MIA > Biblioteca > Lenine > Imperialismo... > Novidades
(<-Capitulo VI) (Capitulo VIII->)
Precisamos agora de tentar fazer um balanço, resumir o que dissemos acima sobre o imperialismo. O imperialismo surgiu como desenvolvimento e continuação direta das características fundamentais do capitalismo em geral. Mas o capitalismo só se transformou em imperialismo capitalista quando chegou a um determinado grau, muito elevado, do seu desenvolvimento, quando algumas das características fundamentais do capitalismo começaram a transformar-se na sua antítese, quando ganharam corpo e se manifestaram em toda a linha os traços da época de transição do capitalismo para uma estrutura econômica e social mais elevada. O que há de fundamental neste processo- do ponto de vista econômico, é a substituição da livre concorrência capitalista pelos monopólios capitalistas. A livre concorrência é a característica fundamental do capitalismo e da produção mercantil em geral; o monopólio é precisamente o contrário da livre concorrência, mas esta começou a transformar-se diante dos nossos olhos em monopólio, criando a grande produção, eliminando a pequena, substituindo a grande produção por outra ainda maior, e concentrando a produção e o capital a tal ponto que do seu seio surgiu e surge o monopólio: os cartéis, os sindicatos, os trusts e, fundindo-se com eles, o capital de uma escassa dezena de bancos que manipulam milhares de milhões. Ao mesmo tempo, os monopólios, que derivam da livre concorrência, não a eliminam, mas existem acima e ao lado dela, engendrando assim contradições, fricções e conflitos particularmente agudos e intensos. O monopólio é a transição do capitalismo para um regime superior.
Se fosse necessário dar uma definição o mais breve possível do imperialismo, dever-se-ia dizer que o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo. Essa definição compreenderia o principal, pois, por um lado, o capital financeiro é o capital bancário de alguns grandes bancos monopolistas fundido com o capital das associações monopolistas de industriais, e, por outro lado, a partilha do mundo é a transição da política colonial que se estende sem obstáculos às regiões ainda não apropriadas por nenhuma potência capitalista para a política colonial de posse monopolista dos territórios do globo já inteiramente repartido.
Mas as definições excessivamente breves, se bem que cômodas, pois contêm o principal, são insuficientes, já que é necessário extrair delas especialmente traços muito importantes do que é preciso definir. Por isso, sem esquecer o caráter condicional e relativo de todas as definições em geral, que nunca podem abranger, em todos os seus aspectos, as múltiplas relações de um fenômeno no seu completo desenvolvimento, convém dar uma definição do imperialismo que inclua os cinco traços fundamentais seguintes: 1) a concentração da produção e do capital levada a um grau tão elevado de desenvolvimento que criou os monopólios, os quais desempenham um papel decisivo na vida econômica; 2) a fusão do capital bancário com o capital industrial e a criação, baseada nesse "capital financeiro" da oligarquia financeira; 3) a exportação de capitais, diferentemente da exportação de mercadorias, adquire uma importância particularmente grande; 4) a formação de associações internacionais monopolistas de capitalistas, que partilham o mundo entre si, e 5) o termo da partilha territorial do mundo entre as potências capitalistas mais importantes. O imperialismo é o capitalismo na fase de desenvolvimento em que ganhou corpo a dominação dos monopólios e do capital financeiro, adquiriu marcada importância a exportação de capitais, começou a partilha do mundo pelos trusts internacionais e terminou a partilha de toda a terra entre os países capitalistas mais importantes.
