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O proletariado russo deu os seus primeiros passos nas condições políticas de um Estado despótico. Greves proibidas por lei, círculos clandestinos, proclamações ilegais, manifestações de rua, conluio entre a polícia e a tropa – tal foi a escola formada pela combinação de um capitalismo em rápido desenvolvimento e dum absolutismo que cedia terreno lentamente. A concentração dos operários nas empresas gigantescas, o carácter igualmente concentrado da opressão exercida pelo Estado, enfim os desenvolvimentos impulsivos de um jovem proletariado e cheio de frescura, fizeram da greve política, tão rara em Ocidente, o método essencial da luta na Rússia. Os números de greves operárias desde do princípio do século são os índices mais instrutivos sobre a história política política na Rússia. Apesar do desejo que se tenha de não atravancar o texto de números, é impossível de abster-se de citar os quadros das greves políticas no período entre 1903 a 1917. Esses dados, levados a sua mais simples expressão, dizem respeito somente às empresas que eram da competência da inspecção das fábrica: os caminhos de ferro, as indústrias mineiras e metalúrgicas, diversos ofícios e, em geral as pequenas empresas, sem falar, bem entendido, da agricultura, não entram , por diferentes razões, neste cálculo. Porém, a curva do movimento de greves não deixa portanto de se manifestar nitidamente.
Anos | Número de grevistas (em milhares) |
1903 | 87 [1] |
1904 | 25 [1] |
1905 | 1843 |
1906 | 651 |
1907 | 540 |
1908 | 93 |
1909 | 8 |
1910 | 4 |
1911 | 8 |
1912 | 550 |
1913 | 502 |
1914 (primeiro semestre) |
575 |
1915 | 156 |
1916 | 310 |
1917 (Janeiro - Fevereiro) |
575 |
[1] Para 1903 e 1904, a estatística relaciona-se a todas a greves, nas quais predominam sem dúvida as greves económicas.
Temos diante de nós a curva, única no seu genero, da temperatura política de uma nação que trazia no seu seio uma grande revolução. Num país atrasado onde o proletariado não é numeroso – nas empresas subordinadas à inspecção das fábricas – cerca de um milhão e meio de operários em 1905, cerca de dois milhões em 1917. O movimento de greve toma uma amplitude que ele nunca teve em lado nenhum no mundo. Dada a fraqueza da democracia pequena burguesa, da dispersão e da cegueira política do movimento camponês, a greve revolucionária dos operários torna-se o aríete que a nação ao acordar dirige contra a muralha do absolutismo. Que fossem 1 milhão 843 000 participantes nas greves políticas somente no ano 1905 (os operários tendo participado a várias greves são, bem entendido, contados aqui como grevistas) esse número por si só nos permitia indicar no quadro o ano da revolução, mesmo quando nós desconhecemos as efemérides políticas da Rússia.
Em 1904, primeiro ano da guerra russo-japonesa, a inspecção das fábricas registou no total somente 25 000 grevistas. Em 1904, as greves políticas e económicas no seu conjunto contaram 2 milhões 863 000 participantes, seja um número 115 vezes superior ao do ano precedente. Esse salto prodigioso sugere já que o proletariado, forçado pela marcha dos acontecimentos improvisar essa actividade revolucionária extraordinária, devia a qualquer custo tirar do seu próprio fundo uma organização que correspondesse à amplitude da luta e à imensidão das tarefas previstas: assim nasceram os sovietes (conselhos) da primeira revolução que se tornaram os órgãos da greve geral e da luta pela conquista do poder.
Quebrado na sua insurreição de Dezembro 1905, o proletariado faz esforços heróicos para conservar uma parte das posições tomadas no decurso dos dois anos seguintes, os quais, como mostram os números das greves, ligam-se ainda muito perto à revolução, sendo já anos de regressão. Os quatro anos seguinte (1908-1911) surgem no espelho da estatística das greves como o período da contra-revolução vitoriosa. A crise industrial que coincide com ela esgota ainda mais o proletariado já exsangue. A profundidade da queda é simétrica à altura do voo anterior. As convulsões da nação encontra as suas marcas nesses simples números.
A vida industrial reanimando-se a partir de 1910 levanta de novo os operários e dá novo impulso à sua energia. Os números de 1912-1914 reproduzem quase os dados de 1905-1907, mas no sentido contrário: a tendência já não é a queda, é a subida. Sobre novas bases históricas mais elevadas – os operários agora são mais numerosos e mais experientes – uma nova ofensiva revolucionária se desencadeia. O primeiro semestre de 1914 aproxima-se evidentemente, quanto à importância das greves políticas, do ano que data o ponto culminante da primeira revolução. Mas a guerra rebenta e interrompe brutalmente esse processo. Os primeiros meses são marcados pela inacção política da classe operária. Porém, desde da Primavera de 1915, esse entorpecimento começa a dissipar-se. Ele abre-se um novo ciclo de greves políticas que, em Fevereiro de 1917, conclui na insurreição dos operários e dos soldados.
