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A subjectivação reducionista das categorias foi politico-economicamente justificada com o desenvolvimento do próprio capitalismo, até um capitalismo "organizado" (Hilferding). Os problemas da valorização, na realidade resultantes de um processo secular de dessubstancialização do próprio valor, que tinham potenciado as intervenções do Estado desde o fim do século XIX (com os posteriores impulsos da economia de guerra da época das guerras mundiais e mais tarde da regulação fordista na segunda metade do século XX), apareciam a bem dizer como "remoção da lei do valor", através do pretenso comando directo da política e da gestão dos conglomerados empresariais sobre a reprodução capitalista. Esta representação assombra todos os domínios dos padrões interpretativos entretanto classificados com o rótulo de "marxismo ocidental" e que arvoram a pretensão de ir além do "economismo" do marxismo tradicional — quando na realidade representam apenas o reverso subjectivo-ideológico da mesma medalha.
Com isto se prolonga e potencia a ilusão política, tal e qual ela tinha caracterizado o marxismo do antigo movimento operário desde o início. A "luta pelo reconhecimento", no terreno do trabalho abstracto e portanto da socialização do valor, na realidade só podia ser conduzida de forma política precisamente devido à sua limitação, pois a política não é senão a "esfera de tratamento" secundária dos problemas sociais continuamente causados pela relação de capital. Esta esfera, de acordo com o seu conceito, pressupõe a valorização do valor como positiva, sendo considerada uma componente imanente do valor como forma social. Qualquer contraposição de economia e política que se fique por esta diferença e suponha as duas esferas como mutuamente exteriores, sem conseguir compreender a sua conexão abrangente [übergreifenden Zusammenhang] na relação de valor e na substância de trabalho, permanece decisivamente reduzida e desemboca em alguma variante da ilusão política. A política, de acordo com o seu conceito, está relacionada com o Estado, mas o Estado como categoria e como aparelho concreto representa o mecanismo de tratamento político do capitalismo, que per se não pode conduzir para além do fim em si da valorização do valor, não passando, pelo contrário, de uma simples função desta coacção (as fricções no decurso do processo de tratamento político podem involuntariamente libertar potenciais da crítica, mas isto nada muda no estado das coisas estrutural).
O entendimento do carácter comprometido com o sistema do Estado e da política pressupõe no entanto o entendimento da falsa objectivação das categorias capitalistas em geral e do carácter de fim em si do "sujeito automático". Daqui resulta uma crítica do Estado completamente diferente da do marxismo tradicional. O modo de falar do Estado como "comité de gestão de negócios da burguesia", tal como é usado ocasionalmente também por Marx e como se consolidou finalmente no conceito de "Estado de classe", é de muito pouco alcance e é a expressão de uma subjectivação sociologística. As classes não determinadas nos seus pressupostos, mas na realidade categorias derivadas da relação de fetiche que são tomadas por sujeitos sem pressupostos, parecem então subsumir todas as categorias da reprodução do capital sob esta subjectividade sociológica, como sua última base. Precisamente por isso, porém, as categorias trabalho, valor, Estado, política etc., são ontologizadas, pois só são definidas como objectos da crítica pelos seus atributos, como "trabalho (transhistórico) explorado pelo capital", "valor apropriado pelos dominantes (mais valia)", "Estado da burguesia" etc., de modo que se gostaria de imaginar um "trabalho livre", um "valor apropriado com autodeterminação, isto é, justamente repartido", um "Estado proletário" e, nota bene, uma "política emancipatória".
A falsa subjectivação já estava na hipóstase do conceito de classe sociologicamente reduzido, como pretenso ponto de partida de toda a reflexão (enquanto Marx começa com a forma da célula capitalista valor, com a determinação da reprodução pela forma fetichista, e não com a classe sociológica). No marxismo tradicional, ainda assim, as categorias da crítica da economia política desenvolvidas por Marx, que nada mais exprimem que a objectivação negativa da constituição de fetiche, do "sujeito automático", levaram por algum tempo uma vida própria fantasmática e produziram aqueles debates sobre desenvolvimento capitalista, tendências de crise e colapso, que permaneciam sistematicamente não mediados com a supostamente "autêntica" problemática das "classes" e da sua "política"; daí também o desembocar em e o fracassar na não resolvida questão abstracta da estrutura-sujeito-objecto.
Na medida em que o movimento operário, na sua "luta pelo reconhecimento" como sujeito do trabalho, do direito e da cidadania estatal, que necessariamente assumia a forma política, foi bem sucedido, transformou-se ele próprio em sujeito burguês, na "jaula de ferro" (Max Weber) da socialização do valor. O seu êxito foi simultaneamente um auto-acorrentamento e uma auto-condenação à forma fetiche, e a política permaneceu o veículo desse encantamento. A ascensão do movimento operário, o seu sucesso na "luta pelo reconhecimento" (um sucesso escrito a sangue, pois encontrou a sua realização na primeira guerra mundial — o pleno reconhecimento veio junto com o sacrifício de sangue no altar da nação burguesa) e a ascensão da intervenção do Estado caminharam de mãos dadas. O que seria mais óbvio do que concluir agora a subjectivação das categorias, entender definitivamente mal a política como forma de emancipação e justificar isto com o próprio desenvolvimento do capital?
