, pois diante de toda uma serie de transições e graus intermediários, que constituem um elemento nada desprezível da ditadura do proletariado. Entre as indicações orientadoras do Partido e sua encarnação na realidade, intervêm, pois, a vontade e a ação dos dirigidos a vontade e a ação da classe, sua inclinação (ou aversão) a apoiar estas indicações, sua aptidão (ou inaptidão) para levá-las à prática precisamente na forma que exige a situação. Não é preciso demonstrar que o Partido, que tomou a seu cargo a direção, não pode deixar de tomar em consideração a vontade, o estado e o nível de consciência dos dirigidos, não pode deixar de lado a vontade, o estado e o nível de consciência de sua classe. Por isso, quem identifica o papel dirigente do Partido com a ditadura do proletariado substitui a vontade e a ação da classe pelas diretivas do Partido.
Terceiro — "A ditadura do proletariado — diz Lenine — é a luta de classes do proletariado que triunfou e tomou em suas mãos o poder político". (Lenine, t. XXIV, pág. 311, discurso pronunciado no Congresso das Instituições de Instrução Extra-escolar). Em que se pode expressar esta luta de classes? Pode expressar-se numa serie de ações armadas do proletariado contra as intentonas da burguesia derrotada ou contra a intervenção da burguesia estrangeira. Pode expressar-se na guerra civil, se o poder do proletariado ainda não se consolidou. Pode expressar-se num amplo trabalho construtivo e de organização do proletariado, já depois da consolidação do poder, atraindo para esse obra as grandes massas. Em todos esses casos, quem atua é o proletariado como classe. Ainda não se deu o caso de o Partido, só o Partido, ter organizado todas essas ações exclusivamente com suas forças, sem o apoio da classe. Geralmente, o Partido não faz senão dirigir essas ações e as dirige na medida em que conta com o apoio da classe, pois o Partido não pode igualar, não pode substituir a classe, pois o Partido, com todo o seu importante papel dirigente, continua sendo, de qualquer modo, uma parte da classe. Por isso, quem identifica o papel dirigente do Partido com a ditadura do proletariado substitui a classe pelo Partido.
Quarto — O Partido leva a seu termo a ditadura do proletariado. "O Partido é a vanguarda diretamente governante do proletariado, é o dirigente" (Lenine). Nesse sentido, o Partido toma o Poder e governa o país. Mas isso não significa que o Partido leve a seu termo a ditadura do proletariado passando por cima do poder do Estado, sem o poder do Estado; que o Partido governe o país prescindindo dos Soviets e não por meio dos Soviets. Isso não significa que o Partido possa identificar-se com os Soviets, com o poder do Estado. O Partido é o núcleo central do poder. Mas não é o poder do Estado nem se pode identificar com ele.
"Como partido governante — dizia Lenine — não podíamos deixar de fundir as "camadas superiores" dos Soviets com as "camadas superiores" do Partido: em nosso país estão e continuarão a estar fundidas". (Lenine, t. XXVI, pág. 203, informe feito no X Congresso do P.C. (b) da Rússia: Sobre o Trabalho Político do Comitê Central).
É absolutamente certo. Mas com isso Lenine não quer dizer, nem de longe, que nossas instituições soviéticas, em conjunto, por exemplo: nosso exército, nosso transporte, nossas instituições econômicas, etc., sejam instituições de nosso Partido, que o Partido possa substituir os Soviets e suas ramificações, que se possa identificar o Partido com o Poder do Estado.
Lenine repetiu mais de uma vez que
"o sistema dos Soviets é a ditadura do proletariado", que "o Poder soviético é a ditadura do proletariado". (Lenine, f, XXIV, págs. 14 e 15, discurso e tese Sobre a democracia burguesa e a ditadura do proletariado),
mas não disse nunca que o Partido é o poder do Estado, que os Soviets e o Partido são a mesma coisa. O Partido, que conta com algumas centenas de milhares de membros dirige os Soviets e suas ramificações no centro e na base, ramificações que abrangem milhões de pessoas, filiadas ao Partido e sem partido; mas não pode nem deve substituí-las. Eis porque Lenine diz que
"a ditadura é realizada pelo proletariado organizado, dentro dos Soviets, dirigido pelo Partido Comunista bolchevique", que "todo o trabalho do Partido se realiza através (sublinhado por Stálin) dos Soviets, que unificam as massas trabalhadoras sem distinção de ofícios". (Lenine, t. XXV, pág. 192-193, Extremismo, Doença Infantil do Comunismo), que a ditadura "há de ser levada a cabo... através (sublinhado por Stálin) do mecanismo soviético" (Lenine, t. XXVI, pág. 64, Sobre os sindicatos).
