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Primeira Edição: Em Marcha, 22 Maio 1980
Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
Manifestações-monstro, ausência de alvo — duro contraste que resume o quadro deste Abril-Maio carregado de tensões. Massas enormes acorrem às manifestações, mas em vez das respostas que procuram recebem o duche frio das frases mastigadas, dos slogans bem comportados, das esperanças em suspenso.
Porque é que a direita não tem deixado de avançar apesar de tantas manifestações gigantescas dos últimos anos? Porque as manifestações só valem como indicadores do estado de espírito das massas que espera ser materializado em actos. É isso que fingem não compreender os estados-maiores reformistas, para os quais cada manifestação é um trunfo mais que se joga na mesa dos acordos, com vistas ao futuro governo. Neste momento, o jogo dessa gente concentra-se em fazer engrossar a corrente de oposição à AD e canalizá-la para o apoio ao bloco de Eanes. Já está em marcha a grande operação de amolecer o povo com o “realismo” pantanoso de que não há outro remédio senão alinhar atrás de Eanes para barrar o caminho aos trogloditas de Soares Carneiro.
Porquê Eanes, se o seu programa é o mesmo do outro, é o programa negro que foi levantado no dia 25 de Novembro de 1975; Chegou tão baixo o povo de Abril que não mereça melhor candidato que Ramalho Eanes?
“É que Eanes é o que tem mais hipóteses de ganhar”, explicam os políticos. “Um candidato de esquerda neste momento é uma utopia que só serve para dividir votos e dar a vitória a AD”.
Eu gostava que me fizessem as contas aos centos de milhares ou milhões que ardem em desprezo por todo este lodaçal e que irão dar o seu voto, estupidamente, a um dos seus inimigos — Soares Carneiro ou Eanes — se não se levantar alguém que dê voz à sua indignação.
Gostava que me dissessem quantos votos estamos a perder todos os dias, ao proibir como “provocação” que o povo alentejano defenda a sua terra dos assaltantes, ao desconvocar as greves, ao encarregar os trabalhadores de policiarem a “ordem pública”.
Barrar o caminho ao “Videla” Carneiro, sim! E da única maneira eficaz, que é apontar um caminho contrário ao dele, levantar um programa oposto ao dele, ir-lhe arrancar os votos que ele se prepara para arrebanhar e que pertencem à esquerda.
Dirão que já não há condições para fazer triunfar um candidato de esquerda em Dezembro e que esses votos serão de qualquer maneira perdidos. É falso. O resultado mais decisivo que pode sair das eleições será precisamente a afirmação de uma corrente popular compacta em torno de um candidato do povo, dum programa de verdadeira mudança. Daí partiremos para novas lutas. Ainda estamos a tempo.
Observação: Tiro ao Alvo - Coluna de FMR no jornal Em Marcha e no jornal Política Operária.
Inclusão | 06/02/2018 |