A teoria do "capitalismo organizado", da pretensa "suplantação da lei do valor" e do "comando político" sobre as categorias reais do trabalho abstracto e do valor prosseguiu apenas, por um lado, a clássica tendência da social-democracia a "ir-se chegando paulatinamente" e sem quebra ao "socialismo" de uma auto-trituração autodeterminada numa sociedade fabril organizada ou "fábrica social total"; por outro lado, levou até ao fim a subjectivação e tornou-se assim susceptível de também dar lugar a interpretações de esquerda radical, que no entanto permaneciam enraizadas na mesma lógica. Isto aplica-se tanto à teoria de Horkheimer e Adorno do "Estado autoritário", que supostamente actuaria para além da lei do valor, como às posteriores posições operaistas. Em cada caso, quer o pretenso regime de comando político sobre o trabalho abstracto/forma do valor se tenha apresentado como positivo (social-democracia), quer (não em último lugar sob a impressão do nacional-socialismo) tenha sido entendido como "fatalidade" (Horkheimer/Adorno), ou tenha figurado como pura "determinação da vontade" do inimigo de classe, que devia desafiar e mobilizar sempre de novo a "contra-vontade" do proletariado (Negri-Operaismo) — perante este pano de fundo, quando tudo se dissolveu na "política", já não é pensável um limite interno objectivo. Com isto, no entanto, a aparente "suplantação" das teorias do colapso tornou-se idêntica à ilusão política acabada, com a inflexão do pensamento da emancipação para a esfera da função política da modernidade capitalista.
É com razão que Giacomo Marramao chama a atenção nos anos 70 para que "são precisamente os teóricos do austromarxismo que abrem no marxismo europeu aquela ‘saison da subjectividade’ que consiste numa leitura renovada, activista, das obras de Marx, através do filtro de determinados temas do neo-kantismo" (Marramao, ob. cit., 26). De modo nenhum por acaso, os activistas radicais de esquerda do operaismo e correntes semelhantes dos anos 70 (e em parte até hoje) invocam nas suas análises teóricas precisamente do teorema de Hilferding do "capitalismo organizado". Esta orientação geral tinha por consequência, porém, como Marramao constata de seguida, "tanto junto dos austromarxistas neo-kantistas, como também junto da ala maioritária do comunismo de esquerda, uma restrição gnoseológica daquele domínio que em Marx é determinado pelas relações sociais de produção. Ao postulado do momento subjectivo (etico-universalista) corresponde a análise sociológico-empírica do "múltiplo ou do real". Em vez de tornar reconhecíveis as leis que determinam as tendências do modo de produção, a análise económica perde-se assim num exercício de micro-sociologia" (ob. cit. 26, itálico de Marramao).
Este entendimento crítico ficou porém por desenvolver, um simples elemento de pista, e não pôde impedir que o mainstream da nova esquerda se tivesse movido nas variantes da falsa subjectivação de Negri. O que se encontrava também na própria argumentação de Marramao, uma vez que esta não chegou ao problema da constituição-fetiche, nem à solução do dilema-sujeito-objecto, mas ela própria já partia a priori da redução desconceptualizada à política; o objectivo do seu ensaio, esclarece ele logo no começo, estava "na perspectiva de uma complexa nova definição de uma política adequada à situação dos países tardo-capitalistas" (ob. cit., 13, itálico de Marramao). Isto lembra fatalmente Christoph Deutschmann, no qual a aproximação ao problema do limite objectivo enquanto dessubstancialização também se transforma imediatamente no paradigma do tratamento político; o que em Deutschmann aparece no plano das categorias do capital, como "política económica", transforma-se em Marramao na abstracção vazia "da política" em geral, no metaplano do problema-sujeito-objecto.
Por aqui se ficou até hoje. Tanto o pós-operaísmo de Negri, que de há algum tempo a esta parte tem feito furor de novo (pelo menos nos suplementos culturais), como em termos gerais a esquerda pós-moderna, mas também posições antes de mais do marxismo tradicional da "luta de classes", continuam apegados a um conceito tão difuso quanto inflacionário de "política", degradado à frase vazia. Nem sequer sabem de que história são o resultado. A política é equiparada de qualquer maneira com intervenção em geral, passando ao largo das categorias, que mais do que nunca estão degradadas a um mero ruído de fundo. O que em Pannekoek ainda foi pré-pensado com pouca clareza, concluiu-se até à estupidificação categorial da esquerda. Invocam-se os sujeitos ou "o sujeito" puro e simples, a forma não é nada e a vontade, tudo. Indiferente ao trabalho abstracto, à substância do valor e à forma do valor, ao desenvolvimento e à crise, pretende-se mobilizar nos seres humanos em falsa imediatez tudo aquilo que de algum modo "não se encaixa" na valorização do valor, como se isso fosse possível sem a mediação da crítica da forma do sujeito e da sua substância social. "A capacidade de intervenção" é tudo, e precisamente por isso nunca dá nada. Nos meios de esquerda, que são determinados por este conceito político inflacionário, vazio e desvanecido, a ideia de um limite interno objectivo já só provoca uma espécie de grunhidos e, mês sim, mês não, celebra-se a despedida definitiva dos "teóricos do colapso". E esses grunhidos tanto mais são rosnados e escarrados quanto mais penosa e regularmente a "intervenção política" se ridiculariza até ao tutano.
