IV Congresso do Partido Comunista do Brasil - PCB

Discurso de Abertura

Astrojildo Pereira

7 de novembro de 1954


Fonte: Problemas Revista Mensal de Cultura Política, nº 64, dezembro 1954 a fevereiro de 1955.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo, novembro 2006.
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Camaradas!

Eis-nos reunidos, em alguma parte do Brasil, para iniciar uma jornada que já se anuncia fecunda e gloriosa. Eis-nos a postos, com ânimo firme, com entusiasmo e alegria, para levar por diante os trabalhos do IV Congresso do Partido Comunista do Brasil. Permiti-me acrescentar, quanto a mim, que me sinto particularmente emocionado, orgulhoso e feliz por encontrar-me aqui presente e poder apresentar-vos, em nome do Comitê Central, as nossas saudações muito cordiais de companheiros e amigos.

A presença, entre nós, dos delegados fraternais dos Partidos Comunistas da Argentina, do Chile, do Paraguai e do Uruguai é motivo de especial satisfação e constitui, além disso, um penhor de inapreciável colaboração em nossos trabalhos, que muito terão a lucrar com a assimilação das experiências que nos vieram transmitir.

Numerosas mensagens nos chegam de longe, de quase todos os Partidos Comunistas e Operários do mundo inteiro, trazendo-nos palavras de saudação, amizade e incentivo. São mensagens, entre outras, dos grandes Partidos Comunistas da França e da Itália; dos Partidos Comunistas da Espanha e de Portugal, que tão de perto nos falam ao coração; dos Partidos Comunistas da Índia e do Japão; do Partido do Trabalho da Coréia, que soube dirigir com implacável decisão a guerra do heróico povo coreano contra os bandidos imperialistas; dos Partidos Comunistas e Operários das Democracias Populares da Europa; do Partido Comunista dos Estados Unidos, que trava o seu combate dentro mesmo dos muros da cidadela do inimigo, que é nosso inimigo comum; dos fraternos Partidos da América Latina, cujas lutas se desenvolvem em condições tão semelhantes às nossas, contra semelhantes inimigos internos e o mesmo inimigo externo. Sentimo-nos sobremaneira sensibilizados com a mensagem do provado Partido Comunista da China, que conduziu à vitória a revolução antifeudal e antiimperialista do grande povo chinês, organizou e dirige a República Popular da China e inicia com êxito a construção do socialismo. Para encerrar com fecho de ouro estas referências, mencionarei por fim, a mensagem verdadeiramente luminosa que nos envia o sábio Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética, e que o nosso Partido recebe com justificado orgulho.

Além do muito que vale e significa, intrinsecamente, com suas palavras de estimulo, confiança e conselho, a honrosa mensagem do Partido Comunista da União Soviética adquire neste momento uma significação toda especial, muito grata ao nosso coração, pela feliz circunstância de se instalar o nosso IV Congresso justo na data sobre tôdas gloriosa de 7 de Novembro, quando, no mundo inteiro, a humanidade progressista comemora com festas de regozijo e solidariedade o 37º aniversário da Grande Revolução Socialista de Outubro.

O IV Congresso participa calorosamente dessas festas e reafirma, com o mesmo vigor de sempre, os sentimentos de irrestrita dedicação que o nosso Partido, desde a sua fundação, consagra à União Soviética e ao grande Partido de Lênin e Stálin.

Camaradas!

Do III ao IV Congresso do nosso Partido transcorreu um já longo período de 25 anos, assinalado por duras lutas contra os inimigos internos e externos.

