Enver Hoxha: ardor revolucionário em defesa do marxismo-leninismo

Manuel Quirós

Julho de 1974


Fonte: Livro A Educação Política dos Quadros e das Massas publicado pela editora portuguesa “Biblioteca Povo e Cultura” em 1974.
Tradução e adaptação: Thales Caramante — Jornal A Verdade.
HTML: Lucas Schweppenstette.

Enver Hoxha, o primeiro secretário do Partido do Trabalho da Albânia (PTA), partido comunista que sempre permaneceu fiel ao marxismo-leninismo e ao internacionalismo proletário, nasceu na cidade de Gjirokastër, em 16 de Outubro de 1908, quatro anos antes do reconhecimento da independência do país, efetuado na conferência de Londres de 1912.

O pequeno Enver, filho de uma família muçulmana e citadina, frequentou a escola primária da cidade natal, que foi, juntamente com Shkodër, um dos mais antigos centros das aspirações nacionais albanesas, e aí aprendeu, além das primeiras letras, um sentimento patriótico muito elevado, de total identificação com os interesses populares.

No período da revolta democrática de 1924, conduzida pelo bispo ortodoxo e poeta Fan Noli, revolta inconsequente que iria levar ao regime tirânico de Ahmed Zogolli, apoiado por sérvios e italianos, Enver Hoxha, então estudante do liceu em Korçë, organizou a primeira manifestação de estudantes contra a opressão monarquista. Conhece, nesta altura, pela primeira e última vez na sua vida, o cárcere, aos 16 anos de idade, com muitos colegas do liceu. É a sua primeira prova de revolucionário, de combatente popular.

A coroação de Ahmed Zogolli, como Rei Zog I, com o apoio financeiro italiano e submetida à conferência de Londres, que só reconhecia para a Albânia o regime monárquico, traz uma entrada de divisas no país, mas cria, cada vez mais, uma estrita dependência política e económica em relação ao fascismo.

Como brilhante aluno do liceu francês de Korçë, Enver Hoxha recebe, em 1930, uma bolsa do governo albanês para fazer seu curso superior na França, para onde parte no fim desse mesmo ano. Já então está perfeitamente convicto da absoluta necessidade de lutar contra o fascismo, contra o domínio que queriam impor ao país com a conivência do Estado, perante o ascenso da luta popular, em que Enver Hoxha toma parte. É o início da sua participação política como militante antifascista.

Na França, se inscreve na faculdade de ciências de Montpellier, no final de 1931, com 23 anos, e, dentro em breve, entra nas fileiras do Partido Comunista Francês (PCF). Aí vai encontrar um partido robustecido pelo movimento de bolchevização, pelo estilo de trabalho bolchevique, aguerrido na luta contra os social-democratas, a instabilidade política pequeno-burguesa e as primeiras manifestações ideológicas trotskistas. Enver Hoxha compreende profundamente a necessidade absoluta da unidade política, ideológica, organizativa e de ação do partido do proletariado. É a sua definição como comunista, como combatente de vanguarda do proletariado revolucionário, à frente das massas populares.

Os serviços secretos do regime de Zog referenciam-no, seguem a sua evolução ideológica, e fazem com que seja suprimida sua bolsa de estudos em fevereiro de 1934. Enver Hoxha é então obrigado a ir para Paris à procura de trabalho e, na capital, começa a escrever como colaborador, para o jornal L’Humanité do PCF onde denuncia a ditadura de Zog, que conduz a Albânia para o fascismo mais descarado, para sua entrega total à Itália de Mussolini.

Alertado pelos informes políticos do 5º e 6º Congressos da Internacional Comunista, e no período de preparação do 7º Congresso, em que os ataques de Dimitrov e a definição da política de frente única serão pontos de princípios para todos os comunistas, os artigos de Enver Hoxha, contra o fascismo, são cada vez mais violentos, chegando mesmo a prever a ocupação da Albânia pelas tropas italianas, a simples concretização do domínio que se exercia a todos os níveis da vida albanesa, como veio a suceder em 7 de Abril de 1939. É o domínio do método de análise marxista, aplicado à situação concreta do país.