Os bruscos fluxos e refluxos da luta das massas tornaram, em alguns anos, o proletariado russo quase desconhecido. As fábrica que, dois ou três anos antes, se meteram em greve, de acordo unânime, a propósito de um qualquer acto de arbítrio policial, perdiam agora toda a aparência de espírito revolucionário e deixavam passar sem protesto os crimes mais monstruosos das autoridades. As grandes derrotas são duravelmente desencorajantes. Os elementos revolucionários perdem o seu poder sobre a massa. Na consciência desta surgem na superfície os preconceitos e as superstições mal digeridas. Os recém-chegados do campo, massas ignorantes, abandonavam durante esse período as fileiras operárias. Os cépticos abanavam a cabeça irónicamente. Foi assim de 1907 a 1911. Mas esses processos moleculares nas massas curavam as feridas psicológicas causadas pelas derrotas. Um novo curso dos acontecimentos ou um desenvolvimento económico surdo inaugurava um novo ciclo político. Os elementos revolucionários reencontraram o seu auditório. A luta retoma um grau mais elevado.
Para compreender os duas principais correntes na classe operária da Rússia, é importante considerar que o menchevismo formou-se definitivamente durante os anos da reacção e da regressão, apoiando-se principalmente sobre uma fina camada de operários que tinham rompido com a revolução; enquanto que o bolchevismo, terrivelmente esmagado durante o período da reacção, subiu rapidamente, no decurso dos anos que precederam a guerra, a crista do novo fluxo revolucionário.
“O elemento mais energético, o mais alegre, o mais capaz de lutar infatigavelmente, de resistir e de se organizar constantemente, encontra-se nos grupos e indivíduos que se concentram à volta de Lenine...”
É assim que o departamento da polícia apreciava o trabalho dos bolcheviques, nos anos que precederam a guerra.
Em Julho de 1914, quando os diplomatas pregavam os últimos pregos na cruz sobre a qual devia ser crucificada a Europa, Petrogrado estava em plena ebulição revolucionária. O presidente da República francesa, Poincaré, quando veio depositar uma coroa de flores no túmulo de Alexandre III, ouviu os últimos ecos de uma batalha de rua com os primeiros fragores de uma batalha das manifestações patrióticas.
O movimento da ofensiva das massas em 1912-1914 teria levado à queda do czarismo se a guerra não se intercalasse? Não é possível responder a esta questão com toda a certeza. O processo conduzia implacavelmente à revolução. Mas por quais etapas, nesse caso, dever-se-ia passar? Não corríamos para una nova derrota? Quanto tempo teria sido necessário aos operários para revoltar os camponeses e conquistar a tropa? Em todas as direcções, só se pode conjecturar. A guerra, de qualquer forma, fez retrogradar o processo para acelerar tanto mais potentemente na fase seguinte e assegurar-lhe uma esmagadora vitória.
Aos primeiros toques do tambor, o movimento revolucionário foi suspendido. As camadas operárias mais activas foram mobilizadas. Os elementos revolucionários tomados nas fábricas foram empurrados para a frente. As greves eram castigadas com rigor. A impressa operária foi varrida. Os sindicatos foram abafados. Foram admitidos nas oficinas, por centenas de milhar, mulheres, adolescentes, camponeses. Políticamente, a guerra, em ligação com o afundar da Internacional, desorienta extraordinariamente as massas e deu aos directors de fábrica que levantavam a cabeça a possibilidade de falar a linguagem patriótica em nome das suas empresas, arrastando consigo uma parte considerável da mão-de-obra e obrigando ao silêncio atentivo os operários mais afoitos e resolutos. O pensamento revolucionário reduziu suas actividades nos pequenos círculos que se silenciaram. Nesse tempo, ninguém se arriscava, nas fábricas, a se dizer “bolchevique”, temendo ser preso ou mesmo brutalizado pelos operários atrasados.
Na Duma, a fracção bolchevique, cujo efectivo era fraco, não se mostra, no momento que rebenta a guerra, à altura da sua tarefa. De acordo com os deputados mencheviques, ela depositou uma moção que se comprometia a “defender os bens culturais do povo contra qualquer atentado, viesse donde viesse”. A Duma sublinhou por aplausos esta rendição. De todas as organizações e grupos russos do partido, nem um tomou abertamente a posição derrotista que Lenine proclamou no estrangeiro. Porém, a proposição dos patriotas entre os bolcheviques mostrou-se insignificante. Ao contrário dos populistas e mencheviques, os bolcheviques, desde 1914, começaram a desenvolver nas massas, pela imprensa e pela palavra, a sua agitação contra a guerra. Os deputados na Duma encorajaram-se e retomaram o seu trabalho revolucionário sobre o qual as autoridades estavam informadas de perto, graças às ramificações dos seus serviços de provocadores. Basta dizer que, sobre sete membros do comité do partido em Petersburgo, na véspera da guerra, três eram agentes da Segurança (Okhrana). Foi assim que o czarismo brincava à cabra cega com a revolução.