Mais adiante veremos como se pode e deve definir de outro modo o imperialismo, se tivermos em conta não só os conceitos fundamentais puramente econômicos (aos quais se limita a definição que demos), mas também o lugar histórico que esta fase do capitalismo ocupa relativamente ao capitalismo em geral, ou a relação entre o imperialismo e as duas tendências fundamentais do movimento operário. O que agora há a considerar é que, interpretado no sentido referido, o imperialismo representa em si, indubitavelmente, uma fase particular de desenvolvimento do capitalismo. Para dar ao leitor uma idéia o mais fundamentada possível do imperialismo, procuramos deliberadamente reproduzir o maior número de opiniões de economistas burgueses que se viram obrigados a reconhecer os fatos da economia capitalista moderna, estabelecidos de maneira particularmente incontroversa. Com o mesmo fim, reproduzimos dados estatísticos minuciosos que permitem ver até que ponto cresceu o capital bancário, etc., que expressão concreta teve a transformação da quantidade em qualidade, a transição do capitalismo desenvolvido para o imperialismo. Escusado é dizer, evidentemente, que na natureza e na sociedade todos os limites são convencionais e mutáveis, que seria absurdo discutir, por exemplo, sobre o ano ou a década precisos em que se instaurou definitivamente o imperialismo.
Mas sobre a definição do imperialismo vemo-nos obrigados a discutir sobretudo com K. Kautsky, o principal teórico marxista da época da chamada IIª Internacional, isto é, dos vinte e cinco anos compreendidos entre 1889 e 1914. Kautsky pronunciou-se decididamente em 1915, e mesmo em Novembro de 1914, contra as idéias fundamentais expressas na nossa definição do imperialismo, declarando que por imperialismo se deve entender não uma "fase" ou um grau da economia, mas uma política, e uma política determinada, a política "preferida" pelo capital financeiro; que não se pode identificar o imperialismo com o capitalismo contemporâneo , que, se a noção de imperialismo abarca "todos os fenômenos do capitalismo contemporâneo" - cartéis, protecionismo, dominação dos financeiros, política colonial -, então o problema da necessidade do imperialismo, para o capitalismo, transforma-se na "tautologia mais trivial", pois nesse caso, "naturalmente, o imperialismo é uma necessidade vital para o capitalismo", etc. Expressaremos com a máxima exatidão o pensamento de Kautsky se reproduzirmos a sua definição do imperialismo, diametralmente oposta à essência das idéias que nós expomos (pois as objeções procedentes do campo dos marxistas alemães que defenderam idéias semelhantes durante longos anos, são já conhecidas desde há muito por Kautsky como objeções de uma corrente determinada do marxismo).
A definição de Kautsky é a seguinte:
"O imperialismo é um, produto do capitalismo industrial altamente desenvolvido. Consiste na tendência de toda a nação capitalista industrial para submeter ou anexar cada vez mais regiões agrárias (o sublinhado é de Kautsky), quaisquer que sejam as nações que as povoam."(1*)
Esta definição não serve absolutamente para nada, visto que destaca de um modo unilateral, isto é, arbitrário, apenas o problema nacional (se bem que seja da maior importância, tanto em si como na sua relação com o imperialismo), relacionando-o arbitrária e erradamente só com o capital industrial dos países que anexam outras nações, e colocando em primeiro plano, da mesma forma arbitrária e errada, a anexação das regiões agrárias.
O imperialismo é uma tendência para as anexações; eis a que se reduz a parte política da definição de Kautsky. E justa, mas extremamente incompleta, pois no aspecto político o imperialismo é, em geral, uma tendência para a violência e para a reação. Mas o que neste caso nos interessa é o aspecto econômico que o próprio Kautsky introduziu na sua definição. As inexatidões da definição de Kautsky saltam à vista. O que é característico do imperialismo não é precisamente o capital industrial, mas o capital financeiro. Não é um fenômeno casual o fato de, em França, precisamente o desenvolvimento particularmente rápido, do capital financeiro, que coincidiu com um enfraquecimento do capital industrial, ter provocado, a partir da década de 80 do século passado, uma intensificação extrema da política anexionista (colonial). O que é característico do imperialismo é precisamente a tendência para a anexação não só das regiões agrárias, mas também das mais industriais (apetites alemães a respeito da Bélgica, dos franceses quanto à Lorena), pois, em primeiro lugar, estando já concluída a divisão do globo, isso obriga, para fazer uma nova partilha, a estender a mão sobre todo o tipo de territórios; em segundo lugar, faz parte da própria essência do imperialismo a rivalidade de várias grandes potências nas suas aspirações à hegemonia, isto é, a apoderarem-se de territórios não tanto diretamente para si, como para enfraquecer o adversário e minar a sua hegemonia (para a Alemanha, a Bélgica tem uma importância especial como ponto de apoio contra a Inglaterra; para a Inglaterra, tem-na Bagdad como ponto de apoio contra a Alemanha, etc.).