É um esforço inglório querer apresentar a estes meios de cena, que não são senão os últimos moicanos da história marxista, uma reformulação da reflexão categorial, enquanto eles próprios não consigam dar passos nessa direcção, encarando de frente desde logo o seu próprio comportamento de lemmings do intervencionismo político. No entanto, a reflexão categorial também pode e deve ser desenvolvida independentemente da capacidade de recepção destes ilusionistas políticos do social em estado terminal. Retomemos a discussão no ponto em que o debate histórico colapsou na subjectivação das categorias. Em que sentido é que o problema se coloca de novo, se a ontologia do trabalho marxista for criticada e superada, o que por seu lado também conduzirá a uma nova definição do sistema categorial do trabalho abstracto?
Apesar da sua redução à sociologia das classes e à política, o marxismo tradicional pôde viver com a objectivação das categorias por as ter positivado e transformado em objectos ontológicos de um tratamento político reduzido aos atributos, cujo resultado acabaria por ser a subjectivação categorial total; o movens desta subjectivação era constituído pela discussão em torno da teoria do colapso, que conduziu à paralisia na insolúvel aporia-sujeito-objecto. O regresso às categorias após a passagem pela crítica radical da ontologia do trabalho já não pode conceber positivamente a conexão categorial do trabalho abstracto, mas apenas negativamente (como se explicitou na primeira parte deste estudo). Mas com isso também se coloca de modo diferente o problema-sujeito-objecto no contexto da questão da crise e do colapso. O sujeito e o objecto já não podem ser relacionados de um modo simplista como unidade positiva, mas têm que ser percebidos primeiro no seu rompimento [Zerrissenheit].
Logicamente a questão da crise e do colapso está então sediada puramente no plano da objectivação falsa, negativa, e do movimento categorial autonomizado da dinâmica capitalista. A questão da crise e do colapso deve ser portanto estritamente separada da questão da emancipação. Ambas se separam em primeiro lugar conceptual e realmente, tal como a sociedade-fetiche moderna se constitui em geral em polaridades autonomizadas opostas. A emancipação só pode ser consciente; crise e colapso, pelo contrário, de acordo com o seu conceito, só podem acontecer num processo inconsciente de desenvolvimentos objectivados e nada têm a ver imediatamente com o agir consciente. Daí que o capitalismo pode colapsar sem que os seres humanos se emancipem. O resultado seria o auto-aniquilamento da humanidade, ou a "queda na barbárie", como Marx assinalou metaforicamente esta alternativa. O conceito é problemático e de proveniência eurocêntrica, mas é o mais atreito a assinalar uma possibilidade, última, de objectivação negativa. Assim, de facto, pode-se ver na televisão as "catástrofes de natureza social", até elas atingirem o próprio, mas não a própria emancipação do contexto que provoca essas catástrofes. Inversamente, os seres humanos podem em princípio emancipar-se sem que o capitalismo colapse. Este colapso não é nenhuma pré-condição social indispensável da emancipação, mas pode, na sua cega objectividade, tornar-se na condição de ambiente social do pensar e do agir emancipatórios, se a transformação emancipatória se fizer esperar por muito tempo e for dada ao capitalismo a oportunidade de desenvolver completamente as suas contradições internas. Crítica e crise são assim botas de dois pares, e quem calçar uma bota de cada par e quiser correr nesta falsa unidade tem que cair sobre os próprios pés.
Nesta perspectiva torna-se completamente impossível uma afirmação como a de Paul Mattick, que junta de modo simplista ambos os polos e abstrai do seu rompimento [Zerrissenheit] a favor de um monismo não mediado de sujeito e objecto: "O conhecimento teórico de que o sistema capitalista, por causa das contradições que o impulsionam, só pode desembocar no colapso não obriga por isso à opinião de que o colapso real seja um processo automático, independente dos seres humanos" (Mattick, cit. em Marramao, ob. cit., pag 25, itálico de Mattick). A fórmula desamparada do colapso "real", como se houvesse um autêntico e outro não autêntico, remete apenas para o facto de que não se chegou ao fundo do problema. Tanto a tendência secular para o colapso, enquanto dessubstancialização ou desvalorização do valor, como também um processo real de colapso, no fim da capacidade de desenvolvimento capitalista, são de facto como legalidade sistémica um "processo automático", enquanto os seres humanos agirem conforme a determinação da forma capitalista; mas daí não resulta jamais "automaticamente" uma outra sociedade, emancipada.
