Contra o Subjetivismo nas Ciências da Natureza

I. Zhdanov


Primeira Edição:......
Fonte: Problemas - Revista Mensal de Cultura Política nº 47 - Julho de 1953.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo
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A obra de J. V. Stálin, "Problemas Econômicos do Socialismo na U.R.S.S.", tem uma importância considerável para o desenvolvimento da ciência materialista de vanguarda, para a luta contra as várias manifestações de pontos de vista não científicos, idealistas — tanto nas ciências da natureza como nas ciências sociais.

Stálin mostra, de fato, em sua obra, o erro da posição de certos economistas que negavam o caráter objetivo das leis da ciência e procuravam apresentar as coisas como se as leis da ciência pudessem ser abolidas ou transformadas pela vontade dos homens. Tais pontos de vista conduziam diretamente ao labirinto do idealismo subjetivo. Stálin, criticando-os, frisa nestes termos a posição de princípio da teoria marxista:

"O marxismo concebe as leis da ciência — quer se trate das leis das ciências naturais, quer das leis da economia política — como o reflexo de processos objetivos que se realizam independentemente da vontade dos homens. Os homens podem descobrir estas leis, concebê-las, estudá-las, levá-las em conta nas suas ações, utilizá-las no interesse da sociedade, mas não podem modificá-las nem aboli-las. E menos ainda podem formar ou criar novas leis da ciência".(1)

Esta definição profunda apresenta, de forma clara e concisa, a conclusão essencial que se pode tirar do desenvolvimento da ciência. Ela acentua que os fenômenos da natureza e da vida social são regidos por leis; destaca o caráter objetivo das leis da ciência e a cognoscibilidade dessas leis; é dirigida contra a contemplação passiva das leis, contra a sua transformação num fetiche. Ao mesmo tempo, Stálin vibra um golpe esmagador em todas as manifestações do subjetivismo nacional na ciência.

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Os grandes fundadores da ciência marxista-leninista defenderam e desenvolveram, durante décadas, esta concepção do caráter das leis científicas e desmascararam os idealistas de todos os matizes. Ora, uma das formas sob as quais se manifesta a concepção idealista do mundo é o subjetivismo na ciência, o esforço para privar as leis da natureza e as leis da sociedade de seu conteúdo objetivo, para substituir o método científico objetivo de conhecimento por um método subjetivo qualquer.

Um exemplo clássico de luta contra os pontos de vista subjetivistas na ciência é a maneira pela qual Lênin e Stálin desmascararam os liberais narodniki, os socialistas-revolucionários, os anarquistas, os empirocriticistas. Os narodniki, com seu chefe Mikhailovski, negavam, como se sabe, que os métodos objetivos fossem aplicáveis ao estudo dos fenômenos da vida social. Destacavam os fenômenos sociais do conjunto dos "processos históricos naturais" e exigiam a criação de um método particular, um "método subjetivo em sociologia". Este método tornaria a considerar os fenômenos históricos do ponto de vista das idéias e dos objetivos do homem, de seus desejos, de seus sentimentos, de suas aspirações. Com isso, os narodniki eludiam a questão de saber de onde vinham as idéias e os objetivos sociais, manifestavam uma incompreensão completa do caráter determinante do ser social dos homens em relação aos seus sentimentos, seus pensamentos e seus desejos. Mostrando o erro desse ponto de vista, Lênin escreveu:

"Assim como Darwin destruiu a concepção de que as espécies animais e vegetais não se achavam absolutamente ligadas entre si, eram acidentais, "criadas por Deus" e imutáveis, e foi o primeiro a dar uma base rigorosamente científica à biologia, estabelecendo a variabilidade e a sucessão das espécies — da mesma forma Marx destruiu a concepção de que a sociedade é um conglomerado mecânico de indivíduos que sofre todas as espécies de transformações ao sabor das autoridades (ou, o que vem a dar no mesmo, ao sabor da sociedade e do governo); que nasce e se transforma ao acaso; foi o primeiro a dar uma base científica à sociologia, estabelecendo o conceito de formação econômica da sociedade como um conjunto determinado de relações de produção; estabelecendo que o desenvolvimento dessas formações é um processo histórico natural".(2)

Sem a derrota do subjetivismo em sociologia, a criação de uma ciência social autenticamente materialista não teria sido possível, nem tampouco a previsão científica, que é a base da política dos Partidos Comunistas: o subjetivismo condenava com efeito seus partidários a errar no caos das casualidades, a se enredar em utopias, e levava-os, finalmente, ao aventurismo no domínio político.

