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Origem: Discurso proferido no Grande Comício "O Nordeste a Luiz Carlos Prestes", no Parque 13 de Maio, no Recife.
Fonte: Problemas Atuais da Democracia, Editorial Vitória, 1947, pág: 167-182.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo,
dezembro 2006.
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Povo do Recife!
Povo Pernambucano!
Povo do Nordeste!
Trabalhadores, operários e camponeses!
A vós, que constituis a parte mais sofredora da população do Brasil, povo das mais gloriosas tradições em todas as lutas pela liberdade e pela justiça em nossa terra, devia-vos, a todos vós, há muito, esta visita.
Aqui estou hoje para transmitir-vos a saudação do meu Partido, o Partido do proletariado, para transmitir-vos a saudação do Partido Comunista do Brasil, o Partido do proletário, vanguarda organizada da classe operária e também partido do povo. Aqui estou com as minhas saudações, menos para falar-vos do que para ouvir-vos, para sentir, como dirigente do Partido, as vossas reivindicações, porque, partido do povo, se o Partido Comunista quer, precisa, deseja, ser compreendido, o Partido Comunista, pelos seus dirigentes, precisa estar junto do povo, para compreender, para conhecer as reivindicações do povo.
Concidadãos! Companheiros!
A visita de hoje traz-me a oportunidade de, em nome do Partido do proletariado, dizer-vos que o Partido Comunista apóia, com entusiasmo, com satisfação e com orgulho, a candidatura civil levantada pelas forças democráticas de nossa terra, a candidatura do engenheiro Yeddo Fiuza à presidência da República.
Mas, companheiros, companheiras, amigos e amigas do Partido Comunista, concidadãos, a visita de hoje, esta grandiosa festa, festa organizada pelo povo e para o povo, coincide também, concidadãos, cem a grande data do nosso povo. Pela primeira vez, concidadãos, pela primeira vez, depois de 10 anos, podemos comemorar em praça pública os gloriosos acontecimentos de Novembro de 1935.
Concidadãos! Esta festa do povo, esta alegria popular é devida ao sacrifício de dezenas, de centenas, de milhares de companheiros, aqueles que gloriosamente tombaram na jornada de Novembro de 35, aqueles muitos outros que sofreram as torturas, os martírios, nos cárceres da reação, aqueles que morreram nas mãos dos carcereiros, dos bandidos policiais, aqueles que foram torturados, enlouquecidos pelos carrascos dos Felinto Muller e Etelvino Lins.
Companheiros! Concidadãos! Aos nossos gloriosos mortos a homenagem mais sentida de todo o nosso povo, de todos os que, no Brasil, estão dispostos a continuar lutando até o definitivo esmagamento do nazismo em nossa terra.
Concidadãos! O movimento de 1935 foi por 10 anos difamado, caluniado nos seus verdadeiros objetivos. Em 1935 o mundo marchava para o fascismo. Hitler assumia o poder na Alemanha e no mundo inteiro o fascismo subia e aqui, em nossa terra, um governo reacionário de mãos dadas com os bandidos integralistas tudo fazia para levar o Brasil ao fascismo, entregar o nosso povo ao chicote da Gestapo. Naquela época, concidadãos, ser patriota era ser democrata e ser democrata era saber lutar contra a fascistização de nossa terra. Se a todos nós roubavam as mais elementares armas da democracia, era dever nosso, de patriotas, de democratas, empunhar as verdadeiras armas e, de armas na mão, continuar lutando contra a fascistização do Brasil.
Foi o que fizeram os comunistas desde o início de 1935. Os comunistas estendiam a mão a todos os patriotas e democratas e organizavam a Aliança Nacional Libertadora. Organizavam-na com que objetivos? Com o objetivo de impedir a fascistizaçãode nossa terra. A Aliança Nacional Libertadora era antifascista e com 3 meses vida, arbitrariamente, contra o espírito e contra a letra da Constituição, era fechado o movimento aliancista. O povo, no entanto, continuou a afluir às fileiras da Aliança, e, se o fascismo marchava em ascendência no mundo inteiro, se os bandos integralistas atacavam em todas as cidades ao povo que lutava pela democracia, a Aliança Nacional Libertadora à frente do povo e com o Partido Comunista, fez uso, contra a violência dos dominadores, da violência como única arma de que podiam dispor todos os verdadeiros patriotas.