Quem identificar, portanto, o papel dirigente do Partido com a ditadura do proletariado estará substituindo os Soviets, ou, seja, o poder do Estado pelo Partido.
Quinto — O conceito ditadura do proletariado é um conceito estatal. A ditadura do proletariado contém, forçosamente, a idéia de violência. Sem violência não pode haver ditadura, sempre e desde que a ditadura seja compreendida no sentido exato da palavra. Lenine define a ditadura do proletariado como
"o poder que se apóia diretamente na violência". (Lenine, t XIX, pág. 315, A palavra de ordem do desarmamento).
Por isso, falar da ditadura do Partido em relação à classe dos proletários e identificá-la com a ditadura do proletariado significa a mesma coisa que dizer que o Partido deve ser, com relação à sua classe, não só o dirigente, não só o chefe e o mestre, mas também uma espécie de poder estatal que emprega a violência contra a classe. Quem identificar, portanto, a "ditadura do Partido" com a ditadura do proletariado parte logicamente do fato de que a autoridade do Partido se pode basear na violência, o que é coisa absurda e absolutamente incompatível com o leninismo. A autoridade do Partido mantêm-se baseada na confiança da classe operária. Mas a confiança da classe operária não se conquista pela violência — pela violência é que ela se extingue — mas pela justeza da teoria do Partido, pela política justa do Partido, pela abnegada lealdade do Partido à classe operária, por sua união com as massas da classe operária, por sua disposição, por sua capacidade para convencer as massas do acerto e da justeza de suas palavras de ordem.
Que se conclui de tudo isso? Conclui-se:
Chegamos, pois, ao problema das relações mutuas entre o Partido e a classe, entre os membros do Partido e os homens sem partido dentro da classe operária.
Lenine define essas relações com uma "confiança mútua" (sublinhado por Stálin) entre a vanguarda da classe operária e a massa operária". (Lenine, t XXVI, pág. 235, discurse pronunciado no X Congresso do P.C. (b) da Rússia Sobre os Sindicatos).
Que significa isso?
Significa, em primeiro lugar, que o Partido deve estar atento à voz das massas; prestar atenção ao instinto revolucionário das massas; estudar a experiência da luta das massas, comprovando, desse modo, a justeza de sua política; e, portanto, deve não somente ensinar às massas, mas também aprender com elas.
Significa, em segundo lugar, que o Partido deve conquistar, dia após dia, a confiança das massas proletárias; e, por meio de sua política e de seu trabalho ganhar para si o apoio das massas; que não deve dar ordens, mas, antes de tudo, persuadir, facilitando às massas o trabalho de convencer-se, através de sua própria experiência, da justeza da política seguida pelo Partido; e que deve, por conseguinte, ser o dirigente, o chefe, o mestre de sua classe.
Infringir essas condições equivale a contrariar as relações mutuas acertadas entre a vanguarda e a classe, minando a "confiança mutua", destruindo tanto a disciplina de classe como a disciplina de Partido.
"Hoje, seguramente, quase todo mundo vê que os bolcheviques não se teriam mantido no poder nem dois anos e meio, nem mesmo dois meses e meio, sem a disciplina severíssima, verdadeiramente férrea dentro do nosso Partido, sem o apoio mais completo e abnegado dado a ele por toda a massa da classe operária (sublinhado por Stálin), ou seja, por tudo o que ela tem de consciente, de honrado, de abnegado, de influente, e capaz de conduzir consigo e de arrastar atrás de si as camadas atrasadas". (Lenine, t. XXV, pág. 173, Extremismo, Doença Infantil do Comunismo).
