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Durante o agitado período em que foram elaborados tantos sistemas econômicos, políticos e sociais, e em que a Europa inteira foi abalada pela explosão da Revolução Francesa, surgiu, na Grã-Bretanha, o primeiro movimento revolucionário operário. O inspirador desse movimento foi o sapateiro escocês Tomaz Hardy (1752-1832), que se estabeleceu em Londres no ano de 1772 e se filiou às ideias democráticas, então em voga. Em 1791, fundou uma associação operária, a Sociedade de Correspondência de Londres, que por ele foi posta em contacto com os jacobinos franceses em Sheffield. Coventry, Leeds, Nottingham, e Edimburgo formaram-se organizações análogas. Correspondiam-se umas com as outras. Por isso, chamavam-se “sociedades de correspondência”. Como naquele tempo as leis não permitiam que as associações políticas se agrupassem em federações nacionais, elas se punham em contacto por correspondência. Desse modo, estabeleciam entre si a união interdita por lei. As finalidades dessas associações eram: 1.º a conquista da democracia; 2.º uma legislação destinada à proteção dos operários. Numa declaração, publicada em abril de 1792, da Sociedade de Correspondência de Londres, eis o que dizem:
“A liberdade é um direito que o homem adquire ao nascer. É, pois, nosso dever conservá-la inteiramente para o bem de nossos concidadãos e de nossos descendentes. Todo cidadão tem o direito de participar do governo. Não possuindo tal direito, ninguém se pode chamar livre. A maior parte da população da Grã-Bretanha não é representada no Parlamento e, consequentemente, é excluída de qualquer participação no governo do país. Eis os resultados das restrições do sufrágio, assim como da corrupção eleitoral: impostos esmagadores, leis injustas, restrições da liberdade e delapidação da Fazenda pública. O único remédio para estes males é o sufrágio universal. A Sociedade de Correspondência de Londres resolveu trabalhar energicamente para atingir esse alvo, mas condena todo ato de violência e toda anarquia. As armas de que pretende servir-se são unicamente os argumentos da razão, a convicção e a tenacidade”.
Em fins de Setembro de 1792, após a proclamação da República em França, a Sociedade de Correspondência de Londres enviou a Convenção a seguinte mensagem:
“Franceses!
“Vós já haveis conquistado a liberdade. E nós, igualmente, nos preparamos em vista do crescente triunfo da liberdade na Grã-Bretanha... Enquanto vós gozais da invejável glória de ser os campeões da liberdade, nós acreditamos na felicidade que espera a Humanidade. Se alcançardes definitivamente a vitória, para o que fazemos os mais ardentes votos, a trindade, não dos reis, mas dos povos da América, de França e da Grã-Bretanha. levará aos povos da Europa a liberdade e ao mundo inteiro a paz.
“Companheiros! Vós lutais polo direito humano!”
Muitos políticos partidários das ideias democráticas aderiram à Sociedade de Correspondência de Londres. Spence trabalhou intensamente em prol do seu desenvolvimento. Quando apareceu a Justiça Social de Godwin, os membros das associações operárias frequentemente a liam. A tal ponto aumentaram os efetivos da Sociedade, que o governo inglês, em guerra com a França desde 1793, prendeu os seus dirigentes e os processou por alta traição. Quase todos foram absolvidos pelo juri. Mas a organização continuou sendo continuamente perseguida pelo governo até que, em 1799, deixou de funcionar completamente. Quase todos os líderes operários que mais se destacaram no período compreendido entre 1810 e 1820 eram antigos membros da Sociedade de Correspondência de Londres.
Ao proletariado moderno, que surgiu com o desenvolvimento da grande indústria, incorporaram-se os mais diferentes elementos: operários das manufaturas, artesãos, trabalhadores a domicílio, aldeãos expropriados, etc. A revolução industrial influiu de maneira diversa sobre esses diferentes elementos. Enquanto uns lembravam melancolicamente a época das corporações, outros olhavam resolutamente para a frente e se pronunciavam a favor da democracia, das reformas sociais e da organização coletiva da terra. Outros, ainda, nutriam ódio profundo pelos contratistas e, em geral, contra todo o aparato industrial. É necessário lembrar que o proletariado britânico foi o primeiro a ser atirado sob as rodas do capitalismo; os maiores cérebros do século XIX procuraram explicar a transformação que se processava. Nas primeiras décadas da revolução industrial a sociedade transformou-se num verdadeiro caos, no seio do qual surgiam seres estranhos e monstruosos: as novas máquinas. Familiarizado com as maravilhas da ciência e com as máquinas que o cercam, o homem dos nossos dias só muito dificilmente poderá compreender o estado de espírito que o aparecimento dos maquinismos causou nas suas primeiras vítimas. Em meados do século XIX, havia ainda, na Inglaterra, homens de cultura, que consideravam as máquinas produtos monstruosos do engenho humano, que prenunciavam a decadência da Inglaterra. O órgão oficial do cartismo dessa época dizia: “É muito difícil encontrar atualmente um homem com coragem de estudar o problema do maquinismo. Dir-se-ia até que todos sentam por ele uma espécie de terror... Todos percebem que a máquina está realizando a maior das revoluções e transformando radicalmente as relações entre as classes no seio da sociedade. Mas ninguém quer intervir”.