Kautsky remete-se particularmente - e repetidas vezes - aos ingleses que, diz ele, formularam a significação puramente política da palavra "imperialismo", no sentido em que ele a entende. Tomamos o inglês Hobson e lemos no seu livro O Imperialismo, publicado em 1902:
"O novo imperialismo distingue-se do velho, primeiro porque, em vez da aspiração de um só império crescente, segue a teoria e a prática de impérios rivais, cada um deles guiando-se por idênticos apetites de expansão política e de lucro comercial; segundo, porque os interesses financeiros, ou relativos ao investimento de capital, predominam sobre os interesses comerciais" (2*)
Como vemos, Kautsky não tem de fato razão alguma ao remeter-se aos ingleses em geral (os únicos a que poderia remeter-se seriam os imperialistas ingleses vulgares ou os apologistas declarados do imperialismo). Vemos que Kautsky, que pretende continuar a defender o marxismo, na realidade dá um passo atrás em relação ao social-liberal Hobson, o qual tem em conta, com mais acerto do que ele, as duas particularidades "históricas concretas" (Kautsky, com a sua definição, troça precisamente do caráter histórico concreto!) do imperialismo contemporâneo: 1) concorrência de vários imperialismos; 2) predomínio do financeiro sobre o comerciante. Se o essencial consiste em que um país industrial anexa um país agrário, então atribui-se o papel principal ao comerciante.
A definição de Kautsky, além de ser errada e de não ser marxista, serve de base a todo um sistema de concepções que rompem em toda a linha com a teoria marxista e com a atuação prática marxista de que falaremos mais adiante. Carece absolutamente de seriedade a discussão de palavras promovida por Kautsky: como se deve qualificar a- fase atual do capitalismo: de imperialismo ou de fase do capital financeiro? Chame-se-lhe como se queira, isso é indiferente. 0 essencial é que Kautsky separa a política do imperialismo da sua economia, falando das anexações como da política preferida pelo capital financeiro, e opondo a ela outra política burguesa possível, segundo ele, sobre a mesma base do capital financeiro. Conclui-se que os monopólios, na economia, são compatíveis com o modo de atuar não monopolista, não violento, não anexionista, em política. Conclui-se que a partilha territorial do mundo, terminada precisamente na época do capital financeiro, e que é a base da peculiaridade das formas atuais de rivalidade entre os maiores Estados capitalistas, é compatível com uma política não imperialista. Daqui resulta que, deste modo, se dissimulam, se ocultam as contradições mais fundamentais da fase atual do capitalismo, em vez de as pôr a descoberto em toda a sua profundidade; daqui resulta reformismo burguês em vez de marxismo.
Kautsky discute com Cunow, apologista alemão do imperialismo e das anexações, que discorre de uma maneira grosseira e cínica: o imperialismo é o capitalismo contemporâneo; o desenvolvimento do capitalismo é inevitável e progressivo; por conseguinte, o imperialismo é progressivo; por conseguinte devemos prosternar-nos diante do imperialismo e glorificá-lo! Este raciocínio parece-se, de certo modo, com a caricatura dos marxistas russos que os populistas faziam nos anos de 1894 e 1895; se os marxistas consideram que o capitalismo é inevitável e progressivo na Rússia, diziam os populistas, devem dedicar-se a abrir tabernas e a fomentar o capitalismo.
Kautsky objeta a Cunow: não, o imperialismo não é o capitalismo contemporâneo, mas apenas uma das formas da sua política; podemos e devemos lutar contra essa política, lutar contra o imperialismo, contra as anexações, etc. A objeção, completamente plausível na aparência, eqüivale, na realidade, a uma defesa mais subtil, mais velada (e por isso mesmo mais perigosa), da conciliação com o imperialismo, pois uma "luta" contra a política dos trusts e dos bancos que deixe intactas as bases da economia de uns e outros não passa de reformismo e pacifismo burgueses, não vai além das boas e inofensivas intenções. Voltar as costas às contradições existentes e esquecer as mais importantes, em vez de as descobrir em toda a sua profundidade: é isso a teoria de Kautsky, o que nada tem a ver com o marxismo. E, naturalmente, semelhante ,teoria,, não procura outro fim que não seja defender a idéia da unidade com os Cunow!
