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Fonte: Problemas Revista Mensal de Cultura Política, nº 64, dezembro 1954 a fevereiro de 1955.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo,
dezembro 2006.
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Camaradas:
De inicio, quero dizer da minha satisfação em participar do IV Congresso do nosso glorioso Partido.
Pertencendo a uma geração posterior ao III Congresso, quero saudar aos camaradas cuja abnegação e espírito de sacrifício fizeram com que o nosso Partido percorresse, nos seus 32 anos de existência, um caminho de lutas gloriosas à frente da classe operária e do povo brasileiro.
Quero saudar muito especialmente ao querido camarada Prestes, guia e mestre do Partido Comunista do Brasil. É com os olhos fitos na vida exemplar do camarada Prestes que procuramos nos colocar à altura das grandes tarefas do nosso Partido, hoje condensadas no Programa do Partido.
No curso desses anos têm sido muitos os exemplos de dedicação e heroísmo das mulheres brasileiras à causa do proletariado.
Na história do movimento revolucionário brasileiro estão inscritos os nomes de algumas mártires : Olga Benário Prestes, sacrificada num campo de concentração nazista; Zélia Magalhães, assassinada em praça pública; Angelina Gonçalves, fuzilada quando participava das comemorações do 1º de Maio.
Inúmeros são os exemplos de heroínas anônimas.
São as mulheres dos ferroviários da Rede Mineira de Viação que se deitam no leito da estrada para impedir a saída de trens e a quebra da unidade da greve de seus esposos por aumento de salários e contra o regime do barracão.
São as mulheres do Rio Grande do Sul. cuja participação no movimento grevista de agosto de 1952 contribuiu valorosamente para que uma greve da classe operária se transformasse em greve de todo o povo. Uma companheira da cidade do Rio Grande dirigiu o povo à cadeia pública, arrancando da prisão o nosso vereador encarcerado.
Participando de piquetes de greve, falando, insistindo e persuadindo, vale salientar a ação das mulheres do Distrito Federal e de Pernambuco nas greves dos têxteis e das mulheres paulistas no memorável movimento grevista de março de 1953 e na grandiosa greve geral de 2 de setembro último.
As mulheres brasileiras, graças a sua combatividade e espírito de iniciativa, muito contribuíram para impedir que os nossos soldados e marinheiros fossem enviados para a guerra da Coréia. É uma vitória que devemos assinalar em nossa contribuição à luta mundial em defesa da paz.
Na greve dos 100.000 marítimos em junho de 1953, ou mais recentemente, no movimento grevista dos ferroviários da Leopoldina, a ação das mulheres junto aos grevistas impediu que os fura-greves quebrassem a unidade desses movimentos.
Nas manifestações populares de 24 e 25 de agosto último, em todo o país, estiveram as mulheres entre os manifestantes mais combativos. No Distrito Federal, foram as palavras dos jovens e mulheres comunistas que conduziram o povo à luta contra a Embaixada norte americana. Em tão formidáveis manifestações as mulheres foram não só ouvidas e atendidas, mas também recebidas com carinho e protegidas pelas massas.
Na preparação da Conferência Latino-Americana de Mulheres, os ataques da reação e toda a campanha caluniosa dirigida pelo Departamento de Estado norte-americano não conseguiram quebrar o ânimo e entusiasmo das mulheres, que conduziram vitoriosamente a tarefa até o fim.
Na recente campanha eleitoral, as companheiras do Distrito Federal, por exemplo, deram provas de dedicação e espírito de sacrifício. As companheiras do Méier iniciavam os comandos de casa em casa às 6 horas do manhã e iam até às 22 horas, chegando a percorrer diariamente 33 ruas. As companheiras do Catete, com um entusiasmo exemplar, dirigiram, altas horas da madrugada, grandes colagens de cartazes. As companheiras de Santa Tereza durante oito dias, estiveram com sua mesinha de distribuição de cédulas no Largo da Carioca. Foi a mesinha mais movimentada da cidade, contando com o apoio entusiástico e a solidariedade ativa da massa.
Sabemos, entretanto, que não basta a dedicação pessoal.
O trabalho do nosso Partido junto às massas femininas é ainda estreito. Falamos em dezenas e centenas, quando necessitamos de milhares de mulheres no Partido e milhões de mulheres para a luta democrática de libertação nacional.
Decorridos 10 meses da publicação do Programa do nosso Partido, ainda não soubemos aplicar, com inteira justeza, as tarefas fundamentais que o camarada Prestes expôs em seu Informe de apresentação do Programa, isto é, ganhar todo o Partido para o Programa e transformar o Programa do Partido em Programa de todo o povo.