O que os artesãos e operários de manufaturas temiam desde o século XVI surpreendeu-os bruscamente em meados do século XVIII: uma invasão de monstros de ferro que transformaram todas as tradições, paralisaram as mais hábeis mãos e espalharam em torno de si a riqueza e a indigência. O proletariado, que cada vez mais miserável se tornava, contemplava com espanto e estupor estes infatigáveis seres de múltiplos braços, que pareciam possuir forças inesgotáveis... E logo correu de boca em boca a palavra de ordem; “Destruamos esses monstros, antes que se tornem mais numerosos! Se eles se multiplicarem farão de nós seus escravos!”
Em 1769, foi promulgada na Inglaterra a primeira lei contra a destruição das máquinas e dos edifícios das fábricas. A lei declarava tais atos crimes passíveis até da punição máxima. Entretanto, apesar dos tribunais castigarem draconianamente os destruidores das máquinas, o seu número cresceu consideravelmente no Norte e no Centro do país. Em Nottingham, um tal Ned Ludham ou Ned Ludd destruiu uma oficina têxtil e, logo a seguir, apareceram imitadores no Lancashire e em toda a Inglaterra.
Surgiram assim os “ludistas”, ou destruidores de máquinas. De 1811 a 1812, o ludismo tornou-se um movimento de massas, visando ao mesmo tempo fins políticos e econômicos. A burguesia aterrorizou-se tanto com o movimento, que o governo elaborou um projeto de lei relativo a destruição de máquinas, punindo os autores dos atentados com a pena de morte. Quando esse projeto, em Fevereiro de 1812, foi lido pela segunda vez na Câmara dos Lordes, lorde Byron pronunciou inflamado discurso combatendo-o e defendendo os operários.
O projeto em questão tornou-se lei em Março de 1812. Mas essa lei, como sucedera com a de 1769, apesar de ter sido aplicada com terrível rigor, não conseguiu deter o movimento dos ludistas. Nos ataques às fábricas e nos atentados contra as máquinas, registravam-se frequentemente mortes. Mas era muito difícil descobrir os culpados. A captura de alguns cabeças do movimento só foi conseguida graças à traição, e somente depois que o governo estabeleceu o prêmio de 2.000 libras esterlinas pela prisão de cada um dos chefes “ludistas”. O tribunal de York foi o único que pronunciou sentenças de morte contra os destruidores de máquinas. No dia 13 de Janeiro de 1813, subiram ao cadafalso três operários, entre os quais se encontrava o chefe ludista Jorge Mellor. Todos eles mantiveram até o fim atitude digna e valorosa. Mellor, do cadafalso, pronunciou rápido discurso ao povo que assistia à execução. Três dias depois, foram executados mais quinze operários, sete pela manhã e oito a tarde. A princípio, estas execuções surtiram o efeito desejado. O movimento declinou um pouco; mas logo depois ressurgiu. Em 1816, estava novamente em pleno apogeu. Era, no fundo, um movimento revolucionário elementar. Byron, que também se celebrizou como poeta, compôs um poema em que compara os ludistas aos homens da guerra da Independência americana.
As guerras napoleônicas terminaram em 1815. A paz voltou ao país, depois de dois séculos de guerras. Mas, ao clarão dos fogos de artifício que saudaram o seu regresso, aparecia um triste espetáculo de miséria. Todas as esperanças de melhor situação haviam desaparecido. A redução dos salários, o aumento do custo da vida, o desemprego, o peso esmagador dos impostos, a ausência total da liberdade política haviam, no mais alto grau, exacerbado o descontentamento geral. A Inglaterra encontrava-se, desde 1816, num estado de rebelião, que provocou tentativas insurrecionais ao mesmo tempo sangrentas e inúteis. O ludismo reanimou-se. Em Nottingham, os tecelões destruíram 30 máquinas. Nas regiões orientais, os operários agrícolas incendiaram granjas de feno, destruíram moinhos e realizaram manifestações empunhando estandartes com a inscrição: “Pão ou sangue”. Em Birmingham, em Preston, em Newcastle, os desempregados, em massa, fizeram várias manifestações. Em Dundee e Glasgow, houve sangrentos conflitos entre os manifestantes e a polícia. No centro do país, verificou-se uma tentativa de insurreição preparada clandestinamente, na qual 23 pessoas perderam ou a vida ou a liberdade. Em 1819, realizou-se em Manchester uma manifestação monstro a favor do sufrágio universal e da legislação operária, durante a qual a tropa disparou contra a multidão, matando e ferindo várias centenas de pessoas. Em 1820, estalou em Londres outra tentativa que terminou pela execução de 5 pessoas. Data desse período de movimentos revolucionários elementares a celebre Marselhesa dos operários, de Shelly.
