Cartas

Francisco Martins Rodrigues


Cartas a PA


Carta 1
22/11/1984

Amigo A.

Não tenho recebido notícias tuas e não sei se me conseguiste obter alguns dos livros que te tinha pedido, é natural que as tuas ocupações não te deixem tempo para respirar, mas temos que procurar manter contacto.

Tenho uma novidade que não sei como receberás, saí do PC(R) ontem mesmo, outros camaradas, entre eles o ZB e o JME, antigos dirigentes do partido, também saíram ou foram demitidos. Não foi uma decisão leviana, como calculas, mas fomos forçados a ela pela campanha de perseguições a que vínhamos sendo sujeitos desde há ano e meio. O conflito gira à volta de nós exigirmos que se levasse à prática a viragem à esquerda decidida pelo 4º congresso, de Março 83, e o CC estar a encostar-se cada vez mais aos elementos direitistas. Actualmente, todos os elementos "esquerdistas" estavam metidos em células de base, marginalizados e sujeitos a uma série de ataques. Já não nos davam o mínimo espaço para travar uma luta interna, os atropelos ao centralismo democrático por parte do CC eram diários e, em nome do perigo de fraccionismo, impunham-se as proibições mais absurdas à discussão, mesmo só dentro das células.

Lima das coisas que mais contribuiu para a agudização do conflito era um estudo que tenho andado a fazer sobre o 7º congresso da IC, reavaliando o relatório de Dimitrov e a linha de Staline nos anos 30-50 como fontes donde nasceu o revisionismo. Consegui acabá-lo, com grande dificuldade, e ontem mesmo o entreguei ao CC, para ver se é capaz de o criticar com o mínima de seriedade. É absurdo tentar congelar a crítica rnarxista-leninista em nome dos "princípios", como vem fazendo o CC. Está a conduzir o PC(R) a um definhamento desastroso, no que têm graves responsabilidades, na minha opinião, o PTA e o PC do Brasil.

Gostaria que lesses o meu estudo e me desses uma opinião. Eu e outros camaradas que se afastaram ou foram afastados neste processo estamos dispostos a dar corpo organizada à nossa corrente de ideias. Somos marxistas-leninistas, queremos um partido comunista em Portugal e não nos resignamos à confusão, impotência e esvaziamento de ideias a que se chegou. A acusação de "anarco-trotskismo" que nos é feita não tem pés nem cabeça.

Gostaria de saber o que pensas disto tudo e se estás disposto a continuar a corresponder-te comigo, Isso depende naturalmente da tua atitude face ao PC(R). Poderias dar opinião sobre o meu estudo e outros materiais que temos em preparação, obteres aí livros e jornais, dares-nos contactos para grupas ou organizações estrangeiras, contactares camaradas da emigração, etc. Duma coisa te posso dar a certeza; vamos fazer um trabalho sério para renovar a corrente marxista-leninista, crítico, revolucionário, e virado para os operários avançados. Vamos fazer um trabalho preparatório para reorganizar o partido comunista no nosso país.

Seja o que for que pensares do sucedido, peço que me escrevas a dar a tua opinião. Se tiveres algum dos livros de que te falei, peço que mo envies. Se pensas vir a Portugal proximamente, gostaria de conversar contigo.

Um abraço

Carta 2
4/1/1985

Camarada:

Estranho não ter ainda recebido resposta tua à minha carta de 22/11. Sei que me telefonaste quando eu não estava e que falaste ao telefone com o R e o V. A Ana mostrou-me o teu cartão de Boas Festas. Calculo que já estejas informado das causas principais que me levaram a abandonar o PC(R), juntamente com mais 40 camaradas. Resumidamente:

Esta luta ocupou-nos cerca de dois anos de debates internos em que respeitamos escrupulosamente as normas e as imposições do CC. Só saímos depois de ter esgotado todas as possibilidades de debate e de termos recebido, como resposta às nossas críticas o impedimento do debate, acusações de “anarco-trotskismo”, sem nos darem o direito de responder perante o partido, despromoção de todos os "esquerdistas" para a base, marginalização absoluta de todos os camaradas em discordância, calúnias, etc. 0 CC só nos dava como alternativa ou calarmo-nos ou sairmos do partido. Decidimos sair porque estão em jogo questões de princípio, das quais depende a existência futura do Partido Comunista em Portugal. Não foi um passo leviano nem um abandono da luta. Chegamos à conclusão de que o PC(R) não pode já ser posto no caminho revolucionário e que a luta dos comunistas tem que prosseguir de fora, até se tornar possível a reconstituição do partido.

