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Dimitrov, fundador da democracia popular da Bulgária |
Um dos resultados principais da segunda guerra mundial foi o surgimento de Estados democráticos de novo tipo: Iugoslávia, Bulgária, Polônia, Checoslováquia e Albânia. Por democracia de novo tipo entendemos a situação do país em que os resíduos feudais — a grande propriedade fundiária — foram destruídos e em que existe o sistema de propriedade privada sobre os meios de produção; mas as grandes empresas industriais, o transporte e o crédito estão nas mãos do Estado e o próprio Estado e o seu aparelho de repressão não servem aos interesses da burguesia monopolista, mas aos interesses dos trabalhadores da cidade e do campo.
O regime social destes Estados se diferencia de todos os Estados por nós conhecidos até agora: é qualquer coisa de absolutamente novo na história da humanidade. Não é a ditadura da burguesia, nem tampouco a ditadura do proletariado. O velho aparelho estatal não foi despedaçado, como na União Soviética, mas se reorganiza mediante a participação contínua dos fatores do novo regime. Não são Estados capitalistas no sentido habitual da palavra e nem tampouco Estados socialistas. Com a nacionalização dos principais meios de produção e com o próprio carácter destes Estados foram lançadas as bases para a sua passagem ao socialismo. Esses Estados podem, mantendo o poder estatal atual, passar gradualmente ao socialismo desenvolvendo sempre mais as organizações de tipo socialista, que já existem ao lado das empresas mercantis simples (camponesas e artesãs) e das organizações capitalistas que perderam a sua posição proeminente.
Para todos estes países, indistintamente, a premissa histórica geral que fez surgir e existir tais Estados democráticos de novo tipo foi a crise geral do capitalismo, que se agravou fortemente em seguida à segunda guerra mundial.
As condições históricas específicas para esses países são as seguintes:
1) — As classes dominantes e os seus partidos políticos se desacreditaram aos olhos das grandes massas populares pela sua colaboração com o fascismo hitlerista antes da guerra e no seu curso, política que levou à ocupação desses países por parte das tropas alemãs, à repressão feroz e ao extremo empobrecimento das massas trabalhadoras;
2) — Os partidos comunistas tiveram uma função decisiva no movimento de resistência, alcançando a unidade da classe operária e a constituição de uma frente popular para a luta contra o fascismo, contra a propriedade fundiária e o grande capital, bases econômicas do fascismo;
3) — Esses países encontraram na União Soviética um apoio moral, político e econômico, sem o qual os Estados democráticos de novo tipo dificilmente teriam podido resistir ao ataque da reação, quer interna ou externa. Neste propósito, é muito instrutiva a sorte da Grécia.
A Economia dos Estados democráticos de novo tipo é caracterizada pelos seguintes traços:
Continua a existir a propriedade privada sobre os meios de produção: o camponês é proprietário da sua terra, o artesão da sua loja, o negociante de seu armazém, o pequeno capitalista da sua fábrica. Mas as grandes empresas de mineração, de industriais, de transportes, bancárias, foram nacionalizadas e são administradas pelo Estado. Existe ainda a apropriação da mais-valia, mas esta é limitada a um campo relativamente restrito e não só porque a propriedade privada dispõe de um capital notavelmente inferior ao que possuía primitivamente, mas também porque os sindicatos e o Estado defendem eficazmente os operários contra os capitalistas.
Queremos sublinhar aqui a importância decisiva que tem o caráter particular do Estado para o desenvolvimento econômico desses países. Se o Estado é dirigido pelo capital monopolista e serve aos seus interesses, pode possuir uma parte muito grande dos meios de produção, sem que o caráter do regime social seja minimamente modificado. Na Alemanha hitlerista as ferrovias, o Banco do Império, o Banco de Desconto, o Banco Estatal Prussiano, grandes empresas industriais (W.I.A.G., Hermann Gemig-Werke), centrais elétricas, grandes propriedades florestais e agrícolas eram de propriedade do Império, de instituições locais e das cidades. Entretanto, a existência de uma tão grande propriedade social não modificou de fato o caráter monopolista da Alemanha hitlerista e a ordem social permaneceu burguesa. A modificação do caráter do Estado — a sua transformação de instrumento de domínio nas mãos das classes possuidoras em Estado do povo trabalhador — eis o que determina o verdadeiro significado da passagem da parte dos meios de produção, que tem uma importância decisiva nas mãos do Estado, nos países democráticos de novo tipo.
A modificação do carácter do Estado é dada também pela influência da nacionalização sobre a distribuição da renda nacional, a qual é absolutamente diversa nos Estados democráticos de novo tipo e nos países democráticos burgueses, como, por exemplo, a Inglaterra.