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A luta contra as diferentes manifestações de subjetivismo tem igualmente uma grande importância no domínio das ciências da natureza. Em todos os domínios essenciais das ciências da natureza, a afirmação de um método de,pesquisa de caráter científico conseqüente, objetivo, conduziu à luta encarniçada contra esta forma de idealismo, que é o ponto de vista subjetivista.

Sabe-se da luta que K. A. Timiriaziev travou contra o chamado método "psicológico" dos vitalistas fito-psicólogos em botânica. Os partidários desta variedade de subjetivismo dissertavam sobre a memória, sobre as tendências dos vegetais, sobre seus psiquismo; tentavam assim explicar o crescimento dos vegetais pelas tendências instintivas do caule em se dirigir para a luz.

A fisiologia da atividade nervosa superior representa igualmente um setor importante da frente de combate da ciência materialista de vanguarda contra o subjetivismo. Esta ciência deve seus êxitos na época atual a I. P. Pavlov. Quando Pavlov pronunciou seu célebre discurso "As Ciências Naturais e o Cérebro", no qual defendia o método objetivo em fisiologia, Timiriaziev lhe escreveu:

"É-me necessário constantemente batalhar contra botânicos, jovens ou velhos, russos ou alemães, que pregam que os fisiologistas devem recusar "as regras estritas de pensamento das ciências naturais" e substituir este sistema de regras por uma certa "fito-psicologia" que, felizmente, não existe. Mas agora que eu posso dizer que "um grande fisiologista de nacionalidade russa, como vós, considera que tem por missão expulsar o método psicológico de seu último reduto na fisiologia, sinto de hoje em diante sob meus pés o terreno sólido para continuar a oferecer-lhes resistência".

Pavlov acentua realmente por diversas vezes em suas obras a esterilidade do chamado método subjetivo, a futilidade dos raciocínios banais sobre a alma: existe uma análise materialista conseqüente, rigorosa, objetiva de todos os aspectos do comportamento do homem e dos animais, sem no entanto fechar os olhos ante as dificuldades destas tarefas. Critica os métodos dos subjetivistas, que forjam hipóteses sobre os sentimentos ou os desejos dos animais ou procuram edificar a fisiologia e a psicologia sobre a base da introspecção.

"O método subjetivo no estudo de todos os fenômenos, escreve Pavlov, data do primeiro ser humano, e que nos trouxe ele? Nada. Tudo o que foi imaginado com a ajuda deste método, precisa ser rechaçado e substituído por algo novo".

Também o método objetivo de Pavlov foi alvo de ataques abertos dos cientistas inclinados ao idealismo. Assim como os narodniki, alegando o caráter específico dos fenômenos sociais, exigiam a rejeição do método científico objetivo em sociologia, outros, em fisiologia, apoiavam-se no caráter específico da atividade nervosa superior do homem para apresentar uma exigência idêntica. Em conseqüência das deformações subjetivistas na fisiologia subsistem ainda idéias — das quais muitos ainda não se livraram — sobre a "alma", a "psique", consideradas como entidades misteriosas e incognoscíveis, às quais não se podem aplicar as normas habituais da pesquisa rigorosamente científica e objetiva.

Os mais ativos adversários da fisiologia pavloviana, como o acadêmico L. A. Orbeli, o acadêmico I. S. Beritôv, o professor P. K. Anokhine e alguns outros fisiologistas, atraíram a critica do mundo científico durante a sessão conjunta da Academia de Ciências da U.R.S.S. e da Academia de Ciências Médicas da U.R.S.S., em 1950, consagrada às questões de fisiologia. Deturpando o ensinamento de Pavlov, Orabeli declarava o método objetivo limitado e unilateral, e para "superar" esta limitação, propunha completá-lo com o método subjetivo. Nesse sentido, escreveu ele:

"Para estabelecer as leis fundamentais atividade do sistema nervoso central, os fisiologistas devem recorrer tanto ao método objetivo como ao método subjetivo".

Observamos que ainda tem curso entre os fisiologistas pontos de vista deste gênero.

Os fisiologistas materialistas consideram a liquidação das sobrevivências do subjetivismo como sua tarefa essencial; não é possível trabalhar com êxito para um desenvolvimento fecundo da fisiologia pavloviana se esta tarefa não foi cumprida.