“Homens da Inglaterra, por que trabalhar para os lordes que vos espezinham? Por que tecer com cuidado e sacrifício os ricos trajes que os vossos tiranos vestem? Por que nutrir, vestir, sustentar, do berço à tumba, esses ingratos zangões que querem esgotar o vosso suor, – sim, e beber o vosso sangue? Por que, abelhas da Inglaterra, forjar tantas armas, cadeias e chicotes para que esses zangões sem aguilhões possam pilhar o produto do vosso trabalho?
“Tendes descanso, comodidade, calma, abrigo, alimento? Tendes o doce bálsamo do amor? Que é, pois, que comprais tão caro com os vossos sofrimentos e com as vossas penas?
“O grão, que semeais, é por outros colhido; a riqueza, que produzis, é por outros amealhada: os trajes que teceis, são por outros vestidos; as armas, que forjais, são por outros manejadas.
“Semeai o grão, mas que nenhum tirano o colha! Descobri tesouros, mas que nenhum impostor os amealhe! Tecei túnicas, mas que nenhum preguiçoso as vista! Forjai armas, mas usai-as para a vossa defesa!”
É desse período que data o começo do socialismo moderno na Inglaterra.
Com Roberto Owen começou, na Inglaterra, a História do socialismo moderno. Owen, aliás, foi uma das mais notáveis inteligências da História do socialismo em geral. Foi o primeiro crítico social que, antes de todos os economistas e políticos burgueses, compreendeu a significação da revolução industrial e procurou os meios de pôr as conquistas desta revolução a serviço do progresso social. Participando pessoalmente da produção, compreendeu melhor que Fourier e Saint-Simon o verdadeiro mecanismo do regime capitalista.
Fourier e Saint-Simon o ultrapassaram apenas porque conheciam melhor a História e porque possuíam mais ampla e arrazoada visão das coisas.
Roberto Owen nasceu em 1771, em Newton, país de Gales. Descendia de uma família pequeno-burguesa. Seu pai exerceu o ofício de guarda, depois o de ferreiro e, por último, o de encarregado do correio. Até a idade de dez anos, frequentou a escola primária onde se distinguiu pela sua viva inteligência. Trabalhou, depois, como empregado no comércio em Stainfort, Londres, e em Manchester. Desde cedo, demonstrou notáveis aptidões para organizar e dirigir os homens. Sua saúde, o notável equilíbrio de suas faculdades físicas e intelectuais, sua maneira ordenada de agir, sua persistência no trabalho, seu caráter inquebrantável, aliados a uma vontade de ferro, a uma inabalável confiança em si mesmo e a uma rapidez de decisão extraordinária – fizeram de Owen um homem predestinado a dirigir as multidões. Owen era uma dessas naturezas raras, cujo trabalho intelectual se faz sem choques nem perturbações, e que, por isso mesmo, podem tomar rapidamente decisões claras e acertadas. Dessa categoria de homens saem os grandes chefes, notáveis estadistas e os grandes revolucionários. Em 1790, Owen tornou-se diretor de uma fábrica têxtil de Manchester, na qual trabalhavam cerca de 500 operários. Apesar de sua pouca idade e de seu aspecto modesto, logo exerceu uma grande influência sobre os operários sujeitos às suas ordens. Embora ganhasse 300 libras por ano, e, além disso, tivesse a promessa de ser admitido como sócio da empresa, Owen nela trabalhou somente até 1795, data em que resolveu tornar-se de novo independente. As ondas da revolução industrial elevavam à riqueza os homens de negócio, que sabiam aproveitar-se da ocasião. Ao mesmo tempo, precipitavam na miséria os que não conseguiam adaptar-se às novas condições. Owen resolveu trabalhar por conta própria e dedicou-se a fabricação de tecidos finos, a mais lucrativa indústria da época. Sua empresa prosperou tanto que ele, em 1797, com alguns sócios, pode comprar em New-Lanark, na Escócia, uma fábrica têxtil no valor de 60.000 libras. Aí iniciou a sua atividade reformadora. Esta e o seu sucesso industrial o tornaram um dos mais célebres homens da época. Em 1800, assumiu toda a direção do negócio e então procurou transformar radicalmente a população de New-Lanark, realizando as seguintes reformas:
1.º Abriu escolas, nas quais o ensino era baseado em lições de coisas. Suprimiu os castigos e os prêmios. Fez dar lições de ginástica aos meninos, e de artes domésticas às meninas.
2.º Os menores de 10 anos não eram mais admitidos na fábrica. Foi adotada a jornada normal de 10 horas e meia de trabalho.
3.º A fábrica foi completamente remodelada, tornando-se mais bonita e mais higiênica. Owen, além disso procurou sanear toda a aldeia e criar na população hábitos de limpeza, de ordem e de pontualidade. Graças à instituição de um armazém cooperativo, onde vendiam a baixo preço produtos de boa qualidade; «Graças ainda ao saneamento físico e intelectual produzido pela melhoria das casas e dos locais de trabalho, as tabernas foram perdendo pouco a pouco seus atrativos para os operários. O consumo de bebidas alcoólicas diminuiu. A embriaguez, com todas as suas consequências, desapareceu.