Em Novembro,os deputados bolcheviques foram presos. Foi tentada a destruição do partido em todo o país. Em Fevereiro 1915, o caso da fracção parlamentar foi ouvida no Palácio da Justiça. Os acusados mantiveram-se calados. Kamenev, como teórico inspirador da fracção, negava a posição derrotista de Lenine, assim como Petrovsky, actualmente presidente do Comité executivo central em Ucrânia. O departamento da polícia notou com satisfação que a sentença severa relatada contra os deputadas não tinha dado ocasião a nenhum movimento de protesto entre os operários.
Em Agosto de 1915, os ministros do czar comunicavam entre eles dizendo que os operários
“procuravam por todo o lado descobrir a traição, a conivência com os alemãs, a sabotagem a proveito destes e que eles deleitavam-se ao se interrogarm sobre os culpados dos nossos revés na frente”.
Efectivamente, nesse período, o sentido crítico da massa acordava e, parcialmente sincero, parcialmente camuflado reclamava-se muitas vezes da “defesa da pátria”. Mas esta ideia assinalava um ponto de partida. O descontentamento dos operários procede então a avanços cada vez mais importantes, reduzindo ao silêncio os contra-mestres, os Cem Negros do seu meio, permitindo aos trabalhadores bolcheviques de levantarem a cabeça.
Da crítica, as massas vêem à acção. A indignação encontra, antes de tudo, uma saída nos sarilhos causados pela insuficiência de abastecimento, os quais, aqui e ali, tomam a forma de motins locais. Mulheres, velhos, adolescentes sentam-se, no mercado ou na praça pública, mais independentes e mais ousados que os operários mobilizados nas fábricas. Em Moscovo, o movimento, no mês de Maio, deriva do saque das casas alemãs. Ainda que os participantes sejam principalmente originários da ralé patrocinada pela polícia, o facto que o progrom seja possível no Moscovo industrial prova que os operários não tinham ainda acordado ao ponto de impor as suas palavras de ordem e disciplina ao povinho das cidades, saídos do seu equilíbrio. Espalhando-se por todos o país, os sarilhos sobre o abastecimento dissipam a hipnose da guerra e abrem caminho às greves.
O afluxo de uma mão-de-obra pouco qualificada nas fábricas e a corrida desenfreada aos lucros de guerra ocasionaram, por todos os lados, o agravar das condições de trabalho e ressuscitaram os procedimentos grosseiros de exploração. O aumento do custo de vida reduzindo automaticamente o valor dos salários. As greves económicas foram inevitavelmente o reflexo da massa, tanto mais violento que ele tinha sido contido durante muito tempo. As greves foram acompanhadas de comícios, de moções de ordem política, de confrontações com a polícia, frequentemente com tiros de armas de fogo, e houve vítimas.
A luta ganha primeiro a região central do têxtil. A 5 de Junho, a polícia dispara uma salva sobre os tecelões em Kostroma: 4 mortos, 9 feridos. No 10 de Agosto, as tropas abrem o fogo sobre os operários de Ivanovo-Voznessensk: 16 mortos, 30 feridos. No movimento dos operários do têxtil estão comprometidos os soldados do batalhão aquartelados nesse sítio. As greves de protesto respondem, em diversos pontos do país, ao tiroteio de Ivanovo-Voznessens. Paralelamente propaga-se a luta económica. Os operários do têxtil avançam muitas vezes nas primeiras filas.
Em comparação com o primeiro trimestre de 1914, o movimento, quanto à violência da pressão e à nitidez das palavras de ordem, marca um grande recuo. Não é de estranhar: na luta são levados, por uma parte considerável, as massas incultas, enquanto que as camadas operárias dirigentes estão perturbadas. Contudo, desde das primeiras greves em tempo de guerra, sente-se a iminência das grandes batalhas. Khvostov, ministro da Justiça, declarava, em 16 de Agosto:
“Se os operários não se entregam neste momento a manifestações armadas, é unicamente porque eles não têm organização.”
Goremykine exprimiu-se de uma forma mais precisa:
“A questão, para os agitadores de operários, reside na insuficiência de uma organização deslocada no seguimento da prisão de cinco membros da Duma”.
O ministro do Interior acrescentou:
“É impossível amnistiar os membros da Duma (os bolcheviques), porque eles constituem o centro da organização do movimento operário nessas manifestações mais perigosas.”
Essa gente, de qualquer forma, sabia discernir sem erro onde se encontrava o verdadeiro inimigo.
Enquanto que o governo, mesmo num momento de pânico extremo, mesmo disposto a fazer concessões liberais, considerava indispensável de continuar a bater os bolcheviques, a alta burguesia esforçava-se de colabora com os mencheviques. Assustados pela amplitude das greves, os industriais liberais tentaram impor aos operários uma disciplina patriótica ao admitindo seus eleitos nos comités de indústria de guerra. O ministro do Interior queixava-se de não poder opor-se senão com dificuldades a esta iniciativa de Gotchkov:
“Todo este assunto apresentou-se sob o signo do patriotismo e em nome dos interesses da defesa.”
