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A actividade política de L. D. Trotsky remonta aos últimos anos do século passado. Mas foi apenas em 1902 que travou conhecimento pessoal com Lenine, em Londres. Este último tentou utilizar Trotsky, como o fazia com todos os jovens militantes, no interesse do movimento revolucionário. Foi assim que o fez colaborar durante algum tempo na Iskra, Órgão Central do Partido, então sob a direcção de um comité de redação que compreendia, além de Lenine, Plekhanov, Axelrod, Potressov e Vera Zassoulitch.
Quando, no II Congresso do POSDR (Londres, 1903), rebentaram as primeiras divergências profundas entre os sociais-democratas revolucionários (bolcheviques) e os oportunistas (mencheviques) sobre a questão dos estatutos do Partido, que deviam no fundo definir a verdadeira natureza do Partido do proletariado, Trotsky enfileirou no campo dos oportunistas de direita.
Enquanto Lenine propunha um projecto de programa do Partido que punha à frente, fato único na II Internacional, a palavra de ordem da ditadura do proletariado, Trotsky pronunciou-se contra Lenine e defendeu uma tese segundo a qual a ditadura do proletariado só era possível no dia em que a classe operária e o Partido «se tivessem tornado quase, idênticos», em que o proletariado constituísse a maioria da população e os socialistas pudessem conquistar pacificamente a maioria parlamentar.
Os estatutos propostos por Lenine tinham por objectivo criar um Partido de um tipo novo, homogéneo e combativo. Para se ser nele admitido, não bastava, de forma alguma, aceitar o seu programa e pagar as quotas, mas, e sobretudo, militar na prática numa das organizações de base. Foi contra este último ponto, que fechava a porta do Partido aos elementos hesitantes, pouco firmes, que se levantaram todos os oportunistas, entre os quais, Trotsky. Na passagem a seguir, Lenine refuta certos argumentos de Trotsky, mostra a sua debilidade e o seu carácter anti-marxista. Trotsky tinha declarado nomeadamente:
«Não sabia que era possível combater o oportunismo por meio de estatutos... Não atribuo aos estatutos uma importância mística!»
Entre estas considerações destinadas a justificar a fórmula de Martov(1), é preciso destacar a frase em que Trotsky declara que o oportunismo tem causas muito mais complexas (ou muito mais profundas) do que este ou aquele ponto dos estatutos, que deriva da diferença de desenvolvimento da democracia burguesa e do proletariado... Não se trata de saber se os pontos dos estatutos podem criar o oportunismo, trata-se de forjar, com estes pontos, uma arma mais ou menos eficaz contra o oportunismo. Quanto mais profundas forem as causas do oportunismo, tanto mais cortante deve ser esta arma. É por isso que justificar pelas causas profundas do oportunismo a fórmula que lhe abre a porta, é simplesmente pôr-se do lado dos «seguidistas». Quando Trotsky estava contra Liber, compreendia que os estatutos são como a «desconfiança organizada» da vanguarda contra a retaguarda; mas quando se viu do lado de Liber, esqueceu as suas declarações e pôs-se a justificar por «razões complexas», pelo nível de desenvolvimento do proletariado, o fato desta desconfiança estar entre nós fracamente organizada.
Eis ainda outro argumento de Trotsky:
É muito mais fácil para os Jovens intelectuais organizados de uma ou de outra forma inscreverem-se nas listas do Partido.
De fato, e é justamente por isso, que esta fórmula, em virtude da qual elementos mesmo não organizados se declaram membros do Partido, está impregnada de amorfismo intelectualista, contrariamente à minha que recusa a esses elementos o direito de «se inscrever nas listas do Partido».
Trotsky diz que se o CC «não reconhece» as organizações dos oportunistas, é apenas devido ao carácter das pessoas, mas que sendo estas pessoas conhecidas como individualidades políticas, deixam de ser perigosas e podem ser eliminadas pelo boicote do Partido. Isto não é verdade senão para os casos em que é preciso eliminar do Partido (e ainda neste caso é apenas meia verdade, porque um partido organizado elimina por um voto e não pelo boicote). Mas isso é completamente falso para os casos muito mais frequentes em que seria estúpido eliminar e é necessário apenas controlar. Em certas condições, o CC pode incluir intencionalmente no Partido uma organização não completamente segura, mas capaz de trabalhar, para experimentá-la, para tentar dirigi-la no bom caminho, para paralisar os seus desvios parciais, etc. Uma tal admissão não é perigosa, desde que não se permita às organizações «inscreverem-se» elas próprias «nas listas do Partido». Muitas vezes, será mesmo útil para o esclarecimento de pontos de vista errados ou de uma táctica falsa.
Mas se as normas jurídicas devem corresponder às relações reais, a fórmula de Lenine deve ser rejeitada, declara mais à frente Trotsky. Aí também, ele fala como oportunista. As relações reais não são imutáveis; vivem e desenvolvem-se. As normas jurídicas podem corresponder ao desenvolvimento progressivo destas relações, mas podem também (se forem más) corresponder a uma regressão ou a uma paragem no desenvolvimento. Este último caso é o de Martov.
Maio de 1904.
V. I. Lenine: «Um passo em frente, dois passos atrás».
Obras comptetas. tomo VI, pp. 216-217, ed. r.
Notas de rodapé:
(1) Os estatutos da Martov (menchevique), que apenas pediam aos aderentes o reconhecimento do programa do Partido, o seu apoio financeiro, abriam a porta do Partido a todos os elementos instáveis, não proletários, propensos ao oportunismo (nota da edição francesa). (retornar ao texto)
Fonte |
Inclusão | 01/03/2014 |