MIA > Biblioteca > Stálin > Novidades
Camaradas:
Acho que Sémich não compreendeu inteiramente a essência fundamental do problema nacional, tal como o formulam os bolcheviques. Os bolcheviques nunca separaram, nem antes nem depois de Outubro, o problema nacional do problema geral da revolução. A essência fundamental da atitude bolchevique diante do problema nacional consiste em que os bolcheviques sempre consideraram o problema nacional em conexão indissolúvel com a perspectiva revolucionária.
Sémich citou Lênin, dizendo que este era partidário de que se fixasse, na Constituição, determinada solução do problema nacional. É evidente que, com isso, Sémich queria dizer que, a seu ver, Lênin considerava o problema nacional como um problema constitucional, isto é, não como um problema da revolução , mas como um problema de reformas. Isso é inteiramente falso. Lênin nunca alimentou nem podia alimentar ilusões constitucionais. Basta analisar as suas obras para nos convencermos disto. Se Lênin falava em Constituição, referia-se não ao meio constitucional de resolver o problema nacional, mas ao meio revolucionário, isto é, considerava a Constituição como um resultado da vitória da revolução. Na URSS também possuímos uma Constituição, que reflete determinada solução do problema nacional. Entretanto, essa Constituição saiu à luz, não como resultado de um acordo com a burguesia, mas como resultado da revolução triunfante.
Mais adiante, Sémich recorre ao conhecido folheto de Stálin sobre o problema nacional, escrito em 1912, procurando encontrar nele uma confirmação, mesmo indireta, da sua argumentação. Mas essa referência resultou estéril, uma vez que não encontrou nem podia encontrar nem citações nem sequer vagas alusões que justificassem, por pouco que fosse, a sua atitude “constitucional” diante do problema nacional. Em apoio a isso, posso recordar a Sémich determinado trecho do folheto de Stálin, em que opõe ao método austríaco de resolver o problema nacional (constitucional) o método dos marxistas russos (revolucionário) .
Vejamos o trecho:
"Os austríacos pretendem realizar a “liberdade das nacionalidades” mediante pequenas reformas, a passo lento. Propondo a autonomia nacional como medida prática, não contam para nada com transformações radicais, com um movimento democrático de libertação, que eles não têm em perspectiva. De outro lado, os marxistas russos relacionam o problema da “liberdade das nacionalidades” com prováveis transformações radicais, com o movimento democrático de libertação, não tendo razões pata contar com reformas. E isso muda essencialmente a questão, no que se refere aos prováveis destinos das nações na Rússia".
Parece que está claro.
Esse não é o ponto de vista pessoal de Stálin, mas o ponto de vista geral dos marxistas russos, que consideravam e consideram o problema nacional em conexão indissolúvel com o problema geral da revolução.
Sem forçar a coisa, pode-se dizer que, na história do marxismo russo, a formulação do problema nacional passou por duas etapas: a primeira é a de antes de Outubro; a segunda, a de Outubro. Na primeira etapa, o problema nacional era considerado como parte do problema geral da revolução democrático-burguesa, isto é, como parte do problema da ditadura do proletariado e dos camponeses. Na segunda etapa, quando o problema nacional se ampliou e se converteu no problema das colônias, quando de problema estatal interno se converteu em problema mundial, o problema nacional já era considerado como parte do problema geral da revolução proletária, como parte do problema da ditadura do proletariado. Como vedes, tanto em um caso como em outro, a atitude diante desse problema era profundamente revolucionária.
Acho que Sémich não compreendeu inteiramente tudo isso. Daí as suas tentativas para fazer descer o problema nacional ao terreno constitucional, isto é, para considerá-lo como um problema de reformas.
Desse erro parte seu segundo erro, que consiste em não querer considerar o problema nacional como um problema camponês em essência. Não agrário, mas camponês, que são duas coisas diferentes. É inteiramente certo que não se pode identificar o problema nacional com o problema camponês, uma vez que o problema nacional compreende, além dos problemas camponeses, os problemas da cultura nacional, da vida estatal nacional, etc. Mas está igualmente fora de dúvida que o problema camponês constitui, apesar de tudo, o fundo do problema nacional, a sua essência interior. Isso é o que explica precisamente que os camponeses representem o exército básico do movimento nacional e que sem um exército camponês não existe nem pode existir um vigoroso movimento nacional. É precisamente isso que se tem em consideração quando se diz que o problema nacional é, em essência, um problema camponês. Acho que na negativa de Sémich de aceitar essa fórmula estão implícitos o menosprezo da fôrça interior do movimento nacional e a incompreensão de seu caráter profundamente popular e profundamente revolucionário. Essa incompreensão e esse menosprezo constituem grave perigo, uma vez que representam, na prática, o menosprezo das fôrças potenciais internas que encerra, tomemos como exemplo, o movimento dos croatas por sua independência nacional, menosprezo pejado de graves complicações para todo o Partido Comunista iugoslavo.
Nisso consiste o segundo erro de Sémich.
É indubitável que também deve ser considerada a tentativa de Sémich de tratar o problema nacional na Iugoslávia fora de suas conexões com a situação internacional e com as prováveis perspectivas na Europa. Partindo do fato de que, no momento presente, não existe um importante movimento popular pela independência entre os croatas e os eslovenos, Sémich chega à conclusão de que o problema do direito das nações à separação é coisa acadêmica ou, pelo menos, destituída de atualidade. Naturalmente, isso é falso. Se admitimos que esse problema não é de atualidade no presente momento, pode converter-se, entretanto, em problema de toda atualidade se começa a guerra ou quando essa começar, se a revolução se desencadeia na Europa ou quando ela se desencadear. E se temos em conta a natureza e o desenvolvimento do imperialismo, não cabe a menor dúvida de que a guerra tem de começar inevitavelmente e de que eles vão lutar aí, forçosamente.