É preciso, no entanto, notar que a própria polícia evitava prender os sociais patriotas, vendo neles aliados indirectos na luta contra as greves e os “excessos” revolucionários. A confiança exagerada na força do socialismo patriota baseava-se a convicção da Segurança que enquanto durasse a guerra não haveria insurreição.
Quando as eleições do comité das indústrias de guerra, os partidários da defesa nacional, à cabeça dos quais se encontrou o energético Gvozdiev, operário metalúrgico – nós encontrámos-o ministro do Trabalho num governo revolucionário de coligação – foram colocados em minoria. Eles aproveitaram porém de diversos apoios, vindos não somente da burguesia liberal, mas também da burocracia, para derrubar os partidários do boicote que guiavam os bolcheviques e impor ao proletariado de Petrogrado uma delegação nos grupos orgânicos do patriotismo industrial. A posição dos mencheviques foi claramente formulada num discurso que um dos seus representantes pronunciou seguidamente diante dos industriais, no seio do comité:
“Vós deveis exigir que o poder burocrático existente abandone a cena, cedendo o lugar a vocês, herdeiros do actual regime.”
Esta nova amizade política crescia de hora a hora. Após a revolução, ela daria fruto.
A guerra devastou terrivelmente as organizações clandestinas. Os bolcheviques deixaram de ter organização centralizada do partido após a prisão da fracção parlamentar. Os comités tinham uma existência episódica e nem sempre estavam em contacto com os distritos. A acção vinha dos grupos disseminados, de círculos, de indivíduos isolados. Todavia, o movimento de greve que começava a se reanimar nas fábricas, dava ardor e vigor. Pouco a pouco, eles reencontraram-se entre eles, criando ligações entre grupos. O trabalho retomou, clandestino. No departamento da polícia, escrevia-se mais tarde:
“Os partidários de Lenine, que lideram na Rússia a grande maioria das organizações sociais democratas clandestinas, fizeram circular desde do início da guerra, nos seus principais centros (a saber: Petrogrado, Moscovo, Kharkov, Kiev, Toula, Kostroma, o governo de Vladimir, Samara), uma enorme quantidade considerável de folhetos revolucionários, reclamando o fim das hostilidades, o queda do poder actual e a proclamação da República; além disso, esta actividade teve como resultado sensível a organização pelos operários de greves e de desordens.”
O aniversário tradicional da marcha dos operários em direcção ao Palácio de Inverno, que quase não se tinha notado no ano precedente, suscita uma grande greve no 9 de Janeiro 1916. O movimento de greves, nesse ano, torna-se duas vezes mais intenso. Confrontações com a polícia acompanham toda a greve potente e obstinada. Em relação às tropas, os operários têm uma atitude abertamente amistosa e a Segurança nota mais que uma vez esse facto alarmante.
As indústrias da guerra aumentavam sem limites, devorante à volta delas todos os recurso e minando assim suas próprias bases. Os ramos de produção de natureza pacífica começaram a se esfarrapar. A regulamentação da economia geral, a despeito de todos os planos, não chegava a nada. A burocracia, já incapaz de assumir esta tarefa diante da obstrução dos poderosos comités das indústrias, não consentia todavia a se despossuir do papel regulador em favor da burguesia. O caos aumentava. Os operários experimentes eram substituidos por noviços. As carvoeiras, as fábricas da Polónia logo se encontrariam perdidas: no primeiro ano da guerra, o país foi despossuido de cerca de um quinto dos seus recursos industriais. Até 50% da produção fora afectada às necessidades do exército e da guerra, cujo cerca de 75% dos tecidos fabricados no país. Os transportes, sobrecarregados de trabalho, não estavam em condições de entregar às fábricas as quantidades indispensáveis de combustíveis e as matérias primas. Não somente a guerra absorvia todo o rendimento nacional corrente, mas ela começou a dissipar seriamente o capital fondamental do país.
Os industriais recusavam cada vez mais em fazer concessões aos operários e o governo continuou a responder a cada greve por uma rigorosa repressão. Tudo isso levava o pensamento operário do particular ao geral, da economia à política: “é preciso que todos declararemos greve ao mesmo tempo.” Assim renasceu a ideia de uma greve geral. O processo da radicalização das massas exprimiu-se da maneira mais convencida para a estatística. Em 1915, o número de participantes nas greves políticas é de 2,5 inferior ao dos operários comprometidos nos conflitos económicos; Em 1916, a inferioridade exprimida pelo número 2; no decurso dos primeiros meses de 1917, as greves políticas englobaram seis vezes mais de operários que as greves económicas . O papel de Petrogrado é suficientemente indicado pelo número: durante os anos da guerra, 73% dos grevistas políticos pertenciam à capital !