Não levar à prática vitoriosamente essas tarefas junto às mulheres comunistas e às massas femininas significa não compreender a importância da participação das mulheres para tornar realidade os sublimes objetivos do Programa. Significa esquecer toda a tradição de luta da mulher pela independência e em defesa dos interesses vitais do nosso povo. Significa ainda que deixamos de lado um grande potencial em capacidade de trabalho e dedicação à luta libertadora constituído pela população feminina.
O trabalho do nosso Partido entre as mulheres apresenta serias debilidades. O sectarismo é o principal entrave ao trabalho do Partido junto às massas femininas. As próprias Organizações de Base femininas criadas para facilitar o trabalho do Partido junto às grandes massas de mulheres, não têm cumprido satisfatoriamente sua missão. Em sua maioria as Organizações de Base femininas realizam mais o trabalho de agitação e propaganda, deixando de lado a tarefa fundamental para a qual foram criadas, isto é, mobilizar e organizar as mulheres partindo das suas reivindicações específicas, das lutas contra a carestia, pelo congelamento de preços, em defesa da infância e elevando-as até às lutas democráticas e emancipadoras.
No ComitêRegional de Piratininga, por exemplo, existem algumas dezenas de Organizações de Base femininas. No entanto, não chega a uma dezena o número das Organizações de Base femininas que realizam trabalho junto às grandes massas femininas. É o exemplo do Comitê de Zona de Tatuapé, onde as Organizações de Base femininas vivem voltadas para dentro de si mesmas e as companheiras realizam desde o trabalho de finança ordinária ao de colagem de cartazes, sem se cogitar da necessidade de que estas Organizações de Base concentrem seu trabalho na mobilização e organização das massas femininas.
Os métodos sectários de trabalho são levados às organizações de massa que se transformam, na maioria dos casos, em simples frente legal do Partido. Isto afasta as massas femininas dessas organizações, que se vêem reduzidas a pequenos círculos de comunistas e simpatizantes.
Entrave não menor ao desenvolvimento do trabalho feminino tem sido o espontaneísmo com que ainda enfrentamos nossas tarefas. Têm sido poucas, por exemplo, as medidas práticas tomadas no sentido de ganhar para a luta revolucionária milhões de mulheres.
Em recente ativo nacional do Partido sobre o trabalho feminino, constatou-se um regular avanço na elevação do nível político e ideológico das camaradas, mas poucas foram as experiências novas surgidas no trabalho com as massas. Isto significa que necessitamos de mais ação, combatividade e espírito de iniciativa no trabalho de mobilização e organização das mulheres em torno do Programa e das palavras-de-ordem do nosso Partido. Poucas foram as medidas tomadas, por exemplo, para levar à prática a palavra-de-ordem de nosso Partido de que trabalhistas e comunistas devem marchar juntos, como irmãos na luta contra o atual governo. O mesmo acontece com a palavra-de-ordem de ganhar para a luta democrática e libertadora as massas da pequena burguesia enganadas até agora pela demagogia supostamente oposicionista da UDN.
O espontaneísmo do trabalho do Partido junto às massas femininas, revela-se também no fato de que nos voltamos, geralmente, para o trabalho mais fácil e de efeito mais imediato, deixando de desenvolver o trabalho junto àqueles setores mais importantes. É isto que tem contribuído para que o trabalho do Partido junto às mulheres operárias e camponesas ficasse, até agora, relegado a um plano secundário. Não cuidamos, por exemplo, em São Paulo e no Distrito Federal, assim como nas grandes cidades, de ganhar as mulheres que sendo operárias, funcionárias ou comerciarias, não deixam de ser donas de casa. O pior é o descaso pelo trabalho junto às mulheres camponesas.
Insatisfatória vem sendo ainda a maneira do nosso Partido levar o Programa às massas femininas. O nosso trabalho tem se limitado a distribuição de folhetos com o Programa ou a realização de palestras, sem a preocupação de levantar com vigor e clareza as reivindicações especificas e mais sentidas da mulher, vítima de discriminação econômica, das desigualdades sociais e jurídicas e mesmo de preconceitos feudais e burgueses, conforme assinala, com justeza, o camarada Prestes em seu Informe a este Congresso.
