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Fonte: Cuba Debate
Transcrição e HTML: Fernando Araújo.
Queridos Miguel Barnet e demais membros da UNEAC:
Não posso participar junto de vocês nos debates. Conheço as preocupações dalguns dos membros da organização — sobretudo as tuas, Miguel — devido ao tradicional costume de estar presente nos congressos de nossos escritores e artistas.
Contudo desejo, como um modesto aporte à reunião, expressar algumas inquietações que vêm a minha mente, a qual de costume se coloca perguntas difíceis, embora nem sempre com a calma e o tempo do qual agora disponho forçosamente. Serei breve, sintético e me limitarei a fazer poucas observações.
O ser humano moderno não é menos egoísta do que o grego da época de Platão. Tudo o contrário, o ser humano de nossos dias está sendo submetido a um dilúvio de publicidade, de imagens e de influências nunca antes visto.
No socialismo não pode ser excluída a fórmula de que cada qual aporte segundo a sua capacidade e receba segundo o seu trabalho. De onde sairão os recursos da sociedade para oferecer a todos os serviços essenciais da vida, possam ou não trabalhar, produzam ou não os bens ou serviços econômicos?
O aporte à sociedade não pode fugir de uma parte proporcional, e jamais igual, daquilo que seja capaz de criar. O imposto é irrenunciável e não pode ser simplesmente uma proporção. Existe um momento, por seu alcance, no qual pode chegar a ser quase a totalidade do que foi criado.
O imposto direto aniquilou governos da esquerda nos países nórdicos e noutros europeus. Não existe nada mais antipático. Captar o excedente em valor dos serviços exportados, além daqueles que são oferecidos gratuitamente na esfera internacional por dezenas de milhares de compatriotas, não só é justo, mas também mais compreensível do que o cobro direto de uma crescente proporção da renda pessoal como um punhal no peito exigindo a bolsa ou a vida.
Os estímulos que são entregues não só em divisas para comprar no mercado, mas também através de numerosas formas de conteúdo social, humano e familiar altamente eficazes, não estimulam o individualismo e o egoísmo que conduzem à negação, com os mais diversos disfarces, da sociedade que queremos criar.
Escutei os discursos que foram proferidos hoje de manhã, vários deles excelentes por sua expressão e conteúdo. Enquanto redigia e passava a limpo esta mensagem pude escutá-los todos. Tuas palavras, Miguel, foram uma sincera estocada aos corruptos que, em benefício pessoal, se apropriam de uma boa parte desse excedente. Temos que bater neles “com fúria de mão escrava sobre seu opróbrio”, mesmo como ao tirano. Cito as palavras de um dos Versos Simples de Martí.
Pergunto-me, podem os métodos com os quais é administrado um armazém criar a consciência necessária para atingir um mundo melhor?
Não teria sentido falar de consciência revolucionária se não existisse o capitalismo desenvolvido e globalizado, previsto há quase cem anos.
A consciência do ser humano não cria as condições objetivas. É ao invés. Só então é que se pode falar de revolução.
As palavras belas, necessárias como portadoras de idéias, não são suficientes; precisasse de meditações profundas.
Há dois dias, num artigo da imprensa estrangeira, fizeram referência a trinta invenções geniais que transformaram o mundo: disco compacto, GPS e DVD, telefone celular, fax, Internet, microonda, Facebook, câmara digital, correio eletrônico, et cetera, et cetera, et cetera.
A quantidade de dólares que implica — e de certa maneira já implicou — a venda de cada um dos produtos acumula tantos zeros nas mãos das multinacionais, que é incompreensível. Ainda pior: cada um deles será substituído por uma outra invenção mais efetiva e já não se poderá nem se sequer garantir o segredo daquilo que fala um casal num banco do parque.
Tem algum sentido esse tipo de existência que promete o imperialismo? Quem rege a vida das pessoas? Pode inclusive ser garantida a saúde mental e física com os efeitos ainda desconhecidos de tantas ondas eletrônicas para as quais não evolucionou nem o corpo nem a mente humana?
Um congresso da UNEAC não pode deixar de abordar estes temas espinhosos. Muitos dirão: é fatalismo. Respondo. De maneira nenhuma, fatalismo è deixar de colocar o problema. Nem sequer os incomodaria com estas linhas.
O clima esta mudando como conseqüência da ação irresponsável do homem. O equilíbrio quebrou-se. O grande problema que devemos resolver é o que fazer para restabelecê-lo.
Mencionei apenas uma parte das perguntas que, observando as realidades do mundo, passam por minha mente.
Desfruto muito quando vejo os avanços de nosso povo em diversos domínios, que outras sociedades livres de cruéis bloqueios e mortais ameaças não puderam conseguir, inclusive em matéria de luta para a preservação do meio ambiente.
Isso provoca o ódio de nossos adversários. Li artigos de reconhecidos órgãos de imprensa capitalista que nos atacam em matilha. Falam de nosso país como se fossemos indigentes e começássemos a partir de zero, e não um povo com níveis de educação mínima não alcançados pelos mais desenvolvidos, um índice de saúde excelente e previdência social talvez alta demais, como pensei quando um delegado do congresso falou com justeza a respeito daqueles que maltratam grosseiramente determinados bens sociais e instava a lutar contra os hábitos que nossa sociedade repudia.
O adversário comete erros graves e mostra ineficácia inconcebível em sua batalha contra a verdade objetiva. Há pouco tempo, empresas ianques contratadas para prestar serviços, por ordens do governo ianque privaram centenas de milhares de cidadãos suecos de ter acesso à site Rebelión da Internet, que publica notícias sobre Cuba. Simplesmente cortaram-lhe arbitrariamente esse acesso. São incapazes de compreender que o interesse por Rebelión multiplica-se e a batalha de idéias entre Cuba e o imperialismo se intensifica.
Peço-lhes desculpas caros companheiros, se fui muito extenso.
Observo o império e seus sinistros planos.
Partindo de nossos esforços sadios, patrióticos e internacionalistas nas tarefas manuais e intelectuais que realizamos todos os dias, atrevo-me a expressar: tudo que fortaleça eticamente a revolução é bom, tudo o que a debilite é mau.
Um forte abraço para todos.
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Inclusão | 09/07/2019 |