4.º Foram fundadas caixas de previdência para a assistência médica e a velhice. Em 1806, ano de crise e desemprego, Owen pagou salários integrais aos operários sem trabalho até o fim da crise.
Todo o programa reformador de Owen repousava na seguinte ideia: os vícios não poderão desaparecer enquanto suas causas não forem suprimidas. É necessário criar condições de vida capazes de desenvolver instintos de sociabilidade, porque o caráter do homem depende inteiramente do meio em que ele vive. Trata-se, portanto, de transformar tal meio, de maneira a que o homem possa ser bom, possa sentir e trabalhar socialmente.
A partir de 1812, Owen manifestou-se a favor da reforma do ensino e da legislação operária, falando, várias vezes, em reuniões políticas, em defesa de suas ideias. Em 1817, tornou-se socialista. Em vez de assistência aos pobres, ele pedia para os desempregados a criação de cooperativas agrícolas e industriais. Aconselhava aos operários que se organizassem em cooperativas de produção e utilizassem, em seu próprio interesse, os inventos técnicos que, sob o domínio do capitalismo, constituem uma maldição para eles, transformando-os numa benção. A causa principal da agravação da situação operária e do aumento do desemprego estava, para Owen, no desenvolvimento inaudito do maquinismo, que proporcionou riquezas crescentes aos capitalistas e só trouxe para os operários o desemprego e a redução dos salários, obrigando suas mulheres e filhas, a também procurarem trabalho nas fábricas. De 1818 a 1821, em artigos e folhetos que publicou e em cartas que dirigiu ao governo, Owen defendeu as seguintes ideias: antes da revolução industrial ter transformado radicalmente a economia inglesa, isto é, até o ano de 1790, aproximadamente, apenas os adultos executavam trabalhos produtivos. Só excepcionalmente mulheres e meninos deles participavam. Em 1792, um quarto da população já estava empregada na produção. Nesse momento, a população da Grã-Bretanha e da Irlanda elevava-se a uns 15 milhões de habitantes, e a sua população produtora era de cerca de 3.7750.000 pessoas. A força produtiva científica (mecânica e química) representava o triplo da força do trabalho manual, isto é, 11.250.000, ou, seja, um total de 15 milhões. Vê-se, pois, que, nesse momento, o conjunto das forças produtivas da Inglaterra correspondia exatamente ao valor numérico da população. A seguir, assistiu-se a uma exploração cada vez mais intensa dos inventos mecânicos que, a partir de 1760, aproximadamente, foram progressivamente introduzidos em todos os ramos da produção. A transformação que esses inventos provocaram foi imensa. As fábricas encheram-se de mulheres e crianças. A jornada de trabalho aumentou. As forças produtivas, consequentemente, multiplicaram-se de uma forma inaudita.
Em 1817, a população das Ilhas Britânicas já era de 18 milhões de habitantes; um terço da população, isto é, seis milhões, participava do trabalho produtivo. Mas a quantidade de forças produtivas mecânicas havia aumentado em proporções muito maiores. Atualmente, (1817) ela é igual, pelo menos, a 200 milhões. Esses 200 milhões de trabalhadores mecânicos produzem, ininterruptamente, em ritmo acelerado e com uma despesa mínima, riquezas incalculáveis. Para cada cidadão britânico, há atualmente mais de 10 forças de trabalho mecânico, criando dia e noite produtos de todas as espécies. Isso mostra que cada operário inglês tem que lutar atualmente contra a concorrência de mais de 30 trabalhadores mecânicos, os quais, evidentemente, de nada necessitam. As transformações que se processaram nas Ilhas Britânicas de 1792 a 1812 podem ser assim resumidas:
Assim, pois, para cada unidade da população britânica, há, em 1817, mais de 12 forças produtivas vivas ou mecânicas. A capacidade produtiva da Grã-Bretanha, de 1792 para cá, tornou-se, portanto, 12 vezes maior. O país pode ou gastar esse enorme excedente de riquezas em guerra e em empreendimentos inúteis do mesmo gênero, ou aplicá-lo no melhoramento da situação do povo trabalhador. Foi graças a essas riquezas que o governo inglês pode, durante uma geração toda, sustentar dispendiosas guerras contra Napoleão, e, afinal, derrotá-lo. Mas, comparada com as possibilidades do país, possui ainda capitais inutilizados — ou simplesmente mal utilizados — em quantidade suficiente para desencadear pouco a pouco forças produtivas que ultrapassarão, em proporções fantásticas, a quantidade de forças de trabalho manuais.
Com uma população de 18 milhões de habitantes, e com a ajuda das forças de trabalho que são “dirigidas” apenas pelo cego interesse pessoal, a Grã-Bretanha já está em condições de não só satisfazer, como mesmo de superar, as necessidades do seu mercado interno, enchendo, além disso, o mercado mundial de produtos manufaturados de toda espécie. Eis porque o governo inglês procura conseguir novos mercados por toda parte, até nas mais distantes regiões do globo. Se fosse possível criar um novo mundo, a indústria inglesa poderia facilmente satisfazer as necessidades desse novo mercado.