"A ditadura do proletariado é uma luta tenaz, cruenta e incruenta, violenta e pacífica, militar e econômica, pedagógica e administrativa, contra as forças e as tradições da velha sociedade. A força do costume de milhões e dezenas de milhões de homens é a força mais terrível. Sem um Partido férreo e temperado na luta, sem um Partido que goze da confiança de tudo o que há de honrado dentro da classe, (sublinhado por Stálin) sem um Partido que saiba aquilatar o estado de espírito das massas e influir sobre ele é impossível levar a cabo, com êxito, a referida luta (Lenine, t. XXV, pág. 1901 Extremismo, Doença Infantil do Comunismo).
Mas como adquire o Partido essa confiança e este apoio da classe? Como se forja a disciplina férrea necessária para a ditadura da proletariado? Em que terreno brota?
Eis o que diz Lenine sobre este assunto:
"Como se mantém a disciplina do Partido revolucionário do proletariado? Como se controla? Como se reforça? Primeiro, pela consciência da vanguarda proletária e por sua abnegada lealdade à revolução, por sua firmeza, por seu espírito de sacrifício, por seu heroísmo. Segundo, por sua capacidade de ligar-se, aproximar-se e, até certo ponto, se desejais, fundir-se com as grandes massas trabalhadoras (sublinhado por Stálin), em primeiro lugar com a massa proletária, mas também com a massa trabalhadora não proletária. Terceiro, pela justeza e pelo acerto da direção política que esta vanguarda realiza; pelo acerto, pela justeza de sua estratégia e de sua tática política, desde que as massas extensas se convençam disso por experiência própria. Sem essas condições, não seria possível a disciplina em nenhum partido revolucionário verdadeiramente apto para ser o Partido da classe avançada, destinada a derrubar a burguesia e a transformar toda a sociedade. Sem essas condições, as tentativas de implantar uma disciplina convertem-se inevitavelmente em ficção, em meras palavras, em gestos grotescos. Mas, por outro lado, essas condições não podem brotar de repente. Vão se formando somente através de um trabalho prolongado, através de uma dura experiência; sua formação só é facilitada através de uma justa teoria revolucionária, que, por sua vez, não é nenhum dogma, mas forma-se definitivamente apenas em estreita relação com a pratica de um movimento verdadeiramente de massas e verdadeiramente revolucionário". (Lenine, t XXV, pág. 174, Extremismo, Doença Infantil do Comunismo).
E mais adiante:
Para alcançar a vitória sobre o capitalismo é preciso estabelecer uma correlação exata entre o Partido dirigente, — o Partido Comunista, a classe revolucionária — o proletariado e as massas, ou, seja, a totalidade dos trabalhadores e explorados. Só o Partido Comunista, desde que realmente forme a vanguarda da classe revolucionária, desde que compreenda os melhores representantes da mesma, se é constituído por comunistas, totalmente conscientes e abnegados, instruídos e temperados na experiência de uma tenaz luta revolucionária, se esse Partido soube vincular-se inseparavelmente a toda a vida de sua classe e por meio dela a toda a massa dos explorados e se soube inspirar a esta classe e a esta massa completa confiança (sublinhado por Stálin); só um Partido assim está apto para dirigir o proletariado na luta mais implacável, na luta final decisiva, contra todas as forças do capitalismo. Por outro lado, somente sob a direção de um Partido nessas condições é o proletariado capaz de desenvolver toda a potência de seu impulso revolucionário, desfazendo a inevitável apatia e, em parte, a resistência da pequena minoria, da aristocracia operária, corrompida pelo capitalismo, a resistência dos velhos lideres das tradetunions, das cooperativas, etc. Só assim é o proletariado capaz de desenvolver toda sua força, que é incomensuravelmente maior devido à própria estrutura econômica da sociedade capitalista, que a proporção que ela representa na população". (Lenine, t XXV, 315, Tese Sobre as Tarefas Fundamentais do II Congresso da Internacional Comunista).
Destas citações compreende-se o seguinte:
Se não existirem essas condições, a autoridade do Partido e a disciplina férrea serão, ou frases ocas, ou fanfarronadas e aventureirismo.