A penetração de pontos de vista subjetivistas tem causado também um grande prejuízo à química. Aqui, semelhantes idéias encontraram sua expressão original na chamada teoria da mesomeria (ou da ressonância) oposta em seus próprios princípios à teoria de A. M. Butlerov. Butlerov mostrou que os cientistas, pela observação, a experiência e a reflexão, estão em condições de conhecer as relações que existem objetivamente entre os átomos nas moléculas e de exprimi-las em fórmulas de estrutura. Se, estudando a estrutura das combinações, a teoria da estrutura química de Butlerov parte de relações químicas reais, objetivas, por sua vez os teóricos da ressonância propõem considerar as diferentes representações gráficas que se podem estabelecer para determinada combinação, partindo de diferentes dogmas sobre a valência dos átomos, e guiar-se pelas fórmulas assim estabelecidas. Em conseqüência disto declara-se que a verdadeira estrutura da molécula é a média (mesomérica ou ressonante) entre as diferentes fórmulas estabelecidas graficamente, fórmulas que, como se sabe, não exprimem nenhuma realidade. Um dos autores desta teoria pseudo-científica, o químico americano Wheland, o reconhece:

"A teoria da ressonância é uma concepção especulativa num grau mais alto que as outras teorias físicas. Ela não reflete nenhuma propriedade interna da própria molécula, é um método matemático criado pelo físico ou o químico para sua própria comodidade".

Depois de ter assim proclamado que a ressonância é uma ficção destituída de significação física, Wheland examina com uma seriedade não menor a questão da "influência da ressonância sobre as propriedades físicas e químicas das moléculas"!

Esta maneira de conceber os resultados da ciência como métodos cômodos de descrição dos fatos é o alimento — tomado por empréstimo à filosofia positivista — do subjetivismo em química. Não é de hoje que se encontram químicos agnósticos para defender a tese de que a ciência não pode conhecer a essência das reações químicas nem a estrutura das moléculas, que as fórmulas químicas têm como única função descrever comodamente as transformações químicas! Mas é uma arbitrariedade na ciência indicar uma só substância e, simultaneamente, dez, cem fórmulas químicas, abarrotando assim de dificuldades a rota que conduz à síntese das combinações químicas. Precipitados por seu cego subjetivismo no império do caos e das casualidades, os teóricos da ressonância convidam, os químicos a seguir seu "miraculoso instinto", sua "intuição" — mas, para dizer toda a verdade, isto significa abandonar-se à ciência que lhes convêm.

Os teóricos soviéticos travam a luta contra a teoria da ressonância; entretanto, as raízes subjetivistas desta teoria não foram ainda postas a descoberto.

O desenvolvimento da física moderna processa-se igualmente na luta contra as manifestações do subjetivismo neste ramo da ciência. Os pontos de vista subjetivistas foram introduzidos em física, como nos outros domínios das ciências naturais, pela vaga turbulenta do kantismo, a arma principal da reação imperialista na frente científica. Em seu "Materialismo e Empiro-Criticismo", Lênin já havia submetido à crítica impiedosa os pontos de vista subjetivistas dos machistas, dos empiro-crticistas e de alguns físicos a quem eles haviam extraviado.

Na física contemporânea do mundo burguês faz-se sentir fortemente a tendência ao afastamento do método objetivo de pesquisa. Assim é que o célebre físico N. Bohr afirma que no domínio da física atômica

"não é possível justificar uma separação rigorosa entre o, objeto e o sujeito".

O astrônomo inglês Ellington escreve que as leis e as constantes da física são inteiramente subjetivas e podem ser deduzidas (a priori). Outro físico, P. Jordan, chega a afirmar que o pesquisador numa experiência de física, não estuda a realidade objetiva, mas que "prepara uma realidade física". Tal ponto de vista encontrou eco na literatura científica soviética, em particular nos trabalhos do físico Markov; este pôde assim escrever que a realidade física da teoria dos quanta continha em si um elemento de intervenção ativa do homem, que ela é submetida à atividade humana; afirmava que a introdução da noção de atividade humana no conceito de realidade física mostra a força e a eficácia do conhecimento científico. Em realidade, tal ponto de vista golpeia o conteúdo da física, priva a prática de uma orientação justa e, dessa forma, restringe a força do conhecimento humano.

Uma interpretação incorreta, subjetiva, é muitas vezes dada aos resultados da teoria física da relatividade. Os teóricos da relatividade apresentam as categorias de espaço, tempo e causalidade como formas de intuição inseparáveis da consciência. Em um de seus trabalhos sobre a teoria da relatividade, Einstein afirma, por exemplo:

"para cada homem existe um tempo subjetivo pessoal".

Estas asserções e muitas outras do mesmo gênero atestam a desordem que reina na cabeça dos físicos seduzidos pela filosofia machista, que os desvia de um método de pesquisa rigorosamente científico e objetivo. Malgrado os pontos de vista dos subjetivistas, dos machistas, dos agnósticos, os resultados obtidos pela física moderna demonstram o caráter objetivo da ciência, a cognoscibilidade das leis da natureza, a capacidade da ciência de penetrar nos segredos mais profundos do sistema do universo.