Em 8 de Dezembro, num encontro a que compareceram os 40 camaradas demitidos, decidimos convocar uma Assembleia para constituir um agrupamento comunista, cuja actividade central será a publicação duma revista de crítica marxista-leninista, que lance os alicerces para definir o programa, a estratégia, a táctica e os estatutos do futuro Partido Comunista. £ inevitável um período talvez longo de reagrupamento, de formação de uma corrente de ideias comunistas, que até hoje no. tem faltado e que tem sido a origem dos nossos fracassos. Não estamos dispostos a desviar-nos desta tarefa de propaganda, por muito difícil que seja.

A Comissão Preparatória nomeada no encontro de 8/12 está a preparar projectos dos documentos para aprovação da Assembleia (Manifesto--Programa, Estatutos, plano da revista, balanço da crise do PC(R), etc) c procura reunir todos os meios necessários para a concretização do projecto. Esperamos que a Assembleia possa ter lugar em princípios de Fevereiro.

Para nós, é importante saber o aue pensas tu da situação e deste projecto, se estás disposto a ligar-te a ele e em que termos. Na impossibilidade de te deslocares a Portugal (suponho), vamos enviar-te os documentos à medida que forem elaborados, pera poderes formar uma opinião e dizer-nos c que pensas deles.

Decidimos também editar em livro o documento que entreguei ao CC do PC(R) sobre c 7º congresso da IC. Pode ter uma certa no debate que queremos travar. Mando junto uma folha de subscrição que está a circular. Peço que vejas a possibilidade que tens de contribuir. e eventualmente de angariar outras contribuições. As dificuldades financeiras estão a dificultar-nos muito o avanço rápido que queremos fazer para a edição do livro e da revista.

Mando também uma cópia de uma das cartas que dirigi ao CC do partido antes de sair, para teres uma ideia maio precisa da polémica. E ainda uma fotocópia de artigos saídos na imprensa (há mais, seguem depois). Um abraço

Carta 3
13/3/1985

Caro PA:

Tenho aguardado em vão notícias tuas. Não sei se o teu silêncio se deve só aos afazeres profissionais e familiares ou se significa que tens reservas ou discordâncias com o projecto em que nos lançámos. Agora que soube pelo MV a tua nova morada, resolvi voltar a escrever-te dando notícias. Junto cópia da carta que te enviei em 4 de Janeiro para a antiga morada e que não sei se chegaste a receber.

O nosso projecto deu um passo em frente com a constituição dum agrupamento, em assembleia que teve lugar em Lisboa nos dias 2, 3, 9 e 10 de Março. Formámos a Organização Comunista "Política Operária" (será este o nome da revista que vamos editar) e elegemos uma direcção de sete membros, de que faço parte. Aprovámos um Manifesto, Estatutos e outros documentos que te enviarei brevemente, para tua apreciação.

O nosso objectivo central como grupo é a edição da revista, que será mensal ou bimensal, conforme as possibilidades, e que queremos pôr na rua a curto prazo. Caso estejas de acordo com a orientação geral, de que te poderás aperceber pelos documentos que vais receber em breve, esperamos poder contar com a tua colaboração, visto que a revista não se apresenta com vínculos â organização e está aberta a todas as colaborações que se enquadrem na sua linha geral.

O ideal para nós seria que tu fosses o correspondente da revista em Londres, enviando-nos com a regularidade possível notícias e comentários sobre o movimento revolucionário e anti-imperialista em Inglaterra, transcrição de artigos aí publicados, etc. Além disso, como é evidente, gostaríamos de receber artigos teus sobre quaisquer temas dentro do âmbito da revista. Também nos interessa muito tudo o que nos possas mandar em livros, revistas, jornais, recortes, etc. Esta hipótese da tua colaboração na revista é para nos o mais importante e pedimos que nos digas se podemos contar com ela.

O meu livro "Anti-Dimitrov" está para sair brevemente, foi custeado por uma subscrição aberta aqui entre camaradas e amigos. Como não sei se extraviou a folha de subscrição que te mandei em Janeiro, envio-te junto uma outra, para o caso de quereres e poderes contribuir. O livro será vendido a 250 escudos. Diz por favor se queres que te mande e se podes colocar aí alguns exemplares.

