A miséria da política conjuntural
A ressurreição do keynesianismo é mais que duvidosa

Robert Kurz

29 de agosto de 2008


Primeira Edição: Original DAS ELEND DER KONJUNKTURPOLITIK em www.exit-online.org. Publicado em “Freitag”, 29.08.2008

Fonte: http://www.obeco-online.org/robertkurz.htm

Transcrição e HTML: Fernando Araújo.


Quanto mais claramente se faz notar a queda da conjuntura global de deficit, mais altos se tornam os apelos a favor de um programa estatal de conjuntura, desde o sábio da economia Bofinger, passando pelo ministro da economia Glos e pelos sindicatos, até bem dentro do espectro político de esquerda. Precisamente perante o regresso da estagflação dos anos 70, exumam-se variantes das receitas keynesianas, que então fracassaram e empurraram as elites capitalistas na fuga em frente para a “revolução neoliberal”. Agora regressam os mesmos problemas, no nível mais elevado da globalização. É mais que duvidoso que a óbvia bancarrota da doutrina neoliberal possa ser vencida pela ressurreição do keynesianismo.

Todos os programas conjunturais são limitados ao espaço do Estado-Nação. Porém, já não existe conjuntura nacional. O que estatisticamente ainda é referido como tal, há muito que é parte integrante de uma conjuntura mundial integrada, com orientação para a exportação de sentido único, que tem como ponto de fuga o “milagre do consumo” dos EUA apoiado no deficit. Quando este sorvedouro terminar, o que ainda só está iminente, é de esperar um efeito dominó negativo sobre todo o conjunto encadeado da economia mundial. O declínio conjuntural em toda a União Europeia, na Europa Oriental e em parte também já na Ásia é apenas o indício deste desenvolvimento. Sob estas condições, programas nacionais de conjuntura poderiam, na melhor das hipóteses, ter o conhecido efeito da gota de água no oceano. Simultaneamente regressa, como na estagflação dos anos 70, o dilema da política monetária, como dilema de política conjuntural. Os bancos emissores precisariam de subir os juros de referência para eliminar a inflação; por outro lado, precisariam de baixar os juros, para estabilizar a conjuntura que submerge. Injecções estatais na conjuntura, por meio de tomadas de crédito para o efeito, como prevê a receita keynesiana, agravariam este dilema. Pois uma procura crescente de crédito por parte do Estado puxa para cima a taxa de juro no mercado, encarecendo os investimentos e agravando o potencial inflacionário.

Além disso, as munições do keynesianismo já foram realmente esgotadas. Pois o neoliberalismo era mais keynesiano do que queria fazer crer. As intervenções estatais foram apenas num sentido diferente, já não direccionadas para programas sociais, investimentos na educação e infra-estruturas. Por um lado houve o keynesianismo do armamento, desde o Presidente Reagan, que conduziu ao “porto seguro” dos EUA o capital monetário global excedentário. Por outro lado, as orgias de desregulação e privatização abriram caminho para a “inflação de activos” da economia das bolhas financeiras, com que foi alimentada a conjuntura mundial. Com a crise financeira global e o surto de inflação igualmente global chega ao fim este crescimento baseado no deficit. Para evitar a “fusão nuclear” do sistema financeiro, os Estados já tiveram de aportar enormes somas para saneamento dos balanços dos bancos; e este processo ainda não chegou ao fim. O keynesianismo do armamento, das bolhas financeiras e do saneamento já esgotou as possibilidades do Estado, antes que pudessem ter sido tomados em consideração quaisquer programas de apoio à conjuntura.

O mainstream cada vez mais neoliberal dos economistas exige, em vez de um programa de conjuntura, mais “reformas da economia de mercado”, sobretudo a desregulação do mercado de trabalho. Salta à vista a falta de lógica deste argumento perante a conjuntura. Já a Agenda 2010 em vigor levou a que os supostos “êxitos no emprego” da administração coerciva estatal, através de baixos salários e aumento do tempo de trabalho, fossem de par com o secar do consumo interno. O fim da conjuntura de exportação repercutirá também sobre os precários postos de trabalho fictícios surgidos à sua sombra. De grande actualidade seria exigir não a delegação nas forças milagrosas do Estado, mas uma resistência social sem hesitações por um drástico aumento dos salários e das prestações sociais do programa Hartz-IV indignas de seres humanos, em nome dos interesses vitais. Este critério, porém, parece já não desempenhar qualquer papel, quando os sindicatos e a esquerda já se limitam a funcionar como forças de manutenção junto à cama de enfermo da capacidade funcional capitalista e dão tratos à imaginação sobre a desordem vigente. O dilema estrutural do capital mundial nos limites da globalização “financeiramente induzida” mais uma vez chama a atenção para a falta de uma alternativa social.


Inclusão: 28/12/2019