Militantes Palestinianos Acusam:
"Sharon é o Pai do Terrorismo"

Entrevista por Francisco Martins Rodrigues


Primeira Edição: ....

Fonte: Francisco Martins Rodrigues Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.


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Mahmoud Jiddah e Ala Jaradat, da FPLP

Durante o Encontro Internacionalista promovido pelo Batasuna no País Basco, em Junho, entrevistei dois membros da delegação da Frente Popular de Libertação da Palestina, Mahmoud Jiddah, de 56 anos, e Ala Jaradat, de 35 anos.

A imprensa apresenta agora Ariel Sharon como sinceramente desejoso de paz, mas colocado entre dois fogos: os extremistas sionistas dum lado, os extremistas palestinianos do outro. Queres comentar?

A. J. — Apresentar Sharon como um negociador entre dois fogos é inteiramente falso. Ele prossegue a política de assassinato dos palestinianos, de lhes confiscar as terras, de os cercar com o muro do apartheid. Quer convencer a opinião pública internacional de que não consegue controlar os seus “civis” extremistas. Mas os colonos não são simples civis, são militantes sionistas que cumprem a missão de alargar a ocupação.

Os media nunca dizem a verdade sobre a Palestina e muito menos sobre os combatentes da resistência. Ora nos apresentam como rebeldes sem moral, terroristas, ora como uma força comparável à maciça repressão israelita. Infelizmente há na Europa muitos que acreditam. A verdade é que os palestinianos não desperdiçaram uma única possibilidade de se encontrar uma solução política para a ocupação foram os palestinianos que tomaram a iniciativa de declarar o cessar-fogo.

Mas Israel está a libertar prisioneiros palestinianos...

A. J. — Sharon fez grande propaganda em torno da libertação de 398 prisioneiros palestinianos. Não disse que muitos deles nunca chegaram a ser acusados nem julgados. Dou-te um exemplo: um dos que foram condenados por “terrorismo” tinha visto um programa num vídeo acerca da resistência palestiniana! Nem sequer era militante! Sharon também não diz que desde fins de Fevereiro já foram presos mais 700 palestinianos. Soltaram 400, prenderam 700! Só nos dois dias a seguir ao anúncio da “medida de clemência”, prenderam 150.

Mahmoud, queres falar-nos da situação que conheceste nas prisões durante os 20 anos que lá passaste?

M. J. — É uma longa história. Fui preso em 1968. Fui torturado: espancamentos prolongados, até perder os sentidos, privação do sono, o shabeb... Havia médicos que vinham acompanhar a tortura. Não desejo a ninguém aquilo por que passei, nem mesmo aos que me torturaram. A tortura nas prisões não é uma excepção, é a regra. Talvez não saibas que Israel é o único Estado do mundo que legalizou a tortura. Mesmo depois da decisão em contrário, do Supremo Tribunal de Israel, em 1999, a tortura continua a ser praticada. Há registo de 70 presos mortos devido a torturas. Porque não fala disto a imprensa ocidental?

Depois de condenado, o teu regime prisional atenuou-se?

M. J. — Fiquei anos numa cela, onde só havia um catre com uma manta. O dia começa pelo conto: levantas-te, arranjas a cama, sentas-te no chão da cela, num sítio onde o guarda te veja. Esperas a vez para ir fazer as necessidades. A comida, miserável. Estive numa prisão em que havia recreio. Levavam-nos para o pátio, andávamos à volta, formados dois a dois, em silêncio, meia hora de manhã, outra meia hora à tarde. Passei anos sem me serem autorizadas visitas da família. As cartas para a família eram só “Olá pai, mãe, estou bem, adeus”. Uma carta da família pode demorar meses a chegar-te à mão. Os carcereiros têm poder absoluto sobre os presos. Qualquer reclamação dá direito a castigo no segredo. Somos prisioneiros de guerra, tratam-nos como criminosos.

A vossa luta vai continuar, apesar das acusações de “terrorismo”?

M. J. — Sharon é que é o pai do terrorismo. Faz propaganda de que vai desmantelar os colonatos em Gaza para desviar as atenções do roubo de terras que prossegue na Cisjordânia com o avanço do Muro e a construção acelerada de mais colonatos. Mata palestinianos impunemente. Prossegue o objectivo estratégico de Israel: escorraçar os palestinianos, reduzir os que ficarem à situação de servidão. A paz e a segurança nunca estarão garantidas enquanto continuar este tratamento brutal sobre o nosso povo.


Inclusão 21/08/2019