Práfrentex

Francisco Martins Rodrigues

17 de Novembro de 1982


Primeira Edição: Em Marcha, 17 de Novembro de 1982

Fonte: Francisco Martins Rodrigues Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.


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Encheu-me as medidas a arrojada entrevista do camarada Álvaro Cunhal ao “Expresso". Principalmente naquela parte em que assegura que o seu partido nunca irá para o euro-carrillismo porque “isso seria puro oportunismo: sacrificar ideais e princípios na mira de resultados eleitorais. Somos um partido comunista, não somos um partido social-democrata". Ora ai está o que é bem dito e vem acabar com uns rumores desagradáveis que por ai corriam a seu respeito.

Fica agora definitivamente esclarecido que o camarada doutor nunca poderia ter dito que esta droga estava numa via “não-capitalista" porque as conquistas de Abril eram irreversíveis. Como podia você, um revolucionário, iludir assim tão grosseiramente os trabalhadores?

Você nunca aconselhou os operários das nacionalizadas a darem o litro para os gestores embolsarem mais uns pacotes. Isso seria puro oportunismo e você não faz isso, não é verdade?

Nem foi você que foi dizer a Évora em 17 de Abril de 1980 que a recuperação das terras roubadas pelos agrários não era pela força mas por um novo governo “que declare a nulidade das decisões ilegais do MAP". O “Avante" publicou isso como palavras suas mas foi gralha, claro. Você não ia dizer essa cavalidade oportunista.

Você nunca semeou esperanças no general Eanes, que ideia! Você estava farto de saber que ele nunca ia demitir a AD. Você até se cansou a alertar os operários, eles é que estavam cheios de ilusões e não lhe deram ouvidos. Agora torcem a orelha mas já é tarde.

Você não aprova de maneira nenhuma as tabelas salariais feitas pelos seus rapazes nas empresas, a pedir 20% de aumento para os serventes e 33% para os chefes, com a desculpa que é para fazer mais unidade. Você até vai fazer um discurso a denunciar esse social-democratismo infiltrado no seu partido cem por cento revolucionário.

Você soube sempre que o Carrillo era um oportunista reles. Olha quem! Chamava-lhe camarada só para não arranjar conflitos com os espanhóis, que se podiam ofender.

Você defende a União Soviética porque desconhece que lá um camarada director de fábrica ganha 30 vezes mais do que os camaradas operários. Se você tivesse a confirmação de uma tal monstruosidade, denunciava logo aquilo como um novo capitalismo de Estado. Você nessas coisas de princípios é uma fera!

Perguntam alguns se a luta de classes em Portugal está atrasada ou adiantada. Eu lhe digo: está tão atrasada que um pequeno-burguês republicano, ordeiro e temente a Deus como você, ainda consegue passar por um perigoso comunista. Santa miséria!


Inclusão 22/08/2019