No calor da luta, as velhas crenças foram consumidas. A Segurança declarou “com dor”, num relatório, que se se reagiam conformemente às exigências da lei, “em todas as ocasiões onde se produzem isoladamente ou abertamente crimes de lesa majestades, o número dos processos baseados sobre o artigo 103 seria sem precedentes”. Porém, a consciência das massas se atrasa perante o seu próprio movimento. A terrível pressão da guerra e o desespero acelera de tal forma o processo de luta que largas massas operárias não têm tempo de se desfazer, antes da revolução, das ideia e preconceitos trazidos do campo, ou nas cidades, das familias pequeno burguesas. Esse facto deixava marcas nos primeiros meses da Revolução de Fevereiro.
Perto do fim de 1916, o custo de vida sobe por saltos. À inflação e a desorganização dos transportes, juntou-se uma verdadeira penúria de mercadorias. O consumo, por esta data, reduziu-se por metade. A curva do movimento operário desenha um ascenso brusco. A datar de Outubro, a luta entra numa fase decisiva, unificando todas as variedades de descontentamento: Petrogrado toma impulso para o grande salto de Fevereiro. Nas fábricas explode o número de comícios. Sujeitos tratados: os abastecimentos, vida cara, a guerra, o governo. Os panfletos dos bolcheviques são difundidos. Greves políticas são declaradas. À saída das fábricas têm lugar manifestações improvisadas. Acontece que os operários de certas empresas fraternizam com os soldados. Uma violenta greve rebenta, em protesto contra o processo levantado aos marinheiros revolucionários da frota do mar Báltico. O embaixador da França, informado de um caso de tiroteio dos soldados sobre a polícia, atraiu a atenção de Stümer, presidente do Conselho, sobre o incidente. Stümer tranquiliza o embaixador: “A repressão será impiedosa”. Em Novembro, um importante contingente de operários das fábricas de Petrogrado é mobilizado e enviado para a frente. O ano termina na tormenta.
Comparando a situação com a de 1905, Vassiliev, director do departamento da Polícia, chega a conclusões extremamente pouco consoladoras.
“O espírito da oposição ganhou proporções excepcionais, que estava longe de atingir, entre as largas massas, no decurso do período de sarilhos acima mencionados.”
Vassiliev não conta com as guarnições. E mesmo a guarde móvel não lhe parece segura. A Segurança reporta que a palavra de ordem de greve geral se reanima e que a perigo de retoma de terrorismo. Os soldados e oficiais que voltam da frente dizem da situação actual:
“Para que serve procurar? Basta passar a baioneta pelo malandro. Se permanecermos aqui, não seria por muito tempo...”
Chliapnikov, membro do Comité central dos bolcheviques, antigo operário metalúrgico, conta que nesses dias os operários estavam muito nervosos:
“Basta às vezes que um só assobio, um rumor, para que os operários acreditassem ter ouvido o sinal de entrar em greve.”
Esse detalhe é tão notável como sintoma político e como aspecto psicológico: a revolução espera nervosamente descer à rua.
A província passa pelas mesmas etapas, mas mais lentamente. O carácter massivo e a combatividade crescente do movimento transferem o centro de gravidade dos operários do têxtil aos da metalurgia, as greves económicas às greves políticas, da província a Petrogrado. No decurso dos primeiros meses de 1917, contavam-se 575 000 grevistas políticos, cuja parte do leão pertence à capital. Ainda que a polícia tivesse infligido rigorosamente na véspera do 9 de Janeiro, houve, para este aniversário do dia sangrento, 150 000 operários em greve em Petrogrado. Os espíritos estão superexcitados, os metalúrgicos tomaram a dianteira, os operários sentem cada vez mais que não há retirada possível. Em cada fábrica se destaca um núcleo de acção, a maior parte das vezes aglomerado à volta dos bolcheviques. As greves e os comícios seguem-se sem interrupção durante as duas primeiras semanas de Fevereiro. A 8, a fábrica Potilov, os polícias são acolhidos por “uma chuva de ferro e escória”. A 14 , dia de abertura da Duma, houve em Petrogrado cerca de 90 000 grevistas. Várias empresas fecharam também em Moscovo. No 16, as autoridades decidiram introduzir em Petrogrado as “cartas de pão”. Esta inovação fez crescer a nervosidade. No 19, perto das boutiques, em certos bairros da cidade, as padarias foram assaltadas. Foram os primeiros relâmpagos precursores da insurreição que devia eclodir alguns dias mais tarde.
O proletariado russo não só extraía em si mesmo a audácia revolucionária. A sua situação de minoria na nação mostra já que ele não poderia ter dado à sua luta uma tal amplitude, nem, pela mais forte razão, tomar a direcção do Estado, se ele não tivesse encontrado um poderoso apoio no mais grosso das massas populares. É a questão agrária que lhe assegurou esse apoio.