Nos Estados da nova democracia, a nacionalização é uma revolução econômica particular. A propriedade dos traidores da pátria, dos capitalistas fascistas foi expropriada sem indenização. Os outros grandes capitalistas, ainda que hajam recebido uma indenização, gozam de uma renda que constitui uma pequena parte da mais-valia de que antes se apropriavam.
A contradição entre o caráter social da produção e o caráter privado da propriedade se aguçou de tal modo em seguida à agravação da crise geral do capitalismo que, no após-guerra, a onda das nacionalizações se estendeu a quase todos os países — com exceção dos Estados Unidos — desenvolvidos capitalisticamente. Nesses países, a nacionalização é uma tentativa de superar, no quadro do regime social-burguês, as contradições entre o caráter social da produção e o caráter privado da propriedade privada. Assim se explica precisamente a nacionalização com completa indenização dos capitalistas. Na Inglaterra por exemplo, aos possuidores de ações das empresas elétricas foi concedida uma indenização de 450 milhões de esterlinos. Esta soma foi estabelecida com base no curso das ações na bolsa antes da nacionalização. Do mesmo modo, foi estabelecida a quantia da indenização, que corresponderá aos proprietários das empresas de transportes destinadas à nacionalização, em 1.035 milhões de esterlinos. Isto quer dizer que os proprietários das ações não sofreram nenhuma perda. De tal maneira não há nenhuma redistribuição da renda nacional. Estes diversos métodos de nacionalização mostram a diferença entre a democracia burguesa e a democracia de novo tipo.
A nacionalização das grandes empresas industriais nos diversos países tem naturalmente um significado totalmente diverso. Nos países onde predomina a agricultura e onde a indústria é escassamente desenvolvida — na Bulgária e na Iugoslávia — a sua importância é relativamente pequena. Na Polônia, onde existe uma grande indústria pesada e carbonífera a importância da nacionalização é muito maior, tanto mais que ela se estende às empresas industriais médias. Na Checoslováquia, que é industrialmente muito mais desenvolvida e cuja indústria foi ampliada pelos alemães durante a guerra, a nacionalização tem uma função muito importante, ainda que se estenda a um número de empresas médias menor que na Polônia. Enquanto que a indústria da Iugoslávia e da Polônia de ante-guerra foi quase totalmente arruinada, durante a guerra, a indústria da Checoslováquia sofreu muito limitadamente por ações de guerra. O fato de que na Bulgária e na Iugoslávia não se operaram muitas nacionalizações, naturalmente não diminui a importância desta providência para o desenvolvimento econômico futuro destes países, os quais se transformam de apêndices agrícolas da Alemanha, como eram antes da guerra, em países agro-industriais independentes.
O segundo traço importante da economia dos países democráticos de novo tipo é a liquidação completa e definitiva da grande propriedade territorial, deste resíduo feudal no seio do sistema capitalista de economia. A milenar potência social e política dos grandes proprietários territoriais foi destruída. As grandes propriedades foram confiscadas pelo Estado e repartidas entre os camponeses com pouca terra e os trabalhadores agrícolas sem terra. O número das propriedades camponesas, isto é, dos proprietários privados da terra aumentou fortemente nesses países.
A repartição da terra entre muitas centenas de milhares de camponeses sem terra ou com pouca terra fez da enorme maioria desses camponeses sustentáculos seguros do novo regime. O erro cometido pelos comunistas húngaros em 1919, quando quiseram saltar uma etapa histórica necessária, transformando as grandes propriedades nacionalizadas em "sovkhoses", ao invés de distribuí-las aos camponeses e satisfazer-lhes a fome da terra, não foi repetido em nenhum lugar.
Pelo fato de que os camponeses cultivam a terra com os próprios meios e podem vender no mercado os seus produtos (em alguns países somente depois de haver pago os impostos e efetuado as entregas ao Estado) cria-se a possibilidade de manter e de fazer surgir novamente as relações mercantis-capitalistas na economia. Verifica-se o que escreveu Lénin:
"...a pequena produção gera o capitalismo e a burguesia, sempre, cada dia, cada hora, espontaneamente e em vasta escala."
Assim a estrutura social nos Estados democráticos de novo tipo não é a estrutura socialista, mas uma nova forma original de transição. As contradições entre as forças de produção e as relações de produção se atenuam à proporção que aumenta o peso específico do setor socialista.
A nacionalização da terra dos grandes proprietários territoriais e a sua distribuição entre os camponeses tiveram uma importância diferente nos vários países.