Tais debilidades devem-se, fundamentalmente, ao fato de que existe em nosso Partido, das direções às bases, incluindo até o Comitê Central, uma profunda subestimação pelo trabalho feminino. Nesse sentido, não se excetuam mesmo a maioria das companheiras membros do Partido. Boas companheiras negam-se a realizar o trabalho feminino de massas, alegando ser este cansativo ou desagradável.
Toda esta subestimação é de origem ideológica. É comum ainda entre grande número dos nossos companheiros a maneira senhorial de tratar as camaradas.
O trabalho de ganhar milhões de mulheres para o Programa só poderá se desenvolver com pleno êxito quando deixar de ser apenas tarefa das Seções do trabalho feminino e das Organizações de Base femininas e for incluído entre as tarefas permanentes e diárias de todos os organismos do Partido, desde os Comitês Regionais aos Comitês Distritais. Isto é particularmente verdadeiro tratando-se das responsabilidades e das tarefas das Organizações de Base do Partido, especialmente das Organizações de Base de empresa.
Os Estatutos do nosso Partido colocam entre as tarefas das Organizações de Base «estar incessantemente atenta aos sentimentos e reivindicações das massas, transmitir esses sentimentos e reivindicações aos organismos superiores do Partido, dar atenção à vida política, econômica e cultural dos trabalhadores e do povo e ganhá-los para que resolvam seus próprios problemas».
Isto impõe às nossas Organizações de Base a tarefa de auscultar também as reivindicações das mulheres, trabalhadoras ou simples donas de casa, e de buscar os meios de ganhá-las para que resolvam seus próprios problemas. Só assim poderemos ter um movimento feminino fortemente apoiado nas massas e estreitamente ligado às mulheres operárias e camponesas.
Nos organismos do Partido onde se realiza um maior esforço no sentido de integrar o trabalho feminino entre as tarefas cotidianas do Partido observa-se que este trabalho avança. A discussão do trabalho entre as mulheres, a planificação e o controle das tarefas relacionadas com a Conferência Latino-Americana de Mulheres, no Comitê de Zona da Lapa, na Região Piratininga, permitiu que surgissem, nesse período, 3 novas Organizações de Base femininas e mais uma Associação Feminina de massas.
Tudo isto não significa que nós que estamos à frente do trabalho feminino procuremos nos eximir das nossas responsabilidades. Ao contrário. Muito temos que fazer para nos colocar à altura das tarefas do Partido. Não é boa ainda nossa maneira de trabalhar. É urgente revisarmos todos os nossos métodos de trabalho, pois somos as principais responsáveis pelas debilidades existentes no trabalho feminino.
A situação exige que dediquemos uma atenção especial ao trabalho junto às mulheres trabalhadoras. Este deve ser um trabalho de aproximação, de solidariedade às suas lutas e de organização.
A luta contra a carestia e pelo congelamento de preços é o elo capaz de unir o movimento das donas de casa à luta das mulheres operárias e camponesas por melhores condições de vida e de trabalho.
Voltando-nos para este trabalho, tudo devemos fazer para que as operárias e camponesas ingressem nos sindicatos e engrossem as fileiras da União de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil.
O grande Stálin dizia:
«As mulheres trabalhadoras, operárias e camponesas, constituem a grande reserva da classe operária. Esta reserva representa uma boa metade da população. A reserva feminina está contra ou a favor da classe operária ? Disto depende o destino do movimento proletário, a vitória ou derrota da revolução proletária. Eis porque a primeira tarefa do proletariado e de seu destacamento mais avançado, o Partido Comunista, consiste em travar uma luta decisiva para libertar as mulheres operárias e camponesas, da influência da burguesia, para educar politicamente e organizar as operárias e camponesas sob a bandeira do proletariado» .
Fazer com que esses milhões de mulheres lutem e participem dos movimentos da classe operária e dos camponeses e se organizem para lutar mais e melhor, eis, portanto, uma das principais tarefas de todo militante comunista. Na greve do proletariado paulista, de março de 1953, surgiram departamentos femininos nos sindicatos dos têxteis, metalúrgicos e gráficos. Na preparação da Conferência Latino-Americana de Mulheres surgiram organizações de camponesas em vários municípios do interior de São Paulo, de Minas e do Rio Grande do Sul. A Associação Feminina de Ponte Nova, no Estado de Minas Gerais, foi organizada graças à atuação ativa das mulheres na greve dos assalariados agrícolas das usinas de açúcar por aumento de salários. São alguns exemplos, mas nos mostram o caminho a seguir.