A meia emancipação tardia dos camponeses, em 1861, influenciou uma economia rural cujo nível não era diferente daquele que tinha existido dois séculos antes. A manutenção dos antigos fundos de terras comunais, fraudulentamente desfalcadas quando da reforma, com os métodos de cultura arcaicas, agravava automaticamente a crise da superprodução nos campos, que era também a crise do sistema de afolhamentos treinais. A classe camponesa sentia-se tanto mais armadilhada na medida que o processo se desenrolava não no século XVII, mas no século XIX, isto é nas condições onde o papel do dinheiro na economia já estava muito avançado, impondo à relha do arado em madeira as exigências que só eram admissíveis para os tractores. Ainda aqui nós constatamos a coincidência dos graus desiguais do processo histórico – no seguimento do qual se afirmavam as contradições extremamente agudas.
Sábios agrónomos e economistas pregavam que os fundos de terra, na condição de os trabalhar racionalmente, teriam sido perfeitamente suficientes, isto é, eles convidavam o camponês a ganhar de uma só vez um grau superior de técnica e de cultura, sem contrariar o proprietário nobre, nem o chefe da polícia nem o czar. Mas nenhum regime económico, e ainda menos um regime agrícola, o mais atrasado de todos, nunca cedeu terreno sem ter primeiro esgotadas todas as suas possibilidades. Antes de se ver forçado a adoptar métodos de cultura mais intensa, o camponês devia entregar-se a uma última experiência: ele tentaria alargar a sua exploração sem afolhamentos treinais. Ele não poderia evidentemente aí chegar senão ao apoderar-se de terras que não lhe pertenciam. Asfixiado, sentindo-se apertado nos vastos espessos que ocupava, maltratado pelo fisco e pelo mercado, o mujique devia inevitavelmente tentar acabar uma vez por todas com o proprietário nobre.
Na véspera da primeira revolução, a superfície global das terras utilizáveis, nos limites da Rússia europeia, estavam avaliadas em 280 milhões de deciatines, isto é, uma superfície tal que, em números redondos, poderia ser possuída por 10 milhões de famílias rurais. Esta estatística agrária representava o programa completo de uma guerra camponesa.
A primeira revolução não conseguiu resolver a questão dos proprietários nobres. A massa rural não se sublevou inteiramente, o movimento nos campos não coincidiu com o das cidades, a tropa, composta de camponeses, não ousou decidir-se e, finalmente, forneceu os efectivos suficientes para esmagar os operários. Desde que o regimento Semenovsky, da Guarda imperial, tomou vantagem sobre a insurreição de Moscovo, a monarquia rejeitou qualquer ideia de adiantamento sobre a grande propriedade, ou de redução dos seus privilégios autocráticos.
Porém, a revolução quebrada estava longe de ter passado sem deixar traços na vida do campo. O governo anulou as credenciais de 1861 a título de compra das terras pelos camponeses e abriu novas possibilidades de imigração na Sibéria. Os proprietários, assustados, cederam não somente importantes descontos nas rendas mas apressaram-se a vender por lotes o seu latifundio. Esses resultados da revolução foram proveitosos para os camponeses mais ricos que estavam em condições de comprar as terras do domínio público.
A maior latitude para a formação, na classe camponesa, de uma categoria de agricultores capitalistas foi, contudo, atribuida pela lei de 9 Novembro de 1906, principal reforma da contra-revolução vitoriosa. Cedendo mesmo a uma pequena minoria de camponeses, em qualquer comuna, o direito de retirar, contra a vontade da maioria, um lote independente sobre as terras comunais, a lei de 9 Novembro caía como uma bomba lançada pelo campo capitalista contra a comuna. Stolypine, presidente do Conselho, definia a nova política do governo na questão agrária como “uma posição sobre os mais fortes”. O que significava: empurrar a categoria superior de camponeses a lançar mão sobre as terras comunais por compra de lotes “que se tornaram autónomos” e transformar assim os novos agricultores capitalistas em apoios do regime. Era mais fácil de colocar esse problema do que o resolver. Tentando substituir a questão agrícola à da sorte dos kolaques (camponeses ricos), a contra-revolução deveria partir o pescoço.
Em 1 de Janeiro de 1916, 2 milhões 500 000 cultivadores tinham propriedade sua 17 milhões de deciatines. Dois outros milhões reclamavam que lhes fosse cedido 14 milhões de deciatines. Isso podia passar por um formidável sucesso da reforma. Mas, na maioria, as explorações isoladas das comunas eram totalmente desprovidas de vitalidade e não representavam senão os elementos condenados a selecção natural. Enquanto que os proprietários mais atrasados e os camponeses de condição modesta vendiam a quem mais oferecesse – uns seus latifundios, outros arpentes de terras, os compradores vinham principalmente da nova burguesia rural. A economia agrícola entrou numa fase de indiscutível desenvolvimento capitalista. A exploração dos produtos da terra russa aumentou, passando em cinco anos (de 1908 a 1912) de um bilião de rublos a 1 bilião e meio. Isso significava que as largas massas camponesas se proletarizavam enquanto que os elementos ricos do campo lançavam no mercado quantidades de trigo cada vez maiores.