Em Paris, Enver Hoxha esteve em ligação direta com a emigração albanesa, sobretudo com o grupo de comunistas que tenta criar uma “Frente Democrática” contra o regime de Zog, na linha das frentes populares proposta pelo Comintern como única forma de luta eficaz contra o fascismo.

Entretanto, frequenta o 2º ano de Direito e escreve artigos para L’Humanité, continuando a ser perseguido pelos agentes secretos de Zog, o que provoca a perda de vários empregos e a consequente situação precária. Nada conseguem. De fato, nunca abranda o seu ardor revolucionário, a defesa dos princípios, a combatividade e sua entrega à causa do povo.

Enquanto outros jovens, individualmente ou aconselhados pelo grupo de Paris, partem para as brigadas internacionais que vão combater na guerra-civil espanhola, numa atitude plena de idealismo, Enver Hoxha regressa à Albânia. É uma justa compreensão do papel do comunista, uma utilização concreta do internacionalismo, que, em cada momento, consiste em dar a contribuição mais necessária à revolução, de acordo com as condições mais objetivas do país.

Depois do regresso, depois de um período de vários meses sem trabalho, Enver Hoxha leciona durante quatro meses no liceu de Tirana. Em seguida, por causa do domínio da língua francesa, foi enviado para o liceu de Korçë, onde utiliza as aulas para difundir as ideias marxista-leninistas, mas sob um verniz “democrático e antimonarquista”, para assim passar mais despercebido da repressão, que o conhecia bem.

É uma concreta compreensão das limitações, mas também da necessidade absoluta, do trabalho legal.

Ao mesmo tempo, se dedica à atividade política clandestina, como membro do Grupo Comunista de Korçë, do qual é um dos militantes mais ativos, sobretudo através do movimento sindical, ajudando os operários das oficinas artesanais e das pequenas fábricas, da cidade e dos arredores, a organizarem-se no seio das associações profissionais. Aborda e organiza o proletariado nas condições concretas do seu desenvolvimento político. São três aspectos fundamentais, como marxista-leninista, das posições políticas corretas de Enver Hoxha: o reconhecimento e prática da absoluta necessidade do centro político orientador, gérmen do futuro partido do proletariado; a ligação com as massas trabalhadoras; o trabalho fundamental a ser desenvolvido no seio do proletariado. Sem elas, a tentativa de condução política seria o caminho para uma total ineficácia, para o fracasso completo.

Foi demitido do seu cargo no liceu em 1939 sob o pretexto de não ter se filiado ao Partido Fascista, mas, de fato, foi demitido por ter sido um dos organizadores da grande manifestação antifascista de Korçë, do mesmo ano, e um dos responsáveis da juventude. Assim, Enver Hoxha passa a só poder atuar na clandestinidade, numa altura em que ainda reinava uma grande confusão nos grupos comunistas albaneses, separados por profundas divergências internas.

Em 1939, tenta fundir o grupo de Shkodër com o grupo de Korçë em Tirana, com a formação de um Comitê Central de quatro membros, equitativamente eleitos, só vem provar que a unidade sem princípios é impossível, que os grupos continuam a defender as suas posições anteriores, que a constituição do Partido só é possível pela afirmação hegemónica de um grupo, aquele que esteja sempre à frente do proletariado e das massas populares, conduzindo uma linha política correta, proletária.

Só o grupo comunista de Korçë defendia, na prática, a criação efetiva de um verdadeiro partido comunista, com direção centralizada, disciplina, linha única e o lançamento de uma ampla frente antifascista. Foi como representante responsável do grupo de Korçë e com a missão de impor, pelo debate a persuasão, estas posições de princípio, que Enver Hoxha foi enviado a Tirana, nos princípios de 1940.

