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UM DOS PRINCIPAIS meios de ação do sistema de escravização dos países da Europa Ocidental pelos monopólios americanos, criados em Washington, consiste em minar as posições desses países no mundo colonial. Foi prescrito aos aderentes do plano Marshall que assegurassem a famosa «liberdade de comércio», com «possibilidades iguais» para os monopolistas dos Estados Unidos, os quais afastam os países europeus de seus mercados tão vantajosos do ultramar.
Esta cláusula do plano Marshall assusta especialmente a Inglaterra, cujo Império é de há muito sua fonte de imensos recursos. As relações econômicas e os adiantamentos extra-econômicos operados nos países do Império, constituem de longa data a base mais importante do capitalismo inglês. Mas, também a passagem efetiva das possessões dos outros países da Europa (França, Holanda, Bélgica) para o alto patrocínio dos monopolistas americanos enfraquece imensamente estes países no domínio econômico e político.
A imprensa inglesa, comentando o famoso acordo bipartite sob o título de plano Marshall, foi obrigada a reconhecer que este acordo «abre amplamente as portas do Império aos interesses comerciais americanos». Será melhor dizer que a porta do Império britânico está completamente aberta à expansão americana.
Já no decorrer da guerra, os monopolistas americanos afastaram seus concorrentes ingleses de muitos mercados vantajosos. Desenvolveram especialmente em grande escala seu comércio com a Índia. Limitemo-nos a lembrar que, desde 1942, a exportação americana para esse país aumentou 9 vezes em relação a 1939.
Terminada a guerra, a Grã-Bretanha intensificou de forma considerável suas exportações em comparação ao valor anterior à guerra. O escoamento das mercadorias inglesas, porém, é inconcebível, em primeiro lugar, sem a importação de um certo contingente de produtos dos países coloniais e, em segundo lugar, sem uma política apropriada de créditos e investimentos. As cláusulas do plano Marshall permitem amplamente minar estas bases da exportação e, em conseqüência, a economia britânica em todo seu conjunto.
A política de Washington visa liberar a colocação para os produtos americanos no Império britânico. Para este efeito tomam-se medidas visando enfraquecer as relações econômicas entre a Inglaterra e seu Império. Alegam que o plano Marshall não deve, vejam só, servir para fornecer créditos aos países não europeus. É sob este pretexto que os monopólios americanos submetem ao seu pesado domínio as relações entre a Inglaterra e a zona da libra esterlina.
Esta circunstância inquieta os meios financeiros ingleses. A 19 de
maio, o «Times» notava sem qualquer entusiasmo que, para Harriman,
a zona esterlina e sua posição em relação ao programa de reerguimento europeu são um «problema» que deve ser «resolvido em comum».
Desde que se considera isto como um problema, dizia o jornal, quanto mais cedo se discutir, melhor. E mais adiante: :
«Criticando o uso que a Inglaterra fez do crédito em dólares, os americanos ressaltam sobretudo o fato de que a Inglaterra remeteu a maior parte dos dólares a outros, pagando suas dividas, e exportando capitais para outros países, da zona esterlina. Atualmente os Estados Unidos insistem seriamente para que os dólares recebidos a título do plano Marshall não sejam enviados, direta ou indiretamente, a outros, como foi feito antes».
Objetando a esta crítica americana, o órgão da City apontava um argumento muito original, isto é, que as restrições à conversão das libras em dólares para os países da zona esterlina podem levar a uma discriminação em relação à exportação americana!
«Além disso, prosseguia o «Times», os investimentos que asseguram o desenvolvimento dos outros países da zona esterlina contribuirão mais que os destinados ao desenvolvimento da Inglaterra propriamente dita para torná-la um país não dependente da ajuda em dólares. Toda a limitação sobre as transferências, para a zona do esterlino, dos dólares recebidos pelo Plano Marshall, pode, pois, ter conseqüências indesejáveis para os Estados Unidos».
Mas ao falar assim, por meias palavras, o jornal inglês se trai. Isto porque se advinha sem dificuldade que o enfraquecimento da Inglaterra não é absolutamente uma «conseqüência indesejável para a América». Antes ao contrário!