Os ataques obrigatórios do regime comunal nas aldeias substituíam rapidamente a cooperação voluntária que conseguia, em alguns anos, penetrar de maneira relativamente profunda as massas camponesas e que se tornou logo objecto de uma idealização liberal e democrática. A força real, na cooperação, pertencia aos camponeses ricos, os quais, no fim de contas, tiravam proveito. Os intelectuais populistas, que tinham concentrado na cooperação camponesa as suas principais forças, dirigiam enfim o seu amor do povo para os caminhos resistentes da burguesia. Foi assim, em particular, que se preparou o bloco do partido socialista-revolucionário “anti-capitalista” com o partido cadete que era, por excelência, o do capitalismo.
O liberalismo, guardando as aparências de oposição em consideração pela política agrária da reacção, considerava portanto com grande esperança a destruição da comuna rural empreendida pelo capitalismo.
“No campo – escrevia um liberal, o príncipe Trobetskoi – forma-se uma poderosa pequena burguesia que, pela sua natureza, pela sua estrutura, é igualmente estrangeira aos ideais da nobreza unificada e aos sonhos socialistas.”
Mas esta maravilhosa medalha tinha o seu reverso. Da comuna rural destacava-se não somente “uma poderosa pequena burguesia” mas também o seu extremo oposto, seus antípodas. O número de camponeses que tinham vendido seus lotes inviáveis tinha aumentado, no início da guerra, até ao milhão, o que significa pelo menos cinco milhões de habitantes proletarizados. Como reservas de explosivos bastante potentes, existia também milhões de camponeses pobres que não tinham outra coisa a fazer senão manterem-se nos seus lotes de fome. Seguidamente, na classe camponesa, reproduziram-se as contradições que tinham, cedo, entravado na Rússia o desenvolvimento da sociedade burguesa no seu conjunto. A nova burguesia rural, que devia constituir o apoio dos proprietários mais antigos e mais poderosos, se encontrava em estado de hostilidade declarada em relação às massas camponesas, tanto que os antigos proprietários em relação ao povo tomado em bloco.
Antes de se tornar um apoio da ordem, a burguesia rural tinha ela própria necessidade de uma ordem fortemente estabelecida para manter as posições conquistadas. Nessas condições, não é de espantar que a questão agrária, em todas as Dumas do Império, tenha conservado a sua acuidade. Todos sentiam que a última palavra não tinha sido dita. Petritchenko, deputado camponês, declarou um dia do alto da tribuna da Duma:
“Vocês poderão proseguir vossos debate com quiserem, não conseguirão criar outro globo terrestre. Será preciso que vocês cedam a terra sobre a qual nós estamos.”
Ora, esse camponês não era nem bolchevique, nem socialista-revolucionário; longe disso, era um deputado de direita, um monarquista.
O movimento agrário, que, perto do fim de 1907, se tinha acalmado, assim que o ascenso das greves operárias, acordou parcialmente desde 1908 e reforça-se no decorrer dos anos seguintes. É verdade que a luta se transferiu, por uma boa parte, para o interior da vida comunal: é nisso que consiste o calculo político da reacção. As coligações entre camponeses armados não são raros por ocasião das partilhas das terras comunais. Mas a luta contra o proprietário nobre não tem descanso. Os rurais obstinam-se a incendiar os solares senhoriais, as colheitas, medas de feno, sem poupar pelo caminho os camponeses ricos que se constituíram contra a vontade das comunas.
Era essa a situação quando eclodiu a guerra. O governo expediu para a frente cerca de 10 milhões de cultivadores e perto de 2 milhões de cavalos. As empresas agrícolas, já fracas, foram ainda mais debilitadas. O número dos que não tinham campos a semear aumentou. Mas, desde do segundo ano de guerra, os camponeses de média condição baixaram de condição por sua vez. A aversão crescente do camponês pela guerra afirmava-se de mês em mês. Em Outubro 1916, a direcção da guarda de Petrogrado relatava que, nos campos, não se acreditava já mais a uma saída feliz das hostilidades: segundo as afirmações tidas por agentes de seguros, os mestres de escola, os comerciantes e outras pessoas,
“toda a gente espera com a última das paciências o fim desta maldita guerra”.
Ainda mais:
“Em todo o lado, discute-se questões políticas, votam-se resoluções contra os proprietários nobres e os comerciantes; diversas organizações criam células...Pelo momento, não existe ainda centro unitário, mas é preciso pensar que os camponeses encontrarão a unidade por intermediário das cooperativas que se multiplicam de hora em hora por toda a Rússia.”
Há aí alguns exageros, o guarda anticipa um pouco os factos, mas, sem dúvida, ele tem razão no essencial.