A situação dos grupos comunistas, ou que se afirmavam como tal, na Albânia, era bastante complexa e confusa. Alguns membros, sobretudo os dirigentes do grupo de Shkodër, estavam convencidos, numa atitude perfeitamente capitulacionista, do qual não se poderia fazer nada, pois o pacto tático germano-soviético poderia ser prejudicado. Muitos dos jovens militantes de Tirana defendiam a entrada das tropas fascistas no solo albanês, porque assim se conseguiria uma rápida industrialização do país com a consequente formação de um vasto proletariado, pois apenas assim haveria condições para a revolução proletária, que só seria possível, para esses oportunistas de direita, quando o proletariado fosse a classe mais numerosa. O grupo Fogo, formado por trotskistas, defendia o “entrismo” nas organizações fascistas, para as modificar por dentro, numa forma descarada de colaboracionismo. Alguns militantes do grupo de Korçë apegavam-se ao sectarismo, não queriam alianças e recusavam a política da Frente Antifascista, o que equivalia a isolar o proletariado dos outros setores populares, precavendo uma pureza ideológica de laboratório, não a que deriva da condução política da luta proletária.

Frente a esta situação política, que oscilava entre o mais descarado oportunismo de direita e o sectarismo cego, o trabalho de Enver Hoxha, mesmo com o apoio que encontrou junto de dois militantes do grupo de Shkodër – Qemal Stafa e Vasil Shanto – foi prolongado e difícil, até à afirmação prática, mobilizadora, de uma linha com o completo apoio das massas populares, de luta declarada contra o fascismo.

O início da guerrilha popular no fim de 1940 em Pezë se mostrou ainda muito dependente do ponto de vista político do grupo de Korçë. Nessa altura, ainda estavam se concretizando as conversações em defesa da unidade política de princípios com os demais grupos, e Enver Hoxha se desloca para as montanhas, em contato direto com a guerrilha. Em junho de 1941, o total apoio dos comunistas de Korçë à guerra popular foi um importante apoio para a unidade dos grupos, para o reconhecimento prático da vanguarda proletária na situação concreta. Anos mais tarde, perante críticas de direita ao seu “voluntarismo”, Enver Hoxha respondeu: “Sim, começamos a luta antes da URSS, mas, com a entrada desta na guerra, tivemos a certeza de que o nosso sangue não seria vertido em vão”. Isso foi uma justa compreensão do papel da vanguarda proletária reconhecida na prática, não por decreto formal.

Enver Hoxha, novamente em Tirana, sob os pseudónimos de Hassani e de Thanas, consegue convocar, em 3 de Novembro de 1941, uma reunião de todos os grupos comunistas, onde necessariamente havia militantes dispostos a aderir a posições corretas, com a presença de um representante da Liga dos Comunistas Iugoslavos. Ele tem de lutar para convencer todos os oportunistas de direita e os esquerdistas de que é possível a construção do partido num país de classe operária reduzida, que ela será a condição básica da vitória, que só assim ela não poderá cair sob a influência hegemônica de vizinhos poderosos, sobretudo numa altura em que a luta de massas conhece um ascenso vertiginoso.

Em 8 de Novembro de 1941 nasce o Partido Comunista da Albânia (PKSH) – mais tarde Partido do Trabalho da Albânia (PTA) –, partido que conduziu o proletariado e o povo albanês à vitória, que foi a cabeça do Exército de Libertação Nacional (LANÇ) e da Frente Democrática, contra os fascistas italianos e os seus serventuários burgueses do interior do país, contra o conluio dos aliados anglo-americanos. Hoje o partido continua a dar passos na marcha para a construção do socialismo.