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A luta da ciência materialista de vanguarda contra as teorias subjetivistas e as demais teorias idealistas é, em suma, uma das expressões da luta implacável que a história vê desenrolar-se entre as classes, entre a classe operária e a burguesia, entre o socialismo e o capitalismo. Para defender seus interesses de classe, a reação imperialista, sob a égide da burguesia americana, utiliza qualquer teoria reacionária idealista, obscurantista, por mais insignificante, desde que ela sirva à sua luta contra o materialismo. No domínio da ciência a reação disfarça com vestes e berrantes as manifestações mais recentes do positivismo e do machismo, e investe contra a realidade objetiva, contra a concepção materialista do mundo, contra a cognoscibilidade dos fenômenos da natureza e da sociedade.

É preciso não fechar os olhos ao fato de que tais pontos de vista conseguem penetrar na ciência soviética. Com a ajuda de artifícios de terminologia, diferentes autores procuram na U.R.S.S. apresentar fraudulentamente esses pontos de vista como materialistas, da mesma maneira como em seu tempo um inimigo encarniçado do marxismo, Bogdanov, tentou fazer passar por marxista sua orientação machista. Nas condições atuais da União Soviética, o subjetivismo contemporâneo se caracteriza pela tendência a "corrigir", a "completar" o método científico objetivo, apoiando-se no caráter específico, na originalidade qualitativa de tal ou qual fenômeno estudado.

Em todos os ramos do conhecimento, o subjetivismo é o inimigo da verdadeira ciência. O subjetivismo e a ciência são incompatíveis. Não existe em realidade nenhum "método subjetivo" sobre o qual se pudesse realmente basear o desenvolvimento da ciência. A ciência só conhece um método de pesquisa, o que é rigorosamente objetivo; só ele é fecundo e provou por toda parte sua eficácia: em sociologia como em física, em fisiologia como em química, em psicologia como em geologia. Isto não quer dizer, é claro, que cada ramo do conhecimento não possua seus próprios processos de pesquisa e seus modos específicos de aplicação das leis. Em seus trabalhos "O Marxismo e as Questões de Lingüística" e "Problemas Econômicos do Socialismo na U.R.S.S.", Stálin mostrou a extrema importância das leis específicas dos fenômenos sociais; ressaltou que ignorar este caráter específico seria um erro profundo. Mas o próprio caráter específico de cada fenômeno exige uma análise objetiva, partindo das posições da ciência materialista.

O emprego do método científico permite assim descobrir as leis da natureza e da sociedade, sem o reconhecimento e sem o estudo das quais nenhuma ciência pode desenvolver-se. Sobre a base dos conhecimentos adquiridos desenvolve-se a prática humana, a utilização das forças da natureza no interesse da sociedade e a limitação da ação destrutiva dos elementos. Em sua obra "Problemas Econômicos do Socialismo na U.R.S.S.", Stálin indica:

"Por conseguinte, quando se fala de "subjugação" das forças da natureza ou das forças econômicas, de "domínio sobre elas, etc., isto absolutamente não quer dizer que os homens possam "abolir" as leis da ciência ou "formá-las". Ao contrário, com isto quer-se dizer somente que os homens podem descobrir as leis, conhecê-las, assimilá-las, aprender a aplicá-las com pleno conhecimento de causa, utilizá-las no interesse da sociedade e dessa maneira subjugá-las, chegar a exercer domínio sobre elas".

O conhecimento das leis objetivas do desenvolvimento da sociedade permite ao Partido conduzir com segurança o povo soviético para comunismo. O conhecimento das leis objetivas serve de base à grandiosa transformação da natureza que se realiza na União Soviética. Um papel eminente na realização destas tarefas cabe à ciência soviética.

A obra de Stálin "Problemas Econômicos do Socialismo na U.R.S.S." inspirará os trabalhadores científicos no prosseguimento da luta por uma ciência de vanguarda, materialista, em seu trabalho de criação no interesse do povo.


Notas de rodapé:

(1) J. Stálin — "Problemas Econômicos do Socialismo na U.R.S.S.", in PROBLEMAS, n, 43, pág. 34 — Rio. (retornar ao texto)

(2) V. I, Lênin — Obras Escolhidas, texto em francês, tomo pág. 94 — Edições em Línguas Estrangeiras — Moscou. (retornar ao texto)

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Inclusão 27/04/2011