Em 1912, quando nós, os marxistas russos, elaborávamos o primeiro projeto de programa nacional, ainda não tínhamos, em qualquer das regiões periféricas do Império russo, um movimento de importância a favor da independência. Entretanto, consideramos necessário incluir em nosso programa o ponto referente ao direito das nações à autodeterminação, isto é, o direito de cada nacionalidade separar-se e ter uma vida estatal independente. Por que? Porque não somente partíamos do que existia naquele momento, mas também do que se desenvolvia e se avizinhava no sistema geral das relações internacionais, isto é, tínhamos em conta, naquela ocasião, não apenas o presente, mas igualmente o futuro. E sabíamos que, se qualquer nacionalidade exigisse a separação, os marxistas russos lutariam por conseguir que fosse assegurado o direito de separação a toda nacionalidade que o exigisse. Em seu discurso, Sémich recorreu repetidas vezes ao folheto de Stálin sobre o problema nacional. Eis o que se diz nesse folheto de Stálin a respeito da autodeterminação e da independência:
"O desenvolvimento do imperialismo na Europa não é um fenômeno casual. Na Europa, o capital começa a sentir-se constrangido e luta por escapar para países estrangeiros, buscando novos mercados, mão-de-obra barata, novas bases de inversão. Mas isso conduz a complicações exteriores e a guerras. Cabe perfeitamente dentro do possível que se dê uma combinação de circunstâncias internas e externas, na qual uma ou outra nacionalidade da Rússia considere necessário formular e resolver o problema da sua independência. E, naturalmente, não hão de ser os marxistas que criarão obstáculos em tais casos."
Isso foi escrito em 1912. Como sabeis, essa tese se viu plenamente confirmada mais tarde, tanto durante a guerra como depois dela, particularmente depois do triunfo da ditadura do proletariado na Rússia.
Com tanto mais razão essas possibilidades devem ser levadas em consideração na Europa em geral e na Iugoslávia em particular, sobretudo agora, depois da acentuação do movimento nacional-revolucionário nos países oprimidos e depois do triunfo da revolução na Rússia. Cumpre ser tomada também em consideração a circunstância de que a Iugoslávia é um país não de todo independente, que está ligado a determinadas coalizões imperialistas e que, por conseguinte, não se pode afastar do grande conjunto de fôrças organizado fora da Iugoslávia. E se elaborais o programa nacional para o Partido iugoslavo — e, no caso presente, trata-se precisamente disso —, é necessário recordar que o programa deve basear-se não somente no que existe no presente momento, mas também no que se encontre em processo de desenvolvimento e acontecerá inevitavelmente em virtude das relações internacionais. Eis a razão pela qual acho que o problema do direito das nações à autodeterminação deve ser considerado como um problema de palpitante atualidade.
Falemos agora sobre o problema nacional. O ponto de partida do programa nacional deve ser a tese relativa à revolução soviética na Iugoslávia, a tese de que, sem a derrocada da burguesia e a vitória da revolução, o problema nacional não pode ser resolvido de modo algum, da maneira menos satisfatória que seja. Naturalmente, pode haver exceções. Uma exceção dessas verificou-se, por exemplo, antes da guerra, ao separar-se a Noruega da Suécia, coisa a respeito da qual Lênin fala detidamente em um de seus artigos. Mas isso aconteceu antes da guerra e com uma coincidência excepcional de circunstâncias favoráveis. Depois da guerra, e particularmente depois do triunfo da revolução soviética na Rússia, somente podem dar-se casos como esse. Entretanto, as probabilidades favoráveis para isso são tão poucas que podem ser consideradas iguais a zero. Mas se assim é, não podemos, evidentemente, elaborar o programa na base de grandezas cujo valor seja igual a zero. Eis a razão pela qual a tese da revolução deve constituir o ponto de partida do programa nacional.
Ademais, cumpre ser incluído obrigatoriamente no programa nacional um ponto especial referente ao direito das nações à autodeterminação, chegando também à separação estatal. Já indiquei linhas atrás a razão pela qual, nas atuais circunstâncias internas e internacionais, não podemos passar sem esse ponto.
Finalmente, deve haver no programa igualmente um ponto especial sobre a autonomia nacional territorial para as nacionalidades da Iugoslávia que não considerem necessário separar-se da Iugoslávia. Não têm razão os que acham que se deve excluir tal dispositivo. Isso é falso. Em determinadas condições, como resultado do triunfo da revolução soviética na Iugoslávia, é bem possível que as nacionalidades não pretendam separar-se, como aconteceu aqui na Rússia. Compreende-se que, para tais casos, seja necessário ter-se no programa um ponto referente à autonomia, admitindo uma transformação do Estado iugoslavo em federação de Estados nacionais autônomos, na base do regime soviético.
Em conclusão: direito de separação para as nacionalidades que queiram separar-se e direito de autonomia para as nacionalidades que prefiram permanecer nos limites do Estado iugoslavo.
Para evitar equívocos, devo dizer que o direito de separação não deve ser interpretado como dever, como obrigação de separar-se. Uma nacionalidade pode utilizar tal direito no sentido da separação, ou pode não o utilizar; e se não o deseja, é coisa que lhe diz respeito e não podemos deixar de tomá-lo em consideração. Alguns camaradas convertem o direito de separação em obrigação, exigindo, por exemplo, que os croatas se separem de qualquer maneira. Essa posição é falsa e deve ser combatida. Não se deve confundir direito com obrigação.
Inclusão | 08/02/2013 |