Enver Hoxha é nomeado, no ato da fundação do partido, Primeiro-Secretário do Comitê Central e passa a viver nas zonas montanhosas libertadas, onde as nove guerrilhas populares albaneses passam a formar o corpo central de combate do Exército de Libertação Nacional. Entretanto, a criação do Zëri i Popullit (Voz do Povo), em agosto de 1942, sob a direção do Primeiro-Secretário do PKSH, surge como o elemento unificador de todo o partido, como o transmissor da teoria marxista-leninista, da linha única política, ideológica, organizativa e de ação do proletariado revolucionário a todos os seus membros.

A atitude política que, desde o início da publicação do Zëri i Popullit, define Enver Hoxha como grande teórico, sobretudo nos editoriais e nos artigos de fundo, aparece assinados sob os pseudónimos de Selami, Maio, Sali, Taras, Valbona e Shpatë, são a ligação da verdade universal do marxismo-leninismo às condições concretas da Albânia, o fato de participar ativamente, pela teoria e pela prática, na luta do proletariado e do povo. É a justa e correta compreensão do marxismo-leninismo como doutrina científica de uma classe (o proletariado) da teoria para a prática, enriquecida através da prática.

Ao mesmo tempo, Enver Hoxha chama a si, numa combatividade exemplar, riscos constantes, quer deslocando-se às zonas ocupadas pelas tropas italianas, mesmo depois da polícia de Tirana ter divulgado uma foto sua com a circular dizendo: Comunista Perigoso! Procurado Vivo ou Morto; quer indo sozinho ao ninho dos esquerdistas de Vlorë, numa altura em que se corria o risco de dominarem o partido; quer, ainda, ao estabelecer mais ligações, dando o exemplo de como se estabelecem durante os cercos militares, como ocorreu de 1943-44 com as tropas alemãs, quando fica isolado nas montanhas, com a maior parte do Comitê Central do PKSH e da Frente Democrática, ligações essas que eram vitais para a continuidade do trabalho político, para a condução da luta proletária. É a união prática da combatividade do militante às responsabilidades da direção política.

Enver Hoxha que até aí se via quase sempre obrigado a combater os oportunistas de esquerda, mais poderosos e as vezes aparentemente firmes, dos obreiristas aos trotskistas, passa a ter de combater, com a máxima força, o ressurgimento dos oportunistas de direita, sobretudo os partidários da submissão da vanguarda à Frente Democrática incondicionalmente, sem princípios, mas que se apresentavam sob a forma mentirosa de juntar ainda mais setores na luta contra o fascismo.

Em agosto de 1943, o seu combate aos dirigentes oportunistas de direita toma nova forma, porque estes queriam uma unidade capitulacionista com os Balli Kombëtar, o que equivalia a entregar o proletariado e o povo à burguesia mais covarde e inconsequente, paralisando a Frente Democrática. Depois de uma dura luta de princípios, as posições do PKSH acabam por ser reconhecidas como justas e a Frente Democrática proclama a condenação dos acordos com os Balli Kombëtar, os representantes dos interesses conciliatórios em defesa da burguesia. É um duro golpe proletário contra todos os direitistas.

Em 28 de Novembro de 1944, depois de três anos de luta vitoriosa, com o PKSH à frente, condutor do Exército de Libertação Nacional e da Frente Democrática, Enver Hoxha entra em Tirana e é eleito chefe do governo democrático da Albânia, que se estrutura sob a forma política de ditadura do proletariado vitorioso. É o início da construção do socialismo na Albânia, mas é igualmente o dealbar de novas lutas.

É também neste momento que Enver Hoxha se casa com uma professora e militante do agora Partido do Trabalho da Albânia (PTA), Nexhmije Xhuglini, filha de uma família muçulmana da cidade de Bitola (Macedônia), militante do partido desde a sua fundação, e responsável da União da Juventude do Trabalho da Albânia (BRPSH). Ela sempre teve uma intensa atividade política, com um papel muito ativo no movimento de emancipação da mulher albanesa.