E por hoje é tudo. Fico a aguardar notícias tuas. Se por acaso vieres a Portugal, gostarei muito de conversar directamente contigo.

Um abraço

Carta 4
7/5/1985

Amigo P:

Algumas informações sobre a nossa actividade e perspectivas:

"Anti-Dimitrov" - Está praticamente todo vendido, estamos a pensar em reeditar. Não sei se tens aí algum comprador em perspectiva. Já leste? Que te pareceu? Estamos a realizar algumas reuniões de debate para agitar as ideias do livro e tentar criar corrente de ideias. Junto dois recortes dos muitos que saíram nos jornais daqui.

"Política Operária” - é o nome da futura revista de crítica marxista, a começar em Outubro. Segue junto o manifesto de lançamento e o estatuto editorial. Vão também algumas folhas para subscrição antecipada. Estamos a preparar as condições técnicas, financeiras e de redacção para assegurar a revista a partir de Outubro, bimensal. Vamos fazer um número experimental, no mês próximo, que não será impresso e servirá só para nos treinarmos. Como já te pedi anteriormente, será muito importante a tua ajuda: recortes da imprensa, jornais ou revistas, livros ou folhetos, artigos ou notas tuas. 0 ideal era seres o nosso correspondente em Londres, o que implicava mandares-nos de dois em dois meses um comentário sobre questões em foco aí (na política interna, na política externa, ou na corrente ML). Poderemos contar contigo? Lembrámo-nos de que poderias fazer aí uma assinatura para nós de uma revista que nos ponha ao par dos debates na corrente ML. Falaram-nos na "New Left Review", mas não sabemos se é essa a mais interessante. Tu estás em melhores condições para decidir. Podemos contar?

Organização - Inaugurámos a nossa sede no 12 de Maio, com uma confraternização e debate que reuniu cerca de 70 camaradas e amigos. Participámos com as nossas faixas e palavras de ordem próprias nas manifestações do 25 de Abril e do 1º de Maio. Estamos agrupados em núcleos, temos uma direcção constituída e vamos fazer debates amplos periódicos. Para já, um sobre intervenção sindical, para o mês que vem haverá outro sobre a experiência do PC(R) e da corrente ML em Portugal.

Partidos ML - enviámos a 25 partidos e grupos ML, incluindo o PTA e PC do Brasil, uma carta em que expomos resumidamente a nossa plataforma política e as razões do nosso corte com o PC(R). Segue junta uma cópia traduzida em inglês. Talvez tu pudesses enviá-la a partidos ou grupos (Inglaterra, índia, Canadá, etc.) de que tenhas referência. Podes fazer-nos chegar os endereços de partidos ou grupos ML para completarmos o nosso ficheiro? Pretendemos enviar a revista para todos os que estejam interessados em fazer troca de publicações.

PC(R) - Depois de alguns artigos no "BV" a chamar-nos anarco-trotskistas, têm feito silêncio a nosso respeito. Sabemos que prometeram aos militantes uma resposta ao "Anti-Dimitrov" numa Conferência que vão realizar em breve, mas temos fortes dúvidas de que se metam nisso. A táctica do PC(R) para “um candidato único das oposições contra a reacção" nas eleições presidenciais, ou seja, na prática, o apoio à candidatura de Lurdes Pintasilgo, está a provocar algum descontentamento nas fileiras, ao mesmo tempo que reforça as tendências mais direitistas. Isto reforça a nossa convicção de que o PC(R) se irá afastando gradualmente e cada vez mais do campo revolucionário, depois da ruptura que fez com a sua ala esquerda (nós).

Manifesto - Tirámos 1.000 exemplares do manifesto inaugural da OC-PO (Organização Comunista "Política Operária"), que estamos a usar para debates em torno das nossas posições e para ganhar novas adesões. Gostaria que mandasses a tua opinião e que digas se há alguma possibilidade de traduzir em inglês para divulgação aí. Mando também uma carta que temos estado aqui a enviar a militantes do PC(R).

Finanças - Apoiando-nos nos nossos recursos financeiros e num empréstimo, vamos comprar uma máquina de fotocomposição em segunda mão, que nos servirá não só para fazer a revista como para trabalhos comerciais que a financiem. Esperamos ter a funcionar dentro dos próximos dois meses um ateliê de composição, fotografia e montagem, pois vieram do PC(R) vários camaradas especializados nestes trabalhos. Como decerto compreendes, a questão financeira é a mais premente. Haverá aí algumas condições para recolheres verbas de apoio para o lançamento deste projecto? Peço-te que faças todo o possível neste campo, pois as dificuldades são enormes. Neste sentido escrevi também ontem ao MV.