Nos países camponeses como a Bulgária e a velha Sérvia, não existia a grande propriedade territorial no verdadeiro sentido da palavra. Assim é que, entre os seus camponeses se pôde repartir uma quantidade de terra relativamente pequena. Nas outras partes da Iugoslávia, que antes pertenciam à Hungria — Croácia e Banato — se pôde distribuir uma maior quantidade de terra. Na Checoslováquia, já depois da primeira guerra mundial se efetuara a reforma agrária: entre os camponeses tinha sido repartida a terra dos alemães que haviam sido expulsos.
Na Polônia, a reforma agrária tem uma importância decisiva para o desenvolvimento político do país. A situação dos camponeses era a pior possível. Polônia infemum rusticorum, (Polônia inferno dos camponeses), assim se dizia já há centenas de anos atrás. Ali se conservava plenamente a propriedade territorial de tipo feudal, quer nos territórios da Polônia de antes da guerra, quer nas regiões ocidentais, as quais se encontravam precedentemente sob o domínio alemão. A destruição da propriedade territorial abre uma nova era na vida econômica e política da Polônia.
É de todo evidente que a classe dos grandes proprietários territoriais não está de fato disposta a reconhecer pacificamente estas modificações e resiste de todos os modos ao novo regime. A nacionalização da terra não corta imediatamente aos grandes proprietários territoriais a sua influência política. É verdade que alguns deles fugiram para o exterior; muitos, entretanto, permaneceram no país. Uma parte notável da sua propriedade — objetos de valor, móveis, objetos de arte, casas — permaneceram em suas mãos. Em muitos casos, como por exemplo na Polônia, penetrar no aparelho estatal, sobretudo na administração da agricultura e sabotar a aplicação da reforma agrária. Mais importante ainda é o fato de que no país permaneceu uma camada de pessoas influentes cuja existência dependia, completa ou parcialmente, dos grandes proprietários territoriais. Por exemplo: párocos no campo, notários, juizes, professores, os quais recebiam continuamente do proprietário territorial dinheiro, víveres, lenha etc.; os diversos empregados da propriedade, agrônomos, etc. que estavam a serviço do proprietário territorial; funcionários do Estado, oficiais, os quais obtinham um posto graças à sua proteção; os deputados, eleitos pela população sob as suas ordens. Em resumo, a liquidação da base econômica do poder dos latifundiários não quer dizer a eliminação ao mesmo tempo da sua influência política no país.
A mesma coisa se pode dizer acerca da grande burguesia. Embora as empresas dos capitalistas tenham sido nacionalizadas, na maioria dos casos ficou ainda nos suas mãos uma parte notável das suas propriedades. Uma grande parte dos seus diretores, dos seus engenheiros, chefes, etc., permaneceu nas empresas nacionalizadas. No aparelho estatal e nas diversas organizações econômicas, que existem ainda — Câmara de Comércio, de Indústria, etc. — se podem ainda encontrar elementos seus. Os representantes da grande burguesia têm estreitos laços com a burguesia média, cujas empresas não foram expropriadas. Eles não perderam ainda completamente a sua influência após a nacionalização das suas empresas.
Dessa maneira, também neste caso, continua a ser válida a lei geral, segundo a qual as modificações na base econômica não comportam imediatamente modificações correspondentes em política. Privada da sua potência econômica, a classe dos grandes proprietários territoriais, junto aos capitalistas expropriados e não expropriados, e os seus sustentáculos, lutam por todos os meios contra o novo regime democrático. Estas forças reacionárias organizam os partidos políticos de oposição e, servindo-se dos padres, dos professores e dos notários, já antes corrompidos por eles, conduzem uma agitação entre os novos camponeses, frequentemente privados dos meios de produção necessários à lavoura, a fim de que restituam a terra aos proprietários fundiários. Eles ameaçam os camponeses, dizendo-lhes que serão mortos se retornar o velho regime, porque "roubaram" a terra; organizam "complots" contra o governo; armam os bandidos, etc., procuram e encontram um ativo apoio nos círculos reacionários estrangeiros.
A grande burguesia, que ainda tem uma certa função importante no comércio interior e exterior, luta contra o novo regime e, no campo econômico, procura espoliar o Estado e desacreditar o regime social. Favorecida pelos próprios sustentáculos subornados, que se encontram nas empresas estatizadas e no aparelho estatal, ela recebe as mercadorias abaixo do custo, as esconde, envia-as aos países estrangeiros ou as vende no interior do país somente em troca de ouro ou de divisas. Os representantes da grande burguesia buscam provocar a inflação ou então acentuar a inflação já existente para suscitar o descontentamento entre os trabalhadores e torná-los politicamente contrários ao novo regime.
Numa palavra: nos países da nova democracia não reina de fato uma paz idílica, mas, ao contrário vem sendo conduzida uma luta de classe cerrada, tão encarniçada como nos velhos países capitalistas.