Nexhmije Xhuglini, companheira de Enver Hoxha, mãe de três filhos (Ilir, Sokol e Pranvera) é membra efetiva do Comitê Central do PTA desde 1948; é responsável pelo Departamento de Agitação e Propaganda desde 1952, além disso é diretora do Centro de Pesquisas Marxista-Leninistas, com um importante papel na Revolução Cultural da Albânia.

A luta interna do Comitê Central contra as influências titoístas, contra o paternalismo de Tito, contra os seus desejos anexionistas, vinha do período anterior à conquista de Tirana. Havia, na Albânia, uma grande influência exercida pelos conselheiros iugoslavos, pelos adeptos que conseguiram quer no partido, quer nas fileiras da Frente Democrática. Os titoístas tentaram intervir, pela primeira vez, declaradamente, em novembro de 1944, no decurso da 2ª Plenária do Comitê Central, em Berat, onde taxam o “intelectualismo” de Enver Hoxha, forma habilidosa de desarmar teoricamente o partido do proletariado. Nesse momento não ousaram propor a sua demissão, receosos da ligação do dirigente com o proletariado e as massas do povo. As corretas posições de Enver Hoxha prevalecem e são elas que conduzem à vitória, calando, por certo tempo, todos os oportunistas de direita, que ficam planejando sabotagens e traições nas sombras.

Em Paris, na Conferência dos 21 países no dia 29 de julho de 1946, tentam diminuir a participação da Albânia, sob o pretexto de que ela “tinha colaborado com o fascismo italiano”. Assim, buscavam diminuir o bloco socialista através da invalidação da intervenção dos membros do PTA na plenária, reconhecendo apenas o poder da burguesia, diminuindo toda a luta do Partido do Trabalho da Albânia. Enver Hoxha faz seu discurso em 21 de agosto, no qual exigia o reconhecimento da Albânia e seus princípios socialistas, neste momento as cadeiras das delegações americanas e inglesas estão vazias, mostrando que estavam comprometidas com a tentativa de estabelecer um regime burguês no país; há também a ausência de Bidault, Presidente da França, horrorizado pela pressão do discurso de Enver Hoxha. Ele é o único dirigente a afirmar que só em seu país os colaboracionistas dos fascistas foram realmente punidos. Em uma justa posição internacionalista, denuncia a aliança do Primeiro-Ministro britânico, Anthony Eden, com seu colega grego, Konstantinos Tsaldaris, e sua política de esmagamento do Partido Comunista da Grécia (KKE), ao lincharem seu principal dirigente, Nikos Zachariadis, ao aniquilarem as guerrilhas comunistas, os únicos combatentes consequentes contra o nazifascismo na Grécia, onde o Exercito de Libertação Nacional Albanês também combateu na região de Çamëria, mas retiraram suas tropas logo depois da vitória contra os alemães. Esta denúncia tem grande importância, pois nessa altura já era sabido que Tito havia entregue muitos patriotas gregos ao governo reacionário de Tsaldaris e alimentava esperanças de incorporar a Albânia na Federação Iugoslava através da atuação de seus agentes secretos.

Em 14 de julho de 1947, Enver Hoxha faz uma viagem a Moscou, a convite do secretário-geral do Partido Bolchevique, Josef Stálin, de lá que se derivam os primeiros acordos comerciais e culturais entre os dois países socialistas, bem como o auxílio técnico soviético no momento em que a Albânia começa a estar no auge do seu esforço para a industrialização e na preparação dos terrenos pantanosos do litoral para a agricultura. É um total acordo de comunistas, o internacionalismo nas suas formas práticas, baseado na ideologia comum, nos princípios marxista-leninistas defendidos com firmeza.

Os desejos anexionistas de Tito tomam forma em 1947, como manifestação de uma política burguesa mascarada de marxismo, que procura transformar a Albânia na sétima república da Federação Iugoslava. Se encontravam pessoas adeptas dessa posição até mesmo dentro do próprio PTA. Eram eles que suscitavam, no geral, uma oposição às orientações do Comitê Central e tinham uma total rejeição e repugnância entre as massas populares. Repugnância, no fundo, que não é mais do que a justa vigilância das massas perante a degeneração interna da Iugoslávia. O povo encontrou sua expressão política quando a quadrilha de Tito foi expulsa da Cominform e do bloco dos países socialistas em 1948.