Companheiros! Em 1935 para lutar contra a fascistização de nossa terra, tivemos que empunhar armas. Fomos derrotados, sem dúvida. A derrota nas lutas políticas, como nas guerras, traduzem sempre graves erros. Se fomos derrotados é porque erramos. Esses erros estão sendo estudados pelo Partido Comunista e constituem rica experiência que o Partido saberá entregar a todo nosso povo. Mas o erro, concidadãos, o erro não foi o empunharmos armas. O erro estava, principalmente, em não estarmos à altura dos acontecimentos, em não termos conseguido ampliar a frente, União Nacional, em não termos conseguido desmascarar, por completo, a propaganda fascista. Quanto a empunhar armas, concidadãos, não foi erro porque aquele era o dever de todos os patriotas e de todos os democratas. Aquela derrota, companheiros, sabíamos nós que sendo a derrota numa luta justa, por uma causa do povo, pela causa da independência de nossa pátria contra a submissão do Brasil ao imperialismo nazista, seria fatalmente uma derrota passageira, uma derrota de pequena duração, porque mais dia menos dia, o sangue dos nossos mártires havia de transformar aquela derrota na vitória que hoje festejamos.
Companheiros! Se o movimento da Aliança Nacional Libertadora foi fundamentalmente um movimento antifascista, não há dúvida alguma que para enfrentar a demagogia integralista não bastava o programa negativo de impedir fascistização do Brasil. Era necessário que os aliancistas apresentassem um programa objetivo, capaz de atender aos problemas do desenvolvimento do Brasil. Os aliancistas, com os comunistas à frente, não temeram, apresentar o programa da revolução democrátieo-burguesa. Sabíamos que naquela época, como hoje, ainda não há condições para uma revolução socialista, mas o fundamental era romper todos os laços, todos os entraves que estavam impedindo o progresso de nossa terra, a livre expansão, o rápido desenvolvimento da economia nacional. Naquela época, já os aliancistas diziam: — vamos lutar contra o fascismo, façamos a revolução democrático-burguesa, agrária e antiimperialista — e por isso o lema da Aliança Nacional Libertadora era o mesmo lema dos dias de hoje: — pão, terra e liberdade.
Concidadãos! Fomos acusados naquela época de que pretendíamos implantar o comunismo, que pretendíamos criar governo soviético ou ditadura do proletariado. É mentira. É uma infâmia. É calúnia. Nem naquela época e nem hoje supomos possível uma revolução socialista imediata em nossa terra. Nós comunistas, somos socialistas, queremos e lutaremos até o fim para liquidar a exploração do homem pelo homem. Mas não pensamos em implantar comunismo. Para nós, marxistas, dizer isto é dizer uma asneira, mas esses senhores da reação, esses juizes dos tribunais de exceção não se incomodam, não têm vergonha de dizer asneiras, desde que isto satisfaça interesses de sua classe. Os comunistas, companheiros, na expressão de Marx, não pretendem criar nenhum Estado ideal. Os comunistas, aqui no Brasil e em toda parte, lutam pela negação dessa miséria atual, pelo contrário disso que aí está, mas esse contrário, essa negação, só pode ser construída com os materiais de que dispomos, com os recursos, com as condições objetivas de nossa terra e do momento histórico que atravessamos. Portanto, concidadãos, é falso, é injurioso, pretender condenar aos aliancistas em 1935 porque pretendiam implantar o comunismo. Os aliancistas lutavam em primeiro lugar, contra a fascistização de nossa terra e pelo desenvolvimento econômico dentro das possibilidades do Brasil — revolução democrático-burguêsa, revolução agrária e antiimperialista, revolução que já teve lugar na França há mais de 150 anos.
