É Preciso Boicotar a Conferência!(1)

J. V. Stálin

20 de Setembro de 1907


Primeira Edição: “Gudók” (“A Sirena”), (54) n.° 4. 20 de setembro de 1907.
Fonte:J.V. Stálin – Obras – 2º vol., pág: 86-91, Editorial Vitória, 1952 – traduzida da 2ª edição italiana G. V. Stalin - "Opere Complete", vol. 2 - Edizioni Rinascita, Roma, 1951.
Tradução: Editorial Vitória
Transcrição: Partido Comunista Revolucionário
HTML: Fernando A. S. Araújo
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O problema da participação na conferência dos industriais do petróleo não é para nós uma questão de princípio, mas de oportunidade prática. Não podemos boicotar de uma vez por todas qualquer conferência que seja, como nos propõem fazê-lo alguns “indivíduos” irritadiços e não de todo normais. E, por outro lado, não podemos decidir de uma vez por todas a questão a favor da participação na conferência, como chegam a fazer os nossos camaradas cadetizantes. Devemos enfrentar a questão da participação e da boicotagem com base nos fatos reais e somente nos fatos. Poderia resultar neste caso que, dados determinados fatos e determinadas circunstâncias, nossa tarefa de unir as massas leve à conclusão de que a participação é necessária, e deveremos então positivamente intervir na conferência. E, vice-versa, dadas outras circunstâncias, a mesma tarefa pode levar à conclusão de que é necessário o boicote, e deveremos então positivamente boicotar a conferência.

Além disso, para evitar a confusão, devemos estabelecer com antecedência os princípios segundo os quais operamos. Que significa “participar” da conferência? Que significa “boicotá-la”? Se nós, formulando reivindicações gerais nas assembleias, elegendo os delegados, etc., etc., não nos propomos o objetivo de fazer fracassar a conferência, mas, pelo contrário, vamos à conferência, aceitamos-lhe o regulamento, valemo-nos dela para efetuar negociações com os industriais do petróleo, com o objetivo de chegar afinal de contas a este ou àquele contrato, deveremos chamar essa nossa atitude de participação na conferência. Mas se nós, elaborando as reivindicações, elegendo os delegados que as formulem do melhor modo, popularizando em público as reivindicações já elaboradas, não nos propomos a tarefa de participar dos trabalhos da conferência com os industriais do petróleo, mas de fazer fracassar a própria conferência, de fazer fracassar qualquer contrato com esses industriais antes da luta (consideramos necessário um contrato após a luta, particularmente após uma luta vitoriosa), essa nossa atitude deve ser chamada boicote da conferência, boicote, compreende-se, ativo, uma vez que termina com o malogro da conferência.

Em nenhum caso, porém, deve-se confundir a tática baseada nos antagonismos da Duma com a tática baseada nos antagonismos da conferência, A participação na conferência ou a sua boicotagem tem por finalidade preparar as condições para um melhoramento de determinados regulamentos vigentes nos poços, ao passo que a participação ou o boicote da Duma têm por finalidade melhorar as condições gerais no país. Os destinos da conferência são determinados exclusivamente pelo proletariado de uma dada localidade, porque sem a participação desse proletariado a conferência cai por si; ao invés, os destinos da participação na Duma ou seu boicote não são determinados pelo proletariado sozinho, mas também pelo campesinato. Enfim, o boicote (malogro) da conferência pode facilmente vir a tornar-se ativo, mesmo que não seja dirigido ativamente, ao passo que, sob essa condição, não se poderia dizer que o boicote da Duma daria os mesmos resultados.

Após estas observações gerais, passemos à questão concreta do boicote da conferência iminente.

A história da luta econômica dos operários de Baku pode ser dividida em dois períodos.

O primeiro período é o da luta prolongada até estes últimos tempos, o período em que os operários das oficinas desempenhavam um papel de primeiro plano, e os operários dos poços seguiam simplesmente e com confiança, como são seguidos os próprios chefes, os operários das oficinas; em que os operários dos poços não eram cônscios de sua grande importância, de sua função na produção. A tática dos industriais do petróleo nesse período podia ser qualificada como a tática do namoro com os operários das oficinas, de fazer-lhes sistematicamente concessões e de ignorar na mesma proporção, sistematicamente, os operários dos poços.

O segundo período abre-se com o despertar dos operários dos poços, que entram em cena por sua iniciativa, ao passo que os operários das oficinas são relegados a segundo plano. Ademais, essa estreia tem um caráter extremamente grotesco, porque: 1.°) — não vai além das gratificações humilhantes e, 2.°) — toma os matizes da mais perniciosa desconfiança contra os operários das oficinas. Os industriais do petróleo procuram explorar a situação modificada e mudam de tática. Já não mais cortejam os operários das oficinas, já não mais procuram alisá-los, porque sabem muito bem que nem sempre, hoje, os operários dos poços os seguem; antes, procuram provocar a greve dos operários das oficinas independentemente dos operários dos poços, para demonstrar aos primeiros a sua relativa impotência e torná-los dóceis. Paralelamente, os industriais do petróleo, que primeiro não prestavam nenhuma atenção aos operários dos poços, hoje os namoram da maneira mais descarada, oferecendo gratificações. Procuram dessa maneira dividir definitivamente os operários dos poços dos das oficinas, corrompê-los a fundo, inocular-lhes a confiança servil nos patrões, substituir o princípio da luta inconciliável pelo “princípio” da mercantilagem e da pedincharia, próprio de lacaios e, assim, impedir qualquer melhoria séria.