Porém, no que concerne à luta de classe, existe uma diferença de princípio entre os Estados democráticos de novo tipo e os velhos países burgueses. Nestes últimos, o Estado é o instrumento de domínio nas mãos das classes possuidoras. Todo o aparelho estatal — funcionários, juizes, policiais e gendarmes — e, por último, as tropas regulares, estão do lado das classes possuidoras.
Nos países da nova democracia se observa um quadro de todo diferente. O Estado defende os interesses dos trabalhadores contra aqueles que vivem apropriando-se da mais-valia. A porta dos ministérios está aberta não aos representantes do capital monopolista e aos defensores dos interesses dos capitalistas, como nos países capitalistas, mas aos representantes dos Sindicatos e das associações camponesas. Quando os conflitos têm lugar, as formações armadas não se encontram do lado dos capitalistas, mas do lado dos operários. É absolutamente inconcebível que o Exército destes Estados possa ser utilizado contra os trabalhadores. Os funcionários estatais e os juizes servem ao interesse do povo trabalhador. A particularidade que mostra claramente o novo caráter do Estado nos referidos países é que o poder se encontra nas mãos do povo.
Este caráter peculiar do Estado decorre do fato que a sua ação sobre a vida econômica do país é muito mais forte e diversamente dirigida de maneira diferente da que se vê nos velhos países burgueses, embora também nestes últimos, após o término da guerra, as funções do Estado se tenham notavelmente ampliado em confronto com o período de antes da guerra.
Mas a orientação da política econômica nos países democráticos de novo tipo é diversa, oposta nos princípios. Nos países capitalistas, a política econômica do Estado serve para manter, em geral, o regime social existente e, em particular, o capital monopolista. Nos Estados democráticos de novo tipo a política econômica é dirigida no sentido de reforçar e estender o setor socializado da economia, a reerguer a economia, a melhorar a situação dos trabalhadores, a estabelecer uma justa distribuição da renda, proporcional aos serviços prestados à comunidade. Para elevar o nível de vida de todo o povo é necessário incrementar a produção. A política econômica se põe assim ao objetivo de obter que as forças produtivas se desenvolvam de todos os modos e que sejam eliminados aqueles freios ao desenvolvimento das forças produtivas que existem sob o capitalismo, e que foram criados pela caça ao lucro.
Para obter a realização destes fins, os Estados democráticos de novo tipo procuram agir sobre o desenvolvimento da economia mediante a planificação. Foram elaborados planos econômicos para vários anos.
É claro que nestes países não pode existir uma economia planificada no sentido em que nós a entendemos. Isto não é possível dada a existência ainda de uma propriedade privada sobre os meios de produção. Uma economia verdadeiramente planificada é possível unicamente no regime socialista, em que TODOS os meios de produção estão nacionalizados.
A nacionalização das empresas de importância fundamental no campo da indústria, dos transportes e do crédito dá todavia, aos Estados da nova democracia, possibilidades muito maiores do que aos Estados de capital monopolista para agir mediante a planificação da atividade econômica dos pequenos produtores privados, tanto mais que a ação planificadora do Estado se executa no interesse da esmagadora maioria destes pequenos produtores privados, em primeiro lugar os camponeses, não sendo, por conseguinte, dirigida contra eles. Não há dúvida que esta ação se reforçará à medida que os países da nova democracia estenderem as nacionalizações. Todos estes fatos demonstram que a ação planificadora do Estado sobre a economia dos países da nova democracia é bastante eficaz não só para impedir o retrocesso no sentido dos sistemas sociais capitalistas de velho tipo, mas também para favorecer o desenvolvimento destes países em direção ao socialismo. Não somente a linha geral do desenvolvimento histórico, mas as necessidades de ordem prática os impelem para este caminho.
Assim, por exemplo, muitos dos velhos operários agrícolas obtiveram a terra, mas não dispõem de meios de produção, de tração e dos instrumentos para cultivá-la. Os meios de produção das grandes áreas, — tratores, arados a vapor, etc. — distribuídos entre os camponeses, não servem para cultivar os pequenos lotes. Os novos proprietários, privados dos meios de produção, estão ameaçados do perigo de cair na dependência econômica dos camponeses acomodados, os quais, em troca de dinheiro, de parte da colheita ou da prestação de trabalho, cultivam a terra com as próprias máquinas.