Até este ponto já o problema foi discutido noutro lugar (vide Kurz 2003, 226 sg.). Mas com isto não se esgotou ainda a colocação da questão, mesmo se tal contribuiu ao menos para desfazer a distorção do problema-sujeito-objecto no contexto da problemática da crise e do colapso. Poder-se-ia contudo objectar que, com a tónica na estrita objectividade da tendência de crise e colapso, por contraposição à crítica e à emancipação, o problema acabou por ser de novo objectivado, uma vez que o que aqui está em questão não é a objectividade de processos da "primeira natureza" efectiva, mas a objectividade de uma pseudo-natureza social, que em última instância tem de ser mediada por acções humanas. Uma vez que nem pode ser de outra maneira, a questão a colocar de seguida é evidentemente a da mediação "subjectiva" da objectividade social, em vez de subjectivar esta objectividade de modo não mediado (como fazem, em grande medida, o marxismo da sociologia das classes e particularmente o comunismo de esquerda/operaismo), ou entendê-la mal como uma objectividade no sentido das ciências naturais (como a doutrina da economia política). No fundo trata-se do mesmo problema que nas ciências sociais burguesas desde sempre se constituiu como a oposição entre a teoria da estrutura e a teoria da acção.
Uma vez que em última instância todas as manifestações, categorias e processos sociais não são produzidos nem conduzidos por nenhuma "coisa do exterior", mas remontam a acções e decisões humanas, então não há realmente nenhum determinismo em geral, pelo menos absoluto. Tudo o que aconteceu e acontece, incluindo a objectivação da "segunda natureza", é determinado por acções e decisões. A pura objectividade de um processo histórico e a filosofia da história positiva a construir sobre ela é sempre uma interpretação ex post, que glorifica como "necessidade" um percurso simplesmente real (em Hegel elevado a sistema e simplesmente "virado do avesso" no chamado materialismo histórico). Na realidade todos os processos históricos são sempre até um certo ponto abertos e indeterminados, enquanto não forem tomadas decisões nem executadas acções. À semelhança das explicações populares da física quântica, poder-se-ia apresentar a história como uma nuvem de probabilidade de possibilidades indeterminadas, que apenas no momento do agir se consolidam em realidade histórica.
Mas, primeiro, há acções e decisões de alcances diversos; em segundo lugar, as acções e decisões constituem uma conexão em cadeia, de modo que uma vez executadas já não podem ser revertidas. E nesta medida todas as acções encontram-se sempre ligadas aos resultados de acções anteriores e por estas condicionadas. Enquanto a sociedade humana não chegar a uma consciência própria como "associação de indivíduos livres", que sempre já correflecte as condições e as consequências da sua acção social e que, em decisão livre e consciente, decide sobre a realização das suas possibilidades, também as conexões em cadeia sempre voltam a adensar-se em padrões de acção cegos, na matrix de uma "segunda natureza" que se autonomiza face aos indivíduos e se apresenta como uma "coisa exterior".
Em termos gerais, isto poderia ser designado por constituição de fetiche, sendo que toda a História até à data foi a história das relações de fetiche. Uma semelhante matrix é o que Marx designa por modo de produção histórico e que poderia alargar-se no conceito de um modo de vida e de produção; na ciência histórica burguesa fala-se muitas vezes de culturas, no marxismo por vezes também de formações sociais. Para recorrer uma vez mais à comparação com a física, poder-se-ia também falar de um campo histórico. Trata-se aqui precisamente daquilo que no início deste estudo foi criticado como défice de percepção sistemático do pensamento pós-moderno, que vê a contingência em acção de modo quase indiferente, sem desenvolver um conceito desses campos históricos e das diferenças da respectiva matrix. O pensamento pós-moderno é não histórico, precisamente neste sentido de um entendimento da contingência meramente difuso.
Porém, uma vez constituído um tal campo, este limita a contingência, que fica reduzida às possibilidades no interior da sua matrix. Portanto na contingência historico-social temos que nos defrontar com duas distintas nuvens de probabilidade; à uma, com a nuvem de probabilidade de ordem superior da história, a partir da qual tais campos históricos ou formações se condensam, e, por outra, com uma nuvem de probabilidade secundária, a partir da qual a história interna de tal campo se desenvolve de acordo com o padrão da sua matrix específica.
Evidentemente, há que dizer desde já que esta conceptualidade, mesmo representando uma generalização, deve-se por inteiro à experiência criticamente elaborada da constituição social capitalista moderna. Para a investigação de estados anteriores e da história anterior no seu conjunto como "história de relações de fetiche", há que acrescentar apenas uma prudente pretensão heurística, mas nenhuma nova "filosofia da história" ideológica. Portanto, há que evitar os erros da filosofia do iluminismo e do materialismo histórico, os quais ambos — num caso afirmativamente, noutro com propósito crítico — ontologizaram transhistoricamente as categorias capitalistas modernas, com que o materialismo histórico revestiu a história duma lógica de desenvolvimento dinâmico, como "dialéctica de forças produtivas e relações de produção", que na realidade caracteriza apenas o capitalismo, a moderna socialização do valor.