Concidadãos! Aqueles problemas, aquela miséria de 1935 que facilitou, sem dúvida, o grande, o rápido movimento da Aliança Nacional Libertadora, aqueles problemas, passados 10 anos, aí estão e agravados. A miséria do nosso povo, em vez de diminuir, cresce. A carestia da vida é cada vez maior. A mortalidade infantil liquida quase a metade das crianças que nascem vivas, antes que completem 1 ano de idade. A nossa juventude, os moços de 21 e 22 anos, segundo a palavra do ex-ministro da Guerra, sr. General Dutra, essa mocidade, na flor da idade é, em 60%, fisicamente incapaz para o serviço militar. A tuberculose cresce por todo o Brasil; a mortalidade pela tuberculose atingiu números jamais conhecidos.
Concidadãos! É esta a situação do nosso povo e não é necessário que eu insista nesse quadro perante o povo do nordeste, que o conhece muito bem, porque o sente em sua própria carne, na carne de seus filhos.
A carestia da vida, companheiros, se agrava de tal maneira que aumentos de salários de 40 a 50% são aumentos fictícios, porque os víveres de primeira necessidade no mesmo período de tempo aumentam de 100 e 200%. Enquanto isto, faz-se uma demagogia barata na liquidação do mocambo e numa criação de cooperativas contra o povo.
Concidadãos! A causa fundamental da carestia de vida está na inflação. Inflação é o aumento descontrolado dos meios de pagamento — moeda papel, crédito bancário — que crescem sem controle, e sem controle porque desde 10 de Novembro de 1937 o único organismo que ainda podia controlar o Executivo, que era o Parlamento, foi dissolvido. E a ditadura sabia que para oprimir o povo não eram bastantes nem as polícias, nem os juizes da reação, nem os cárceres e carrascos policiais, que era nececessário ainda amortecer o povo, enganar a nação com obras fictícias, obras de fachada, com avenidas para turistas, palácios majestosos que não interessam ao povo. Mas, tudo isso, companheiros, custou o dinheiro do povo e como os recursos resultantes de impostos eram insuficientes, um governo sem controle por parte de ninguém passou a emitir livremente, a aumentar o meio de pagamento sem um correspondente aumento da produção nacional. É a isto, concidadãos, é a essa diferença no ritmo do crescimento dos meios de pagamento e do crescimento da produção nacional que se chama inflação. É coisa, portanto, muito fácil do povo conhecer. Somente os jornais da reação e esses políticos da classe dominante é que procuram fazer tais problemas incompreensíveis para o povo. Mas, companheiros, a própria inflação é consequência da miséria de nosso povo, do atraso de nossa terra, e aqui, companheiros, falemos a verdade. Entre nós, ser patriota é dizermos uns aos outros a verdade, e não nos enganarmos, e a verdade, verdade dolorosa, sim, mas que é o primeiro passo para que possamos sair dessa situação, é que o Brasil é um dos palcos mais atrasados do mundo.
A renda nacional é miserável. Um brasileiro consome 25 vezes menos que um norte-americano. Essa, companheiros, é a realidade de nossa terra. Se o brasleiro comendo 25 vezes menos do que um americano ainda existe como nação, é porque o nosso povo é, sem dúvida, uma grande raça, contra tudo o que dizem os seus caluniadores.
Mas a verdade, companheiros, é que a renda pública, dinheiro indispensável para os serviços públicos mais necessários, para escolas para os nossos filhos, para estradas, portos, energia elétrica, para o saneamento de nosso povo, o dinheiro necessário para isso não existe. As rendas públicas são pequenas para as grandes despesas de um país moderno. Estamos no século XX, século do socialismo; as tarefas dos governos são cada vez maiores e nada se faz no mundo capitalista sem dinheiro, e esse dinheiro só pode vir da produção nacional. A renda nacional é ridícula, em nossa terra, é miserável. Mas, como aumentá-la? Evidentemente companheiros, não é com esses planos de industrialização do Brasil enquanto o mercado interno não crescer de uma maneira considerável. O povo não tem dinheiro em mãos para comprar coisa alguma. Mal ganha o indispensável para matar a fome. A classe média nas nossas cidades se proletariza a passos largos, para manter um nível de vida que vinha mantendo nos anos anteriores. Vive a fazer empréstimos que, pagos no dia de amanhã, a reduzirão a ter unicamente os braços para trabalhar. Não são, portanto, companheiros, os comunistas os que são contra a propriedade privada, como nos acusam.