Entretanto, a miséria dia a dia aumenta e o valor do trabalho manual (o salário) diminui. Os pobres odeiam cada vez mais os ricos e já recorrem a atos de violência. Os amigos da Humanidade estão alarmados com a miséria que por toda parte aumenta sem que seja possível remediá-la.
De fato, com os meios até agora utilizados, não foi nem será possível combater a miséria. Pelo contrário, esses meios só a têm feito aumentar. Isso acontece porque, no regime atual, são justamente os progressos científicos, a multiplicação das forças produtivas mecânicas e a acumulação de riquezas, que engendram a miséria e continuarão sempre a engendrá-la. Qual é, então, a causa da miséria? É a multiplicação rápida de novas forças produtivas, que a sociedade não conseguiu utilmente aplicar. A sociedade esqueceu-se de fundar instituições que conferissem a todos os seus membros o direito e a possibilidade de auferir todas as vantagens e benefícios do progresso da ciência e da técnica.
O grande problema do nosso tempo não é, portanto o da organização da produção e sim o de sua distribuição. A verdadeira causa do mal está no fato de não se saber inteligentemente utilizar as enormes riquezas criadas pela sociedade em consequência do progresso verificado no domínio científico-técnico. Disso resulta a miséria, a ignorância, a ociosidade, os crimes, os castigos draconianos e as sangrentas guerras, simples sintomas da grande moléstia que aflige a sociedade. Nenhum economista ou estadista, nenhum sábio ou legislador foi até agora capaz de compreender a situação e de remediá-la.
Owen tornou-se, pois, socialista. Mas, como as massas operárias ainda se encontravam, naquela época, em nível político muito baixo, Owen não acreditava que os trabalhadores fossem capazes de lutar e de se libertarem por si sós. Ele, aliás, só tinha fé na educação e na evolução pacífica. Caiu, por isso, na utopia. Julgou que a situação das classes trabalhadoras poderia ser modificada com a criação de colônias comunistas. Em 1820, Owen abandonou definitivamente os negócios. Fundou, em seguida, colônias comunistas na Inglaterra e na América; mas nenhuma dessas colônias foi avante. Owen, desde então, afastou-se do movimento operário que, a partir de 1824 — data em que foi revogada a lei que proibia as coalizões operárias – começava a adquirir uma feição cada vez mais revolucionária. Das ideias de Owen, o movimento operário não aproveitou senão a parte crítica e o plano cooperativista, que mais tarde iria ser aplicado nas cooperativas de consumo.
Abram Combe (1785-1827) foi discípulo de Owen Em 1820, visitando New-Lanark em companhia de milhares de curiosos, Combe aderiu às ideias de Owen. Três anos depois, publicou um pequeno folheto intitulado: Esboços metafóricos do antigo e do novo sistema, e em 1825 fundou a colônia comunista de Glasgow, que depois de sua morte desapareceu.
John Gray (1798-1850), um dos acionistas da colônia comunista de Orbiston, era partidário da reforma dos meios de troca e de circulação. Em 1825, publicou uma brochura intitulada: Conferência acerca da felicidade humana, na qual adotava quase integralmente as ideias de Owen e se utilizava de estatísticas para demonstrar que a classe produtora só recebe a quinta parte do produto de seu trabalho, enquanto a classe parasitária se apodera dos quatro quintos restantes. Gray conclui afirmando que a concorrência não só já deixou de ser útil, como se tornou até prejudicial.
Em 1831, surgiu o seu segundo livro, O Sistema Social, que expõe um projeto de reforma social baseado na organização das trocas. As ideias fundamentais desse livro podem ser assim resumidas:
É necessário suprimir completamente a moeda metálica. Sendo um meio de troca, o dinheiro deve poder ser fabricado e obtido tão facilmente como os bens que pelo dinheiro se trocam. Sendo ao mesmo tempo medida dos valores, ele deve ser tão constante como uma vara ou uma libra. O ouro não é nem fácil de obter nem de valor constante. Por isso, não pode servir como meio de troca, nem como medida dos valores. O que se dá com o ouro, dá-se também com as notas de banco, porque o papel-moeda nada mais é que uma representação de valores. Baseia-se em garantias, cujo valor ultrapassa o do dinheiro que as representa. Eis porque constantemente sentimos falta de meios de troca; esses meios nunca atingem o valor total dos bens a trocar.