O imperialismo americano se considera antes de tudo como o herdeiro do Império britânico. Mas, por outro lado, não negligencia de modo nenhum as possessões coloniais dos outros países do Oeste europeu. O capital dos Estados Unidos penetra cada vez mais fundo na Indonésia, na Indochina, no Congo Belga. Eis, por exemplo, alguns dos algarismos referentes a este último país. A parte das exportações desta colônia para a metrópole caiu de 84% em 1949 para 63% em 1947, enquanto que sua exportação para os Estados Unidos, que atingia a 3,5% em 1939, elevou-se em 1947 a 17%. Ao mesmo tempo a América tornou-se o principal fornecedor do Congo Belga. A importação de produtos americanos para esta possessão colonial da Bélgica passou de 7% em 1939 para 38% em 1947 em relação ao valor total das importações. Quanto aos produtos belgas, a importação caiu de 48% em 1939 para 27% em 1947. É claro que o governo belga, que se atrelou já há muito tempo ao carro do imperialismo americano, não deixa de contribuir para este reforço das posições da América em sua colônia.
As colônias dos países da Europa Ocidental atraem a atenção dos imperialistas do outro lado do Atlântico não só como mercados onde podem esvaziar, a elevados preços, seu armário de quinquilharias, mas ainda como bases estratégicas e fontes de matérias primas.
Em novembro de 1947 foram publicados muitos relatórios da «comissão especial da Câmara, dos Representantes para a ajuda aos países estrangeiros», chamada comissão Herter. Estes documentos mostram, em principio, que os países participantes do plano Marshall devem remediar «ao esgotamento das riquezas naturais americanas». Era previsto o envio aos Estados Unidos de «metais e minerais estratégicos», cujas jazidas existem especialmente nos «territórios coloniais controlados pelos países da Europa Ocidental».
Os documentos da comissão Herter vão até à previsão:
«No caso em que seja inoportuno, por razões políticas ou outras, tentar obter diretamente direitos sobre os minerais, uma combinação do capital particular americano posto a serviço da valorização, sob uma garantia governamental parcial, e de entregas destinadas à constituição de estoques, poderia permitir o reembolso em grande parte de certos empréstimos concedidos sob o plano Marshall, e poderia também assegurar o pagamento dos juros dos empréstimos anteriores».
Por outras palavras, as colônias, com suas reservas de matérias primas estratégicas, deviam formar uma espécie de penhor colocado pelos devedores da Europa à disposição dos usurários americanos.
Um relatório da mesma comissão indicava o que os Estados Unidos deviam receber em primeiro lugar, da França, da Bélgica e da Holanda: 20.000 toneladas de chumbo, 30.000 toneladas de zinco, 2.000 toneladas de cobalto, 15.000 toneladas de cromite, 20.000 toneladas de cobre, 2.500 toneladas de estanho, 50.000 toneladas de bauxita.
É sabido que as frases sobre o pretenso esgotamento das riquezas naturais da América servem sempre para mascarar as tentativas dos magnatas do dólar em seu avanço sobre as fontes de matérias primas dos outros. Devemos lembrar as demagogias periódicas a respeito do esgotamento dos recursos petrolíferos dos Estados Unidos. Na realidade, o capital americano procura monopolizar em suas mãos as fontes das matérias primas mais importantes e principalmente as estratégicas.
Por exemplo, a política de Washington tende abertamente a monopolizar as reservas de urânio. Assim, o «Daily Express» de Londres podia colocar num dos seus recentes artigos o seguinte título: «Os Estados Unidos pretendem absorver o mineral de Urânio». E passava a relatar: «toneladas de mineral de urânio do qual não pôde utilizar senão uma décima parte para a fabricação de bombas atômicas ou experiências».
Trata-se pois, de um lado, do acúmulo dos estoques desta importante matéria prima e, por outro lado, de uma tentativa de monopolizar suas reservas para que não possam cair nas mãos de outros países. Este jornal notava que o Congo belga e o Canadá são os principais fornecedores do mineral de urânio para os Estados Unidos.
Desta forma, estamos em presença de uma situação bastante paradoxal. As potências coloniais da Europa, que os americanos ajudam por meio de seus fornecimentos de armamentos e pela diplomacia dos «bons serviços», fazem a guerra de rapina nas colônias, embora seus «protetores» de Washington tirem para si todos os pedaços mais saborosos da economia dos países coloniais. As potências européias tiram as castanhas do fogo para os que se nomearam os tutores. Por sua conduta, as metrópoles da Europa se desacreditam ainda mais aos olhos dos povos coloniais, enquanto que os maestros da América procuram ficar na sombra. Mas a linguagem dos tanques e aviões americanos é bem mais eloqüente que as afirmações amáveis dos diplomatas. O plano Marshall leva aos povos das colônias e dos paises dependentes uma dupla escravidão: ao regime colonial das potências européias alia-se a pressão da exploração americana.
Inclusão | 28/03/2008 |