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Durante certo tempo ela foi impressa na Bahia. A maior parte de seus números saiu de pequenas e escondidas oficinas no Rio de Janeiro. Houve números paulistas. No fundo do terror ela sobrevivia, marcava o caminho, indicava os rumos certos, criticava, discutia, educava. Esse pequeno jornal operário, tenaz e combativo, foi, durante algum tempo, o único livre da censura dos Dips, livre do suborno, suas palavras verdadeiras, sua ideologia proletária dizendo do futuro, iluminando perspectivas.
Sei que muitos irão ler a CLASSE OPERÁRIA pela primeira vez. Sabem dela vagamente, de ouvir falar, não têm a perfeita idéia do papel que ela representou. Quando o fascismo caminhava de triunfo em triunfo, de crime em crime, marchando sobre os povos e as pátrias, naqueles anos que vieram da subida de Hitler ao poder no início da aventura traidora de Franco, o medo e o desanimo, como uma corda de enforcado, enrolaram-se no pescoço dos intelectuais. Nas conversas tímidas, como um ser real, estava o terror. Os intelectuais não viam uma saída, não divisavam nenhuma luz na noite que se abatia pesada como um fardo. E sua capacidade de luta e de criação desaparecia no crescendo do ascenço fascista. Era o medo habitando em cada coração, era o desânimo fazendo casa em cada peito, desespero, falta de confiança.
Nas cavernas, operários curvados sobre folhetos, curvados sobre problemas, doentes, fugidos e perseguidos, não temiam nem desanimavam. Era o Partido Comunista, pequeno, injuriado e sozinho na sua luta. O medo ficava do outro lado, haviam riscado a palavra desânimo do seu dicionário. Esses que ainda lutavam, os últimos a acender um facho de luz na noite cada vez mais envolvente, cada vez mais negra de terror, acreditavam no proletariado e no futuro.
Sua mensagem chegava por vias difíceis, a todos os setores. Chegava também àqueles intelectuais que amavam o povo e a liberdade mas cujos corações estavam apertados pelo desânimo e pelo desespero. Chegava como um balsamo, como a luz de um farol para o náufrago no último momento. Mensagem do proletariado, voz de esperança, rasgar de caminhos, perspectivas, saídas para a aurora naquela noite de assassinos, de bandoleiros, de lama. Chegava silenciosa e conspirativamente, era encontrada num envelope de cor neutra, tratava-se de um trapo de papel, mal impresso ou mal mimeografado.
A “Classe Operária” chegava até o descrente coração dos intelectuais para arrasar o pânico, para levantar a confiança, para impedir o desespero. Trazia a palavra ardente e bem pesada, do proletariado e de seu partido, a consigna que era como uma chave para a porta antes intransponível da reação. Chegava por mais que crescessem as dificuldades e cada número parecia ser o último, pensava-se que seria impossível no mês seguinte voltar a encontrá-la novamente. As oficinas caíam nas garras da polícia, os redatores – estranhos redatores de jornal que tinham mãos calosas de operários – eram torturados e processados, mas a CLASSE OPERÁRIA renascia a cada mês, não conhecia solução de continuidade como se aquele grupo de homem houvesse conquistado o poder sobre-humano dos milagres. Era um milagre do Partido, um milagre feito com sangue e sacrifício, e a CLASSE OPERÁRIA atravessou os anos ensinando e educando.
Não que fosse perfeita, bela e sempre justa. Mas, se pensarmos bem no que foram aqueles anos, então a encontraremos perfeita, bela de toda beleza e justa de toda a justiça. Quando ela chegava suja e rasgada de muitas mãos que a haviam segurado para que centenas de olhos a mirassem e a lessem, uma confiança nova alentava os corações mais desesperados. Os intelectuais compreendiam então que sobre o terror, sobre a noite e sobre o crime estava, construindo o futuro, o proletariado que não se entregava e nem se vendia. Era como um pão para famintos. Como um porto para um navio desarvorado, como o primeiro dia de convalescença para o desenganado.
Quando ela volta a surgir, agora graficamente bem feita, intelectualmente poderosa, refletindo o Partido novo que cresceu do pequeno Partido de ontem, bela como uma noiva alegre, nós a devemos recordar também nos seus dias subterrâneos, nos seus dias perseguidos. Porque a CLASSE OPERÁRIA ajudou a construir a realidade de hoje, foi alavanca para a ascenção do Partido através [de] sua justa linha política. Quando saudamos os construtores do grande Partido de agora, os homens saídos do proletariado e do povo para organização que hoje possuímos, quando saudamos esses jovens heróis da batalha do Partido, coloquemos ao seu lado o pequeno jornal que iluminou muito caminho e alimentou tanta esperança.
Recordo Jofre, o que morreu baleado na defesa do seu Partido. E o recordo sustentando na sua mão levantada um número da CLASSE OPERÁRIA. E vejo sorrir Celso Cabral, o marinheiro que fugiu, e jamais foi preso, aparecendo anos depois desse mergulho na ilegalidade no Comitê Central do Partido legal, que ajudou a construir. E lhe pergunto: — Quantos números da CLASSE não distribuíste, camarada, pelas cidades e fazendas do estado do Rio nesses anos em que buscavas em meio às trevas, o caminho que traria o Partido Comunista para a liberdade das ruas?
A CLASSE volta a circular. É como uma velha camarada que retorna após anos de cadeia ou de hospital. E volta com outra experiência, com outra capacidade, com outra força. Porque a gora não é mais o órgão daquele agressivo, audaz e pequeno Partido ilegal. Agora é o órgão do Partido sobre todos unitário, do Partido do proletariado e do povo, do Partido de Prestes!
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Inclusão | 22/01/2016 |