Mas a finalidade do dinheiro é permitir que os homens possam em qualquer momento trocar um dado objeto por outro do mesmo valor. Para atingir essa sua finalidade, o dinheiro não deve possuir por si mesmo nenhum valor de troca. Deve ser apenas um título indicando que o seu possuidor adicionou um determinado valor à fortuna nacional e que ele tem, por isso, direito de receber em qualquer momento bens desse mesmo valor. A troca não deve ser feita anarquicamente. É necessário organizá-la racionalmente. Os princípios cooperativistas que Gray expõe na sua primeira obra referem-se unicamente à troca. É nisso que consiste a diferença fundamental entre ele e Owen. Segundo Gray, a produção dos bens deve conservar seu caráter privado. Mas a troca deve ser feita por intermédio de instituições centrais, cooperativas. Seria criado, para esse fim, um banco central, o único autorizado a emitir papel-moeda. Além disso, construir-se-iam armazéns dirigidos por agentes que estariam constantemente em contacto com o banco nacional, dele recebendo o papel-moeda e a ele enviando relatórios sobre as quantidades de produtos postos em circulação. Os vários produtores entregariam as mercadorias fabricadas em seus estabelecimentos aos armazéns nacionais. Empregados especiais calculariam os preços de custo (matérias primas, desvalorização dos maquinismos, salários) e adicionariam a esses preços um pequeno excedente, fixado pela Câmara de Comércio Nacional. O preço de custo somado a esse excedente constituiria o preço de venda das mercadorias a retalho. Os produtores receberiam, em seguida, em papel-moeda, o valor correspondente ao montante das mercadorias, por eles entregues, para que pudessem adquirir nos outros armazéns os produtos necessários às suas atividades. Desta maneira, a quantidade de papel-moeda seria sempre proporcional à quantidade de mercadorias existentes em circulação. Os produtores estariam, assim, em condições de trocar suas mercadorias por outras do mesmo valor, além de que poderiam ter uma ideia da situação da oferta e da procura existentes. A contabilidade do banco nacional estabeleceria, a qualquer momento, a quantidade de bens em circulação. Seria assim possível evitar a superprodução e as crises. Aqui o essencial é a produção. Quanto mais se produzir, maiores serão as possibilidades de satisfazer às necessidades. A produção determinará a procura, e não reciprocamente, como se dá nos dias presentes.
Ao contrário de Gray, que passa do socialismo de Owen ao individualismo econômico, William Thompson (1785-1833) começou como partidário da doutrina utilitarista e terminou como adepto do comunismo integral. Seu primeiro livro intitulava-se: Pesquisas sobre os princípios da divisão das riquezas mais adequados à felicidade humana. Nesse livro, encontram-se ainda vestígios de suas hesitações. Mas na sua pequena obra: O trabalho recompensado, publicada em 1827, Thompson declara-se owenista convicto.
Como discípulo de Bentham, Thompson julgava que o objetivo da sociedade é a conquista da felicidade, e que para isso a produção de riquezas é condição indispensável. Sem propriedade privada — dizia Thompson — não é possível produzir riquezas. E sem produção de riquezas não se pode satisfazer as necessidades dos homens. Sem a garantia de posse dos produtos do trabalho é impossível produzir. Mas a revolução industrial demonstrou que a produção por si só não era o bastante para tornar os homens felizes. Ela provou que o essencial era a divisão dos bens, coisa que atualmente não existe. De fato, quem produz a riqueza é o operário, mas quem dela se apodera é o capitalista. Disso nasce uma constante desigualdade e uma insegurança permanente, que impossibilitam a felicidade. O atual estado de coisas é mau e injusto. A produção de riquezas não pode aumentar, quando não existem garantias de posse e de usufruto dos bens. Se, consequentemente, a segurança e a igualdade são os únicos meios capazes de garantir a produção ininterrupta de riquezas e a maior soma de felicidade, só há uma divisão possível: a que tiver como base a justiça. Que cada um possa livremente dispor do produto de seu trabalho. É isto também o que os operários desejam. “Os trabalhadores que despendem sua energia e suas forças físicas e intelectuais na produção desses objetos, para a satisfação das suas próprias necessidades, reclamam a posse dos produtos de seu trabalho”. Mas deve o operário apoderar-se de tudo? O capitalista, que pôs a sua disposição os meios de produção sem os quais o operário não teria podido trabalhar, não tem direito a nada? Thompson responde da seguinte maneira: Certamente, o operário tem de pagar, porque se utiliza de meios produção que, desgraçadamente, não são seus. Resta, agora, saber quanto deve pagar. Segundo o operário, ele não deve pagar senão a importância necessária para refazer a parte do capital que, com o tempo, se desvaloriza, e mais uma importância por meio da qual o capitalista possa ter o mesmo nível de vida que um operário produtivo. Mas, na opinião do capitalista, todo o excedente de valor criado pela utilização do capital pertence a ele, capitalista. O esforço, por meio do qual um individuo consegue acumular capitais para, em seguida, colocá-los a disposição do operário, merece uma recompensa. E essa recompensa deve ser justamente o excedente do valor criado pela utilização do capital. Há, evidentemente, entre o ponto de vista do operário e o ponto de vista capitalista uma diferença enorme. O primeiro reclama uma igualdade quase completa. O segundo, pelo contrário, deseja manter a desigualdade atual.
Para terminar, mencionemos rapidamente o owenista cristão John Minter Morgan (1782-1854), que publicou em 1826 a Revolta das Abelhas e em 1831 o livro Hampden in the Nineteenh Century. Essas duas obras alcançaram um grande sucesso nos meios operários de Londres, em virtude de seu estilo poético.