Quem aniquila a propriedade privada é o próprio capitalismo, principalmente numa situação como a atual. O dinheiro se acumula cada vez mais e a ritmo cada vez maior nas mãos de uma minoria de argentados exploradores.
Concidadãos! O problema portanto, que aí temos, é de ampliar, consideravelmente, o mercado interno em nossa terra. Ampliar, tornar maior o mercado, como? Pela elevação do nível de vida das grandes massas. Mas, se 70% do nosso povo vive no campo, temos que começar, justamente, pela elevação do nível de vida das grandes massas do campo. E todos vós sabeis em que condições vivem esses irmãos camponeses. Não vivem, concidadãos. Vegetam. Sabeis quais são as condições de exploração nas grandes usinas de açúcar. Ainda hoje ao passar pela Paraíba, um camponês dizia-me que no serviço de estradas em São Gonçalo, perto de Sousa, no interior da Paraíba, os operários agrícolas a serviço do Estado ganham Cr$ 3,00 por dia, e não têm hora para trabalhar. Mas, a verdade é que a maioria nem ao menos esses Cr$ 3,00 ganha, porque ou ganha o vale para o barracão ou é o agregado, o meeiro da grande propriedade que, para viver na terra do senhor, de quem nada recebe, é obrigado a entregar de mão beijada a metade daquilo que, com seu trabalho, com o seu suor, tira da terra.
Companheiros! Essa grande massa do campo, em grande parte, nem mesmo o dinheiro conhece. Não há trocas monetárias no interior do Brasil. Enquanto isso não se der, são 20 milhões de brasileiros que nada contribuem para o mercado interno e constituem um fator nulo na economia nacional. No entanto, esses senhores do poder, em vez de se preocuparem em trazer esses 20 milhões à economia nacional, estão gastando recursos e cogitando da imigração estrangeira.
Companheiros! A elevação do nível de vida das grandes massas do campo interessa a todos os brasileiros. Aos capitalistas, aos operários da cidade. Aos capitalistas, porque capitalista não pode empregar dinheiro em máquinas para que essas máquinas fiquem paradas. E para que produzir tecidos se não há quem os possa comprar? Isto não é paradoxo, companheiros. Já em 1939 essa nossa miserável indústria de tecidos estava em superprodução. É irrisório mas é verdade. A indústria de tecidos em nossa terra, trabalhando 3 dias por semana, em superprodução, enquanto o povo não tem roupa para vestir.
Companheiros! Melhorar essas fábricas, trazer nova maquinaria, é aumentar de maneira rápida a sua produção mas, para que essa produção possa ser colocada no mercado, possa ser vendida, é necessário que o povo tenha dinheiro para comprar.
Portanto, companheiros, a elevação do nível de vida das grandes massas do campo, interessa também ao capitalista, naturalmente aos capitalistas patriotas, àqueles que amam a nossa terra, que colocam os interesses do Brasil acima, muito acima de egoísticos interesses individuais.
Mas, companheiros, o problema da elevação do nível de vida das grandes massas do campo interessa também imediatamente, ao proletário, ao operário da cidade. O operário pode gozar do direito de greve, mas que vale fazer greve se os patrões dispõem de uma reserva colossal de mão de obra barata, desses camponeses que por qualquer Cr$ 5,00 ou menos talvez, aqui no Nordeste, vêm substituir o operário na cidade.
Concidadãos! A elevação do nível de vida das grandes massas do campo só é possível pela liquidação do monopólio da terra, e a terra no Brasil está nas mãos uma minoria privilegiada. Essa minoria explora as terras de uma maneira atrasada, por processos os mais rotineiros, quando não as deixa abandonadas, mesmo junto aos grandes centros de consumo e de vias de comunicação já existentes.