"Do ponto de vista puramente econômico - escreve Kautsky -, não está excluído que o capitalismo passe ainda por uma nova fase: a aplicação da política dos cartéis à política externa, a fase do ultra-imperialismo"(3*), isto é, o superimperialismo, a união dos imperialismos de todo o mundo, e não a luta entre eles, a fase da cessação das guerras sob o capitalismo, a fase da "exploração geral do mundo pelo capital financeiro, unido internacionalmente"(4*).
Será preciso que nos detenhamos mais adiante nesta, teoria do ultraimperialismo,,, com o fim de demonstrar em pormenor até que ponto ela rompe irremediável e decididamente com o marxismo. O que aqui devemos fazer, de acordo com o plano geral do nosso trabalho, é passar uma vista de olhos pelos dados econômicos precisos relativos a este problema. Será possível o "ultra- imperialismo" "do ponto de vista puramente econômico", ou será isto um ultradisparate?
Se por ponto de vista puramente econômico se entende a "pura" abstração, tudo o que se pode dizer reduz-se à tese seguinte: o desenvolvimento vai na direção do monopólio; portanto vai na direção do monopólio mundial único, de um trust mundial único. Isto é indiscutível, mas ao mesmo tempo é uma perfeita vacuidade, como seria o dizer-se que ,o "desenvolvimento vai" no sentido da produção dos artigos alimentares em laboratórios. Neste sentido, a "teoria" do ultraimperialismo é tão absurda como seria a "teoria da ultra-agricultura,".
Mas se falamos das condições "puramente econômicas" da época do capital financeiro como de uma época historicamente concreta, localizada nos princípios do século XX, a melhor resposta às abstrações mortas do "ultraimperialismo" (que servem exclusivamente um propósito dos mais reacionários: desviar a atenção das profundas contradições existentes) é contrapor-lhes a realidade econômica concreta da economia mundial moderna. As ocas divagações de Kautsky sobre o ultraimperialismo estimulam, entre outras coisas, a idéia profundamente errada, que leva a água ao moinho dos apologistas do imperialismo, de que a dom Inação do capital financeiro atenua a desigualdade e as contradições da economia mundial, quando, na realidade, o que faz é acentuá-las.
R. Calwer, no opúsculo Introdução à Economia Mundial (5*), procurou resumir os principais dados puramente econômicos que permitem ter uma idéia concreta das relações dentro da economia mundial em fins do século XIX e princípios do século XX. Calwer divide o mundo em cinco ,regiões econômicas principais: 1) a da Europa Central (toda a Europa, com excepção da Rússia e da Inglaterra); 2) a britânica; 3) a da Rússia; 4) a oriental asiática, e 5) a americana, incluindo as colônias nas "regiões" dos Estados a que pertencem e "deixando de lado", alguns países não incluídos nas regiões, por exemplo: a Pérsia, o Afeganistão e a Arábia, na Ásia; Marrocos e a Abissínia, na África, etc.
O seguinte quadro reflete, de forma resumida, os dados econômicos sobre as regiões citadas fornecidos pelo referido autor.
Meios de Comunicação | Comércio | Indústria | ||||||
Principais regiões económicas do mundo | Superficie (em milhões de Km2) |
População (em milhões de habitantes) |
Vias férreas (em milhares de Km) |
Marinha Mercante (em milhões de toneladas) |
Importações e Exportações (em milhões de marcos) |
Hulha (em milhões de toneladas) |
Gusa (em milhões de toneladas) |
Fusos na indústria algodoeira (em milhões) |
1) da Europa Central | 27,6 | 388 | 204 | 8 | 41 | 251 | 15 | 26 |
2) Britânica | (23,6)* 28,8 | (146)* 398 | 140 | 11 | 25 | 249 | 9 | 51 |
3) da Rússia | (28,6)* 22 | (355)* 131 | 63 | 1 | 3 | 16 | 3 | 7 |
4) Orient. Asiática | 12 | 380 | 8 | 1 | 2 | 8 | 0,02 | 2 |
5) Americana | 30 | 148 | 379 | 6 | 14 | 245 | 14 | 19 |
* Os números entre parênteses indicam a extensão e população das colônias.