Devo recordar, nesta hora, aqueles dos nossos que tombaram no seu posto de luta, os nossos heróis e mártires, cujos nomes guardamos como inspiração e incentivo ao prosseguimento da obra revolucionária que eles souberam honrar com a sua bravura e o seu sacrifício. São centenas de homens e mulheres, dirigentes e militantes do Partido, que empenharam toda a sua vida, sem nenhuma reserva, em prol de um futuro melhor para a nossa gente e a nossa terra. São homens e mulheres que enfrentaram corajosamente as armas assassinas e as torturas bestiais da reação, nos cárceres, nas greves e lutas operárias, nas lutas de camponeses, nas ações e demonstrações de rua. São os jovens combatentes da gloriosa insurreição de 1935. Seus nomes são já legião — Herculano de Sousa, Alencar Jorge, Luis Zudio, Mario Couto, Luis Bispo, José Francisco (Cabelo de Rato), Lourenço Bezerra, José Maria, Cabo Joffre, José Ribeiro Filho, Tenente Tomas Meirelles, Feliz Valverde, Augusto Pinto, Anisio Dario, Honorato Lemos, Marma, Godoi, Rossi, William Gomes, Angelina Gonçalves, Euclides Pinto, Aladin Rosales, Dioclécio Santana, Zelia Magalhães, Cajazeiras, Lafaiete Fonseca, Ortiz... e outros e outros. Citarei ainda o nome do nosso querido camarada Estócel de Morais, membro do Presidium do Comitê Central do nosso Partido. Foi um homem fibra por fibra integrado na vida do Partido, exemplo do operário combativo que, ao encontrar o Partido Comunista, logo compreendeu que o Partido era justamente aquilo que lhe faltava — a organização de vanguarda da classe operária, o guia experimentado e clarividente, o verdadeiro condutor das lutas operárias e populares. Estócel de Morais morreu no seu posto de dirigente e até o último sopro de vida foi um homem do Partido.

Camaradas!

Muito pouco representam 25 anos, um quarto de século, se os medimos simplesmente como quantidade de tempo no conjunto de séculos que formam milênios de história; mas estes 25 anos que se seguiram à data do III Congresso do nosso Partido, formam, como qualidade, um quarto de século mais rico de extraordinários acontecimentos do que séculos inteiros no passado.

Iria longe se fosse proceder à apreciação de tais acontecimentos. Não me furtarei todavia a traçar, a traçar apenas, um quadro sumário daqueles sucessos que mais fundamente vincaram e que melhor definem a fisionomia do nosso tempo.

No centro e no cimo deles, dominando o curso da história contemporânea, encontra-se a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas com o seu primeiro Plano Quinquenal, com o seu prodigioso desenvolvimento econômico e cultural, e a sua consequente e não menos prodigiosa vitória na segunda guerra mundial contra a monstruosa máquina militar, montada pelo eixo nazi-nipo-fascista. Da vitória soviética, que não significou somente um gigantesco feito de caráter militar, mas também uma vitória de alcance muito mais amplo, resultou o surgimento das Democracias Populares e da República Popular da China, cujas populações, somadas à população da União Soviética, perfazem já um total superior a 900 milhões de seres humanos, que vivem hoje libertos do jugo imperialista.

Acelera-se, depois da guerra, a decadência do mundn capitalista, irremediavelmente abalado em seus alicerces pela crise geral que o corrói. Esboroam-se as sucessivas provocações de guerra, arquitetadas pelos canibais de Wall Street, desesperados em face da crise. Os imperialistas, com todo o seu tão alardeado poderio econômico e militar, são derrotados na Coréia e na Indochina.

Em luta indormida contra os incendiários de uma nova guerra mundial, prevalece a vontade de paz dos povos, cujo movimento organizado se amplia de mais em mais no mundo inteiro. E, contrariamente ao que ocorre no mundo capitalista em decadência, onde a miséria e a insegurança das massas aumentam sem cessar, o campo do socialismo e da paz, com a União Soviética à frente, avança impetuosamente no caminho do progresso, do bem-estar e da cultura.

