Os Inimigos do Povo Mostram Sua Verdadeira Face

Maurício Grabois

16 de janeiro de 1946


Fonte: Jornal Tribuna Popular (RJ), 16 de janeiro de 1946.

Transcrição: Leonardo Faria Lima

HTML: Fernando Araújo.


Quando em abril do ano passado, em consequência da derrota militar das hordas nazistas nos campos de batalha, diante dos exércitos das democracias, e em virtude da luta tenaz do nosso povo contra o fascismo, o governo do sr. Getúlio Vargas era obrigado a ceder às massas, permitindo a liberdade de imprensa, de palavra e reunião, e posteriormente decretando a anistia, velhos politiqueiros e fascistas empedernidos, de há muito desmascarados perante os verdadeiros patriotas brasileiros, encheram-se de furor “democrático”, negando essas grandes vitórias do povo, ao mesmo tempo que faziam violenta agitação “democrática”.

Querendo barrar a marcha do país, então iniciada, no sentido da democracia, procuravam por todos os meios provocar a desordem propícia aos golpes salvadores para levar a efeito o esmagamento das forças democráticas e do movimento operário. Apesar de não encontrarem ambiente, devido à orientação justa do Partido Comunista do Brasil em defesa da ordem e da tranquilidade internas, os inimigos encapuçados do povo, com este objetivo, utilizavam sua imprensa reacionária e venal, que então vestia roupagens democráticas mas igualmente conhecida do povo por sua cooperação sem reservas na perseguição incruenta dos elementos anti-fascistas comunistas ou não, pela polícia-política do nazista Filinto Muller.

Essa imprensa que jamais ergueu a sua voz contra os atentados à Carta Constitucional de 1934, contra a declaração dos dois estados de guerra, contra a prisão de parlamentares, contra os espancamentos e torturas infringidas aos presos políticos, contra a deportação de Olga Benário Prestes para a Alemanha de Hitler, em abril de 1945, falava em democracia e nos crimes do regime do Estado Novo – que ela mesma ajudou a instalar, e desenvolvia grandes campanhas pela “democracia”. Entre as muitas palavras de ordem que demagogicamente defendiam estava a do direito da greve, que nos tenebrosos tempos da ditadura era considerada crime.

Assim, o “Correio da Manhã”, o “Diário Carioca” e toda a imprensa a serviço dos piores inimigos do nosso povo agitavam esse direito sagrado dos trabalhadores – o de greve – com o fim exclusivo de arrastar os trabalhadores para as suas aventuras golpistas.

Enquanto o proletariado brasileiro conseguia uma grande vitória com a assinatura pelo Brasil da ata de Chapultepec, onde os povos americanos inscreveram a greve como um legítimo direito da classe operária, os remanescentes do fascismo em nossa terra, mascarados de democratas, tentavam inutilizar essa conquista para entravar a democratização do país. Mas, os trabalhadores, conduzidos pelo seu Partido de classe, o Partido Comunista do Brasil, compreenderam que embora a greve fosse um princípio sagrado, havia ainda muitos outros recursos para os quais podiam apelar com o fim de satisfazer as suas reinvindicações imediatas e que só em última instância recorreriam à greve. Com esta compreensão, mesmo com sacrifício de muitos dos seus interesses, os trabalhadores não deram armas para agitações que favorecessem os fascistas, conseguindo muitas de suas reinvindicações, através de outros meios que não a greve, como o dissídio coletivo e outros.

Da parte do trabalhador nunca partiu a menor provocação, apesar de todas as dificuldades que atravessava. Ao contrário, patrões reacionários, administradores de organizações para-estatais, de espírito estreito e autoridades de tendência fascista, provocavam de todas as formas os trabalhadores. A tentativa feita, há poucos meses pelos proprietários de empresas de ônibus, de transformar um “lock-out” em greve de “chauffeurs” mostra de onde partiam as provocações.

Depois do golpe de 29 de outubro, a situação econômica dos trabalhadores piorou tremendamente, em consequência da crise que atravessa o país, a braços com a inflação e crescente carestia de vida. Assim mesmo, a massa trabalhadora se manteve serena. Mas as provocações começaram a surgir. Vinham das próprias autoridades. Qual poderia ser a atitude dos trabalhadores da Light, quando a mais alta autoridade da Nação, o próprio Presidente da República, nas tremendas condições de vida que atravessam, lhes tirava um miserável abono de Natal, a não ser a que tomaram? E outro poderia ser o recurso dos motoristas do Distrito Federal, em face das medidas reacionárias e atrabiliárias, claramente lesivas aos seus interesses, tomadas por um graduado membro da velha polícia de Filinto Muller, senão a greve? Não foram os motoristas que provocaram a greve. Foi o sr. Edgard Estrela quem, prejudicando a população e os “chauffeurs” com a revogação de direitos legítimos, provocou a atual greve.

E qual a atitude da imprensa, a da chamada oposição e a do governo, que há meses defendia o direito de greve com tanto alarde? Com honrosas excepções, como a TRIBUNA POPULAR , “Diretrizes” e “A Notícia” coloca-se abertamente contra os motoristas, aceitando todas as calúnias levantadas pelo sr. Edgard Estrela, de que os modestos motoristas exploram o povo, estão pondo em perigo o “princípio de autoridade” e ameaçam a sociedade com a falência, visando unicamente lançar a população contra os grevistas. E o “Correio da Manhã”, no mesmo dia em que defende o “lock out” na Argentina, combate raivosamente as lutas justas dos nossos “chauffeurs”. Aí está a democracia dos jornais da reação. Isso serve como uma grande lição para os trabalhadores.

Nada mais odioso do que a atitude de tentar lançar o povo contra os grevistas. Eles foram à greve em defesa de justos direitos e se a população é prejudicada, a culpa exclusiva cabe ao auxiliar da Gestapo filintiana, o sr. Edgard Estrela, que deve ser imediatamente destituído do posto que ocupa. Por outro lado, não é mais compreensível que, depois da derrota militar do fascismo, com a cooperação valiosa da FEB, se procure utilizar ameaças policiais para resolver justas reinvindicações dos trabalhadores. É lastimável que jornais que silenciaram sobre os aumentos das passagens de bonde da Light, hoje se voltem contra os motoristas, quando defendem um direito que lhes é violentamente arrancado.

Num momento em que marchamos para a normalização legal do país com a instalação a dois de fevereiro da Assembléia Constituinte, não é possível admitir que, remanescentes do fascismo em nossa terra, tomem atitudes dignas de um Himmler ou de um Heydrich ameaçando a velhos trabalhadores, todos naturalizados, de expulsão do país.

O povo, apesar das dificuldades com a greve dos “taxis”, está compreendendo a justiça da causa dos “chauffeurs”! Cumpre a todos os democratas desmascarar as intrigas dos inimigos dos trabalhadores, prestando a sua solidariedade aos grevistas. Estes devem prosseguir na sua luta porque a sua causa é justa, é um direito democrático que lhes assiste e contam com o apoio de todos os seus irmãos de classe.


Inclusão: 12/09/2020