Não se pode contrapor a ditadura do proletariado à direção ("ditadura") do Partido. Não se pode contrapor, visto que a direção do Partido é o principal da ditadura do proletariado, se se tem em conta uma ditadura mais ou menos solida e completa e não somente algo como, por exemplo, a Comuna de Paris, que era uma ditadura incompleta e pouco sólida. Não se pode contrapor, visto que a ditadura do proletariado e a direção do Partido trabalham, por assim dizer, na mesma linha, atuam num mesmo sentido.
"Ditadura do Partido ou ditadura de classe? Ditadura (Partido) dos chefes ou ditadura (Partido) das massas?" O simples fato de fazer essas perguntas demonstra a mais incrível e irremediável confusão de idéias... É sabido por todos que as massas se dividem em classes..., que as classes são, geralmente, na maioria dos casos, pelo menos nos países civilizados modernos, dirigidas por Partidos políticos; que os Partidos políticos são dirigidos, em geral, por grupos mais ou menos estáveis constituídos das pessoas mais autorizadas, influentes, experimentadas, eleitas para os cargos mais responsáveis e que se chamam chefes ... Chegar... a contrapor, em termos gerais, a ditadura das massas à ditadura dos chefes, é um absurdo ridículo e uma imbecilidade". (Lenine, t. XXV, pág. 187-188, Extremismo, Doença Infantil do Comunismo).
Isso é absolutamente exato. Mas esta tese exata parte da premissa de que existem relações mutuas ajustadas entre a vanguarda e as massas operárias, entre o Partido e a classe. Parte do suposto de que as relações mutuas entre a vanguarda e a classe continuam sendo, por assim dizer, normais, se se mantêm dentro dos limites da "confiança mutua".
Mas, se as relações mutuas ajustadas entre a vanguarda e a classe, se as relações de "confiança mutua" entre o Partido e a classe se rompem? E se o próprio Partido começa a colocar-se, de um modo ou de outro, contra a classe, violando as bases das relações mutuas combinadas, infringindo as bases da confiança mutua? Podem-se verificar, em geral, casos como estes? Sim, podem verificar-se, nos seguintes casos:
A história do nosso Partido oferece toda uma serie de casos como esses. Diversos grupos e frações de nosso Partido fracassaram e desagregaram-se por ter desrespeitado uma dessas três condições, ou, até, às vezes, todas três.
Donde se conclui que contrapor a ditadura do proletariado à "ditadura" (à direção) do Partido só pode ser considerado falso nos seguintes casos:
O desrespeito a essas condições traz, como conseqüência inevitável, um conflito entre o Partido e a classe, determina uma cisão entre eles, joga-os um contra a outra.
Pode-se, porventura, impor à classe pela força a direção do Partido? Não, não se pode. Em todo caso, semelhante direção não poderia ser senão mais ou menos duradoura. O Partido, se quiser manter-se como Partido do proletariado, deve saber que é, antes de tudo e acima de tudo, o dirigente, o chefe, o mestre da classe operária. Não podemos esquecer as palavras de Lenine, escritas a este respeito, no folheto O Estado e a Revolução".
"Educando o Partido operário, o marxismo educa a vanguarda do proletariado capaz de tomar o poder e de conduzir todo o povo ao socialismo, de dirigir, e organizar o novo regime, de ser o mestre, o dirigente, o chefe (sublinhado por Stálin) de todos os trabalhadores e explorados, na obra de construir a sua própria vida social sem a burguesia e contra a burguesia" (Lenine, t XXI, pág, 386).