Exatamente para esses fim foi “excogitada” a próxima conferência.

Pelo exposto acima é evidente que os camaradas mais avançados têm a tarefa imediata de dirigir uma luta obstinada em prol dos operários dos poços, a luta para agrupar esses operários em torno de seus companheiros, os operários das oficinas, infundindo em sua consciência uma ilimitada desconfiança das manobras dos industriais do petróleo, erradicando do seu cérebro os preconceitos prejudiciais da mercantilagem e da pedincharia. À massa dos operários dos poços, que entram pela primeira vez em cena, e além disso de maneira tão ingênua e grotesca (“bakchich”(2), etc.), devemos dizer em voz alta, decididamente, (dizê-lo com os fatos e não somente com as palavras!) que as melhorias das condições de vida não se obtêm de cima e mercadejando, mas de baixo, através da luta comum, juntamente com os operários das oficinas.

Somente tendo presente essa tarefa, podemos resolver de modo justo o problema da conferência.

E eis o que pensamos: participar da conferência iminente, apelar para a colaboração entre os industriais do petróleo e os operários para a elaboração de um contrato obrigatório, hoje, antes da luta geral, enquanto a luta parcial continua, enquanto não se chegou ainda à luta geral e os industriais do petróleo distribuem gratificações à direita e à esquerda, separando os operários dos poços dos das oficinas e corrompendo sua jovem consciência, “marchar para a conferência” neste momento não significa desarraigar, mas reforçar nos cérebros das massas os preconceitos dos “bakchich”; significa inculcar na consciência das massas não a desconfiança mas a confiança nos industriais do petróleo. Não significa agrupar os operários dos poços em torno dos das oficinas e aproximá-los destes últimos, mas abandoná-los temporariamente, jogá-los nas garras dos capitalistas.

Naturalmente, “há males que vêm para bem”: a conferência poderia neste momento ter uma certa utilidade para organizar, para “ampliar a luta”, como diz o camarada Kotchegar(3). Mas, uma vez que o dano que causaria a conferência supera indubitavelmente aquela certa utilidade, é preciso desembaraçar-se completamente da conferência, como de destroços inúteis. Mas, se o camarada Kotchegar “vai à conferência” sobretudo porque ela “organiza” e “amplia a luta”, não se compreende verdadeiramente por que então não “se vá a ela” justamente durante o ascenso, nas vésperas da luta geral, no início da luta que se está organizando. Que há a temer? Não é talvez então particularmente necessária a “organização geral”, a “ampliação da luta”? Então, não deverá talvez a massa manter-se firme, mais do que nunca, e não ceder às concessões de cima? Mas o problema está exatamente nisto: eleger os delegados não significa ainda organizar a massa. O fato é que organizar (no nosso sentido e não no sentido de Gapon) significa antes de mais nada desenvolver a consciência da contradição inconciliável existente entre os capitalistas e os operários. É claro que, se houvesse tal consciência, o resto viria por si.

É exatamente isso que a conferência iminente não pode dar.

Por essas considerações, a única tática que corresponde à nossa tarefa, nas condições atuais, só pode ser a tática do boicote da conferência.

A tática do boicote desenvolve da melhor maneira a consciência de que entre os operários e os industriais do petróleo existe uma contradição inconciliável.

A tática do boicote, abalando os preconceitos dos “bakchich” e separando os operários dos poços dos industriais do petróleo, agrupa-os em torno dos operários das oficinas.

A tática do boicote, fazendo nascer a desconfiança contra os industriais do petróleo, põe em relevo, da melhor maneira, perante as massas, a necessidade da luta, como único meio para a melhoria das condições de vida.

Devemos, pois, iniciar a campanha do boicote: organizar assembleias de oficina, elaborar reivindicações, eleger delegados para que formulem melhor as reivindicações gerais, difundir essas reivindicações por meio da imprensa, explicá-las, apresentá-las ainda uma vez às massas para que a sancionem definitivamente, etc., etc.; devemos fazer tudo isso em nome da palavra de ordem do boicote e assim, após haver tornado populares as reivindicações gerais e utilizado as “possibilidades legais”, boicotar a conferência, torná-la objeto de chacota e pôr ao mesmo tempo em relevo a necessidade da luta pelas reivindicações gerais.

É preciso, pois, boicotar a conferência!

Assinado: Ko...


Notas de fim de tomo:

(1) O artigo foi escrito quando se lançou a proposta no sentido de convocar uma conferência dos industriais do petróleo com os representantes dos operários. A tática do boicote da conferência, adotada então pelos bolcheviques, encontrou uma ampla aceitação entre as massas operárias. De 10 de outubro a 1.° de novembro de 1907 realizaram-se, nas oficinas e junto aos poços, assembleias nas quais se discutiu a questão. Dois terços dos operários pronunciaram-se contra a participação na conferência. Os mencheviques, que desejavam a todo custo nela tomar parte, foram derrotados. (retornar ao texto)

(2) Bakchich (literalmente, presente), pequenas esmolas sob a forma de gratificações distribuídas à larga pelos indus­triais do petróleo com o objetivo de desviar os operários da luta política e de cindir o movimento operário. (retornar ao texto)

(3) Kotchegar, pseudônimo de I. Svitikov (Samartsev), editor e redator oficial do Gudók. (retornar ao texto)

Transcrição
pcr
Inclusão 19/10/2019