As necessidades práticas do camponês que possui a terra, mas não tem os meios de produção, o impelem por conseguinte ao cultivo coletivo da terra para utilizar os meios de produção que se podem utilmente aplicar só nas grandes fazendas. Surgiram diversas formas de cooperativas. Em várias cooperativas, os camponeses aram e cultivam coletivamente a terra, depois do que delimitam de novo os lotes e todo o camponês faz a colheita sobre o próprio campo. Na Bulgária, onde existem velhas tradições de cultivo da terra segundo princípios cooperativos, se constituíram espontaneamente cooperativas para a lavoura coletiva da terra. Toda a terra dos membros da cooperativa (que frequentemente reúnem todos os camponeses de uma comuna) é trabalhada de modo coletivo e coletiva é a colheita. A colheita porém não se divide segundo o número das jornadas de trabalho prestadas, conforme ao princípio puramente socialista: além do número das jornadas de trabalho, toma-se em consideração a quantidade de terra e dos meios de produção que o camponês cedeu à cooperativa. Trata-se pois de um compromisso entre o princípio socialista e o princípio baseado sobre a propriedade privada dos meios de produção. É uma solução que corresponde ao caráter transitório do sistema social. Apoiando este novo aspecto de cooperação agrícola, com créditos, tratores, sementes, etc, o governo colabora em seu desenvolvimento e em sua difusão, agindo no sentido progressivo sobre o desenvolvimento da economia.
Dissemos antes, que o descrédito merecido das classes dominantes e dos seus partidos e a função dirigente dos Partidos Comunistas na luta contra o fascismo hitleriano, foram os fatores decisivos que levaram ao nascimento da democracia de novo tipo. É óbvio que estes fatores não foram os mesmos em todos os países indicados. Esta circunstância, ligada ao passado histórico absolutamente diverso e à vária composição nacional, geraram diferenças notáveis entre cada um dos Estados.
Na Iugoslávia, a classe dominante e os seus partidos políticos foram completamente desacreditados porque entregaram o país a Hitler e também porque colaboraram do ponto de vista econômico, militar e político com os invasores (Nedich, Draja Míkhailovitch, Pavelitch). O rei e o governo emigrado, os quais apoiaram Mikhaillovitch até o fim, também se desprestigiaram. O Partido Comunista, temperado e preparado para esta luta por mais de 20 anos de vida ilegal, organizou em todos as localidades, a luta de guerrilhas dos verdadeiros patriotas, sem distinções de partidos, colocando-se sempre à vanguarda em todos os setores mais perigosos. As formações guerrilheiras, apoiadas pelo povo trabalhador, se desenvolveram até se transformar num Exército. Em Tito o movimento encontrou um dirigente, um organizador político e militar, que durante a longa luta se tornou um herói nacional, um chefe reconhecido.
Por isto, após a libertação do país, já se tinha um novo Exército pronto, surgido no curso da luta, um novo aparelho estatal e administrativo já pronto e um novo governo sob a direção de Tito. Por isto, o novo regime na Iugoslávia está alicerçado do ponto de vista político e militar sobre fundamentos particularmente sólidos. A política nacional da nova Iugoslávia, da qual falaremos em seguida, bem como o aumento da população do país graças à inclusão dos cidadãos que se encontravam antes sob o jugo estrangeiro, reforçaram ainda mais a solidez política do país.
Na Bulgária, a casa reinante, a classe dominante e os seus partidos caíram também eles no descrédito, como na Iugoslávia. Entretanto, dado que a ocupação do país pelos nazistas se realizou com o consentimento do governo, o poder deste último continuou intacto até 9 de setembro de 1944. Não se verificou aqui uma longa guerra civil, não existiram formações guerrilheiras como na Iugoslávia. Somente após a derrota, o Exército se dividiu: uma parte, dirigida pelos reacionários, continuou a luta ao lado dos alemães, enquanto a outra aderiu ao poder popular apenas organizado. A punição dos traidores da pátria e a liquidação do velho regime reacionário, como também a criação de um novo aparelho estatal, não se verificou senão opôs a queda do velho regime. O Partido Comunista, estreitamente ligado ao povo, e que possuía uma grande experiência de trabalho ilegal, veio a ser também aqui o Partido dirigente. Em Jorge Dimitrov, ele possui um chefe de primeira ordem sobre escala internacional, conhecido em todo o mundo, herói da luta anti-fascista. Os resultados das eleições parlamentares demonstram a popularidade do novo regime em geral, e, em particular, do Partido Comunista no seio do povo trabalhador.