Além da independência política e da afirmação da “autodeterminação dos povos”, segundo os princípios básicos de Lênin e Stálin, a luta contra a tentativa de ingerência Iugoslávia é, também, uma luta de duas linhas: entre a linha proletária, o caminhar sobre as suas próprias forças, e a linha capitalista de dar predominância à técnica afastada das massas populares, seus meros executantes.

É caminhando sobre as suas forças, aproveitando a iniciativa das massas, que a indústria albanesa cresce, no decénio de 1949-1959 à cadência de 20,6%(1). É caminhando sobre as suas próprias forças, conduzindo a capacidade criadora das massas operárias e camponesas, que o Partido do Trabalho dirige entre 1945-1946 a Reforma Agrária, que distribui 172 mil hectares de terras aos camponeses, sobre 221 mil ha do total de terras aráveis, beneficiando 70 mil famílias de camponeses pobres. Criam-se as primeiras cooperativas coletivas, segundo o método do convencimento político e do exemplo, e as primeiras Fazendas Estatais, sobretudo nas terras expropriadas das montanhas e dos pântanos. É caminhando com as forças do povo que o PTA pratica a diversificação da indústria e da agricultura, precavendo o abastecimento interno, para evitar qualquer género de dependência, qualquer tipo de chantagem económica, como a URSS tentou fazer em 1960, ao cortar os fornecimentos de trigo e de carvão, na sua tentativa infrutífera de dominar os albaneses.

O 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PCUS), em 1956, onde se juntam os representantes dos interesses da nova burguesia soviética, instalada no aparelho do PCUS e do Estado, através de seus ataques ao camarada Stálin, abre o combate declarado contra a ditadura do proletariado. Porém, se levanta uma onda de protestos na Albânia, contra a defesa de posições burguesas e reacionárias. Encontra, no entanto, eco em alguns oportunistas declarados que, com espírito servil perante Nikita Khrushchev, e demonstrando as suas reais posições de classe, procuram tirar as referências e citações de Stálin de alguns livros, mas estes não conseguem levar o seu trabalho de sabotagem para a frente, diante da resistência da maioria do Comitê Central do PTA e do povo.

Seis meses depois do 20º Congresso do PCUS, Enver Hoxha vai à Pequim, à frente da delegação do PTA convidada a assistir ao 8º Congresso do Partido Comunista da China (PCCh), de setembro de 1956. As relações com a República Popular da China, que se tinham incrementado a partir daquele ano, na altura dos grandes fornecimentos de arroz à Albânia, se estreitam ainda mais. O encontro dos dois dirigentes (Mao Zedong e Enver Hoxha) é caloroso e fraterno, numa compreensão correta das grandes tarefas que se avizinham, do longo caminho que é necessário percorrer para extirpar do Movimento Comunista Internacional a traição do revisionismo moderno.

As críticas insanas a Stálin, muito semelhantes as mentiras da burguesia na tentativa de combater o proletariado na luta de classes, no fundo visava atacar realmente o regime da ditadura do proletariado e todo o passado revolucionário da URSS. Foram uma porta aberta para novas tentativas anexionistas de Tito, para o ressurgimento de formas capitulacionistas, de integração na Federação Iugoslava, de integração direta com um país socialista de fachada, que era capitalista de fato. Enver Hoxha e a maioria do Comitê Central do PTA, com total apoio patriótico do proletariado e das massas populares, combateram, de 1957 a 1959, de forma decisiva, o titoísmo, arrasando, mais uma vez, o oportunismo de direita e a capitulação, frente ao jurado inimigo de classe, pleno de desejos de domínio sobre um povo livre.

