Fome e Revolução na Índia

Manabendra Nath Roy

18 de setembro de 1919


Primeira edição: The Call, em 18 de setembro de 1919.

Tradução e HTML: Guilherme Corona.

Fonte para a tradução: seção inglesa do Arquivo Marxista na Internet.

Direitos de reprodução: Domínio público.


O controle absoluto dos meios de comunicação pelos Governos das Potências vitoriosas impediu que o público soubesse de qualquer fato desagradável para essas poderosas nações, que têm poder o indisputado sobre a terra e sobre os milhões de seres humanos que a habitam.

Porque a Inglaterra capturou todo caminho pelo qual notícias poderiam sair da Índia, o mundo somente sabe o que a Inglaterra deseja sobre a atual condição do povo indiano. Como resultado dessa política, estabelecida mesmo antes da guerra, havia uma crença disseminada no povo do hemisfério ocidental de que a administração benevolente (?) da Índia pelos ingleses resultaram em paz e prosperidade para aquela nação remota. Propagandistas imperialistas têm contado ao público pelos últimos cinquenta anos que antes da chegada dos britânicos o povo indiano nunca tinha conhecido essas bençãos, e que sob sua proteção amigável 350 milhões de indianos vivem contentes e felizes. Mas chegou o tempo em que os eventos mundiais mudam tão rapidamente que mesmo a voz sufocada de milhões de famintos da Índia alcança os cantos mais remotos da terra. Os crimes bárbaros cometidos pelos ingleses na Índia por mais de um século e meio alcançaram seu clímax, e mesmo a mão todo-poderosa da “Pérfida Albion” se vê incapaz de manter o mundo na ignorância da chocante realidade.

No momento presente, a Índia é atingida por uma fome como nunca se viu antes, mesmo em sua longa e trágica história de fomes sob o governo britânico. As causas dessa terrível epidemia são a exaustão econômica do povo e a exportação de toda a comida para alimentar os exércitos dos Aliados durante os quatro anos da guerra.

Aos protestos das massas moribundas, o Governo Britânico respondeu com bombas e baioneta, e a aplicação de leis ainda mais restritas e repressivas para prevenir que a voz de um povo oprimido alcançasse o mundo com seu apelo por ajuda. As poucas notícias publicadas na imprensa americana e canadense testemunham que as condições na Índia alcançaram proporções críticas alarmantes. Todo o país está em estado de rebelião, e o Governo Britânico está usando todo seu poder para reprimir a revolta do povo que tem sido esmagado sob a tirania sem precedentes nos anais do mundo civilizado. No começo de abril, a revolução explodiu simultaneamente nas quatro maiores províncias do Império Indiano; em Bengala, Bumbai, o Punjabi e nas Províncias Unidas, que juntos formam quase dois terços do país. Centenas de vidas foram perdidas em ambos os lados, tanto no do Governo como no dos revolucionários. A antiga cidade de Amritsar foi um dos centros onde a luta se iniciou; ela foi cercada por tropas inglesas, que bombardearam a população inteira com aviões, matando centenas de pessoas inocentes, e destruindo parcialmente o grande Templo de Ouro, sagrado para os Sikhs e um maravilhoso monumento arquitetônico.

Em todas as partes do país bancos ingleses foram saqueados pelos revolucionários. A parte norte de Calcutá, a maior metrópole da Índia, ficou em seu controle por quatro dias. As principais cidades industriais e comerciais como Bumbai, Ahamedabad, Lahore, Déli, a sede do Vice-Rei, Allahabad; Gujranwala, etc., foram transformadas em campos de batalhas entre o povo totalmente desarmado e as forças militares do Governo, completamente equipados com fuzis, carros blindados e aviões dos quais bombas eram despejadas nas multidões desamparadas de homens, mulheres e crianças.

Todos os diferentes elementos que formam a nação indiana, os Hindus, Sikhs, Maometanos e outras grandes comunidades, se uniram em oposição determinada a tirania britânica que sujeitou todo o povo a um verdadeiro reino de terror com sua recente legislação repressiva e impiedosa aplicação da lei marcial. As medidas repressivas, conhecidas como as Atos Roulatt, foram decretadas três meses atrás em face a oposição unânime do povo indiano. Com esses Atos, liberdade de imprensa, de expressão e de associação e organização foram absolutamente destruídos. O propósito dos Atos Rowlatt, francamente admitido, era matar o despertado espírito revolucionário no povo. De acordo com a confissão do próprio Governo Britânico, o povo indiano está lutando pela liberdade, e a única coisa que os pode submeter ao domínio estrangeiro é a força bruta dos opressores.

Por quatro anos a Índia agonizou em uma das piores fomes conhecidas na história. Agora que a guerra terminou, e que todos procuram melhorar a condição dos países devastados da Europa, as condições na Índia pioraram. Até os missionários cristão, que constituem os mais leais e ferozes defensores do Imperialismo Britânico na Índia, se uniram para demandar que os pobres infiéis devem receber comida antes que possam ser salvos para Cristo. (Continua na próxima semana.)