Na Polônia, as condições para criar um Estado democrático de novo tipo foram muito mais difíceis. A classe dominante dos grandes proprietários fundiários era odiada pelo povo. O governo de "coronéis" dirigido por Beck se desmoralizou completamente. Movido pelo ódio contra a União Soviética, conduziu uma política de colaboração com Hitler quase até a eclosão da guerra mundial, tendo sido contrário à participação da União Soviética na defesa contra Hitler dos limites Ocidentais da Polônia, cujos "gloriosos" exércitos acabaram sofrendo tão humilhante derrota. As outras forças políticas, como por exemplo o Partido Camponês (S. L.), o Partido Social Democrático (P. P. S.), e outros ainda eram influentes. O povo acreditava ainda na legenda de Pilsudski. O governo emigrado em Londres organizava grupos para a luta clandestina, os quais naturalmente eram mais frequentemente empregados na luta contra os comunistas e Exército soviético que na luta contra os ocupantes nazistas.
O Partido Socialista Polaco (P. P. S.) o qual em seu tempo conduziu batalhas revolucionárias contra o tzarismo, tinha, embora a maior parte da sua direção possuísse uma orientação chauvinista e oportunista, uma influência muito maior do que a que gozavam os débeis partidos social-democratas iugoslavo e búlgaro.
Na Polônia, como é sabido, não existe um Partido Comunista. O velho Partido Comunista, ao qual os agentes de Pilsudski, penetrados nas suas fileiras até os postos dirigentes nos anos da sua existência ilegal, impuseram uma linha política sectária, que se dissolveu em 1937, O Partido Operário Polaco (PPR), fundado em 1943, reagrupa além dos velhos membros do Partido Comunista largas camadas de trabalhadores progressistas. A sua influência se reforçou durante a luta que conduziu quando o país estava ocupado. A justa política que conduziu após a libertação do país — realização da reforma agrária, criação da frente única com o Partido Socialista, etc. — lhe assegurou uma função importante no governo.
Em virtude destes fatores históricos, a luta das forças reacionárias contra o novo regime na Polônia é, como dissemos acima, muito mais aguda do que nos outros países da nova democracia.
Na Checoslováquia, as condições históricas para o surgimento da nova democracia também tiveram uma característica própria. A burguesia se tinha desprestigiado e havia provocado o ódio geral pela sua incapacidade de defender o país contra Hitler, bem como pela sua colaboração com os invasores. Fato idêntico se deu também com relação aqueles partidos da burguesia, sobre os quais recaiu a responsabilidade de Munich. Entretanto, o Partido Socialista Popular, sob a direção de Benes, e o Partido da Social-democracía mantiveram a sua influência. Enquanto os governos emigrados da Polônia e da Iugoslávia tinham uma posição reacionária e hostil frente à União Soviética; o governo checoslovaco emigrado, dirigido por Benes, era democrático e mantinha relações amistosas com a URSS. O Partido Comunista checoslovaco tinha passado à ilegalidade apenas após a ocupação do país e não possuía assim grande experiência de vida clandestina, como os Partidos iugoslavo e búlgaro. Não se encontrava, por conseguinte, em condições de organizar uma resistência armada de grande vulto; unicamente na Eslováquia, com a aproximação do Exército soviético, tiveram lugar batalhas guerrilheiras de notável importância. Quando as tropas soviéticas abandonaram o país e por alguns dias deixou de existir qualquer poder governativo, o proletariado checo demonstrou todavia a sua maturidade e a sua energia política. Os operários ocuparam todas as grandes fábricas, expulsaram os capitalistas ou os prenderam. A nacionalização da grande indústria na Checoslováquia foi de fato realizada imediatamente, de golpe, pela classe operária. Após o seu retorno, o governo emigrado não teve outro recurso senão sancionar com leis adequadas o fato consumado e organizar a direção estatal da grande indústria nacionalizada. E se dentro do Partido da Social-democracía e o Partido Socialista Popular existiam, com toda a probabilidade, não poucas figuras políticas às quais este desenvolvimento dos acontecimentos não agradava, a correlação de forças era tal que excluía para tais figuras a possibilidade de tomar qualquer iniciativa contra os operários, em defesa dos capitalistas. Estas circunstâncias contribuem para que a luta contra o novo regime na Checoslováquia seja conduzida de maneira muito débil.
Assim vemos que, se bem que em todos os países democráticos de novo tipo exista o mesmo regime social, na economia e na política se verificam diferenças não desprezíveis, determinadas historicamente.
Referimo-nos de modo particular à política nacional daqueles Estados. Pode parecer que exista neste campo uma estridente contradição entre a política da Iugoslávia de um lado e a polícia da Checoslováquia e da Polônia de outro (a Bulgária é um pais de composição nacional quase homogênea). A Checoslováquia e a Polônia transferiram para a Alemanha quase todos os alemães que viviam num território, que ora pertence a estes países. Na Iugoslávia, todas as nacionalidades gozam dos mesmos direitos. Ela constitui uma Federação de diversas nacionalidades. Esta contradição todavia é só aparente. Na Iugoslávia se trata de nações que (independentemente do fato de pertencerem todas ao ramo eslavo) eram oprimidas pelos alemães e lutaram contra os invasores. Durante a guerra, combateram num único agrupamento.