Mas a melhor exposição do owenismo foi feita por J. F. Bray, no livro Queixas dos Trabalhadores (1839).
Falamos dos críticos socialistas. Convém, agora, dizer algumas palavras sobre os críticos individualistas. Estes críticos consideravam o capitalismo e a revolução industrial um período anormal, doentio, da vida social. Por isso, propunham que se pusesse em prática uma reforma que tivesse por finalidade a organização de uma sociedade de trabalhadores agrícolas e industriais independentes, na qual fosse impossível a apropriação capitalista dos produtos do trabalho. Os individualistas atacavam a renda territorial, o lucro capitalista, os monopólios, os direitos alfandegários e os impostos elevados e, de modo geral, eram contrários a qualquer intervenção do Estado na vida econômica. Foram, assim, ou liberais partidários do livre-câmbio, ou anarquistas de ideias opostas aos princípios dos socialistas – com eles nada tendo de comum a não ser a crítica da ordem capitalista vigente. Apoiam-se em Locke, Smith e Ricardo, e, parcialmente, em Godwin. Todos os individualistas afirmam que o homem e a natureza estão sujeitos a certas leis interiores, que os levariam infalivelmente à felicidade, se os dispositivos artificiais do Estado não viessem desgraçadamente entravar o livre jogo das leis naturais.
Os principais representantes dessa tendência são Piercy Ravenstone e Thomas Hodgskin. De 1820 a 1830, iremos encontrar ideias semelhantes externadas por escritores que, anonimamente, colaboravam em diferentes revistas progressistas. A obra principal de Ravenstone foi publicada em 1821. Intitulava-se Algumas dúvidas quanto à exatidão de algumas ideias correntes em economia política. Três anos mais tarde, Ravenstone publicou um folheto relativo às dívidas públicas a que Marx, na sua obra, Teoria da mais valia, consagra uma análise detalhada.
As ideias expostas por Ravenstone em suas obras podem ser assim resumidas:
“A produção de homens e a produção de bens constituem as duas forças essenciais da sociedade. Os homens tornam-se cada vez mais numerosos em virtude de uma lei natural, e a natureza dá a cada um aptidões para obter pelo trabalho, seus meios de subsistência. O crescimento da população tem, pois, como resultado, o aumento da produção, que, por sua vez, engendra modificações no edifício social. Se essas forças funcionassem de maneira normal, o crescimento da população corresponderia sempre a um aumento das riquezas e a um passo no sentido da obtenção da felicidade, que é o verdadeiro objetivo da sociedade. Porque só ela permite uma ampla divisão do trabalho, que por sua vez permite que os homens possam desenvolver vantajosamente a produção das riquezas, dando aos sábios e aos inventores não só o necessário estímulo para seu trabalho, como também as diversões e o repouso não menos necessários às suas atividades. Os inventos não são realizados exclusivamente pelos homens que figuram como seus criadores. São frutos do trabalho coletivo de toda a sociedade. Mas o funcionamento das forças fundamentais da sociedade está entravado pelas más instituições sociais e são essas más instituições que explicam a existência da miséria e da opressão, que afligem as classes produtoras. Quais são essas más instituições? A propriedade (o capital), a renda e os impostos elevados. São elas que destroem o direito natural dos operários ao produto de seu trabalho. São elas que fazem constantemente crescer a importância dos elementos improdutivos que se apoderam de uma quantidade cada vez maior do produto do trabalho dos operários. O capital não é mais que trabalho acumulado. Entretanto, a maioria transforma-o num fetiche, em entidade metafísica a qual se atribuem todas as conquistas da vida social, ao passo que o trabalho — o verdadeiro criador do capital — é considerado um mendigo que só vive por obra e graça do capital. O trabalho acumulado, arrebatado dos que o executam, converteu-se numa força formidável nas mãos da classe improdutiva. A princípio, os proprietários não eram mais que chefes eleitos pelo povo. Mas, com o tempo, usurparam as riquezas que lhes haviam sido confiadas e se apossaram do poder político. Isto era inevitável, porque o poder político e poder econômico estão sempre unidos. As formas de governo, os costumes e o caráter de uma nação, são determinados pelas condições de distribuição da propriedade. Depois de conquistar o poder político, os capitalistas tudo fizeram para rebaixar cada vez mais o trabalho. O antagonismo entre capital e trabalho tornou-se um abismo intransponível. Os operários nada poderiam conseguir, mesmo se resistissem. A luta que se travava era desigual. Era uma luta entre a força e a fraqueza, entre o cavalo e o cavaleiro armado de esporas. Toda a ação sofre e se decompõe nesta luta convulsiva. Só, a classe operária é impotente. Por isso, todos os que sinceramente desejam a felicidade nacional devem ajudá-la. Só uma revolução poderá libertar o país do jugo capitalista.
Ideias semelhantes são defendidas num folheto anônimo, que apareceu em 1820, sob a forma de uma Carta aberta a lorde John Russel.