Nos meados de 1960, Khrushchev, que vinha exercendo pressões econômicas e políticas sobre a Albânia socialista, passa a tentar converter suas teses revisionistas subvertendo o partido internamente, já que ele vira diversas vezes a firmeza da maioria do Comitê Central do PTA. Agora ele passava a querer conquistar quadros direto de Moscou, porém a resposta do PTA não tardou. Com o camarada Enver Hoxha à frente, o partido agiu com firmeza e decisão: Liri Belishova, antiga dirigente da BRPSH, e Koço Tashko, ex-embaixador na URSS, são expulsos do partido; organiza-se um processo com dez membros responsáveis, se comprovam as suas tentativas de participação em um golpe de estado, cujo resultado seria o desmembramento da Albânia, contra os interesses das massas; quatro destes membros renegados do PTA são condenados e executados. Como forma de protesto em relação ao seu golpe fracassado, a quadrilha de Khrushchev retira os submarinos soviéticos da base naval de Vlorë, deixando os 472 quilómetros da fronteira marítima albanesa desprotegidos, perante a esquadra do imperialismo americano que policiava o Mediterrâneo.

Também em 1960, na reunião de Bucareste, o Congresso dos 81 Partidos Comunistas e Operários, Enver Hoxha é o primeiro dirigente a fazer a denúncia pública do revisionismo moderno na própria tribuna do Congresso. É a atitude consequente de um dirigente e militante comunista, que vê e denuncia a traição ao proletariado e a causa de todos os povos do mundo.

Em 1961, o PTA, com Enver Hoxha à frente, arrasando com firmeza as tentativas e investidas do domínio da URSS, abandona e denuncia o Pacto de Varsóvia como uma força agressiva contra os povos do mundo, pois era a URSS que controlava as tropas do Pacto de Varsóvia, que as utilizava para os seus interesses social-imperialistas para subjugar os países da Europa Oriental e as massas populares, e dispor nos postos de direção os revisionistas que melhores sirvam aos seus interesses particulares, que de acordo de defesa perante a guerra imperialista se transformou na ponte da nova burguesia soviética.

Durante o 22º Congresso do PCUS de 1962, Khrushchev, ao mesmo tempo que proclama o Estado de Todo o Povo (mais um ataque contra a ditadura do proletariado) e a Coexistência Pacífica com o Imperialismo, como forma estratégica de decretar a nova partilha do mundo, atributo das superpotências imperialistas que dividem entre si suas respectivas zonas e esferas de influência, ataca a Albânia socialista, comparando-a a uma “rã de fábula”. É uma forma de denegrir o camarada Lênin, de invalidar o seu combate contra os oportunistas e renegados da Segunda Internacional porque estava sozinho à princípio e não tinha o apoio das legiões de Kautsky e de Bernstein e das mais variadas matizes. É a mentalidade de caixeiro que mede o marxismo a metro, não pela correção de princípios.

Porém, Enver Hoxha e o Comitê Central do PTA não estavam sós, como o veio a demonstrar a publicação das várias cartas do Comitê Central do PCCh ao PCUS, numa luta decidida contra o revisionismo moderno, na base dos princípios. São posições comuns de partidos irmãos frente ao inimigo de classe, com respostas precisas que refletem as respectivas particularidades nacionais de luta pela construção do socialismo e do comunismo.

Inicia-se em 1967, com toda a força e prestígio do PTA, a Revolução Cultural conduzida pessoalmente por Enver Hoxha. Processo de extinção da burguesia e do aprofundamento ideológico proletário, levado a efeito sob a ditadura do proletariado. É o culminar de um longo movimento de massas, de crítica ao revisionismo moderno, sob todas as suas formas, cujos primeiros pronúncios vêm de 1960, baseados no discurso de Enver Hoxha no Congresso dos 81 Partidos Comunistas e Operários em Bucareste, que se acentuam com as críticas albanesas às posições revisionistas saídas do 22º Congresso do PCUS. É a correta compreensão de que aquilo que separa o marxismo-leninismo do revisionismo moderno não são só este ou outro ponto concreto, mas duas concepções do mundo: a da burguesia e a do proletariado.