O Partido Comunista do Brasil, no seu programa mínimo de União Nacional, programa que os seus deputados e senadores defenderão na próxima Assembléia Constituinte, diz que as terras úteis junto às grandes cidades ou centros de consumo e vias de comunicação, já existentes, se continuarem exploradas por esses processos rotineiros, se continuarem abandonadas, devem passar às mãos do Estado para serem entregues, gratuitamente, às grandes massas camponesas.
Companheiros! Este é o problema numero 1 de nossa economia, do progresso do Brasil. Esse problema, problema da revolução democrático-burguesa, esse problema para ser resolvido exige a união de todo o nosso povo, de todos os operários e patrões, camponeses e fazendeiros progressistas, todos os que amam realmente o Brasil, todos os que querem o progresso de nossa pátria, todos os que querem um futuro melhor para os nossos filhos. Que todos se unam, que se dêem as mãos sem distinção de categorias e de classes sociais, de crenças religiosas, de ideologias políticas, para enfrentar os graves e os complexos problemas desta hora.
O Partido Comunista vem lutando pela União Nacional. Desde há muitos anos atrás, concidadãos, que o Partido Comunista luta pela União Nacional. Partido perseguido, com seus dirigentes encarcerados, o Partido Comunista, quando o nazismo ameaçou a integridade de nossa pátria, soube esmagar ressentimentos, soube esmagar paixões, para estender a mão a todos e pregar a União Nacional em torno do Governo, Governo que até então perseguia os comunistas, Governo que apesar de todos os apelos do Partido do proletariado, apesar de tudo quanto faziam os comunistas, continuou mantendo o Partido na ilegalidade. Mas os comunistas, na defesa do superior interesse de nossa pátria, sabiam que se tivéssemos um Governo mil vezes mais reacionário do que aquele de então, a obrigação de todos os patriotas era apoiar aquele Governo para colocar a nossa pátria ao lado das Nações Unidas. E foi, companheiros, o que conseguiu o nosso povo. O Governo do sr. Getúlio Vargas, que marchara durante anos para a reação, esse mesmo Governo, sob a pressão do nosso povo, com o Partido do proletariado à frente, rompeu relações com o Eixo, reconheceu o estado de beligerância contra a vontade de meia dúzia de generais fascistas, soube organizar a Força Expedicionária Brasileira enviada para a Itália, onde os nossos soldados souberam honrar as mais gloriosas tradições de nosso povo. O sangue brasileiro foi derramado em solo italiano, na luta gloriosa pela liquidação militar do nazismo, e os nossos soldados estiveram à altura dos soldados das Nações Unidas, foram dignos das glórias dos soldados ingleses, dos soldados americanos e desse formidável exército do proletariado que é o Exército Vermelho.
Companheiros! Aproximava-se, no início deste ano, a olhos vistos, a derrota militar do nazismo, e o Governo brasileiro, esse mesmo Governo composto quase dos mesmos homens que tudo haviam feito para levar o Brasil ao fascismo cedia algo mais ao nosso povo, cedia no caminho da democracia. A liberdade de imprensa foi reconquistada pelo povo e reconquistado foi o direito de reunião, o de livre associação política, inclusive, concidadãos, para o Partido do proletariado, e isto pela primeira vez em nossa história. Depois de 23 anos de vida clandestina, o Partido Comunista alcançava a vida legal e os comunista enfrentando a calúnia, enfrentando a difamação de seus adversários, desses homens que os acusavam de cambalachos com o Governo, que os acusavam de queremismo, ou continuísmo, ou getulismo, ou não sei mais o que, os comunistas, sufocando paixões pessoais, esmagando ressentimentos, colocavam os interesses de nossa pátria acima de tudo e apoiavam, com convicção, com orgulho, com audácia também, o Governo do Sr. Getúlio Vargas porque este cedia ao povo e marchava para a democracia.