De entre todos os campos históricos, o capitalista da modernidade é o único cuja matrix produziu a dinâmica interna de um cego processo de contradição na realização do padrão da acção e, com isso, uma objectividade de segunda natureza que pode provocar um colapso objectivo; e assim acontece ao contrário de todas as constituições pré-modernas, por exemplo dos campos históricos das sociedades agrárias, nos quais a objectividade fetichista não se configurou em nenhuma dinâmica interna deste tipo. Por isso também a sociedade capitalista é a única a ter conduzido, por força desta dinâmica destrutiva, aos limites de uma "história de relações de fetiche" e a ter sequer tornado possível o conhecimento do carácter de fetiche em geral; no entanto, de modo algum positivamente, como coroação de uma "história de progresso" necessária, mas sim de modo puramente negativo, como problema de uma dinâmica interna de colapso especificamente pertencente a este campo histórico.
Neste contexto, há que questionar agora (de novo generalizável historicamente apenas de modo limitado) o carácter diferente da nuvem de probabilidade das possibilidades de acção e de decisão. A contingência apresenta-se de modo diferente, dependendo de se nos colocamos no plano da constituição do campo histórico como tal, ou no plano da sua história interna. Não há nenhum processo de necessidade histórica, a partir do qual o capitalismo como formação histórica "tivesse de" surgir, mas uma espécie de alteração climática para a nuvem de probabilidade das possibilidades de acção, quando a contingência atingiu um estado em que um determinado campo histórico da sociedade agrária começou a decompor-se. Nesta decomposição a peste desempenhou um papel, mas mais ainda a revolução militar das armas de fogo, na chamada idade moderna primordial; a explicação detalhada destes desenvolvimentos constitui um tema próprio e não vem ao caso aqui. Mas é importante a constatação de que com isto se verificou na nuvem de probabilidade da história a possibilidade de um salto qualitativo nas condensações da acção e da decisão, da passagem para a constituição de um novo campo histórico, cuja natureza inicialmente permaneceu ainda indeterminada.
Nesta fase de transformação também teria sido possível a constituição de um novo campo completamene diferente do do capitalismo. Ou que a condensação da nuvem de probabilidade no campo capitalista tivesse parado em determinados níveis de desenvolvimento, transformando-se noutra configuração. Isto torna-se particularmente claro em três pontos históricos. As guerras camponesas dos séculos XV e XVI representaram um levantamento contra a constituição inicial da matrix capitalista, quando esta estava apenas em formação embrionária; se tivessem saído vitoriosas (a sua derrota não era de modo nenhum "necessária") então ter-se-ia constituído uma outra matrix a partir da nuvem de probabilidade; ainda que presumivelmente não uma suplantação da história das relações fetichistas, mas sempre um outro novo campo histórico, com outro padrão de acção que não o capitalista. Os movimentos sociais e revoltas do século XVIII e início do século XIX já estavam mais impregnados da matrix capitalista em formação, mas continham ainda assim a negação do trabalho abstracto; se tivessem saído vitoriosos (e a sua derrota não era absolutamente "necessária"), então a constituição capitalista teria sido parada nesse ponto e a nuvem de probabilidade teria assumido uma outra qualidade na sua condensação. O movimento operário moderno clássico do fim do século XIX, finalmente, já tinha interiorizado amplamente na prática o padrão de disciplinamento do trabalho abstracto, mas ao mesmo tempo, através da recepção da teoria de Marx, que pela primeira vez tematizou em crítica radical o conceito não só do trabalho abstracto e da forma do valor, mas também da relação de fetiche em geral, ficou cheio da possibilidade de uma ruptura consciente; bem cintilante, aliás, nos primeiros programas e intenções marxistas, que na realidade não tardaram a ser abandonados — mas também isso não era absolutamente "necessário". Também neste ponto, tivesse a constituição capitalista ainda sido parada e poderia ter começado uma transformação, que seria certamente acompanhada de violentas fricções, mas nem por isso teria sido "impossível" (ter-se-ia vencido o problema do trabalho abstracto, isto é, o movimento de transformação deveria ter-se emancipado desta matrix através do desenvolvimento da crítica, e com isso dos próprios momentos de interiorização).
Apenas porque neste ponto de ruptura a nuvem de probabilidade se condensou em decisões fácticas, de modo nenhum assentes a priori, que de cada vez resultavam a favor duma mais ampla consolidação e desenvolvimento do campo capitalista, pôde a dinâmica de contradição capitalista continuar a desenvolver a sua lógica de um movimento objectivo das categorias autónomas, com base na matrix constituída. A contingência que ainda restava cada vez numa nuvem de probabilidade de segunda ordem, numa história interna do campo capitalista, era então por sua vez determinada do ponto de vista da lógica de desenvolvimento geral; no interior deste determinismo do campo do conjunto, contudo, eram e são abertas e indeterminadas cada uma das decisões e acções realizadas. Assim, por exemplo, a constituição atrasada do Estado nacional alemão no século XIX não teria necessariamente que ser bem sucedida, cada uma das partes do posterior império alemão teria podido integrar outra estrutura de Estado, e a humanidade teria sido poupada a muita coisa (do mesmo modo também podia pelo contrário ter ocorrido já no século XIX a constituição dessa nação, com a inclusão da Áustria). Nem a vitória do nacional-socialismo, nem a consequente história de catástrofes eram forçosas ou "historicamente necessárias"; mesmo com um desenvolvimento mais aprofundado do campo capitalista, a humanidade não tinha que ter suportado incondicionalmente estes agravamentos extremos da potência para a barbárie no interior do capitalismo.
