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Primeira Edição: Política Operária nº 109, Março-Abril 2007
Fonte: Francisco Martins Rodrigues Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
Estão na moda os simulacros de eleições — “eleições”, livres, democráticas, participadas, disputadas... só que em tomo de coisa nenhuma. E uma forma de os comissários do regime nos compensarem da baixeza mafiosa em que se afunda a vida política. Desta vez, a grande opção oferecida pela RTP aos portugueses foi elegerem, livre e democraticamente, “o maior português de sempre”. E depois de semanas de acesos debates e com a expectativa levada ao rubro, lá saiu na lotaria o Salazar!
Por muito habituados que estejamos ao clima de cano de esgoto da ideologia oficial, a coisa passa das marcas. Que a televisão oficial do Estado tenha patrocinado uma cena como a da noite de 25 de Março, com o público a aplaudir polidamente a “eleição” do ditador como “o maior português de sempre” (ainda por cima engrandecido pela vitória sobre Álvaro Cunhal, graças à tola obstinação de Odete Santos em entrar na palhaçada), roça o obsceno. É um passo mais na degradação das instituições e na desmoralização do povo.
Deitando água na fervura para ajudar a engolir a pílula, alegam os comentadores de serviço que se tratou apenas de um jogo a que não se deve atribuir significado político, porque “hoje temos uma maior maturidade e já podemos discutir a ditadura e o ditador sem extremar posições”. Tretas! Como se não estivéssemos a ver os sinais diários da reabilitação do salazarismo nas patacoadas académicas, nas provocações do PNR, nos grupos fascistas que vão mostrando a cara nalgumas universidades e até no orgulho boçal dos desgraçados santa-combenses que reclamam para a sua terra um museu do ditador.
Como se luta contra esta praga? E aqui que nos separamos dos que condenam o revivalismo salazarista como uma ofensa às instituições, e, para atacar o fascismo, dignificam o regime actual — foi o que fizeram nas últimas semanas intelectuais e parlamentares do PC, do BE, do PS. O surto salazarista que por aí vai não representa uma ameaça ao poder instituído; é mais uma das suas manifestações. Não é uma aberração de maníacos; é um subproduto das pulsões reaccionárias, obscurantistas, xenófobas da burguesia no poder.
E por isso que ir junto do povo contrapor as “virtudes” deste regime à barbárie da ditadura, como fazem esses democratas, é contraproducente e só pode atirar mais e mais pessoas simples para a armadilha da propaganda fascista. Denunciando os crimes do fascismo, temos que lhes dizer que têm toda a razão em execrar a “democracia” actual. A nossa tarefa não é defender este regime contra o outro, é mostrar que o poder da burguesia é sempre anti-popular e só pode ser antipopular.
Inclusão | 26/08/2019 |