Contando com notícias tuas logo que possível e com todo o apoio que possas dar ao nosso projecto, aceita um abraço

Carta 5
23/6/1985

Caro Amigo:

Como vais? Aqui estou a dar-te algumas notícias dos nossos trabalhos e a pedir de novo a tua colaboração no que te for possível.

Revista - Temos estado a montar as infraestruturas essenciais: temos formada uma empresa de composição e montagem de artes gráficas, com uma máquina de fotocomposição por nós comprada que nos vai servir para fazer a revista pelos nossos meios e obter receitas com trabalhos comerciais. É um projecto ambicioso, que nos obrigou a juntar todos os dinheiros disponíveis, empréstimos, etc., mas creio que vai singrar. Sem ele, a revista não teria hipótese de sobrevivência.

A saída do nº 1 está prevista para fins de Setembro-princípios de Outubro. Artigos de fundo em preparação neste momento:

Para além destes artigos principais, haverá um Editorial, comentários curtos, crítica de livros e revistas, etc. Pergunta: poderemos contar com uma carta de Londres feita por ti, sobre um tema à tua escolha? Para ser actual, deveria ser redigida em Setembro e enviada para cá até 13 de Setembro o mais tardar. Decerto compreendes a importância que terá para este começo da revista o aparecimento da tua colaboração. Espero que venças as tuas ideias de incapacidade e nos mandes um comentário sobre temas aqui desconhecidos.

Também seria importante para nós receber, como te pedi há tempos, jornais daí, ML ou outros, recortes da imprensa, uma revista de noticiário internacional que enriqueça a nossa informação, etc. Não te esqueças de que contamos com a tua ajuda para que a nossa revista ganhe público nos meios operários e no público avançado que, embora reduzido, ainda subsiste. Há um espaço para nós.

Mando junto alguns boletins de assinatura antecipada, que é uma forma de apoiar financeiramente o lançamento da revista. Peço-te que vejas o que podes fazer para angariar uma ou outra assinatura. Os preços, como vês, são excepcionalmente baixos reste período de promoção.

"Anti-Dimitrov" - Gostaria de saber se já leste e qual a tua opinião. Aqui não passou despercebido, foi bastante referido na imprensa e vendeu-se já praticamente toda a edição, o que deu uma fonte de receita apreciável para a revista. Podes vender aí algum exemplar ou fazer chegar a gente da emigração?

Actualmente, o meu plano é começar a trabalhar na preparação de um livro, a publicar no Outono do ano que vem, acerca da evolução do PCP, para fazer a tal crítica concreta às origens do revisionismo, que o PC(R) nunca consentiu que se fizesse.

PC(R) - Os dois últimos acontecimentos espectaculares desta banda são a estrondosa adesão do Frederico Carvalho (c pequeno Fred) ao PCP de Alvaro Cunhal e a demissão colectiva de 37 membros da UDP do Porto, quase todos operários. O núcleo central desses operários, encabeçado polo ex-membro do CC do PC(R), José Magalhães, aderiu à nossa organização c constituiu-se em núcleo de apoio da revista.

Seguem junto recortes de imprensa sobre um e outro caso, assim como uma carta por nós dirigida aos membros do , C(R) sobre o caso Fred, lembrando-lhes que ele foi o nosso principal inimigo no 4º congresso e o promotor da nossa expulsão. Afinal quem tinha razão?

Organização - Fizemos a 12 de Maio um encontro para debater a nossa intervenção operária e sindical, çue nos abre algumas perspectivas. A 2 de Junho fizemos a nossa Assembleia, para tomar decisões sobre a constituição do empresa gráfica, que envolve grandes responsabilidades financeiras, e para debater o andamento geral do nosso trabalho. A 16 de Junho realizámos um Encontro, aberto a diversos amigos, onde debatemos o balanço da experiência do PC(R) e da corrente ML em Portugal. Continuará no dia 30 e será transformado num artigo para o nº 2 da revista. Publicamos um boletim interno de debate, "Tribuna Comunista", de que já saíram três números.