Companheiros! E nesta época, os nossos difamadores, esses que nos atacavam, eram esses mesmos velhos políticos que do ano de 1935 ao ano de 1937 dispunham de uma tribuna parlamentar e nada faziam em defesa da democracia. Naquela época aqueles senhores todos cediam ao Sr. Getúlio Vargas a lei de segurança; nenhum protesto contra o fechamento da Aliança Nacional Libertadora; as emendas inconstitucionais do fim do ano de 1935; todos os estados de guerra em plena paz; esse imundo papel Cohen, que aceitaram como verdadeiro, para acabar dissolvendo o Parlamento e a Democracia e facilitar o golpe de 10 de Novembro. Naquela época, quando o sr. Getúlio Vargas marchava para a reação e de mãos dadas com o integralismo, tudo fazia para levar o Brasil ao fascismo, aqueles senhores políticos o apoiavam, tudo lhe davam. Por quê? Porque temiam o povo, concidadãos. E agora atacavam Getúlio Vargas. E se passavam a atacá-lo, a causa era a mesma, era porque Getúlio Vargas cedia ao povo e esses senhores continuam temendo o povo.
Companheiros! O Partido Comunista apoiando o Governo durante esses 6 meses, alertou o nosso povo contra os golpes salvadores. Partido do proletariado, partido ligado à classe operária, o Partido Comunista não deixou de apontar ao povo o caminho da ordem e da tranquilidade. Mostrava e dizia aos operários: — é preferível, companheiros, apertar a barriga, passar fome do que fazer greve e criar agitações, — porque agitações e desordens na etapa histórica que estamos atravessando só interessa ao fascismo. O Partido Comunista foi, durante esses 6 meses o esteio máximo da ordem em nossa terra. O Partido alertou o nosso povo contra os golpes salvadores e apontou, ainda, o verdadeiro caminho na marcha da democracia em nossa terra. Disse ao povo que o Ato Adicional n.º 9 era reacionário e que a medida mais justa para a democracia estava na convocação de uma Assembléia Constituinte. O Sr. Getúlio Vargas com seu governo, nestes últimos meses, parecia ceder mais uma vez às aspirações do povo e os reacionários de todas as cores aproveitaram os mais tolos pretextos para esse golpe armado de 29 de Outubro. O golpe de 29 de Outubro, companheiros, foi profunda e eminentemente um golpe reacionário. Dirigido aparentemente contra o sr. Getúlio Vargas, o golpe de 29 de Outubro foi dirigido principalmente, fundamentalmente, contra o povo, contra as organizações do povo e contra o Partido do proletariado. Os senhores da reação, fazendo uso das armas compradas com o dinheiro do povo, lançaram essas armas contra o povo. E pretendiam um banho de sangue que justificasse uma nova ditadura, uma ditadura militar e o esmagamento do movimento operário. Mas o povo brasileiro e particularmente o proletariado, confiando no seu Partido, alertado pelo Partido Comunista, assistiu com sangue frio, com serenidade exemplar, à espetacular manifestação de força de 200 tanques com os canhões voltados para a sede nacional do Partido Comunista.
O golpe, companheiros, ficou no ar, nem o banho de sangue foi possível, porque o proletariado não deu um só pretexto para que fosse possível o derramamento de sangue do povo brasileiro e ao invés da ditadura teve que surgir um governo civil que, para se manter no poder, teve que se voltar para o povo e retomar o mesmo caminho de concessões ao povo e à democracia, o mesmo caminho que vinha trilhando o sr. Getúlio Vargas.
O governo atual, com o apoio do Partido Comunista, teve que retomar o caminho que vinha seguindo o Sr. Getúlio Vargas e inclusive, concidadãos, convocar a Assembléia Constituinte, a grande vitória de nosso povo. Essa vitória, companheiros, foi o fruto da organização do povo, do despertar político do nosso proletariado e do esforço, da energia, com que o Partido Comunista soube alertar o povo contra os golpes salvadores e a agitação fascista.