Aqui, porém, não se trata da contingência da história no interior do capitalismo, mas da questão da lógica de colapso que se refere inequivocamente ao campo capitalista como tal. Se a dinâmica de contradição do capitalismo contém em si uma tendência de colapso, então ela é o resultado dessa objectivação do campo com tais qualidades. Também a constituição desta objectivação das categorias e da sua cega dinâmica de colapso, como processo logicamente determinado, é de facto determinada pelas acções humanas e levada a cabo pelas acções humanas; mas não pelas acções e sua intencionalidade imediatamente, mas pelo facto de estas mesmas acções, num processo incontrolado, terem feito primeiro uma matrix, um padrão de acção, que se objectivou nas categorias sociais e deu lugar a uma dinâmica de contradição autonomizada; e na medida em que o posterior agir se realiza nestas categorias e de acordo com esta matrix, os seres humanos, sem disso estarem conscientes e sem sobre isso terem controle, põem eles próprios em movimento o motor categorial da autocontradição e do programa de colapso, até serem atingidos pelos respectivos resultados. O "sujeito automático" não é outra coisa senão o auto-movimento das categorias reais capitalistas, que foram criadas pelos seres humanos inconscientemente e que se movimentam de modo autonomizado precisamente porque os indivíduos realizam a sua vida nessas categorias, já não querem imaginar outra coisa para si e buscam a todo o custo a sua felicidade em corresponderem às exigências produzidas por esta matrix.
A tendência de colapso está portanto objectivamente determinada pelo facto de os seres humanos organizarem subjectivamente o seu agir de acordo com a matrix capitalista instituída, ou seja, executarem e executarem cada vez mais o sistema do trabalho abstracto e da sua forma valor, até por assim dizer se enforcarem a si mesmos nele. Ou seja, quanto mais os sujeitos agem, lutam e se movem, sem pôr em questão a matrix deste agir, lutar etc., o sistema do trabalho abstracto, ou sem sequer se aperceberem dele como problema, tanto mais põem eles mesmos em andamento o mecanismo do relógio do "colapso automático". Eles não o querem, não o sabem, mas fazem-no, simplesmente porque não imobilizam a máquina social do "sujeito automático" produzida na longa cadeia histórica de acções e cada vez mais dessenvolvida na sua dinâmica de contradição. Quanto mais subjectivo, mais objectivo — este enigma da moderna estrutura-sujeito-objecto deixa-se resolver com base nas conceptualidades da constituição de fetiche e do campo histórico ou da sua matrix.
A consequência do conhecimento da tendência de colapso automático é por isso exactamente o contrário de fatalismo, nomeadamente uma qualidade completamente nova da própria crítica radical. A falsa subjectivação das categorias, o insistir na pretensamente livre competência de acção do sujeito, geralmente contingente nas categorias, leva assim mais seguramente ao automatismo objectivo do colapso, porque a própria matrix do agir é ignorada e fica por criticar. Inversamente, o conhecimento do carácter deste automatismo do colapso leva à crítica das categorias em si e da matrix que lhes subjaz, portanto a uma radicalidade que vai mais fundo, que é necessária para extravasar o campo histórico.
Porém, à matrix pertencem não só a forma e a substância do trabalho abstracto, mas também o portador da acção desta conexão sistémica cega, que põe em movimento o "sujeito automático" através do seu próprio padrão de acção pré-estruturado — o sujeito. Este sujeito tão pouco pode ser determinado como transhistórico-ontológico quanto o próprio trabalho abstracto. O sujeito representa muito mais o moderno portador da acção do trabalho abstracto e das suas funções derivadas — ele não é senão a forma social do agir nos próprios indivíduos: forma da percepção, forma do pensamento, forma do relacionamento, forma da actividade (cf. sobre isto detalhadamente Kurz 2004). Portanto não há que perguntar como se perfila a nova qualidade da crítica através do sujeito, mas esta nova qualidade implica a crítica do próprio sujeito: a crítica da "forma sujeito", que não é outra coisa senão a moderna forma capitalista do agir. Isto talvez seja difícil de conceber porque estamos habituados a pensar as acções e as decisões em geral apenas na categoria do sujeito. Mas é precisamente nisso que consiste a fixação na matrix capitalista. Crítica do sujeito não significa baixar os braços e entregar-se ao fatalismo, mas antes pelo contrário, uma nova qualidade da própria luta, que conscientemente se coloca o objectivo da ruptura com a matrix capitalista.