Depois do advento da era do maquinismo, declara o autor desse panfleto, o trabalho tornou-se extraordinariamente produtivo. O capital, ou trabalho acumulado, pode ser produzido em abundância. Mas, para utilizar os meios de produção e as matérias primas, os operários têm necessidade de deixar nas mãos dos capitalistas seis sétimos do produto de seu trabalho. O lucro do capital é, pois, excessivamente elevado. E, quanto maior esse lucro, mais ínfima é a parte dos produtos de seu trabalho que os operários recebem, maior é a miséria da classe produtiva. Os elevados lucros obtidos pelo capital mostram que ele é ainda insuficiente, embora possa ser tão facilmente produzido. Como se explica esse fato? A troca de mercadorias de uso comum por artigos de luxo fabricados no estrangeiro, as emissões de papel-moeda, as guerras, os direitos aduaneiros sobre o trigo, as restrições legais imposta à indústria, são fatores que impedem o rápido crescimento do capital e a consequente baixa do seu rendimento — ou, o que dá no mesmo — impedem o aumento da parte dos produtos do seu trabalho que os operários recebem. Para remediar essa situação é então necessário suprimir todos esses obstáculos, e, antes de mais nada, instaurar a liberdade do trabalho. Feito isto, será possível aniquilar todos os outros empecilhos. O capital poderá rapidamente aumentar, o valor do lucro exigido pelo capital diminuirá e, consequentemente, os operários receberão uma porção dos produtos que eles mesmos fabricaram. O melhoramento da situação econômica dos operários acarretará a redução da jornada de trabalho. E, salários elevados e jornada de trabalho reduzida, são os mais seguros sintomas da prosperidade de um país.
Cedo ou tarde, chegará o momento em que haverá tão grandes quantidades de capital que ninguém pagará coisa alguma para utilizá-lo. Quando o lucro cobrado pelo interesse descer a zero soará a hora da libertação da Humanidade.
As obras fundamentais de Tomaz Hodgskin são: A Defesa do Trabalho, publicada sem o nome do autor em 1825; A economia política do ponto de vista das massas populares, coletânea de conferências por ele realizadas em 1826, na Escola de Cultura Operária de Londres e Os direitos de propriedade naturais e artificiais, também publicada sem o nome do autor em 1832. Eis as ideias que Hodgskin desenvolve nessas publicações:
A sociedade é um fenômeno natural e obedece a leis determinadas. Estas leis foram elaboradas pelo espírito mundial, pela força moral e suprema, para garantir uma justa ordem universal. A missão da economia política é puramente negativa. Tal missão consiste unicamente em ditar leis e em impedir que essas leis sejam violadas. As leis naturais são boas. Mas as leis humanas são más. A princípio, reinava a igualdade absoluta. O trabalho era considerado o único título jurídico que dava direito à propriedade e à riqueza. Mas, à medida que a população do globo cresceu, aumentaram as necessidades materiais. Foi então necessário um trabalho intelectual mais intenso. Disso resultou o desenvolvimento dos conhecimentos e das capacidades humanas. Se as instituições humanas não viessem interromper o curso natural das coisas, o progresso da Humanidade, no caminho da Justiça, seria contínuo. Mas a violência interrompeu o curso natural das coisas e separou o trabalho da riqueza. E o poder passou para as mãos dos elementos estéreis da sociedade. Eis porque existe desigualdade, opressão, miséria, luxo, excesso de trabalho, ociosidade, guerras, crimes. Mas as leis humanas não conseguiram eliminar completamente as leis naturais. Estas, a despeito de todas as leis humanas, trabalham lentamente pela libertação dos oprimidos. O servo libertou-se das cadeias da escravidão e conquistou o direito ao produto do seu trabalho. Mas veio o capitalista, que obrigou o proprietário rural a pagar-lhe tributos. Em nossa época, as classes médias multiplicam-se cada vez mais. Entre elas, de novo surgem a união do trabalho e da propriedade. As invenções mecânicas cada vez mais frequentes transferem para as máquinas os trabalhos mais penosos. A classe média poderá, por isso, libertar a Humanidade e instaurar a igualdade entre os homens.
Hodgskin procura mostrar que o capital é improdutivo, que o capital fixo (os meios de produção) é criado pelos operários e que são também os operários que lhe dão uma força criadora. Hodgskin procura ainda mostrar que o capital circulante (os salários sob a forma de subsistência) é um produto da atividade diária dos operários.
Três coisas são necessárias para a produção dos bens: 1.º conhecimentos científicos e espírito inventivo; 2.º capacidade técnica; 3.º habilidade manual. Foram esses três fatores que enriqueceram a Inglaterra. O capital não criou a riqueza da Grã-Bretanha porque ele nada mais é que um símbolo místico. Se os patrões participarem da produção receberão um salário razoável, um salário de operário qualificado. Mas, como capitalistas, eles são simplesmente exploradores e seus interesses diametralmente opostos aos dos operários. Daí as lutas entre o capital e o trabalho. Felizmente, os operários organizam-se em suas associações e procuram completar pela educação a sua superioridade numérica e física.
Não poderá haver paz nem felicidade na terra enquanto o trabalho e a propriedade não forem reunidos nas mesmas mãos.