Devemos agora voltar à expressão "valor ou preço do trabalho".
Vimos que, na realidade, este valor nada mais é que o da força de trabalho, medido pelos valores das mercadorias necessárias à sua manutenção. Mas como o operário só recebe o seu salário depois de realizar o seu trabalho e como,ademais, sabe que o que entrega realmente ao capitalista é o seu trabalho, ele necessariamente imagina que o valor ou preço de sua força de trabalho é o preço ou valor do seu próprio trabalho. Se o preço de sua força de trabalho é 3 xelins, nos quais se materializam 6 horas de trabalho, e ele trabalha 12 horas, forçosamente o operário considerará esses 3 xelins como o valor ou preço de 12 horas de trabalho, se, bem que estas 12 horas representem um valor de 6 xelins. Donde se chega a um duplo resultado:
Primeiro: O valor ou preço da força de trabalho toma a aparência do preço ou valor do próprio trabalho, ainda que a rigor as expressões de valor e preço do trabalho careçam de sentido.
Segundo: Ainda que só se pague uma parte do trabalho diário do operário, enquanto a outra parte fica sem remuneração, e ainda que este trabalho não remunerado ou sobre-trabalho seja precisamente o fundo de que se forma a mais-valia ou lucro, fica parecendo que todo o trabalho é trabalho pago.
Esta aparência enganadora distingue o trabalho assalariado das outras formas históricas do trabalho. Dentro do sistema do salariado, até o trabalho não remunerado parece trabalho pago. Ao contrário, no trabalho dos escravos parece ser trabalho não remunerado até a parte do trabalho que se paga. Claro está que para poder trabalhar, o escravo tem que viver e uma parte de sua jornada de trabalho serve para repor o valor de seu próprio sustento. Mas como entre ele e seu senhor não houve trato algum, nem se celebra entre eles nenhuma compra e venda, todo o seu trabalho parece dado de graça.
Tomemos, por outro lado, o camponês servo, tal como, existia, quase diríamos ainda ontem mesmo, em todo o oriente da Europa. Este camponês, por exemplo, trabalhava três dias para si, na sua própria terra, ou na que lhe havia sido atribuída, e nos três dias seguintes realizava um trabalho compulsório e gratuito na propriedade de seu senhor. Como vemos, aqui as duas partes do trabalho, a paga e a não paga, aparecem visivelmente separadas, no tempo e no espaço, e os nossos liberais podem estourar de indignação moral ante a idéia disparatada de que se obrigue um homem a trabalhar de graça.
Mas, na realidade, tanto faz uma pessoa trabalhar três dias na semana para si, na sua própria terra, e outros três dias de graça na gleba do senhor como trabalhar diariamente na fábrica, ou na oficina, 6 horas para si e 6 para o seu patrão, ainda que neste caso a parte do trabalho pago e a do não remunerado apareçam inseparavelmente confundidas e o caráter de toda a transação se disfarce por completo com a interferência de um contrato e o pagamento recebido no fim da semana. No primeiro caso, o trabalho não remunerado é visivelmente arrancado pela força; no segundo, parece entregue voluntariamente. Eis a única diferença.
Sempre que eu empregue, portanto, a expressão "valor do trabalho", empregá-la-ei como termo popular, sinônimo de "valor de força de trabalho".