Pode-se, acaso, considerar o Partido como o verdadeiro dirigente da classe, se sua política é falsa, se a sua política se choca com os interesses da classe? Naturalmente que não! Nesses casos, o Partido, se quer manter-se como dirigente, deve fazer uma revisão em toda sua política, reconhecer seu erro e corrigi-lo. Para ilustrar esta tese, poderíamos recordar, ainda que só se referisse a um fato, tirado da história de nosso Partido, passado no período da abolição do sistema de requisição de víveres, em que as massas operárias e camponesas estavam claramente descontentes com nossa política, e no qual o Partido empreendeu franca e honradamente a revisão dessa política. Eis o que disse então Lenine, no X Congresso do Partido, sobre a abolição do sistema de requisição de víveres e da implantação da Nova Política Econômica:
"Não devemos ocultar nada, mas dizer francamente que os camponeses estão descontentes com a forma de relações estabelecidas entre eles e nós, que não querem essa forma de relações e não continuarão a viver assim daqui por diante. Isso é indiscutível. Esta vontade manifestou-se de maneira decidida. É a vontade das imensas massas da população trabalhadora. Devemos tomá-la em conta e somos políticos suficientemente sensatos para dizer abertamente: Deve-se fazer uma revisão em nossa política no que se refere aos camponeses!" (sublinhado por Stálin) (Lenine, t. XXVI, pág. 238, Sobre o Imposto em Espécie).
Pode-se, porventura, entender que o Partido deve assumir a iniciativa e a direção na organização das ações decisivas das massas, baseando-se somente em que sua política é, em geral, acertada, se esta política não goza ainda da confiança e do apoio da classe, devido, suponhamos, ao atraso político desta, se o Partido não conseguiu convencer ainda a classe da justeza de sua política, devido, suponhamos, a que os acontecimentos não estejam ainda maduros? Não, não se pode. Em tais casos, o Partido, se quer ser o verdadeiro dirigente, deve saber esperar, deve convencer as massas de sua política ajustada, deve ajudar as massas a se convencerem, através de sua própria experiência, da justeza dessa política.
"Se o partido revolucionário — diz Lenine — não conta com a maioria dentro dos destacamentos de vanguarda das classes revolucionárias, nem dentro de seu país, não se pode falar de insurreição". (Lenine, f. XXI, pág. 282, Manter-se-ão os Bolcheviques no Poder?).
"Se não se produz uma modificação nas opiniões da maioria da classe operária, a revolução é impossível, e essa modificação se consegue através da experiência política das massas". (Lenine, t. XXV, pág. 221 Extremismo...).
"A vanguarda proletária é conquistada ideologicamente. Isto é o principal. Sem isso, não é possível dar nem sequer o primeiro passo para o triunfo. Mas disto ao triunfo ainda falta muito. Apenas com a vanguarda é impossível triunfar. Lançar somente a vanguarda à batalha decisiva, guando toda a classe, quando as grandes massas não adotaram ainda posição de apoio direto a esta vanguarda, ou, pelo menos, de neutralidade benévola com relação a ela, e de uma incapacidade completa de apoiar seu inimigo, seria não só uma estupidez, mas até mesmo um crime. E para que, na realidade, toda a classe, as grandes massas de trabalhadores e dos oprimidos pelo capital cheguem a ocupar semelhante posição, são insuficientes a propaganda e a agitação. Para isso é necessária a própria experiência política dessas massas". (Obra citada, pág. 228).
J á se sabe que nosso Partido procedeu exatamente desse modo durante o período que medeia entre as Teses de Abril, de Lenine, e a insurreição da outubro de 1917. E, precisamente por isso, por atuar de acordo com essas indicações de Lenine, é que saiu vencedor da insurreição.
Tais são, essencialmente, as condições que devem presidir as relações mútuas ajustadas entre a vanguarda e a classe.
Que significa dirigir, se a política do Partido é certa e se as relações ajustadas entre a vanguarda e a classe não são contrariadas?
Dirigir, nessas condições, significa saber convencer as massas do acerto da política do Partido; significa lançar e pôr em pratica as palavras de ordem, que levam as massas às posições do Partido e as ajudam a convencer-se, por sua própria experiência, do acerto da política do Partido; significa elevar as massas ao nível de consciência do Partido e assegurar-se assim apoio das massas, a sua disposição para a luta decisiva.
Por isso, o método fundamental na direção da classe pelo Partido é o método da persuasão.