Decisivo para uma crítica radical da "forma sujeito" é também o conhecimento da estrutura deste sujeito. Ele não é de facto o "ser humano" enquanto tal, mas o sujeito masculino branco ocidental (abreviado MBO) da modernidade. Aqui há que voltar mais uma vez à conceptualidade quebrada da abstracção real do trabalho, assumida na primeira parte deste estudo em ligação com a teoria da dissociação de Roswitha Scholz. A abstracção real vem sempre, não só acidental ou empiricamente, mas de acordo com a sua determinação essencial lógica, junta com a dissociação sexualmente determinada de momentos da reprodução social materiais, socio-psíquicos e cultural-simbólicos, que não cabem no trabalho abstracto/forma do valor. Esta dissociação não deve ser entendida (e assim mal entendida) como "esfera" separada (por exemplo, simplesmente a "privacidade") ou como domínio subordinado, mas como momento essencial abrangente, transversal a todas as esferas, porque está sediado no plano da lógica básica ou da própria matrix. A totalidade capitalista não é portanto uma totalidade monistica, que em si bate certo, como aparece por exemplo ainda em Moishe Postone, mas, enquanto a ser pensada já sempre com a estrutura de dissociação, uma totalidade quebrada, que em si não bate certo (o que implica uma crítica fundamental do conceito de totalidade de Hegel).
Por isso a dissociação, como momento da estrutura essencial do trabalho abstracto, há-de voltar a encontrar-se nos sujeitos desta forma e substância. As mulheres na modernidade são sempre "duplamente socializadas" (Regina Becker-Schmidt), elas estão em certa medida apenas a meias na forma de sujeito, porque também têm sempre de representar e tratar simultaneamente o dissociado, e seja qual for a maneira por sua vez quebrada e diferenciada. A dissociação estende-se, como momento essencial, não só através de todas as esferas da reprodução constituída pela matrix capitalista, mas também através de todas as épocas da sua história interna, com marcas diferentes em cada uma, até à pós-modernidade (vd. detalhadamente Scholz 2000). O mesmo se aplica à humanidade não branca, não ocidental, que debaixo das elites da modernização nunca chegou inteiramente à forma de sujeito moderna, e por isso é sempre a primeira a ameaçar fracassar na matrix capitalista, que lhe é apresentada como perfil de exigência, sem que ela possa atingir as condições para isso necessárias.
A nova qualidade da crítica radical que acompanha a resolução do moderno dilema-sujeito-objecto (não apenas) na teoria da crise e do colapso, exige por isso não só uma crítica da ontologia do trabalho, mas também uma crítica do sujeito, como portador da acção desta ontologia; e não só uma crítica do sujeito, mas também uma crítica da estrutura de dissociação a ele ligada por lógica essencial. Uma "crítica do trabalho" reducionista, que leva a crítica do sujeito só até meio (isto é, até um conceito de sujeito sexualmente neutro) e que ignora a lógica de dissociação, ou a degrada como algo meramente histórico-empírico, permanece sob a égide do MBO e está condenada ao fracasso. Apenas uma crítica radical integrada em igual medida do trabalho abstracto, da forma do sujeito e da dissociação sexualmente determinada pode ganhar a força de impacto para uma suplantação da ontologia do trabalho, e com isso da matrix do campo capitalista. Outra vez, para registo: o conteúdo da crítica não pode ser apenas a eterna invocação do sujeito nas categorias ou junto com as categorias, mas sim a crítica e por fim a destruição prática da matrix categorial e com isso do sujeito, do próprio MBO.
Para a esquerda, mesmo precisamente para a esquerda radical, este entendimento é tão difícil e quase insuportável, porque ela, como herdeira da falsa subjectivação das categorias adoptada no marxismo do movimento operário, por assim dizer congelou de modo particular o conceito de classe. Porém, a "classe operária" não é outra coisa senão — um sujeito, um sujeito do trabalho abstracto e com isso um MBO, o que a história da relação entre os sexos e da sua reflexão de muito curto alcance ou totalmente ignorada no contexto da história da luta de classes demonstrou à saciedade. O conceito de luta de classes é de um universalismo androcêntrico, porque continua preso à ontologia do trabalho e porque declara como alavanca ontológica da emancipação o que não passa de forma e substância da matrix capitalista. Assim, a classe operária permaneceu em última instância como máscara de carácter do capital variável, e a luta de classes, de acordo com o seu conceito, um movimento de modernização no espaço interior do campo capitalista. Hoje desmorona-se empiricamente a marca luta de classes, porque no novo entroncamento da história de crises capitalistas a própria substância do trabalho se tornou obsoleta e as categorias sociais empíricas, que estão entregues à administração da crise, já não se deixam subsumir sob o "trabalho criador de valor" como categoria abrangente. Mas a esta empiria já não corresponde nenhum novo conceito de crítica. Falta o conceito de crítica precisamente porque falta o conceito de crise, porque não foi suplantada a subjectivação das categorias.