Ao contrário, na região dos sudetos e na Polônia, já antes da guerra, os alemães eram o instrumento do fascismo hitleriano. Eles vendiam abertamente o país do qual tinham a cidadania. Durante a guerra mundial, combateram ao lado de Hitler contra aquela que tinha sido a sua Pátria. É compreensível, pois, que, sobre a base desta experiência, os povos checoslovaco e polonês não queriam submeter-se ao perigo, deixando tais elementos traidores no país. A completa igualdade de direitos dos eslovacos e dos checos na Checoslováquia demonstra claramente o caráter da sua política nacional, baseada sobre uma experiência histórica. Terminada a transferência dos alemães e a transferência voluntária dos ucranianos da Polônia para a União Soviética (bem como dos poloneses da União Soviética para a Polônia), a composição nacional dos Estados da nova democracia será a seguinte: a Bulgária e a Polônia constituirão Estados de nacionalidade quase homogênea, a Checoslováquia será composta de duas nações gozando dos mesmos direitos (talvez continue a existir ali também uma minoria húngara, aliás muito mal vista pela população). A Iugoslávia, ao contrário, constitui uma Federação de nações que gozam de iguais direitos. Esta política nacional da nova Iugoslávia é particularmente importante para a prosperidade do país e para a amizade entre todos os povos que vivem em seu território, porque, neste particular, o regime que existia antes da guerra deixou na Iugoslávia uma herança muito penosa. Embora o país fosse chamado Iugoslávia, isto é, país dos eslavos do sul, de fato, ali, dominava a burguesia sérvia, que oprimia as outras nações. Somente pela constituição e pela prática da nova Iugoslávia, foi possível eliminar tudo o que, mesmo em grau mínimo, pudesse ser interpretado como uma continuação da política de opressão praticada pelos sérvios antes da guerra.
Na Iugoslávia, restam ainda pequenas minorias alemãs e húngaras. Mas, graças ao fato de não possuir a Iugoslávia fronteiras com a Alemanha, e ser o seu regime político extremamente simples, pôde ao contrário da Checoslováquia e da Polônia, deixar tranquilamente estas minorias dentro do próprio país.
Todos os Estados democráticos de novo tipo são repúblicas populares: o povo trabalhador determina a política do governo. A forma de domínio político dos trabalhadores não é, porém, igual. A Checoslováquia, a Polônia e a Bulgária são repúblicas parlamentares com sufrágio universal, igual e secreto. Nestes países, o governo é formado pelos partidos coligados que constituem a maioria e são responsáveis frente ao Parlamento. O seu direito eleitoral se distingue do direito eleitoral das velhas democracias burguesas porque é vedada a atividade dos partidos fascistas e os traidores fascistas estão privados de direito de voto. A Iugoslávia, ao contrário, é uma república federativa, cuja Constituição possui muitos pontos de contacto com a da União Soviética.
A este respeito, surge uma questão teórica importante: nos Partidos Comunistas era muito divulgada a idéia de que o domínio político dos trabalhadores, como foi na União Soviética, pôde ser realizada somente na forma do sistema dos Soviets. Isto, porém, não é verdade, nem era sequer a idéia de Lénin.
No meu livro sobre a República Soviética Húngara, "Problemas Econômicos e Políticos da Ditadura Proletária", o qual foi publicado em 1920, escrevi o seguinte:
"A hostilidade dos camponeses acomodados e de todas as camadas das classes dominantes com relação ao Estado Proletário não depende da forma deste último: para as classes dominantes é indiferente que o sistema seja soviético, que o governo seja a expressão dos sindicatos ou da maioria operária no Parlamento. A toda forma eles hão de opor uma resistência igualmente forte, logo que nos pusermos seriamente a trabalhar pela edificação da economia socialista".
Esta frase, que admitia a possibilidade de outras formas de domínio político dos trabalhadores, foi considerada errônea por muitos companheiros. Mas Lénin, que em diversos pontos do meu livro fez notas críticas agudas, não fez neste ponto nenhuma observação e se limitou a sublinhar uma parte da frase.
O surgimento dos Estados da nova democracia demonstra, claramente, que o domínio político dos trabalhadores é possível, mesmo com a conservação das formas da democracia parlamentar.