Quanto ao nosso país, caracteriza-se o quadro da situação por uma crescente penetração dos imperialistas norte-americanos, sendo que após a segunda guerra mundial essa penetração assumiu certas formas mais brutais de escravização econômica, política e cultural, com vistas a reduúr o Brasil a mera colônia dos Estados Unidos. As classes dominantes, isto é, os latifundiários e grandes capitalistas no poder, facilitam a execução dos planos imperialistas, acumpliciam-se com os seus objetivos colonizadores e vendem o país, descaradamente, — movidos  que são  por insaciável apetite de lucros e egoísticos interesses de classe. Para se manterem no poder — quaisquer que sejam os meios postos em prática: fraudes eleitorais, terrorismo policial ou golpes de Estado e militares — recorrem as classes dominantes, sempre e sempre, aos dólares e às armas dos seus patrões norte-americanos. Assim foi em 1930, em 1937, em 1945, durante os sucessivos governos de Vargas e Dutra, e ainda recentemente, em 24 de agosto último.

O golpe de 24 de agosto, desfechado em momento de crescente agravação da situação econômica e política, e visando sobretudo a esmagar pelo terror fascista as greves operárias e as lutas populares em ascenso, deixou meridianamente comprovada a brutalidade da intervenção imperialista.

Mas o povo brasileiro jamais se submeteu nem ao despotismo interno nem à opressão externa.  Isto ficou também comprovado agora, e comprovado de maneira contundente, pelas ações populares de rua contra o golpe de 24 de agosto, nas principais cidades do país e em diversas localidades do interior. E foi unicamente por isto que os generais e politiqueiros golpistas não puderam fazer tudo aquilo que pretendiam.  O Partido Comunista, que desde muito vinha denunciando os preparativos do golpe, alertou o povo, em documentos sucessivos, e pôs a nu, com particular acuidade e vigor, o que havia de real por trás do palavreado de pseudo-moralistas  e  das  manobras  de  supostos  salvadores  — a mão azinhavrada e sangrenta dos monopolistas norte-americanos a dar ordens e a obediência servil de alguns notórios ou disfarçados traidores da Pátria a cumprir as diretivas que a Embaixada Americana lhes transmitia.

Aumenta de ano para ano o espírito combativo das massas. As grandes greves operárias, o despertar dos trabalhadores agrícolas, os movimentos patrióticos em defesa do petróleo e das nossas riquezas minerais pilhadas pelos imperialistas norte-americanos e seus agentes nativos, a organização da Liga da Emancipação Nacional que se amplia e fortalece por todo o país — eis alguns dos pontos altos que demonstram como crescem o nível e o vigor das lutas populares.

O Partido Comunista cumpre com energia e tenacidade o seu papel revolucionário de vanguarda, colocando-se à frente não só das lutas da classe operária e dos camponeses, mas também das lutas patrióticas e democráticas de todo o nosso povo.

Eis por que, em anos e anos de atividade, tem o nosso Partido ocupado, invariavelmente, a posição que lhe compete. Foi o Partido Comunista o organizador e dirigente da Aliança Nacional Libertadora, que agrupava largos setores das forças democráticas e progressistas do país, e da gloriosa insurreição de 1935, primeiro movimento armado do nosso povo dirigido pela classe operária. Na luta contra o nazismo, pelo envio da F.E.B. à Europa, ao lado da União Soviética na guerra contra as hordas de Hitler, desempenhou o Partido Comunista do Brasil um papel que foi decisivo para a liquidação do Estado Novo. As lutas pela anistia e pela legalidade do Partido, as memoráveis campanhas pela Constituinte, a mobilização das massas populares contra a ocupação de bases militares por forças armadas norte-americanas obrigadas por isso a abandonar o solo brasileiro, o movimento pela paz que tem conseguido êxitos notáveis, inclusive na vitoriosa mobilização popular por impedir o envio de tropas para a Coréia, as lutas em defesa das nossas riquezas naturais contra a pilhagem norte-americana, as lutas pelas liberdades democráticas, as granâes greves operárias: de tôdas essas lutas tem participado o Partido Comunista como força de vanguarda.

Através dessas lutas da classe operária e do povo ê que o Partido se formou e forjou uma direção provada, a cuja frente se encontra o líder do povo brasileiro, o camarada Luiz Carlos Prestes.