Companheiros! Marchamos para a Assembléia Constituinte. Aproxima-se a data da eleição dos homens que na Assembléia devem representar o nosso povo. As chapas, as listas dos partidos aí estão, à disposição do povo. O que o Partido Comunista pede é que todos apreciem, discutam, estudem, a composição dessas chapas e verifiquem onde estão os reacionários e os fascistas e integralistas escondidos sob todas as legendas. Que vejam e que estudem as chapas apresentadas pelo Partido Comunista do Brasil. Nas chapas do Partido Comunista estão operários, camponeses, intelectuais que provaram seu amor à democracia e que souberam nestes duros anos de reação, manter-se íntegros ao lado do povo. São esses homens, companheiros, que merecem o sufrágio da Nação, porque são eles que vêm do meio do próprio povo, conhecem as reivindicações do povo e só eles serão capazes, numa Assembléia Constituinte, de discutir e de promulgar a Carta Constitucional que reclamam os mais sagrados interesses do progresso e da democracia em nossa pátria.
Notem bem os companheiros, nas chapas dos partidos da classe dominante, os nomes que se escondem. Apoiando um dos partidos, está esse mesmo Etelvino a que já me referi. Todos vós sabeis que ele não pode ser amigo do povo. E junto a ele, outros e conhecidos integralistas que agora procuram mudar de nome, mas que continuam os mesmos inimigos da democracia e do nosso povo. Mas, não cuideis, companheiros, que é somente de um lado que estão os inimigos do povo. Do outro lado, também, encontram-se. Cito o caso de um homem, o único indivíduo que no estrangeiro, no México, foi capas de torturar uma velhinha brasileira pelo único crime de ser minha mãe. Esse indivíduo foi embaixador do Brasil em terras mexicanas e já foi carrasco, também, do povo pernambucano.
Companheiros! Chapas dessa natureza não podem contar com o sufrágio do povo.
Concidadãos ! Se marchamos para eleições à Assembléia Constituinte a 2 de Dezembro, segundo a legislação em vigor, deve também ser eleito o supremo magistrado da Nação. O Partido Comunista vê nisto um contra-senso político e jurídico. Se a Assembléia Constituinte é soberana, cabia à Assembléia decidir sobre o futuro presidente da República. No entanto, a legislação está de pé e as eleições se aproximam. O povo não pode deixar de votar para presidente da República, no próximo pleito de 2 de Dezembro.
Companheiros! Duas eram as candidaturas apresentadas ao povo. Apresentadas há 6 meses já. Mas essas candidaturas, apesar de toda propaganda já feita, não conseguiram o apoio e nem o interesse do povo.
O povo brasileiro sente que nestes últimos meses chegados a um novo nível democrático. Daqui o povo quer continuar marchando para a frente; nada de voltar aos negros anos de 1935 e 1937. E aquela parte do proletariado e do povo que ainda não estava com o Partido Comunista declara abertamente que preferia o Sr. Getúlio Vargas a qualquer dos dois candidatos militares e o povo tem razão. Atrás das duas candidaturas encontram-se, sem dúvida, alguns democratas equivocados, mas as forças diretoras, as que orientam essas candidaturas militares são profundamente reacionárias. A linguagem dos candidatos, o que dizem em seus boletins é bastante para que o povo conheça o sentido reacionário e fascista dos dois candidatos. Ambos declaram-se, por palavras mais ou menos semelhantes, inimigos do comunismo. Um diz que o comunismo é antibrasileiro. Mas, companheiros, o que significa comunismo para esses senhores? Comunismo é o Partido Comunista, é a organização do Proletariado e hoje, concidadãos, em pleno século XX, não é possível democracia sem o Partido do proletariado. Vivemos no século do socialismo. O proletariado é a classe do presente, é a única classe que tem perspectivas políticas, que sabe o que quer, que sabe para onde vai. Não pode haver democracia sem que o proletariado tenha o seu partido, o Partido Comunista, reconhecido e legal. Estes senhores, que se dizem anticomunistas, por mais que falem em democracia não são democratas, porque são fascistas.
Mas, companheiros, não se trata, já, de palavras somente. Os fatos aí estão para mostrar o verdadeiro caráter dessas duas candidaturas. Os acontecimentos de 29 de Outubro último, o golpe militar, aquele golpe em que as armas do povo foram lançadas contra o povo, teve à sua frente, na sua direção, ao lado dos mais ferrenhos inimigos do nosso povo, os dois candidatos militares à presidência da República.