Vemos três regiões com um capitalismo altamente desenvolvido (alto desenvolvimento dos meios de comunicação, do comércio e da indústria): a da Europa Central, a britânica e a americana. Entre elas, três Estados que exercem o domínio do mundo: a Alemanha, a Inglaterra e os Estados Unidos. A rivalidade imperialista e a luta entre esses Estados encontram-se extremamente exacerbadas em virtude de a Alemanha dispor de uma região insignificante e de poucas colônias; a criação de uma "Europa Central" é ainda coisa do futuro e nasce por meio de uma luta desesperada. De momento, o traço característico de toda a Europa é o fracionamento político. Nas regiões britânica e americana, pelo contrário, é muito elevada a concentração política, mas há uma desproporção enorme entre a imensidão das colônias da primeira e a insignificância das que a segunda possui. E nas colônias o capitalismo apenas começa a desenvolver-se. A luta pela América do Sul vai-se exacerbando cada dia mais.
Há duas regiões nas quais o capitalismo está fracamente desenvolvido: a da Rússia e a asiática oriental. Na primeira, a densidade da população é extremamente fraca; na segunda, é elevadíssima; na primeira, a concentração política é grande; na segunda não existe. A partilha da China mal começou, e a luta entre o Japão, os Estados Unidos, etc., para se apoderarem dela é cada vez mais intensa.
Comparai esta realidade - a variedade gigantesca de condições econômicas e políticas, a desproporção extrema na rapidez de desenvolvimento dos diferentes países, etc., a luta furiosa entre os Estados imperialistas - com a ingênua fábula de Kautsky sobre o ultraimperialismo "pacífico". Não será isto a tentativa reacionária de um filisteu assustado que quer esconder-se da terrível realidade? Será que os cartéis internacionais, nos quais Kautsky vê os germes do "ultraimperialismo" (do mesmo modo que a produção de comprimidos nos laboratórios "poderia" qualificar-se de embrião da ultra-agricultura), não nos mostram o exemplo da divisão e de uma nova partilha do mundo, a transição da partilha pacífica para a não pacífica, e inversamente). Será que o capital financeiro americano e o de outros países, que dividiram pacificamente entre eles todo o mundo, com a participação da Alemanha, por exemplo, no sindicato internacional dos carris de ferro ou no trust internacional da marinha mercante, não redividem hoje em dia o mundo com base na nova correlação de forças, correlação que se modifica de uma maneira que nada tem de pacífica?
O capital financeiro e os trusts não atenuam, antes acentuam, a diferença entre o ritmo de crescimento dos diferentes elementos da economia mundial. E se a correlação de forças mudou, como podem resolver-se as contradições, sob o capitalismo, a não ser pela força? A estatística das vias férreas(6*) proporciona dados extraordinariamente exatos sobre a diferença de ritmo quanto ao crescimento do capitalismo e do capital financeiro em toda a economia mundial. Durante as últimas décadas de desenvolvimento imperialista, a extensão das vias férreas alterou-se do modo seguinte:
Extensão das Vias Férreas
(em milhares de quilômetros)
1890 | 1913 | Aumento | |
Europa | 224 | 346 | 122 |
Estados Unidos da América | 268 | 411 | 143 |
Conjunto das Colónias | 82 | 210 | 128 |
Estados independentes ou | 125 | 347 | |
semi-independentes da Àsia e América | 43 | 137 | 94 |
Total | 617 | 1104 |
As vias férreas desenvolveram-se, pois, com a maior rapidez nas colônias e nos Estados independentes (e semi-independentes) da Ásia e da América. É sabido que o capital financeiro dos quatro ou cinco Estados capitalistas mais importantes ordena e manda ali de modo absoluto. Duzentos mil quilômetros de novas vias férreas nas colônias e noutros países da Ásia e América significam mais de 40 000 milhões de marcos de novos investimentos de capital em condições particularmente vantajosas, com garantias especiais de rendimento, com encomendas lucrativas para as fundições de aço etc. etc.