"Se, hoje, na Rússia — diz Lenine, — depois dos dois anos e meio de triunfos sem precedentes sobre a burguesia russa e a da Entente, estabelecêssemos com condição indispensável para o ingresso nos sindicato o "reconhecimento da ditadura", cometeríamos uma tolice, enfraqueceríamos nossa influência sobre as massas, ajudaríamos aos mencheviques. Porque a tarefa dos comunistas consiste em saber convencer os elementos atrasadas, em saber trabalhar entre eles e não em isolarmo-nos deles por meio de fantásticas palavra de ordem, infantilmente "esquerdistas". (Lenine, t. XXV pág. 197, Extremismo, Doença Infantil do Comunismo).
Isso não significa, naturalmente, que o Partido deve convencer a todos os operários, do primeiro ao último; que só depois de tê-los convencido a todos pode-se passar aos fatos, que só então pode iniciar a ação. De maneira alguma. Significa unicamente que, antes de lançar-se a ações políticas decisivas, o Partido deve assegurar para si, mediante um trabalho revolucionário constante, o apoio da maioria das massas operárias ou, pelo menos, a neutralidade benévola da maioria da classe. Do contrário, a tese leninista, que apresenta como condição indispensável para a revolução vitoriosa a conquista para o Partido da maioria da classe operária, careceria de todo o sentido.
Pois bem. Que se deve fazer com a minoria, se esta não quer, se não se presta a submeter-se de bom grado à vontade da maioria? Pode o Partido, deve o Partido, gozando da confiança da maioria, obrigar a minoria a submeter-se à vontade da maioria? Sim, pode e deve fazê-lo. A direção assegura-se pelo método de persuadir as massas como o método fundamental do Partido para influir sobre estas. Mas isso não exclui o emprego da coação, mas sim que, pelo contrario, o pressupõe, sempre e quando esta coação se baseie na confiança e no apoio que a maioria da classe operária dá ao Partido, sempre e quando esta coação se aplique à minoria depois de ter sabido convencer a maioria. Seria conveniente recordar as polemicas suscitadas, a este respeito, em nosso Partido, na época em que se discutiu o problema sindical. Em que consistiu, então, o erro da oposição, o erro do Comitê Central do Sindicato dos Transportes? Acaso considerava a oposição possível a aplicação, naquela época, da coação? Não, não foi isto. O erro da oposição consistia, então, em que, sem estar em condições de persuadir a maioria do acerto da sua posição, tendo perdido a confiança da maioria, não obstante, começou a aplicar a coação, insistindo em afastar os homens que gozavam da confiança da maioria.
Eis o que disse, então, Lenine, no X Congresso do Partido, em seu discurso sobre os sindicatos:
"Para estabelecer relações mútuas, relações de confiança mútua entre a vanguarda da classe operária e a massa operária, caso o Comitê Central do Sindicato do Transporte tivesse cometido um erro..., seria necessário que o corrigisse. Mas, se este erro começa a ser defendido, isto se converte, numa fonte de perigos políticos. Se não se tivesse feito todo o possível no sentido da democracia, partindo do estado de espírito que Kutusov aqui exprime, teríamos chegado à bancarrota política. Devemos, antes de tudo, persuadir e depois coagir. Devemos, custe o que custar, persuadir, só depois coagir (sublinhado por Stálin). Não soubemos convencer as grandes massas e, desrespeitamos a correlação ajustada entre a vanguarda e as massas". (Lenine, t. XXVI, pág. 235).
Em seu folheto Sobre os sindicatos, Lenine diz a mesma coisa:
"Só temos aplicado de modo certo e eficaz a coação, quando soubemos antes cimentá-la na persuasão". (Lenine, t. XXVI, pág. 74).
E isto é completamente exato, pois, sem se ajustar a estas condições, não há direção possível, pois só deste modo é que se pode assegurar a unidade de ação no Partido, se se trata do Partido, ou a unidade de ação da classe, se se trata da classe em sua totalidade. De outro modo, sobrevém a cisão, a debandada, a decomposição dentro das fileiras da classe operária.
Tais são, de modo geral, as bases em que deverá assentar uma direção conseqüente do Partido.
Qualquer outra interpretação sobre o que é direção será sindicalismo, anarquismo, burocratismo, tudo o que se quiser, menos bolchevismo, menos leninismo.