Mesmo assim, ainda cintila ocasionalmente o problema central, até junto dos últimos políticos da luta de classes, há muito condenados a uma existência meramente virtual. É o que diz, por exemplo, um texto da revista tardo-operaista "Wildcat", completamente ao arrepio das habituais subjectivações categoriais, sobre o conceito de fetiche de Marx: "Ele fala ironicamente das "leis naturais" da produção no contexto do capitalismo, o que tanto os marxistas estruturalistas como os críticos do determinismo tomam à letra, sem verem a crítica aí contida" (Circular Wildcat 2000). Com isto se começa a abordar o problema da matrix (abrangente da estrutura social e das classes), ou da falsa objectivação, como objecto da crítica. Vai ainda na direcção certa quando diz mais adiante: "A acusação de determinismo, como acusação passe-partout contra qualquer análise materialista, deita fora o bébé com a água do banho, e contrapõe especularmente ao determinismo estruturalista não histórico um conceito da ‘liberdade’ ou da indeterminação (‘contingência’) histórica igualmente não histórico e filosófico" (ibidem).
Torna-se porém claro que a crítica categorial ainda está no princípio, porque é incompleta: "As teorias de colapso e deterministas são porém em todo o caso de criticar, se recusam aos seres humanos a possibilidade de no decurso da história poderem tornar-se sujeitos autodeterminados da sua própria história." (ibidem). Aqui surge a forma de sujeito, precisamente ela que impossibilita a autodeterminação, porque é a forma categorial de pensamento e acção da matrix feticista, ainda no estado de pretensa inocência emancipatória; porventura porque o sujeito das classes deve ser salvo incondicionalmente, apesar de ser "em si" parte integrante da objectivação negativa, designadamente sendo ele próprio totalmente constituído sem qualquer resseguro ontológico pela matrix do campo capitalista, e de ser a forma de existência do MBO.
Pelo contrário Freerk Huisken, um ideólogo da revista marxista "Gegenstandpunkt", mostra-se todo imune a dúvidas sobre a ontologia do trabalho e a objectivação fetichista, quando assinala a ideia da ruptura categorial com o trabalho e com a produção de mercadorias da literatura de crítica do valor com um ponto de exclamação entre parêntesis, como se tivesse descoberto uma loucura particularmente evidente. Ele procura ironizar à força "sobre essa coisa da ‘ruptura categorial’..." (Huisken 1999), para acabar por classificá-la como irracionalidade esotérica e "revisionismo": "O leitor... não precisa de nenhuma razão para o seu anti-capitalismo filosófico, mas só da fé na notícia do desencadeamento do tempo final, da visão de um mundo melhor e da ‘ruptura categorial’ com a crítica do capitalismo de Marx, ou seja, da completa rejeição da luta de classes" (Huisken, ibidem, itálico de Huisken). É uma mera colecção de palavras de toque postas em itálico, que aqui são reunidas em acto reflexo em torno dos conceitos das categorias, e que já parece ficar reduzida a meros sons sem sentido. Ora a crítica categorial é de facto uma ruptura com o entendimento que ele, Huisken, tem da "crítica do capitalismo de Marx". Só que ele, tal como todo o círculo da "Gegenstandpunkt", não fazem a mínima ideia de que com este entendimento não passam de um resíduo duma história da teoria fora de prazo.
Provavelmente ainda há-de correr alguma água por baixo das pontes até que se extinga a cena marxista residual, com a sua fé em "fazer política", no "sujeito" e na "luta de classes". Esta cena verá sempre nos conceitos de crise categorial (limite interno absoluto) e crítica categorial apenas uma espécie de quietismo e capitulação, precisamente porque só consegue pensar a crítica e a emancipação nas categorias da matrix capitalista. Para recorrer mais uma vez a uma analogia da área da física mais recente: acontece com eles talvez um pouco como naquela parábola predilecta dos cosmólogos e físicos quânticos, que pretende ilustrar para o nosso entendimento quotidiano o problema do entendimento do mundo "impossível" dos quanta, das cordas etc.: "Um camponês pede a um engenheiro para lhe explicar como funciona a máquina a vapor. O engenheiro dá-lhe uma explicação detalhada, desenha diagramas, explica os princípios fundamentais, mostra-lhe onde se carrega o combustível e onde sai o vapor, como o calor se transforma em movimento etc. Quando o engenheiro acaba, diz o camponês: ‘Compreendo. Mas onde é que está o cavalo?’..." (Cole 2004, 202). Isto, diz um físico, reflecte os sentimentos "que tem perante a teoria da relatividade geral de Einstein. ‘Compreendo, mas não sei onde é que está o cavalo’..." (ibidem, 202 sg.). Um marxista residual como Huisken, se quisesse debruçar-se a sério sobre os conceitos de constituição- sujeito-objecto da sociedade, campo histórico, matrix capitalista, objectivação das categorias etc. havia de compreender tudo de alguma maneira. Mas no fim havia de voltar sempre a perguntar apenas onde é que está o cavalo.