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Primeira Edição: Em Marcha, 8 de Outubro de 1981
Fonte: Francisco Martins Rodrigues Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
Pelo 5 de Outubro é altura de falar em democracia. E como os artigos de circunstância e as romagens da ordem põem toda a gente de acordo mas não dão de comer a ninguém, falemos da democracia 81.
Falemos por exemplo das boas novidades democráticas que nos trouxe à televisão o inefável Ângelo Ministro. Agarrando com as mãos ambas no atentado oportuníssimo das "Forças Populares 25 de Abril" contra a GNR (nem que fosse de encomenda!), o ministro avisou que vêm aí o Serviço de Informações e a Polícia Anti-terrorista. O governo, assegurou, não se deixará dominar pelo "complexo da PIDE".
É bem de crer que o Governo não tenha tais complexos. E com a ajuda dos rapazes das FP-25 talvez para o ano, se a AD ainda for governo, possamos festejar o 5 de Outubro sob a protecção paternal de qualquer SIR/PIDE.
Falemos da lei da rolha para a Oposição no parlamento, que a AD vai fazer aprovar por estes dias. Disciplinar os debates para não desvairar a opinião pública, cortar o pio aos pequenos partidos, fazer passar sem balbúrdias o pacote laboral e a revisão da Constituição — acham que isto não é democracia avançada?
Falemos da reintegração dos militares democratas, decidida aqui há meses pelo Conselho da Revolução. Houve quem dissesse que era muita fartura. E era caso para isso: a Procuradoria-Geral da República acaba de informar que a decisão ficou sem efeito por não ter sido referendada pelo Governo. Lógico! Como ó que se podia aplicar a subversivo» a mesma clemência que aos coitados dos ex-pides?
Falemos da sacrossanta igualdade democrática dos cidadãos perante a lei. 100 mil processos pendentes em Tribunais do Trabalho — sabem o que quer dizer? Que fazer queixa do patrão é uma questão humorística. Por isso não tem razão o ministro Meneres Pimentel quando acha que a situação neste campo é de "quase desespero": pelo contrário, é para rir à gargalhada. De tanta hipocrisia.
Há dias, no Campo Pequeno, o sr. Armando Teixeira da Silva, secretário da CGTP, teve um rasgo ousado em defesa da democracia: desafiou o ministro do Trabalho para um debate na TV sobre as leis laborais!
É possível que o ministro esteja a esta hora de gatas debaixo da secretária, apavorado. É muito possível. Mas parece-me que o homem da rua esperava alguma coisa mais do sr. Teixeira da Silva.
E foi talvez por já saber que não o ouviram que muitos não se deram ao trabalho de lá ir.
Inclusão | 22/08/2019 |