Movimento ML internacional - Segue junto cópia de uma carta aos partidos e grupos ML informando sobro o caso de Frederico Carvalho. Poderás endereçá-la a partidos e grupos ingleses ou de outros países de que tenhas o endereço? rodes mandar-nos os endereços de todos os partidos e grupos ML que conheças?

Até breve, camarada, escreve-nos. Um abraço

Carta 6
25/9/1985

Caro Camarada:

Não respondi mais cedo à tua carta de 20 de Junho porque estava à espera da ocasião para te dar a boa notícia: saiu finalmente (hoje mesmo) o nº 1 da "Política Operária". Embora esteja ainda longe do que desejamos, é um. passo importante pare o avanço do nosso projecto, Mando em correio separado uns exemplares, para tu veres se consegues arranjar compradores ou assinantes. E espero, claro, que tu próprio te tornes assinante, o que é uma boa forma de apoio.

Fico à espera da tua opinião e sugestões sobre a revista. Espero também que te resolvas a escrever a tua "Carta de Londres"" como te tinha proposto antes, para publicar no nº 2. Deveria estar cá até 10 de Novembro. O tema da carta ficaria ao teu critério, naturalmente: panorama do movimento sindical inglês neste momento, actualidade política, Irlanda, etc. Como poderás ver, o MV já fez umacolaboração para o nº 1.

Agradeço as revistas que mandaste. Se não existir aí algo acessível sobre o movimento operário, parece-me que a única de interesse, apesar da orientação trotskista, é a "New Left Review" e nesse caso poderias fazer-me uma assinatura dela? A dos revisionistas é francamente má, não se aprende ali nada.

Não cheguei a ter notícias do amigo a quem tinhas pedido para entregar aqui as 10 libras. Se te for possível enviar o dinheiro por outra via, seria importante para nós, pois, como calculas, as dificuldades financeiros são muitas. Organizámos uma pequena empresa de artes gráficas e é com o dinheiro dela que vamos sustentar a revista, mas os encargos são pesados, sobretudo enquanto tivermos as prestações das máquinas para pagar.

Quando vires o Brandão dá-lhe as minhas saudações e peço que lhe entregues o "Anti-Dimitrov" e a revista, para ele ver se lhe interessa tornar-se assinante. Se quiser escrever-me, terei muito gosto em responder-lhe. E tu, quando vens cá, nem que seja só de fugida? Gostaria de podermos conversar e veres directamente o andamento dos nossos trabalhos. As nossas actividades cá prosseguem, enfrentando as naturais dificuldades destes tempos. Fizemos sair um manifesto aconselhando a abstenção nas eleições, de que mando cópias. As organizações ML para quem enviamos o nº 1 da revista são as seguintes (ver folha junto). Se quiseres mandar para cá outras moradas que aches de interesse, nós encarregamo-nos de a expedir directamente.

Um grande abraço e fico a espera da Carta de Londres!

Cartas 7
30/12/1985

Camarada A:

Enviámos-te há dias a PO nº 2, espero que já a tenhas recebido e te tenha agradado. Tenho estranhado não receber notícias tuas ultimamente, depois da carta de 15 Outubro em que informavas dos contactos que tiveste com representantes do RCP e do PCE (m-l), assim como com o secretário da Associação de Amizade Inglaterra-Albânia. Foi bom teres esses contactos, mas não estranho a reacção negativa dos partidos. Na medida em que pomos em causa as posições oficiais da Albânia (e agora do PC do Brasil), isso dá lugar a um retraimento geral desses partidos. 0 caso é que os problemas existem, são bem reais, e a crise da corrente ML vai inevitavelmente agravar-se por não querer enfrentá-los. Estamos preparados para prosseguir no nosso trabalho de debate durante longos meses, mesmo que as repercussões pareçam nulas por enquanto. Julgo que já te disse que o Marxist-Leninist Party dos EUA e o PC do Japão (Esquerda) têm feito na sua imprensa críticas semelhantes às nossas. Seria bom que continuasses a discussão com o secretário da Associação de Amizade e lhe desses a conhecer o conteúdo da nosso revista.

A Carta de Londres continua a ser uma falta nas páginas da PO. Quando te decides? Um comentário mesmo breve a acontecimentos políticos daí daria um interesse maior ao nosso noticiário internacional. 0 MV está lançado nas Cartas de Paris, há que seguir-lhe o exemplo. Se mandasses alguma coisa até 10 de Janeiro, ainda poderíamos incluir no nº 3.