Não se pode contrapor a ditadura do proletariado à direção ("ditadura") do Partido, se se tem em conta as relações ajustadas entre o Partido e a classe operária, entre a vanguarda e as massas operárias. Mas disso mesmo se conclui que também não se pode identificar o Partido com a classe operária, a direção ("ditadura") do Partido com a ditadura da classe operária. Baseando-se em que a "ditadura" do Partido não se pode contrapor à ditadura do proletariado, Sorin chega à conclusão falsa de que "a ditadura do proletariado é a ditadura do nosso Partido". Mas Lenine não somente diz que aquela contraposição é inadmissível, como diz, ao mesmo tempo, que é inadmissível contrapor a "ditadura das massas à ditadura dos chefes". Não lhes ocorrerá identificar, baseados nisso, a ditadura dos chefes à ditadura do proletariado? Por este caminho, deveríamos dizer que a "ditadura do proletariado é a ditadura de nossos chefes". A esta imbecilidade, precisamente, é que conduz, propriamente falando, a política que identifica a "ditadura" do Partido com a ditadura do proletariado...
Qual a posição de Zinoviev sobre este assunto?
Zinoviev mantém, no fundo, o mesmo ponto de vista de identificar a "ditadura" do Partido com a ditadura do proletariado que mantém Sorin, com uma diferença, entretanto: é que Sorin se expressa mais clara e rapidamente, enquanto que Zinoviev "faz piruetas", para se convencer disso, basta ler a seguinte passagem livro de Zinoviev, "O leninismo":
"Que representa o regime existente na URSS do ponto de vista de seu conteúdo de classe? É a ditadura do proletariado. Qual é o suporte imediato do Poder na URSS? Quem exerce o Poder da classe operária? O Partido Comunista! Neste sentido, governa em nosso país a ditadura do Partido (sublinhado por Stálin). Qual é a forma jurídica do Poder da URSS? Qual é o novo tipo de regime de Estado, criado pela Revolução de Outubro? O sistema soviético. Uma coisa não contradiz de modo algum a outra".
Dizer que uma coisa não contradiz a outra é naturalmente exato, se, por ditadura do Partido em relação à classe operária em seu conjunto, se entender a direção do Partido. Mas como é que se pode equiparar, nesta base, a ditadura do proletariado e a "ditadura" do Partido, o sistema soviético e a "ditadura" do Partido? Lenine identificava o sistema soviético com a ditadura do proletariado, e tinha razão, pois os Soviets, os nossos Soviets, são a organização da coesão das massas trabalhadoras em torno ao proletariado, sob a direção do Partido. Mas, quando, onde, em qual de suas obras, Lenine equipara a "ditadura" do Partido à ditadura do proletariado, a "ditadura" do Partido ao sistema soviético, como o faz agora Zinoviev? A ditadura do proletariado não somente não está em contradição com a direção ("ditadura") do Partido, como não o está, tampouco, com a direção ("ditadura") dos chefes. Baseados nisso não lhes ocorrerá proclamar que nosso país é o país da ditadura do proletariado, ou, seja, o país da ditadura do Partido, ou, seja, ainda, o país da ditadura dos chefes? Pois a esta imbecilidade precisamente, é que conduz o "principio" da identificação da "ditadura" do Partido com a ditadura ao proletariado, conforme supõe Zinoviev, numa pusilânime insinuação.
Nas numerosas obras de Lenine, consegui anotar somente cinco casos em que toca de passagem no problema da ditadura do Partido.
O primeiro caso deu-se por ocasião de uma polemica com os social-revolucionários e os mencheviques, na qual ele nos diz:
"Quando se nos critica sermos a ditadura de um só Partido, e se nos propõe, como acabais de ouvir, a frente-única socialista, dizemos: "Sim, ditadura de um só partido! Neste terreno pisamos e dele não podemos sair, pois se trata de um partido que conquistou, no decorrer de dezenas de anos, o posto de vanguarda de todo o proletariado fabril e indústrial". (Lenine, t. XXIV, pág. 423, discurso pronunciado no I Congresso dos trabalhadores do Ensino da Rússia).