A política exterior dos Estados da nova democracia é determinada pelo caráter transitório do seu regime social. Em virtude deste seu caráter, os Estados capitalistas, e principalmente os Estados Unidos e a Inglaterra, tudo fazem não só para barrar o desenvolvimento social progressivo destes países, mas também para fazê-los voltar atrás, para transformá-los novamente em Estados capitalistas comuns. Esta aspiração é tanto mais forte quanto o sistema social atual dos países da nova democracia exclui a possibilidade da sua transformação em países economicamente dependentes, como eram antes da guerra com relação à Alemanha. Assim se explicam os fatos bem conhecidos dos leitores da imprensa diária: as repetidas tentativas de intervenção nos negócios internos destes países, o rumor que se faz em torno à falta de democracia em virtude dos severos golpes desfechados sobre os reacionários intrigantes; as tentativas de desacreditar as eleições; o apoio dado a toda forma de oposição, isto é, a todos os Partidos e figuras políticas, etc., reacionários na presente situação histórica e, objetivamente contra-revolucionários. A intensidade destas tentativas de intromissão varia segundo os diversos países. Com relação à Checoslováquia, ela é relativamente menor porque ali a burguesia, tendo colaborado com os fascistas alemães, de tal maneira se desacreditou que não pôde, pelo menos agora, agir abertamente como uma força política e a reação exterior se encontra assim privada de um apoio no interior do país. Eis porque o caráter democrático da Checoslováquia não costuma ser contestado. As tentativas de intromissão são mais freqüentes nos negócios da Polônia, onde o Partido dos Camponeses de Nikolaichik é o ponto de apoio legal mais importante para as forças reacionárias no interior do país e para a reação exterior. Um dos objetivos mais importantes da política exterior dos países da nova democracia é por isso a defesa das suas conquistas políticas internas e do seu regime social contra todos aqueles ataques.
Tais circunstâncias esclarecem as razões porque os referidos Estados mantêm estreitas relações amistosas entre si e se prestam um ao outro ajuda econômica e política. Entre estes Estados, Iugoslávia e Bulgária de um lado, Checoslováquia e Polônia de outro, existem fronteiras comuns e isto facilita suas relações econômicas. Entre estes dois grupos de Estados existem dois países, a Hungria e a Romênia,(2*) os quais, embora não pertencendo ainda hoje aos países democráticos de novo tipo, se desenvolvem evidentemente neste sentido.
É igualmente claro que estes países mantêm estreitas relações amistosas com a União Soviética. Isso sucede não só porque foram precisamente as tropas vitoriosas da União Soviética que libertaram estes países, (excetuando, em parte, a Iugoslávia) da ocupação alemã e não só porque são todos Estados eslavos, mas sobretudo porque o atual regime social os aproxima da União Soviética e, entre todas os grandes potências, somente a União Soviética se interessou na manutenção e no desenvolvimento ulterior do regime social e político existente nestes países, podendo dar-lhes uma ajuda diplomática contra a ofensiva da reação estrangeira.
Ao mesmo tempo, a União Soviética tem interesse em que nestes países se mantenha o regime existente e em que tal regime continue a se desenvolver num sentido progressivo. O regime existente nestes países dá a garantia que no futuro eles não se prestarão a constituir uma base militar para qualquer potência, que tente atacar a União Soviética. A União Soviética se encontra, pois, interessada em que estes Estados sejam economicamente, politicamente e militarmente o mais possível fortes para que possam se defender contra um ataque estrangeiro, pelo menos até quando os exércitos soviéticos possam chegar em sua ajuda e impedir assim a sua transformação forçada em base militar contra a União Soviética, como aconteceu durante a segunda guerra mundial (destes países, a Polônia e a Checoslováquia limitam com a União Soviética e a Bulgária lhe é próxima, como potência do Mar Negro).
Esta situação denota que os Estados democráticos de novo tipo são o ponto crucial da luta de dois sistemas, luta renovada após a guerra. Não foi por acaso que Churchill, durante a guerra, propôs muitas vezes abrir a segunda frente nos Bálcãs ao invés de uma verdadeira frente no Ocidente, tentando uma manobra em que os exércitos ingleses pudessem encontrar-se em posição para garantir o velho regime. Mas estas propostas foram rejeitadas por Stalin e Roosevelt, porque constituíam um erro do ponto de vista militar.
Tudo isto mostra o entrelaçamento extremamente estreito da política externa e interna na etapa hodierna da crise geral do capitalismo.
Notas de rodapé:
(1*) Economista húngaro (retornar ao texto)
(2*) Com a abdicação do Rei Miguel, em dezembro último, foi proclamada a República Popular da Romênia. (retornar ao texto)
"O progresso do Brasil exige que seja modificado o conceito de propriedade monopolística da terra.
É a miséria da grande massa camponesa sem terras que determina a miséria da renda nacional e, consequentemente, da renda pública."
Prestes.
Inclusão | 05/08/2007 |