O grande Stálin ensina:
«... as mulheres trabalhadoras não são apenas uma reserva. Elas podem e devem tornar-se — com uma política justa da classe operária — um verdadeiro exército que combaterá a burguesia. Fazer desta reserva de mulheres trabalhadoras um exército de operárias e camponesas combatendo ao lado do grande exército do proletariado, eis a segunda tarefa, que é decisiva, da classe operária».
Camaradas:
As assembléias preparatórias ao IV Congresso revelaram um grande espírito de disciplina, de dedicação e amor ao Partido por parte das companheiras. No entanto, apesar de uma frequência que atingiu até 98%, é muito pequeno ainda o número de mulheres membros no Partido. Este fato está relacionado com a deficiência do trabalho do nosso Partido entre as mulheres, o que demonstra que não extirpamos ainda das nossas fileiras os preconceitos burgueses com relação à mulher.
Não existe no Partido a preocupação permanente com o recrutamento de mulheres, ou não se cuida de faze-lo nas grandes concentrações de mulheres nas cidades e no campo. O recrutamento de novas militantes realiza-se, geralmente, de maneira não planificada e não se procura dar-lhes vida ativa orgânica e politicamente.
De modo geral, os nossos militantes não têm ainda a preocupação de aproveitar os movimentos e as lutas de massas para fazer crescer e fortalecer o nosso Partido. Na campanha eleitoral, por exemplo, houve no Distrito Federal uma ativação de cerca de 80% das militantes comunistas. No entanto, nesse período surgiram apenas três novas Organizações de Base femininas, o que não corresponde ao crescente prestígio do Partido entre as massas femininas.
As assembléias Piratiningadas Organizações de Base, preparatórias do IV Congresso, revelaram, também, o baixo nível político e ideológico, e mesmo cultural, das nossas companheiras. Esta questão requer uma atenção especial por parte das direções do Partido, desde a criação de cursos específicos até o estímulo permanente aos círculos de estudo. A execução desta tarefa será facilitada porque, apesar do praticismo, há grande ânsia de aprender. As companheiras de São Paulo, por exemplo, num plano de emulação do Comitê Piratininga, foram detentoras de um prêmio por haverem criado e feito funcionar o maior número de círculos de estudo. A pequena participação de companheiras nos cursos do Partido, principalmente no Curso Stálin, a falta de publicação de materiais específicos sobre o trabalho feminino revelam que em nosso Partido ainda não se dá a necessária atenção à elevação do nível político e ideológico das suas militantes e mesmo das suas dirigentes.
Relacionado com isto, todo o Partido deveria encarar mais seriamente a necessidade da promoção de quadros femininos. O estímulo, a ajuda direta, o controle vivo, o contato com quadros política e ideologicamente mais capazes e experimentados, a participação nos plenos dos órgãos dirigentes, tudo isto ajudará a todas nós mulheres de Partido a rompermos a timidez muito comum às mulheres, a procurarmos estudar mais a fim de nos pormos à altura das nossas tarefas e responsabilidades.
Na verdade, a promoção de quadros femininos em nosso Partido ainda se processa de maneira muito lenta. As nossas direções ainda procuram ater-se as alegações de timidez das camaradas, ou a problemas de outra ordem, sem promovê-las com audácia. Existem camaradas que no curso das últimas lutas, nas manifestações de 24 e 25 de agosto em todo o país e na greve geral de 2 de setembro em São Paulo, revelaram um elevado espírito de combatividade, coragem pessoal e qualidades de comando. As direções do Partido devem aproveitar esses quadros, promovê-los e ajudá-los.
Neste sentido, os organismos do Partido precisam, também, dedicar uma atenção especial à formação de quadros dedicados ao trabalho feminino, sejam eles companheiros ou companheiras.
Acreditamos que, à base das discussões e resoluções que sairão deste memorável Congresso, deveríamos enfrentar seriamente as seguintes tarefas com relação ao trabalho feminino:
Segundo pensamos, são essas as principais tarefas que precisam ser enfrentadas pelo nosso Partido para liquidar a subestimação existente pelo trabalho feminino, para iniciar uma nova vida no trabalho de ganhar milhares de mulheres para o Partido e milhões para a luta democrática de libertação nacional. É isto o que nos impõem os Estatutos do Partido e o Programa do Partido.
Camaradas:
Nós que tivemos a grande felicidade e honra de participar do IV Congresso do Partido Comunista do Brasil só podemos acrescentar o nosso compromisso de não pouparmos esforços, não medirmos sacrifícios para levar à prática, no mais curto prazo, as resoluções aqui aprovadas.
Inclusão | 12/11/2006 |