Companheiros! As duas candidaturas militares já estão de tal maneira desmascaradas aos olhos do povo pelo seu caráter reacionário, e mais do que reacionário, fascista, que é incompreensível que homens sinceramente antifascistas possam continuar equivocados e apoiar essas candidaturas. E desta tribuna, à frente do povo nordestino, dirijo ainda um último apelo a homens que se dizem democratas, como Gilberto Freyre, por exemplo, porque se são democratas não podem continuar apoiando candidaturas reacionárias.
Companheiros! O povo, as forças democráticas, não podiam participar da eleição de 2 de dezembro sem indicar candidato. Quiseram colocar o nosso povo frente a um dilema terrível — entre o ruim e o pior, o dilema que o povo não aceitou porque as forças democráticas, inclusive o Partido Comunista, apesar da premência de tempo, procuraram o candidato na altura de executar um programa mínimo de União Nacional. O administrador provado, o democrata e o antifascista, e ainda mais, um civil também, porque ficou provado, na prática, o perigo dessas candidaturas militares. Esses senhores tomam a crítica a eles feita como ofensas à corporação a que pertencem e respondem à crítica não com palavras e argumentos, mas pretendem responder à crítica com as armas compradas com o dinheiro do povo.
Companheiros! Retomamos as gloriosas tradições civilistas do nosso povo e as forças democráticas apontam ao sufrágio da Nação o nome do engenheiro Yeddo Fiúza certas de que o povo, se compreender a significação histórica dessa candidatura, se o povo compreender o perigo que ameaça seu futuro com a vitória de qualquer uma das candidaturas reacionárias, se o povo compreender isso, apesar da premência de tempo, o povo brasileiro, que neste memorável ano de 1945 já alcançou duas grandes vitórias — anistia para os presos políticos e a convocação da Assembléia Constituinte — o povo poderá vencer mais uma vez, elevando à suprema magistratura da Nação o candidato civil, o administrador, o técnico e o democrata, engenheiro Yeddo Fiuza.
Companheiros! Termino o que tinha a dizer-vos em nome do meu Partido. Sentimos, companheiros, ante o vosso entusiasmo, ante o espetáculo magnífico desta noite, quão pesadas são as responsabilidades que pesam sobre nossos ombros. O povo brasileiro tem razão de muito esperar do Partido Comunista e das forças democráticas que com ele marcham para a união nacional. A responsabilidade que assumimos frente ao povo é, sem dúvida, responsabilidade esmagadora. Mas os comunistas sabem que junto com o povo não devem, não podem temer responsabilidades.
Companheiros! Para a frente, portanto; com ordem e tranquilidade tratemos de resolver pacificamente os nossos problemas. Façamos uso até o extremo limite das grandes armas da democracia. O grande e genial Stalin disse que estamos numa nova época, estamos na época do desenvolvimento pacífico. Mas não esqueçamos, concidadãos, a frase de Marx, que o desenvolvimento pacífico só pode continuar pacífico enquanto a classe dominante assim o permitir. Porque, contra a violência dos dominadores, em benefício do progresso de nossa pátria e da democracia, pela liquidação do fascismo, jamais vacilaremos de responder à violência dos dominadores com a violência do povo.
Por enquanto, que gozamos do direito democrático façamos uso dele até o extremo limite. Conscientemente façamos uso do direito do voto. Que o nosso voto só seja dado àqueles que realmente o merecem.
Concidadãos! Certo que, mais do que nunca, a desordem no atual momento só interessa ao fascismo, que ainda tenta sobreviver, mas é com as armas da democracia que temos de esmagá-lo, de impor e consolidar a democracia em nossa terra.
Salve o povo do Nordeste! Salve o Brasil!
(Aplausos demoradíssimos. Indescritível entusiasmo popular. Sob entusiásticas aclamações de "Viva Luiz Carlos Prestes", começou todo o povo a cantar o Hino Nacional.)
Inclusão | 23/12/2006 |