A Revolução Cultural incidiu em todos os setores da produção e da vida social, da crítica aos dirigentes revisionistas do PTA comprometidos com a volta do capitalismo através da promoção dos quadros novos; da crítica aos preconceitos dos velhos quadros contra as novas experiências, assim como a crítica ao ardor esquerdista dos quadros da juventude, colocando-os no mesmo esforço comum de condutores de vanguarda da construção socialista; da crítica aos quadros que defendiam a profissionalização do exército através da desagregação das milícias populares, levando ao aprofundamento da integração das mulheres trabalhadoras, aumentando a contribuição das massas para a defesa do socialismo e do povo; da crítica às concepções atrasadas e patriarcais sobre o papel das mulheres na construção do socialismo, levando a sua elevação e participação efetiva em todos os escalões do partido, do Estado e da produção; da crítica aos especialistas tecnocratas aburguesados, através da elevação do ensino politécnico; da crítica à religião opressiva, serventes do reacionarismo, ressaltando o papel histórico dos sacerdotes de todas as crenças que se identificaram com os interesses populares e aplicando as exigências das massas de fechamento dos templos, igrejas e mesquitas; da crítica às concepções individualistas, alimentando o espírito coletivo, a solidariedade proletária mútua; da crítica impiedosa ao revisionismo através da defesa intransigente de classe, do marxismo-leninismo. É um combate declarado e aberto contra o revisionismo e contra a burocracia.

Enver Hoxha, que dirige e participa ativamente em todo o processo da Revolução Cultural, apresenta, citando Stálin, a forma correta da sua condução: “Organizar o controle pela base, organizar a crítica de milhões de homens da classe operária contra o espírito burocrático das nossas instituições, contra os seus defeitos, contra os seus erros [...] Só deslocando o centro de gravidade da crítica pela base que poderemos conquistar o sucesso na nossa luta, e assim o burocratismo será extirpado”.

O informe político de Enver Hoxha ao 6º Congresso do PTA em 1971, bem como o informe de Mehmet Shehu, são o fundo político e ideológico de todo o movimento da Revolução Cultural, da luta contra o revisionismo, das bases para a continuação da construção do socialismo, da construção da sociedade de “a cada um segundo as suas necessidades”, na previsão genial de Marx para o comunismo.

O informe ao 6º Congresso é também o conhecimento, de Enver Hoxha e do Comitê Central do PTA, de que é um caminho longo e difícil, um caminho de constante apuramento político e ideológico, perante o cerco do imperialismo americano e do social-imperialismo soviético, de continuação da luta da classe operária, de participação dos comunistas em todos os trabalhos de vanguarda, sobretudo nos mais perigosos, que exigem os maiores esforços e dedicação, do seu exemplo no seio do povo, do seu trabalho ao serviço do povo – como afirma Enver Hoxha em seu discurso histórico de 2 de Fevereiro de 1973 – de total abdicação de si próprio, sem vantagens econômicas ou regalias pessoais, mas pela obrigação do seu elevado grau de consciência política, de construtores do mundo novo.

Em 1968, no 60º aniversário de Enver Hoxha, o PCCh enviou uma carta de saudação ao secretário-geral do PTA, assinada pelo próprio Mao Zedong, onde se lê, na edição do Zëri i Popullit de 16 de Outubro: “Tu és, de fato, um combatente e um grande herói do marxismo-leninismo”.


Nota de rodapé:

(1) Comparando com os países vizinhos, vemos que na Itália, no mesmo período, o crescimento é de 8,3%, na Grécia, 8,8% e na Iugoslávia, 11,3%. (retornar ao texto)

 

Inclusão: 06/10/2023