Onde o capitalismo cresce mais rapidamente é nas colônias e nos países do ultramar. Entre eles aparecem novas potências imperialistas (o Japão). A luta entre os imperialistas mundiais agudiza-se. Aumenta o tributo que o capital financeiro recebe das empresas coloniais e do ultramar, particularmente lucrativas. Na partilha deste saque, uma parte excepcionalmente grande vai parar a países que nem sempre ocupam um dos primeiros lugares do ponto de vista do ritmo de desenvolvimento das forças produtivas. Nas potências mais importantes, consideradas juntamente com as suas colônias, a extensão das vias férreas era a seguinte:
Extensão das Vias Férreas
(Em milhares de quilômetros)
1890 | 1913 | Aumento | |
Estado Unidos | 268 | 413 | 145 |
Império Britânico | 107 | 208 | 101 |
Rússia | 32 | 78 | 46 |
Alemanha | 43 | 68 | 25 |
França | 41 | 63 | 22 |
Total para as 5 potências | 491 | 830 | 339 |
Portanto, cerca de 80% de todas as vias férreas encontram-se concentradas nas cinco potências mais importantes. Mas a concentração da propriedade das referidas vias, a concentração do capital financeiro, é ainda incomparavelmente maior, porque, por exemplo, a imensa maioria das ações e obrigações dos caminhos-de-ferro americanos, russos e de outros países pertence aos milionários ingleses e franceses.
Graças às suas colônias, a Inglaterra aumentou a sua rede ferroviária em 100 000 quilômetros, quatro vezes mais do que a Alemanha. Contudo, toda a gente sabe que o desenvolvimento das forças produtivas da Alemanha neste mesmo período, e sobretudo o desenvolvimento da produção hulheira e siderúrgica, foi incomparavelmente mais rápido do que na Inglaterra, sem falar já na França e na Rússia. Em 1892, a Alemanha produziu 4,9 milhões de toneladas de gusa, contra 6,8 da Inglaterra, enquanto em 1912 produzia já 17,6 contra 9,0, isto é, uma superioridade gigantesca sobre a Inglaterra!(7*) Perante isto, é de perguntar: no terreno do capitalismo, que outro meio poderia haver, a não ser a guerra, para eliminar a desproporção existente entre o desenvolvimento das forças produtivas e a acumulação de capital, por um lado, e, por outro lado, a partilha das colônias e das ,esferas de influência- do capital financeiro?
(<-Capitulo VI) (Capitulo VIII->)
Notas:
(1*) Die Neue Zeit, 1914, 2 (B.32), S.909, 11 de Setembro de 1914; cf.1915, 2, S.107 e segs. (retornar ao texto)
(2*) Hobson, Imperialism,, L., 1902, p.324. (retornar ao texto)
(3*) Die Neue Zeit, 1914,2 (B.32), S.921, 11 de setembro de 1914; cf. 1915, 2, S. 107 e segs. (retornar ao texto)
(4*) Ibidem, 1915, 1, Sim, 144, 30 de abril de 1915. (retornar ao texto)
(5*) R. Calwer, Einfübrung in die Weltwirtschaft, Berlin, 1906. (retornar ao texto)
(6*) Statistisches Jahrbuch für das Destsche Reich, 1915; Archiv für Eisenbahnwesen, 1892. No que se refere a 1890, foi preciso determinar aproximadamente algumas pequenas particularidades sobre a distribuição das vias férreas entre as colônias dos diferentes países. (retornar ao texto)
(7*) Compara-se também com Edgar Crammondd, "The Economic Relations of the British and German Empires", em Journal of the Royal Statistical Society, 1914, July, p. 777 e segs. (retornar ao texto)
Inclusão | 05/12/2004 |