O Programa elaborado pelo Comitê Central do nosso Partido, durante dois anos de perseverantes trabalhos, é o atestado mais eloquente da maturidade já atingida pelo Partido Comunista do Brasil.

Desde já se pode medir o alcance decisivo do Programa do Partido, como arma de ação política, pelo fato incontestável de que ele se converteu, nos poucos meses decorridos desde sua publicação, no centro para onde convergem as atenções políticas de crescentes camadas do povo brasileiro.

Documento fundamental do Partido Comunista, o Programa segue o seu curso, avança para a frente como um rio de águas fertilizantes, penetrando com irresistível impulso na mente e nos corações de milhares de pessoas que se multiplicam dia a dia.

Camaradas!

Ao  convocar o  IV Congresso  do Partido, declarou o Comitê Central:

"A realização do IV Congresso constituirá um marco histórico na vida do Partido. O IV Congresso será um fator de primeira grandeza para impulsionar e ampliar a democracia interna no Partido, princípio básico da sua organização e condição indispensável ao máximo florescimento da iniciativa revolucionária dos seus organismos e militantes. Com o IV Congresso serão vivificadas extraordinariamente as fileiras do Partido, estimulada a sua combatividade e reforçada a sua coesão e unidade inquebrantável."

Com esta compreensão da importância histórica do IV Congresso é que todo o Partido se jogou, durante meses, aos trabalhos de preparação do IV Congresso, que aqui se reúne, por fim, como demonstração pujante daquilo que já somos e daquilo que devemos e poderemos ser.

Árduo será o nosso trabalho, mas a êle nos entregamos com todas as nossas forças, convictos de que estamos trabalhando, como homens do Partido, pelo Partido e para o Partido, o que significa trabalhar pelos interesses vitais do nosso povo e para construir uma Pátria livre, forte e progressista.

O IV Congresso saberá cumprir o seu papel histórico, e dele sairá um Partido politicamente mais esclarecido, ideologicamente mais forte, com sua unidade consolidada e com maiores possibilidades de imediato desenvolvimento, um Partido realmente capaz de executar a sua tarefa precípua, que consiste em ganhar as grandes massas para as idéias do Programa e em forjar no fogo das lutas de massa a união de tôdas as forcas democráticas e patrióticas do país para a revolução antiimperialista e agrária antifeudal e a instauração do governo democrático de libertação nacional que faça do Programa do Partido o seu próprio programa.

Camaradas!

O Partido Comunista do Brasil aparece aos olhos de camadas cada vez mais amplas do nosso povo como o Partido que apresenta um Programa justo, como o Partido da verdade e da esperança — o Partido de Luiz Carlos Prestes. Para nós comunistas o Partido é tudo, é toda a nossa vida, a nossa carne, o nosso sangue, a nossa alma. É o Partido que soube organizar e pode realizar o IV Congresso — esta esplêndida assembléia democrática dos comunistas brasileiros.

E é sob o impulso criador e combativo do IV Congresso que havemos de marchar, daqui por diante, mais unidos e coesos que nunca pelo mesmo pensamento, a mesma vontade e a mesma disciplina, cada qual no seu posto, que é sempre um posto de honra, seja onde fôr, a cumprir com redobrado entusiasmo e coragem, com mais audácia, sempre mais audácia, a tarefa atribuída a cada um de nós.

Este Congresso é também uma batalha e o Programa do Partido é a sua bandeira de combate. A vitória está em nossas mãos. Será uma grande vitória do nosso Partido e do nosso povo.

Viva os Partidos Comunistas e Operários, nossos irmãos de outros países!

Viva o grande Partido  Comunista da União Soviética, modelo e guia dos Partidos Comunistas do mundo inteiro!

Viva o 37º aniversário da Grande Revolução Socialista de Outubro!

Viva o Partido Comunista do Brasil, que organiza e dirige as lutas do nosso povo pela independência nacional, pela democracia e pela paz!

Viva o IV Congresso do nosso Partido!

Em nome do Comitê Central, declaro aberto o IV Congresso do Partido Comunista do Brasil.


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Inclusão 12/11/2006