As classes possuidoras não podiam abster-se de prever que as campanhas apresentariam a factura, mas tentavam expulsar as pensamentos negros, esperando livrar-se de qualquer maneira. Sobre isso, Paléologue, embaixador de França, que gostava de se instruir, teve conversas, em tempo de guerra, com Krivochine, antigo ministro da Agricultura, com Kokovtsev, antigo presidente o Conselho, com o conde Bobrinsky, grande proprietário, com Rodzianko, presidente da Duma do Império, com o grande industrial e com outros personagens distintas. Eis o que ele tirou dessas entrevistas: para que se possa aplicar uma reforma radical na questão agrária, seria necessário empregar um exército permanente de 300 000 agrimensores durante pelo menos quinze anos; mas, durante esse tempo, o número de explorações agrícolas teriam aumentado a 30 milhões e, consequentemente, todos os cálculos preliminares não teriam mais nenhum valor. Assim, a reforma agrária, nos olhos dos proprietários nobres, altos dignitários e banqueiros, apresentavam-se como a quadratura do círculo. Inútil dizer que tais escrúpulos de matemáticos eram totalmente estrangeiros a mentalidade do mujique. O camponês considerava que seria necessário antes de tudo defumar o senhor: o resto logo se veria.
Se, contudo, os campos continuaram relativamente calmos durante os anos da guerra, é que suas forças activas se encontraram na frente. Os soldados não esqueciam a questão da terra, pelo menos quando eles não pensavam na morte, e suas reflexões de mujiques sobre o futuro penetravam-se, nas trincheiras, do odor da pólvora. No entanto, a classe camponesa, mesmo formada no manuseio das armas, nunca realizou pelas suas próprias forças uma revolução agrária democrática, isto é a revolução que ela queria. Ela tinha necessidade de uma direcção. Pela primeira vez, na história universal, o camponês devia encontra o seu guia na pessoa do operário. É essencialmente e, pode-se dizer, integralmente o que distinguia a revolução russa de todas as que lhe procederam.
Em Inglaterra, a servidão desapareceu efectivamente cerca do fim do século XIV, isto é dois séculos antes que ela fosse instituída na Rússia, quatro centos cinquenta anos antes da sua abolição neste último país. A expropriação dos bens de raíz da classe camponesa inglesa prolonga-se, através da Reforma e duas revoluções, até ao século XIX. O desenvolvimento do capitalismo, que não precipitava nenhuma opressão do exterior, teve assim todo o tempo necessário para meter fim à autonomia dos rurais, muito tempo antes que o proletariado não desperte para a vida política.
Em França, a luta contra a monarquia absoluta, a aristocracia e os príncipes da Igreja forçou a burguesia de diferentes níveis a completar, por etapas, cerca do fim do século XVIII, uma revolução agrária radical. Depois disso, os rurais de França, que se tornaram independentes, mostraram durante muito tempo o apoio seguro da ordem burguesa e, en 1871, ajudaram a burguesia a dominar a Comuna de Paris.
Na Alemanha, a burguesia mostrou-se incapaz de dar uma solução revolucionária à questão agrária e, em 1848, entregou os camponeses aos fidalgos provincianos, tal como Luther, mais de três séculos antes, tinha abandonado os mendigos revoltados aos principes do Império. Por outro lado, o proletariado alemão, no meio do século XIX, era ainda demasiado fraco para tomar a direcção da classe camponesa. Seguidamente, o desenvolvimento do capitalismo, na Alemanha, obteve também um prazo suficiente, ainda que menos extenso que na Inglaterra, para se subordinar à economia agrícola tal como ela tinha saído de uma revolução inacabada.
A reforma do estatuto do campesinato, na Rússia, em 1861, foi obra de uma monarquia conduzida por nobres e funcionários sob a pressão das necessidades da sociedade burguesa, e no entanto a burguesia era completamente impotente na política. O carácter da emancipação dos camponeses era tal que a transformação acelerada do país, no sentido do capitalismo, fazia inevitavelmente do problema agrário um problema de revolução. Os burgueses russos sonhavam com uma evolução agrária à francesa, à dinamarquesa, ou à americana – tudo que se quisesse, salvo de uma evolução russa. Eles não sonhavam, todavia, a se porvir na história da França, no tempo oportuno, ou melhor na estrutura social da América. Os intelectuais democratas, a despeito do seu passado revolucionário, alinharam-se, no momento decisivo, do lado da burguesia liberal e dos proprietários nobres, não do lado dos camponeses revolucionários. Nessas condições, a classe operária era a única que pode colocar-se à cabeça da revolução camponesa.
A lei de um desenvolvimento combinado dos países atrasados – no sentido de uma combinação original dos elementos atrasados com os factores mais modernos – formula-se aqui por nós nos termos mais perfeitos e dá, ao mesmo tempo, a chave do enigma da revolução russa. Se a questão agrária, herdeira da barbarie, da história antiga da Rússia, tinha recebido a sua solução da burguesia, se ele tinha podido receber uma solução, o proletariado russo nunca teria chegado a tomar o poder em 1917. para que se fundasse o Estado soviético, foi preciso a reaproximação e a penetração mútua de dois factores de natureza histórica completamente diferente: uma guerra de camponeses, isto é, um movimento que caracteriza a aurora do desenvolvimento burguês, e uma insurreição proletária, isto é um movimento que assinala o declínio da sociedade burguesa. Todo o anos de 1917 se desenha aí.
Inclusão | 29/04/2010 |
Última alteração | 22/03/2016 |