O segundo caso deu-se na Carta aos operários e camponeses a propósito da vitória sobre Kolchak, na qual Lenine nos diz:
"Assustam os camponeses (particularmente os mencheviques e os social-revolucionários, todos, inclusive os "esquerdistas") com o espantalho da "ditadura de um só partido", do Partido dos bolcheviques-comunistas. Pelo exemplo de Kolchak, os camponeses aprenderam a não ter medo de espantalhos. Ou a ditadura (isto é, o poder férreo dos proprietários de terras e dos capitalistas, ou a ditadura da classe operária". (Lenine, i. XXIV, pág. 436).
O terceiro caso, no discurso pronunciado por Lenine no II Congresso da Internacional Comunista, na polêmica contra Tanner. Já citei este discurso mais atrás.
O quarto caso, nalgumas linhas do folheto Extremismo, Doença Infantil do Comunismo. Já transcrevemos as citações correspondentes.
E o quinto caso é o do esboço do esquema da ditadura do proletariado, publicado no terceiro tomo da Recopilação Leninista, na qual há um sub-título que diz: A ditadura de um só partido. (Veja-se o tomo III da obra citada, pág. 497).
Convém lembrar que, em dois casos dos cinco que são o último e o segundo, Lenine põe as palavras "ditadura de um só partido" entre aspas, querendo fazer ressaltar, de modo claro, o sentido inexato, figurado, dessa formula.
É conveniente indicar, também, que, em todos estes casos, Lenine entende por "ditadura do Partido" em relação à classe operária, não a ditadura no sentido exato da palavra ("poder que se apóia na violência"), mas o fato de ter o Partido a direção.
É interessante notar que, em nenhuma de suas obras, nem nas fundamentais, nem nas secundárias, nas quais Lenine trata ou, pelo menos, aborda a ditadura do proletariado e o papel do Partido no sistemia da ditadura do proletariado, não alude sequer ao fato de que a "ditadura do proletariado é a ditadura do nosso Partido". Pelo contrário, cada página, cada linha dessas obras, é um grifo de protesto contra essa fórmula (Veja-se O Estado e a Revolução, A revolução proletária e o renegado Kautsky, O Extremismo, Doença Infantil do Comunismo, etc.).
E é ainda mais característico o fato de que, nas teses do II Congresso da Internacional Comunista sobre o papel do Partido político, teses feitas sob a orientação imediata de Lenine e às quais Lenine se refere reiteradamente em seus discursos como um modelo de definição acertada do papel e das tarefas do Partido, não encontremos nem uma só palavra, absolutamente nem uma, sobre a ditadura do Partido.
Que se deduz dai?
O seguinte:
E não falemos do fato da formula "ditadura Partido", tomada sem as reservas indicadas mais acima, poder criar toda uma série de perigos e deficiências políticas em nosso trabalho prático. Esta formula, tomada sem reservas, poderia indicar:
É conveniente, recordar esses perigos precisamente agora, no período de ascensão da atividade política das massas, em que a disposição do Partido para ouvir atentamente a voz das massas tem para nós especial importância; em que o prestar atenção às exigências das massas é o postulado fundamental de nosso Partido; em que se exige deste prudência especial e flexibilidade especial na sua política; em que o perigo da presunção é um dos perigos mais sérios que ameaçam o Partido na obra de dirigir acertadamente às massas.
Não se pode deixar de recordar as preciosas palavras pronunciadas por Lenine no XI Congresso de nosso Partido:
"Nós (os comunistas, J. Stalin) somos, apesar de tudo, no meio da massa do povo, como uma gota no mar e só podemos governar quando sabemos exprimir com acerto o que o povo traz em sua consciência. Sem isso, nem o Partido Comunista conduzirá o proletariado, nem o proletariado conduzirá as massas e toda a máquina se esboroará". (Lenine, t. XXVII, pág. 256, Informe Sobre a Atuação Política do C.C. do P.C. (b) da Rússia).
"Exprimir com acerto o que o povo traz em sua consciência", esta é, precisamente a condição indispensável que assegura ao Partido o honroso papel de força fundamental dirigente no sistema da ditadura do proletariado.
Inclusão | 26/01/2012 |