Recebeste os 3 exemplares da PO 1? Conseguiste vender algum aí? Queres que enviemos também da PO 2? E quando é que te fazes assinante? E o Brandão, como vai? Da New Left Review só recebemos o nº 150 (Março/Abril 85). Como tinhas dito que irias fazer uma assinatura, estranhamos não ter chegado mais nenhum.

A nossa actividade por cá continua sem desfalecimentos. Vamos tomar posição pública acerca das eleições presidenciais, depois envio-te. Aceita um abraço do camarada

Carta 8
14/12/1986

Caro Camarada:

Há muito que não nos escrevemos. Como vais? A nossa revista tem continuado a sair, vai ser posto agora à venda o nº 7. Decidi enviar-te este número, até porque gostaria de conhecer as tuas opiniões acerca de um artigo sobre Staline que publicámos. Esforçámo-nos por fazer uma crítica pela esquerda ao stalinismo, sem concessões à posição habitual de social-democratas, trotskistas, etc. Veremos se o conseguimos.

Não te temos enviado a revista regularmente porque as despesas são muitas e esperávamos que tu fizesses uma assinatura. Infelizmente, aquele amigo de que tinhas falado que estava em Lisboa e tinha umas libras para nós não nos contactou. Não podes enviar-nos a importância de uma assinatura?

 Também gostaríamos de continuar a receber a "New Left Review" que há muito não vemos. E também, se possível, o seguinte que vimos anunciado num jornal inglês:

The revolutionary road to communism in Britain (Manifesto do Revolutionary Communist Group, Larkin Publications - BCM Box 5909, London VCIN 5xx

Eizemos o pedido pelo correio mas até agora não obtivemos resposta.

Enviamos juntamente com a "PO" nº 7 exemplares do jornal "Tribuna Operária", cuja publicação iniciámos, e do boletim "Denúncia", de solidariedade com os presos políticos, iniciativa em que colaboramos.

Quando teremos ocasião de nos ver? Pensas vir a Lisboa? Escreve a dar notícias da tua vida e actividades. Com os desejos de um bom Ano Novo, aceita um abraço

Cartas 9
6/3/1987

Caro Camarada:

Recebemos a tua carta, assim como o manifesto do Revolutionary Communist Group, que agradecemos. Ficámos decepcionados, porque é um grupo muito pró-soviético. Tínhamos esperança que houvesse algum novo grupo marxista-leninista revolucionário por aí, mas ainda não é desta...

As tuas dúvidas e preocupações perante a linha de orientação da "PO" são naturais mas parece-nos que resultam de um erro de base da tua parte: receias que se critique aquilo que, apesar de tudo, ainda aparece mais à esquerda. Mas talvez não tenhas em conta que, sem essa crítica às inconsequências da chamada corrente marxista-leninista, não se conseguirá fazer surgir uma corrente de ideias e de acção sólida e ofensiva. A nós parece-nos que o declínio da corrente M-L se tem acentuado nos últimos anos, precisamente porque se proibiu toda a crítica aos erros. Foi por não querermos acabar no oportunismo, como aconteceu à maioria dos antigos dirigentes do PC(R) e como está a acontecer com a UDP, que decidimos investigar as origens do revisionismo. E isso passa obrigatoriamente por uma crítica a Staline. Os Kruchov & Cª não poderiam ter feito o que fizeram na União Soviética e no movimento internacional se o terreno não tivesse sido adubado antes pela política de compromissos de Staline. Vamos continuar a debater o problema, em espírito revolucionário, e esperamos que virás a reconhecer a utilidade do caminho que encetámos.

Sobre a tua vinda aqui: estou ao corrente dos teus problemas, mas supus que já tivesses sido abrangido por uma amnistia e já não houvesse esse impedimento. Não sendo assim, é pena que não possamos discutir de viva voz e confrontar as nossas ideias.

O B encontrou-se aqui comigo há um ano, mas não soube mais notícias dele. Vou escrever-lhe brevemente, até para saber como está de saúde.

Ficamos à espera da "New Left Review", que nos é útil para compreender a evolução de certas correntes marxistas reformistas. Se tiveres oportunidade de nos enviar qualquer outro jornal ou revista daí, será uma boa ajuda para nós.

Agradecendo os teus votos de bom trabalho, aceita um abraço


Inclusão 12/05/2019